Acórdão nº 00028/16.9BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 27 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução27 de Novembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo Norte: I – RELATÓRIO 1.1. Município de (...) intentou a presente ação administrativa comum contra a Águas de (...), S.A., com sede na Av.ª (…), pedindo a condenação da Ré a: «1) reconhecer que a 27 de junho de 2007 celebrou com o Município Autor um “Acordo de Repartição de Custos para Recolha e Tratamento de Águas Residuais Domésticas dos Subsistemas de Águas Residuais de (...) e (...)”, nos termos do qual ficou expressamente convencionado que o ora Autor pagaria à ora Ré uma fatura mensal que resultasse da afetação ao caudal médio mensal verificado nos meses de Junho, Julho, Agosto e Setembro de cada ano, e pela aplicação dos coeficientes aí previstos, bem como reconhecer que tem incumprido aquele acordo na apresentação da respetiva faturação, devendo, em consequência, ser condenada a emitir e entregar ao Autor as necessárias notas de débito, referentes ao período de Fevereiro de 2009 a Fevereiro de 2011, e pelo valor que exceder o que resultar da correta aplicação do mesmo.

2) reconhecer e aceitar os valores propostos pelo Estado, através da então Ministra da Tutela, na reunião efetuada na CCDRN em 26/01/2011, de 0,48€ por metro cúbico de água a partir de 01/01/2011 ter por referência esses valores, devendo, em consequência, ser condenada a emitir e entregar ao Autor as necessárias notas de débito, pelo valor que exceder o que resultar da aplicação daqueles valores aos volumes efetivamente fornecidos e aos caudais efetivamente tratados; 3) reconhecer que, no que à recolha e tratamento de efluentes diz respeito, na faturação efetuadas após 28 de fevereiro de 2009 a ATMAD tem vindo a faturar ao Município de (...) quantidade superior de metros cúbicos do que a própria capacidade instalada das ETAR´s permite tratar; 4) reconhecer que, no período compreendido entre 1 de agosto de 2015 e 1 de dezembro de 2015, faturou um total de 380.032,70€ e que o Município de (...) apenas reconhece a existência de dívida no montante de 316.692,47€, constando como faturação indevida um total de 63.340,23€, devendo, em consequência, ser condenada a emitir e entregar ao Autor nota de crédito neste valor; 5) mais deve a Ré ser condenada nas custas da presente demanda».

Alega, para tanto, em síntese, que a partir do mês de fevereiro de 2009, a R. passou a emitir faturas desajustadas da realidade e do contratualizado em desconformidade com o acordo de repartição de custos, faturando em excesso o caudal afluente às ETAR’s de (...) e (...), procedimento que se seguiu nos meses seguintes; Comunicou essas desconformidades à R. por telefax e carta registada com aviso de receção, solicitando a emissão de notas de crédito; A R. ignorou as desconformidades apontadas e insistiu no mesmo procedimento e faturação referente a cada um dos meses e anos seguintes, faturando sempre por valores superiores aos acordados e constantes do mencionado acordo de repartição de custos; Assim, a R. incorreu, por iniciativa própria, no incumprimento do acordo de repartição de custos que havia celebrado com o A., e faturou caudais de recolha e tratamento de efluentes por valores bem superiores à capacidade de tratamento das próprias infraestruturas (ETAR’s), o que traduz um comportamento abusivo e não sério, pois que, se se obrigou a recolher “um volume máximo de efluentes que não exceda a capacidade dada pelo respetivo dimensionamento” (cf. doc. n.º 03 junto com a petição inicial), então também não poderá facturar acima do que se obrigou a recolher; A partir de janeiro de 2011, a R. alterou unilateralmente os valores das tarifas, quer no fornecimento de água quer na recolha de efluentes, alteração que não foi aceite por nenhum dos municípios de Trás-os-Montes e Alto Douro que, em assembleia geral extraordinária da R. propuseram a suspensão imediata das tarifas praticadas pela R. e a sua renegociação, o que foi rejeitado apenas com o voto da «AdP – Águas de Portugal, SGPS, S.A.», acionista maioritária da R., com 51% do capital social; O A., juntamente com outros municípios da região de Trás-os-Montes e Alto Douro reuniram-se em 26.01.2011 com a Ministra do Ambiente nas instalações da CCDRN, com a presença, além do mais, da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) e de membros do Conselho de Administração da R. e nessa reunião o Ministério do Ambiente apresentou à ANMP um documento de trabalho com uma proposta de perequação tarifária ao nível dos sistemas em alta, enquanto contributo para o estabelecimento de um tratamento equitativo das diferentes regiões do território nacional, atentas as diferenças sócio-económicas e a ação dos fundos estruturais; A referida proposta obteve parecer favorável da ANMP em 12.04.2011 e foi aprovada pela Comunidade Intermunicipal de Trás-os-Montes (CIM-TM), a que pertence o A., em reunião de 08.06.2011; Na sequência dessa reunião, o A. pagou à R. as diversas faturas que lhe foram por esta apresentadas tendo em conta os valores unitários propostos pela ANMP para o Sistema Multimunicipal de Águas e Saneamento de Trás-os-Montes na afetação do FETA (Fundo de Equilíbrio Tarifário para os Sistemas de Águas), que eram de EUR 0,48 por m3 de água fornecida (em vez dos EUR 0,6577 à data faturados) e de EUR 0,53 por m3 de esgotos tratados (em vez dos EUR 0,7219 à data faturados); A proposta do Ministério do Ambiente de criação e afetação do FETA acabou por não se concretizar; Em 10.11.2011 teve lugar nova reunião entre a R. e os representantes das Comunidades Intermunicipais do Douro (CIM-Douro) e de Trás-os-Montes (CIM-TM) a propósito do modo e da forma de regularização dos pagamentos em dívida pelos municípios à R., não tendo sido obtido qualquer acordo; O A. tem comunicado à R. serem totalmente inaceitáveis as propostas apresentadas pela R. de tarifas para vigorarem nos anos de 2012 e 2013, referindo que estas contrariam os princípios de diálogo estabelecidos na reunião de 26.01.2011 na CCDRN; Mais comunicou à R. que não aceitava os tarifários propostos, pelo que continuaria a pagar os serviços à R. pelos valores do FETA; Desde 28.02.2009 o A. tem vindo a reclamar da R. a emissão de notas de crédito que anulem parte da faturação porque não respeita os valores corrigidos para as tarifas de água e saneamento, como não respeita o acordo de repartição de custos celebrado em 27.06.2007, como ainda porque discorda do cálculo dos caudais.

