Acórdão nº 00178/20.7BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 05 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelAna Paula Santos
Data da Resolução05 de Novembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO C., contribuinte n.º (…), com os demais sinais dos autos, executado por reversão das dívidas da sociedade “C., Lda.” interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, que julgou improcedente a reclamação que deduzira contra o despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Viseu, proferido em 2020.03.26, no âmbito da execução fiscal n.º3700200501031791 e Apensos, que indeferiu a arguição de prescrição das dívidas exequendas.

O Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: 1. O presente recurso vem interposto de decisão que julgou improcedente a reclamação apresentada nos presentes autos e, em consequência, manteve integralmente o despacho reclamado.

  1. O processo de execução fiscal inerente aos presentes autos foi instaurado para cobrança de diversas quantias respeitantes a IVA relativo aos exercícios fiscais de 2003 a 2006 – facto provado A).

  2. Conforme foi referido, pelo próprio reclamante, ora recorrente, o único ato interruptivo da prescrição ocorreu em 2008, com a citação do sujeito passivo – facto provado B).

  3. Deste modo, confrontados os factos provados com a redação da lei, temos que o prazo de prescrição interrompeu-se “com o facto que se verificar em primeiro lugar”, ou seja, com a citação ocorrida a 15.12.2008, e como a lei limita as interrupções a “uma única vez”, não pode ter ocorrido em data posterior mais qualquer causa de interrupção.

  4. E, também não se verificou qualquer causa de suspensão, já que o processo apenas suspende “em virtude de pagamento de prestações legalmente autorizadas, ou enquanto não houver decisão definitiva ou passada em julgado, que puser termo ao processo, nos casos de reclamação, impugnação, recurso ou oposição, quando determinem a suspensão da cobrança da dívida.” – art. 49º, n.º 4 da LGT.

  5. Ora, não houve qualquer plano de pagamento em prestações, e também não houve suspensão da cobrança, por força da existência de processos, a saber, reclamação, impugnação, recurso ou oposição, 7. Já que o único processo havido, foi a reclamação que originou os presentes autos, apresentada a 08.04.2020, ou seja, em data após a ocorrência da prescrição.

  6. E, reforça-se, não bastava a existência de tais processos, era ainda necessário que cumulativamente, por força dos mesmos, a cobrança da dívida estivesse suspensa, o que só ocorreria se tivesse sido prestada garantia que garantisse “a totalidade da quantia exequenda e do acrescido, o que será informado no processo pelo funcionário competente.”, de acordo com o disposto no n.º 1 do art. 169º do CPPT 9. O certo é que, por muito que não seja do agrado da AT, a lei não contempla que a mera existência de processos de execução aos quais não haja sido deduzida oposição, como é o caso, constituam causas de suspensão.

  7. Em função do que se deixa referido, a prescrição ocorreu há largo tempo – a 15.12.2016! 11. Porque a douta decisão recorrida limita-se, sem mais, a avalizar o despacho reclamado, sem sequer se debruçar sobre uma análise cuidadosa e fundamentada dos factos, confrontando-os com o dito enquadramento jurídico, a mesma padece, com todo o respeito, de falta de fundamentação, sendo consequentemente nula, nos termos do art. 125º do CPPT, nulidade essa que se invoca para todos os efeitos legais.

    Sem prescindir e por mera cautela, não podemos deixar de nos pronunciar sobre a fundamentação expandida pela Fazenda Pública, já que a douta sentença a confirmou: 12. E, a este propósito, refira-se o artigo publicado na Revista do CEJ de Março de 2019, intitulado “O regime de contagem da prescrição no direito Tributário – Certeza e segurança jurídica”, de Serena Cabrita Neto e Cláudia Reis Duarte: “Acompanhamos ainda integralmente BENJAMIM RODRIGUES, quando é peremptório ao afirmar que não é possível “chamar à colação normas como as que regem a interrupção da prescrição das obrigações no Código Civil, como são as que constam dos arts. 323.º a 327.º.”.

    E assim é, seguindo o mesmo Autor, porque “estaremos perante casos cujos conceitos ou regulação jurídica não foram importados pelo direito tributário e que, portanto, lhe permanecem estranhos”. Continua defendendo que “O termo interrupção consistindo numa importação do art.º 326.º do C. Civil deve ser entendido, portanto, no mesmo sentido, de acordo com o disposto no art.º 11.º da LGT, por não resultar da lei tributária que lhe deva corresponder outro.” Portanto, se o legislador tributário tivesse desejado aplicar a regra especial da “interrupção duradoura” prevista no artigo 327º do CC, tê-lo-ia consagrado expressamente, o que não fez. Temos pois que concluir que, onde o legislador tributário distinguiu entre causas interruptivas e suspensivas, foi porque quis expressamente distinguir os efeitos típicos de uma e de outra realidade. Não haverá, pois, que convocar uma interpretação segundo regras especiais que a lei tributária não consagrou – ainda para mais se considerarmos que não ocorreu qualquer alteração de posição justificável face à nova redacção do artigo 49º da LGT introduzida pela Lei 53º-A/2006, de 29 de Dezembro, quanto às causas de interrupção da prescrição ou aos seus efeitos. Consideramos, por isso, que quer na redacção anterior, quer na actual redacção da norma em análise, os efeitos de uma causa interruptiva são instantâneos e determinam a abertura de um novo prazo de prescrição. Entendemos ainda que esta é a solução constitucionalmente adequada e a única que acautela as razões de certeza, segurança e paz jurídicas em que radica a prescrição das obrigações tributárias”.

