Acórdão nº 01540/08.9BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Novembro de 2020
Magistrado Responsável | Paulo Moura |
Data da Resolução | 19 de Novembro de 2020 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: C., LDA, interpõe recurso da sentença que julgou improcedente a impugnação das liquidações adicionais de IVA e associadas liquidações de juros compensatórios nos.
08111040 a 08111049, referentes aos anos de 2004 e de 2005, no montante total de € 22.824,61, por entender, ao contrário do decidido, que foram efetivamente prestados os serviços correspondentes às faturas emitidas.
Formula nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem: A - Através de um relatório de inspecção tributária com 34 páginas, em que apenas 9 páginas dizem respeito à investigação e às diligências levadas a cabo em relação aos serviços prestados pela “S., Lda.” à impugnante, concluiu a AT pela simulação das operações mencionadas nas facturas emitidas à impugnante pela “S., Lda.”, sendo todos os restantes elementos vertidos nesse relatório relativos a outras relações comerciais sem qualquer conexão com a impugnante ou a aspectos meramente formais; B - A situação irregular da “S., Lda.” para com a AT, a Segurança Social, a contabilidade, os seguros e a eventual inexistência de alvará de construção, não contende com a efectiva prestação dos serviços de mão-de-obra à impugnante que estão expressos nas facturas emitidas por esta sociedade; C - Por essa razão e em sede de impugnação judicial, foi invocada a insuficiência da investigação e dos indícios atinentes às circunstâncias concretas e arroladas testemunhas com intervenção directa nas obras referenciadas nessas facturas; D - As testemunhas depuseram de forma clara e esclarecida, e com conhecimento directo dos factos porque intervieram nas obras em questão por força das funções nelas desempenhadas, designadamente, directores de obra, encarregado e chefes de equipa, E - E todas confirmaram a intervenção da “S.
, Lda.” como subempreiteira da impugnante nas obras adjudicadas a esta pela “H.
, S.
A.”, situadas em Vila Real, tal como esta empresa já havia referido aos agentes da inspecção tributária, bem como noutras obras sem serem da “H.
, S.
A.
” e situadas no Porto.
Vila Meã e Trevoada; F - Foi também descrito pelas testemunhas o número de trabalhadores que esteve nessas obras, a sua categoria profissional, como era feito o transporte do pessoal para as obras e quanto tempo duraram as mesmas, bem como que os serviços prestados respeitam a mão-de-obra; G - Foi também referido por todas as testemunhas que as folhas de ponto não mencionam o nome completo dos trabalhadores, mas antes o seu nome abreviado, normalmente o primeiro e o último nome e identificados alguns dos trabalhadores cujos nomes abreviados constam das folhas de ponto; H - Por essa razão, devia ter sido consignado o teor dos depoimentos prestados, dada a credibilidade dos mesmos e a sua relevância para a decisão final, não se acompanhando, assim o juízo formulado pelo Meritíssimo Juiz a quo no sentido de que os mesmos “acabaram por se revelar vagos e genéricos no que tange aos trabalhos B que se reportam cada uma das facturas, aos exactos trabalhadores que, concretamente em cada uma das obras terão aí trabalhado e por quanto tempo (.
..
)”; I - Devia ter sido consignado, também e a par do nº 12 da matéria de facto, que todos os cheques emitidos pela impugnante para pagamento das facturas da “S.
, Lda.” e à sua ordem, foram apresentados a pagamento no Banco e efectivamente descontados, contendo no seu verso a assinatura do gerente daquela sociedade e o respectivo carimbo, factos que decorrem das cópias, da frente e verso, dos cheques em causa, bem como, dos extractos bancários da impugnante que exibem esse desconto bancário e que constam dos autos: J - Devia ter sido consignada, igualmente, a existência de autos de medição e de folhas de ponto que justificam os valores facturados pela “S.
, Lda.” e que se encontram anexos a cada uma das facturas descritas no nº 11 da matéria de facto: L - A este respeito, não se acompanha o juízo formulado pelo Meritíssimo Juiz, porquanto as falhas apontadas a estes documentos são comuns neste sector de actividade e do conhecimento geral, mormente quando a sua elaboração demonstra, como sucede no caso em apreço, a diminuta instrução das pessoas envolvidas e que é patente em todos os documentos juntos aos autos, atentos os manifestos erros na língua portuguesa evidenciados; M - Ademais, não podem questões meramente formais sobrepor-se à essência do que está em causa: as falhas apontar aos autos de medição, às folhas de ponto e às facturas não são susceptíveis de destruir a credibilidade da prestação de serviços de mão-de-obra que encerram; N - Aliás, os autos de medição juntos ao processo foram elaborados pela impugnante, em papel timbrado, deles constando, sem excepção, a assinatura do subempreiteiro cujo trabalho está a ser medido e encontrando-se, a esmagadora maioria, rubricados pelo gerente da impugnante; O – Devia, assim, ter sido dado como provado que os serviços expressos nas facturas emitidas pela “S.
