Acórdão nº 00581/10.0BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 14 de Julho de 2017

Magistrado ResponsávelHélder Vieira
Data da Resolução14 de Julho de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I – RELATÓRIO Recorrente: Ministério das Finanças e da Administração Pública Recorrido: MMSP Vem interposto recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, que julgou procedente a supra identificada acção administrativa especial, na qual era pedido, designadamente, a anulação da decisão final de aplicação de sanção disciplinar de 240 dias de suspensão.

O objecto do recurso é delimitado pelas seguintes conclusões da respectiva alegação [ Nos termos dos artºs 144.º, n.º 2, e 146.º, n.º 4, do CPTA, 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4, e 685.º-A, n.º 1, todos do CPC, na redacção decorrente do DL n.º 303/07, de 24.08 — cfr. arts. 05.º e 07.º, n.ºs 1 e 2 da Lei n.º 41/2013 —, actuais artºs 5.º, 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 4 e 5, 639.º e 640º do CPC/2013 ex vi artºs 1.º e 140.º do CPTA.]: 1.

“O Recorrido incorreu em responsabilidade disciplinar pela prática de três infracções.

  1. Os factos que foram qualificados como crimes de abuso de confiança fiscal e que motivaram as duas condenações em penas de prisão que constam das duas sentenças transitadas em julgado juntas aos autos constituem um ilícito disciplinar, sendo que, cada um deles, é “atentatório da dignidade e prestígio da função tributária que exercia, bem como afectou a dignidade e o prestígio dos serviços da Administração Tributária”, infracção prevista na 2ª parte do corpo do art.17º do DL. 58/2008, punível com pena de suspensão.

  2. A terceira infracção disciplinar imputada ao arguido consiste na acumulação indevida de funções na Administração Fiscal e de presidente do Clube DA, prevista na alínea c) do mesmo art.17º do DL.58/2008, todas puníveis com pena de suspensão.

  3. A pena prevista no DL.24/84 para as infracções referidas na 2ª parte do corpo do art.17º, era de inactividade, conforme resulta do nº1 do art 25º daquele diploma.

  4. Assim, e no respeito do disposto no nº1 do art.4º da Lei 58/2008, foi aplicado o regime punitivo contido neste diploma, por ser mais favorável.

  5. A douta sentença recorrida ao entender ter sido aplicado regime mais penalizador, incorre em vício de violação de lei por incorrecta interpretação e aplicação do nº1 do art. 4º da Lei 58/2008.

  6. Contrariamente ao decidido a decisão punitiva mostra-se adequadamente fundamentada nos pareceres nº 274/DSCJC/2009 e parecer 195/DSCJC/2009.

  7. Na escolha e medida da pena foram observados os elementos determinantes fixados no art. 20º do Lei 58/2008.

  8. Considerou-se, além do regime decorrente do artigo 17º da Lei 58/2008, as circunstâncias em que as infracções foram cometidas e a gravidade da conduta do arguido das mesmas decorrente bem como as circunstâncias atenuantes e agravantes especiais que no caso se verificavam.

  9. A douta sentença recorrida ao entender que a mesma padece de falta de fundamentação incorre em erro de julgamento por incorrecta apreciação de matéria de facto e vício de violação de lei por incorrecta interpretação e aplicação do art.20º da Lei 58/2008.

    Nestes termos e nos demais de direito deve ser dado provimento ao presente recurso e revogada a decisão recorrida com as legais consequências.”.

    O Recorrido contra-alegou, em termos que se dão por reproduzidos, no sentido do não padecimento, pelo acórdão recorrido, dos vícios que lhe são imputados pelo Recorrente e requer, em termos subsidiários, a ampliação do objecto do recurso, formulando as seguintes conclusões: “1.

    O procedimento disciplinar estava prescrito à data em que foi proferida a decisão final; 2.

    A duração do procedimento, após a sua instauração, não poderia o prazo inicial de instauração do procedimento, acrescido de metade; 3.

    No tocante à infracção disciplinar que é simultaneamente uma infracção criminal, o prazo de prescrição do procedimento criminal e, concomitantemente, do procedimento disciplinar, é o previsto no artigo 15.º do RJIFNA, ou seja, 5 anos; 4.

    Foram violados os artigos 4.º do Estatuto Disciplina antigo, o artigo 121.º do CP e o artigo 15.º do RJIFNA.

  10. O autor do acto impugnado estava impedido de decidir; 6.

    O autor do acto impugnado violou o procedimento previsto nos artigos 45.º e 46.º do CPA perante o incidente do seu impedimento e agiu sem competência formal e procedimental para a prática do acto; 7.

    A violação das leis fiscais por funcionários da DGCI, enquanto contribuintes, não é uma infracção disciplinar; 8.

    O exercício de presidente de um clube desportivo não carecia de autorização superior; 9.

    Foi violado o disposto alínea c) do artigo 32.º do Decreto-Lei n.º 363/78 de 28 de Novembro.

    Termos em que, deve o recurso da ré ser julgado improcedente e, caso assim não se entenda, deve ser conhecida a ampliação do objecto do recurso, julgando-se procedentes as questões aqui suscitadas.”.

    O Ministério Público foi notificado ao abrigo do disposto no artº 146º, nº 1, do CPTA.

