Acórdão nº 01664/19.7BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 04 de Junho de 2020

Magistrado ResponsávelPaulo Ferreira de Magalhães
Data da Resolução04 de Junho de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I - RELATÓRIO A., Ld.ª, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da Sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, datada de 13 de Dezembro de 2019, que julgou totalmente improcedente a Reclamação por si apresentada do despacho datado de 01 de Julho de 2019 proferido pelo Director de Finanças de (...), e que em consequência, decidiu pela improcedência do pedido de extinção da execução por si requerido com fundamento na prescrição da dívida, assim como quanto ao pedido subsidiário de alargamento do plano prestacional relativo ao PEF em curso, bem como ao vício de falta de fundamentação da decisão de indeferimento do alargamento do número de prestações mensais para 5 anos.

No âmbito das Alegações por si apresentadas [Cfr. fls. dos autos em suporte físico], elencou a final as conclusões que ora se reproduzem: “CONCLUSÕES 1. Vem o recurso interposto da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal (doravante TAF) de Braga, datada de 13/12/2019, que julgou totalmente improcedente a reclamação do despacho proferido pelo Órgão de Execução Fiscal (doravante OEF), Serviço de Finanças de (...) 2, apresentado pela Executada, ora Recorrente.

  1. Desde logo, não pode a Recorrente aderir a esta tese do tribunal a quo e conformar-se com os efeitos mediatos e imediatos que a decisão daí vertida acarreta para a sua esfera jurídica.

  2. Em primeiro lugar, e cautelarmente, por dever de patrocínio, cumpre dilucidar o instituto e correspondente regime da prescrição das dívidas tributárias que consiste na extinção do direito, que assiste ao Estado, de exigir determinada dívida tributária ao contribuinte ou a um outro responsável tributário.

  3. O prazo prescricional para as dívidas tributárias é de 8 anos, contados a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou a exigibilidade do imposto relativamente ao imposto sobre o valor acrescentado – art.º 48, n.º 1 da LGT, DL n.º 398/98, de 17 de Dezembro na redação atual da Lei n.º 32/2019, de 03/05.

  4. No que concerne à LGT, o regime da interrupção, a LGT (art.º 49, n.º1) dispõe que a citação (facto interruptivo que ora nos importa), interrompe a prescrição, uma única vez (n.º2), ou seja prevê uma única interrupção, não sucessiva, dando lugar a duas interpretações que contendem diretamente com a questão de saber se, adstrito às causas de interrupção da prescrição aqueles terão efeito duradouro (tal como o consagrada na lei civil) ou instantâneo/imediato.

  5. Considera a Recorrente que uma vez verificado o facto que causa a interrupção da contagem do prazo prescricional, este recomeça a contar de imediato, uma vez que o facto que o interrompeu tem um efeito instantâneo, não carecendo de aguardar pelo trânsito em julgado da decisão.

  6. O efeito duradouro que se pretende inferir ex vi dos artigos 326 e 327º do CC, não se compatibiliza com interesses basilares que se visam tutelar com o regime da prescrição tributária, porquanto a interpretação à luz da lei civil significa que a interrupção da prescrição tem, na prática, um efeito suspensivo “agravado” do prazo pois nem sequer é possível recuperar o prazo antes decorrido.

  7. À interrupção da prescrição, enquanto facto instantâneo e não duradouro, não pode, concomitantemente associar-se uma suspensão com natural efeito duradouro, porquanto tal interpretação não encontra qualquer acolhimento na Lei Geral Tributária, que ao contrário do Código Civil, aquele diploma legal não faz qualquer referência ao facto de o prazo apenas se reiniciar com o termo do processo que despoletou a interrupção.

  8. Sem prescindir, não foi intenção do legislador aplicar ao regime da prescrição tributária expressamente regulado, o que vem vertido no artigo 327º do CC.

  9. Não existem quaisquer lacunas que mereçam ser colmatadas com recurso ao regime civil, pelo que sempre se deverá concluir pelo efeito instantâneo da interrupção da prescrição das dívidas tributárias.

  10. O tribunal a quo, reaviva na douta sentença recorrida, que durante muitos anos a legislação tributária continha – de forma EXPRESSA - a definição de interrupção da prescrição – cfr. o art.º 27º do CPCI, o art.º 34º do CPT e o art.º 48º da LGT até à alteração introduzida pela Lei n.º 53-A/2006, de 29/12 – sempre no sentido de conferir efeito duradouro a todos os atos interruptivos, já que a prescrição não corria após esses atos e só voltava a correr caso cessasse esse efeito duradouro por mor da paragem do processo por facto não imputável ao contribuinte.