*1.2.

Citada, a Ré contestou, invocando a exceção de incompetência do TAF de Mirandela por preterição do tribunal arbitral e defendeu-se, ainda, por impugnação.

*1.3. Dispensou-se a realização de audiência prévia.

*1.4.

Proferiu-se despacho saneador-sentença, no qual se fixou o valor da ação em EUR 63.340,23 (sessenta e três mil trezentos e quarenta euros e vinte e três cêntimos), correspondente ao montante cuja faturação o A. considera indevido e que está em discussão na presente ação, e julgou-se a exceção da incompetência absoluta do TAF por preterição de tribunal arbitral como procedente, constando essa decisão do seguinte segmento dispositivo: «Em face do exposto, julgo este Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela absolutamente incompetente para a apreciação do presente litígio e, consequentemente, absolvo a R. da instância.

Custas pelo A., nos termos do disposto no art.º 527º do CPC e art.º 6º, n.º 1 e na tabela I-A do Regulamento das Custas Processuais.

Registe e notifique.»**1.5.

Inconformado com o assim decidido, o Município de (...) interpôs recurso jurisdicional do saneador -sentença, apresentando as seguintes conclusões: « 1ª O teor literal do nº 3º da cláusula 9ª do contrato de fornecimento junto com a Petição Inicial como documento nº 2, e da cláusula 10ª do contrato de recolha de efluentes junto com a Petição Inicial como documento nº 3, exceciona da sujeição ao Tribunal Arbitral as questões relativas a faturação, ao seu pagamento ou falta dele, sendo-lhe apenas obrigatoriamente submetidas, fruto da referida convenção, «todas as questões relativas à interpretação ou execução deste contrato».

  1. Na Petição Inicial o Autor referiu expressamente estarem em causa questões de faturação, mais concretamente de não pagamento da totalidade das quantias faturadas.

  2. Por erro de julgamento, entendeu o TAF de Mirandela que a causa de pedir alegada na Petição Inicial dizia respeito a questões de interpretação ou execução dos contratos em causa, desvalorizando a falta de pagamento expressamente alegada, e considerando que as «questões de mero pagamento» serão «questões pontuais e de menor complexidade».

  3. Alegar o não pagamento de 63.340,23 € (em razão de faturação indevida) é questão de faturação, concretamente de falta de pagamento, e não é questão pontual e de menor complexidade.

  4. No artigo 64º da Petição, o Autor referiu-se a faturação em excesso no período compreendido entre 1 de agosto e 1 de dezembro de 2015, remetendo para o documento junto sob o nº 12, no qual constam expressamente identificadas as 10 (dez) faturas colocadas em causa pelo Autor, emitidas pela Ré no período compreendido entre 1 de agosto e 1 de dezembro de 2015, e aí constam os números das faturas, as datas de emissão, a sua descrição e os valores, bem como constam os valores pagos pelo Município, os valores não pagos, e o número dos ofícios e datas através dos quais aquelas faturas foram devolvidas à então ATMAD e solicitada a emissão da competente nota de crédito.

  5. Essa circunstância, esses dados, consubstanciam por forma inequívoca questão relativa à faturação, ao seu pagamento, ou falta dele.

  6. A ordem de formulação dos pedidos não constitui indicador absoluto da sua decrescente importância e, no caso concreto, o pedido principal formulado pelo Autor, o que verdadeiramente lhe interessa, é o que consta formalmente em 4º lugar, isto é, que seja reconhecida a existência de faturação indevida, que não tem que pagar, a quantia de 63.340,23 €.

  7. ...

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