    De harmonia com as conclusões da alegação de recurso, as questões suscitadas [ Tal como delimitadas pela alegação de recurso e respectivas conclusões, nas quais deve ser indicado o fundamento específico da recorribilidade — artigos 608º, nº 2, e 635º, nºs 3 e 4, 637º, nº 2, 639º e 640º, todos do Código de Processo Civil ex vi artº 140º do CPTA.] e a decidir [ Para tanto, e em sede de recurso de apelação, o tribunal ad quem não se limita a cassar a decisão judicial recorrida porquanto, “ainda que declare nula a sentença, o tribunal de recurso não deixa de decidir o objecto da causa, conhecendo do facto e do direito”, reunidos que se mostrem os necessários pressupostos e condições legalmente exigidas — art. 149.º do CPTA.], se a tal nada obstar, resumem-se em determinar se a decisão recorrida padece de violação de lei por incorrecta apreciação da matéria de facto, interpretação e aplicação dos artigos 4º, nº 1, e 20º da Lei nº 58/2008, de 09 de Setembro.

    Cumpre decidir.

    II – FUNDAMENTAÇÃO II.1 – OS FACTOS ASSENTES NA DECISÃO RECORRIDA A matéria de facto fixada pela instância a quo é a seguinte: 1.

    O arguido exerceu a Presidência da Direcção do clube DA desde 1 de Agosto de 1992 até 15 de Junho de 2011, sendo responsável por todos os assuntos financeiros; (Facto Provado no processo disciplinar n.º 229/02, a fls 876 do Processo Instrutor) 2.

    O arguido agiu em representação do Clube e no interesse do mesmo, tendo prestado serviços de publicidade durante os anos de 1998 até Junho de 2001 a várias empresas, liquidando e recebendo o IVA; (Facto Provado no processo disciplinar n.º 229/02, a fls 876 do Processo Instrutor) 3.

    O arguido não enviou as declarações periódicas e não fez o pagamento de acordo com o artigo 26.º do CIVA, nos períodos de Junho, Agosto, Outubro, Novembro e Dezembro de 1998 e Janeiro a Agosto de 1999, totalizando 6.571.205£00 (€ 32.777,03); (Facto Provado no processo disciplinar n.º 229/02, a fls 876 do Processo Instrutor) 4.

    O arguido não enviou nenhum meio de pagamento relativo às declarações periódicas de IVA dos períodos de Janeiro a Maio de 1998, totalizando 6.023.100$00 (€30.043,10), do ano de 2000, totalizando o valor de 4.947.000$00 (€ 24.675,33) e do período de Janeiro a Julho de 2001, no montante de 1.681.300$00 (€ 8.386,29); (Facto Provado no processo disciplinar n.º 229/02, a fls 876 do Processo Instrutor) 5.

    O arguido em representação do Clube DA pagou salários aos jogadores durante os anos de 1998, 1999, 2000 e 2001, retendo imposto de acordo com o artigo 29.º do CIRS; (Facto Provado no processo disciplinar n.º 229/02, a fls 876 do Processo Instrutor) 6.

    O arguido não fez a entrega nos cofres do Estado dos valores retidos nos termos do n.º 5 destes Factos Provados, totalizando o valor de 2.358.867£00 (€ 11.765,98); (Facto Provado no processo disciplinar n.º 229/02, a fls 876 do Processo Instrutor) 7.

    O arguido fez o pagamento do rendimento do trabalho dependente de Janeiro a Dezembro de 2000, mas não reteve o correspondente imposto, não o entregando aos Cofres do Estado, correspondente a 2.985.286$00 (€ 14.890,54); (Facto Provado no processo disciplinar n.º 229/02, a fls 876 do Processo Instrutor) 8.

    O arguido fez o pagamento do rendimento do trabalho dependente de Janeiro a Maio de 2001, mas não reteve o correspondente imposto, não o entregando aos Cofres do Estado, totalizando € 4.859,84; (Facto Provado no processo disciplinar n.º 229/02, a fls 876 do Processo Instrutor) 9.

    O arguido contactou os responsáveis de várias empresas, celebrou contratos de publicidade simulados, emitiu ou mandou emitir facturas em nome do Clube Desportivo que não tinham subjacente o fornecimento de publicidade nelas mencionadas; (Facto Provado no processo disciplinar n.º 229/02, a fls 876 do Processo Instrutor) 10. Em 20 de Dezembro de 2001 um documento timbrado de “Direcção-Geral dos Impostos” é subscrito pelo Director de Finanças VN, dirigido ao Director-Geral dos Impostos, onde consta “… Assunto: Denúncia anónima contra MMP. Porque o conteúdo da denúncia se refere a aspectos não tributárias, mas eventualmente passíveis de abordagem disciplinar, tenho a honra de devolver a V. Excia o correspondente expediente (…) ”; (Facto Provado no processo disciplinar n.º 229/02, a fls 20 a 22 do Processo Instrutor) 11. Em 11 de Abril de 2002 é subscrito documento timbrado de “Direcção-Geral dos Impostos”, cujo Assunto é “Denúncia Anónima contra MMSP”, que se dá aqui por reproduzido, mas onde consta designadamente “… 6.

    … Propõe-se: 6.1.

    A remessa do original do presente processo à DSJC para efeitos de apuramento de responsabilidades de âmbito disciplinar contra o funcionário MMSP (…)”; (Facto Provado no processo disciplinar n.º 229/02, a fls 5 a 8 do Processo Instrutor) 12. Em 17 de Abril de 2002, o Subdirector-Geral dos impostos, JD, profere o seguinte despacho “… Concordo. Proceda-se como proposto…”; (Facto Provado no processo disciplinar n.º 229/02, a fls 5 do Processo Instrutor) 13. Em 25 de julho de 2002 é subscrito documento timbrado de “Direcção-Geral das Contribuições e Impostos”...

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