, Lda.” à impugnante foram efectivamente prestados, por ter sido reunida prova concludente nesse sentido, através do depoimento das testemunhas e dos documentos juntos aos autos; P - Por último, e quanto à violação do principio da busca da verdade material, da proporcionalidade e adequação no âmbito da acção de inspecção tributária, a falta de realização de diligências úteis à descoberta da verdade constitui um vício do procedimento de inspecção, susceptível de determinar a anulação da decisão final esse procedimento, o que se verificou no caso em apreço e devia ter conduzido à anulação das liquidações de IVA e juros compensatórios impugnadas; Q - Pelo que a sentença recorrida, além da referida omissão de matéria de facto, incorreu, ainda, em erro de julgamento, motivo por que deve ser revogada.
TERMOS EM QUE, NOS MELHORES DE DIREITO E COM O SEMPRE MUI DOUTO SUPRIMENTO DE VOSSAS EXCELÊNCIAS, DEVERÁ SER CONCEDIDO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, E, EM CONSEQUIONCIA, REVOGADA A DECISÃO RECORRIDA, ASSIM FAZENDO VOSSAS EXCELÊNCIAS SÃ, SERENA E OBJECTIVA JUSTIÇA.
A Fazenda Pública não apresentou contra-alegações.
O Ministério Público emitiu parecer no sentido de o recurso ser julgado improcedente.
Foram dispensados os vistos legais, nos termos do n.º 4 do artigo 657.º do Código de Processo Civil, com a concordância da Exma. Desembargadora Adjunta e do Exmo. Desembargador Adjunto.
*Delimitação do Objeto do Recurso – Questões a Decidir.
As questões suscitadas pela Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respetivas conclusões [vide artigos 635.º, n.º 4 e 639.º CPC, ex vi alínea e) do artigo 2.º, e artigo 281.º do CPPT] são as de saber se (1) os serviços mencionados nas faturas emitidas pela “S.
, Lda.” foram efetivamente prestados, por existir nos autos prova nesse sentido, como a documental e testemunhal; e (2) saber se a sentença incorreu em erro de julgamento ao concluir pela não violação do princípio do inquisitório por parte da Administração Tributária.
* Relativamente à matéria de facto, o tribunal, deu por assente o seguinte: A- COM PERTINÊNCIA PARA A BOA APRECIAÇÃO E DECISÃO DA CAUSA, MOSTRAM-SE PROVADOS OS SEGUINTES FACTOS: 1) Na sequência das Ordens de Serviço n.º OI200702550 e n.º OI200702551 foram levadas a cabo acções de inspecção de natureza interna e parciais, ao sujeito passivo C., Lda., aqui Impugnante, com incidência em IRC para os anos de 2004 e 2005, bem como em IVA para o ano de 2004 e para o período 0503T (primeiro trimestre de 2005) – fls. 18 do processo administrativo junto aos presentes autos, para as quais se remete e se dão aqui por integralmente reproduzidas; 2) A acção de inspecção mencionada no ponto anterior “(…) foi originada pelo facto de a C. ter na sua contabilidade registadas facturas do sujeito passivo ‘S., LDA.’ (NIF: (…)), relativamente ao qual foi comprovado, por estes serviços, tratar-se de um emitente de ‘facturas falsas’. (…)” – fls. 19 do PA; 3) Por ofício com o n.º 25113/0507, datado de 31.03.2008, foi remetido à Impugnante o “Projecto de Relatório de Inspecção Tributária”, para efeitos de notificação para exercício do seu direito de audição quanto ao teor do mesmo – fls. 42 do processo administrativo junto aos presentes autos, bem como fls. 113 do suporte físico dos autos, para as quais se remete e se dão aqui por integralmente reproduzidas; 4) Na sequência da notificação mencionada no ponto anterior, a Impugnante exerceu o seu direito de audição, apresentando resposta com o teor constante de fls. 120 a 123 do suporte físico dos autos, ali requerendo a inquirição, como testemunha, de “A., residente no Lugar (…) (…)”; 5) Em 08.05.2008 foi elaborado o relatório final da acção inspectiva mencionada em 1), do qual consta, no que aqui mais releva: “(…) III – DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL: capacidade para proceder à facturação emitida em seu nome, porquanto as facturas detectadas até este momento, cujo valor global ascende a € 4.763.195,68 (para o período compreendido entre os anos 2003 e 2006), são essencialmente operações simuladas que não têm subjacente operações económicas comprovadas.
-
A conclusão anteriormente enunciada tem os seguintes fundamentos: 2.1.
A acção inspectiva à S. foi determinada pelo facto de, no período compreendido entre 2003 e 2006, terem sido detectados elevados montantes de facturação, isto quando esta não apresentava declarações de IRC desde o ano 2001 (apenas foi entregue esta declaração para o ano 2001) e de IVA desde o 2.° trimestre de 2003, sendo que da consulta à base de dados da DGCI foi possível constatar o seguinte: → Nas declarações periódicas de IVA entregues para o 1° e 2° trimestre de 2003 (períodos 0303T e 0306T) não foram declarados quaisquer valores.
→ Existe informação, declarada por terceiros, em como nos anos 2003, 2004 e 2005 terão sido emitidas facturas (com IVA incluído)...
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