  8. O entendimento anterior é o único que se compadece com a intenção legislativa, porquanto tendo o legislador previsto especificamente na legislação fiscal quais as causas de interrupção e prescrição – vide artigo 49º da LGT- inexiste fundamento legal para recorrer à aplicação subsidiária do disposto no Código Civil, 14. Já que a lei especial derroga a lei geral.

  9. Está expressamente determinado a ordem pela qual as leis se hão-de aplicar, e evidentemente, estando previstas as causas de suspensão na LGT é “A presente lei” que se aplica, só se aplicaria o Código Civil em 4º lugar, e no caso da situação jurídica não estar contemplada na “presente lei” – o que não é o caso.

  10. Não podemos olvidar que uma execução apenas se suspende mediante ou prestação de garantia idónea, ou dispensa de garantia pela AT, mediante requerimento do sujeito passivo – cfr. Art. 169º da LGT, 17. Por mera cautela, e apenas por mera hipótese de raciocínio académico, sempre se diga que no caso dos artigos 326º e 327º, ambos do Código Civil, se aplicarem, o que apenas se equaciona por mera hipótese abstrata de raciocínio – já que desta aplicação resulta a violação da legislação fiscal - teria igualmente de se aplicar o disposto no art. 281º n.º 5 do CPC, relativamente à extinção da execução, decorrendo que não tendo sido praticadas quaisquer diligências após a citação, o processo de execução fiscal extinguiu-se decorridos 6 meses, ou seja, a 15.06.2009; 18. Não sendo menos certo que, a inexistência de bens, leva igualmente à extinção da execução – vide art. 849º do CPC.

  11. Deste modo, quer por uma via, quer por outra, o resultado alcançado é o mesmo, há largo tempo que a execução deveria estar extinta, e, em consequência já há muito que se verificou a prescrição.

  12. Em função do que se deixa referido, dúvidas inexistem que ocorreu a prescrição das quantias exequendas em referência, tal como resulta do artigo 48.º, n.º 1, da LGT.

  13. Assim sendo, a douta decisão recorrida é nula por violação do disposto nos artigos , 11º, 48º e 49º, todos da LGT, e por errada interpretação do disposto nos artigos 326º e 327º, ambos do Código Civil, em articulação com o disposto no art. 281º, n.º 5, e 849º ambos do CPC, nulidade essa que expressamente se invoca.

    Nestes termos e nos melhores de direito, deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e, em consequência, ser revogada a douta Sentença, proferida em 1ª Instância, e substituída por outra que reconheça a prescrição.

    ASSIM SE FAZENDO A ACOSTUMADA JUSTIÇA Não foram apresentadas contra-alegações.

    Dada vista dos autos ao Ministério Público, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal emitiu o douto parecer inserto a fls. 98 e 99 no sentido da improcedência do recurso, no entendimento, em síntese, de que “(…) A falta de motivação susceptível de integrar a nulidade da sentença é apenas a que se reporta à falta absoluta de fundamentos quer estes respeitem aos factos , quer ao direito.

    A motivação incompleta, deficiente ou errada não produz nulidade , afectando somente o valor doutrinal da sentença e sujeitando-a consequentemente ao risco de ser revogada ou alterada quando apreciada em recuso - cf.Prof. Alberto dos Reis , Código de Processo Civil Anotado, vol. V paf.139/140 e Antunes Varelabe outros, Manual de Processo Civil 2ª ed., Coimbra ,pág687.”V.Ac.do TCAN de 30/4/2015, no processo 00730/09.1BEPNF, in www.dgsi.pt) Ao fundamentos do recurso não constituem qualquer novidade, dado que, o Tribunal já deles conheceu e se pronunciou que in casu , não se verifica a prescrição.

    O disposto no artigo 327º do C. Civil tem aplicação em sede tributária, ao contrario do que pretende o recorrente . Neste sentido, vd. entre outros, o Ac. do STA de 13.03.2019, no processo 01437/18BELRS, in www.dgsi.pt.

    Dada a natureza urgente do processo, há dispensa de vistos prévios (artigo 36.º, n.º 2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos ex vi artigo 2.º, n.º 2, alínea c) do Código de Procedimento e de Processo Tributário).

    DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida padece de nulidade por falta de fundamentação e...

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