  11. É manifesta e clara a intenção do legislador em expurgar do ordenamento jurídico tributário aquele efeito duradouro da interrupção da prescrição.

  12. Aquando da alteração pela Lei n.º 53-A/2006, de 29/12 ao CPPT, e nas sucessivas alterações, até à sua redação atual, o legislador não fez qualquer remissão ou transposição da interpretação daquelas regras para o ordenamento tributário.

  13. Ademais, a aplicação do atual regime da prescrição, considerando que o prazo de se interrompe, uma única vez, por um dos factos previstos no art 49.º, n.º 1 LGT, com efeito duradouro, enquanto não houver decisão definitiva ou transitada em julgado, que ponha termo ao processo (n.º 4 do mesmo artigo), aliada à morosidade das decisões administrativas e judiciais e inércia da AT, pode levar facilmente a que os prazos de prescrição, atinjam e cheguem mesmo a ultrapassar as duas décadas! 15. No caso em concreto, na esteira da tese de que se socorre o tribunal a quo, considerando, que os factos tributários ocorreram respetivamente a 01/01/2007, 01/01/2008 e 01/01/2009, o prazo prescricional passa a ser mais do dobro de anos considerados para efeitos do art.º 48.º, n.º 1! 16. Tal solução viola de forma categórica os princípios de proporcionalidade e interesse público intrínsecos à atuação da Administração Pública e conformadores do Estado de Direito Democrático! 17. Esta interpretação/aplicação do regime da prescrição posterga cabalmente as garantias dos contribuintes à tutela jurisdicional efetiva e direito à justiça num prazo razoável.

  14. À luz da teoria do efeito instantâneo, citada a Recorrente a 30/03/2009, o prazo prescrição até aí decorrido interrompe-se e é dado sem efeito, começando a correr novo prazo com a duração de 8 anos, com término a 30/03/2017 e sendo essa a data da prescrição daquela dívida com origem em liquidações adicionais de IVA.

  15. Face ao ora exposto, entende a Recorrente, que sempre se deverá atribuir efeito instantâneo ao facto interruptivo, porquanto é essa interpretação que melhor se arquiteta com as garantias dos contribuintes, sem prejuízo do interesse público de uma cobrança eficaz e célere.

  16. Por tudo quanto foi exposto, dúvidas não restam quanto à inconstitucionalidade material de que enferma a interpretação dos preceitos da prescrição das dívidas tributárias à luz da lei civil, porque restringe os direitos, liberdades e garantias dos contribuintes para além do necessário para salvaguardar as necessidades financeiras do Estado e a justa repartição da riqueza, sem exceção para o caso concreto, aquela interpretação acolhida pelo Tribunal a quo, viola diretamente os princípios da proporcionalidade e prossecução do interesse público, constitucionalmente consagrados nos artigos 18.º, n.º 2 e 266.º, n.º 2 da Constituição da Republica Portuguesa.

  17. A interpretação do efeito duradouro dos factos que interrompem o prazo prescricional, que propicia a inércia da Autoridade Tributária relativamente aos processos de execução fiscal e morosidade das decisões judiciais sempre contenderá com direito dos cidadãos à obtenção de justiça num prazo razoável e ao direito à tutela jurisdicional efetiva – arts. 20º e 268º, n.º 4 CRP - , bem como com o princípio da tutela da confiança legítima inerente à ideia de Estado de Direito Democrático – art.º 2º CRP.

  18. Por fim, não pode deixar de considerar que a posição adotada pelo tribunal a quo assente no elemento literal do n.º 1 do Artigo 49.º da LGT, de que o prazo prescricional não se inicia enquanto não transitar em julgado a decisão que ponha termo a reclamação, recurso hierárquico ou impugnação judicial, sempre se socorrerá da interpretação analógica com recurso às normas dos artigos 326.º e 327.º do CC para validade tal interpretação.

  19. O que constitui, indubitavelmente, uma violação da proibição do recurso à analogia em matéria respeitante a garantias dos particulares e consequentemente uma violação do princípio da legalidade – art.º 266º, n.º2.

  20. A douta sentença recorrida, enferma de inconstitucionalidade material, na medida da incorreta interpretação e desvirtuada aplicação do disposto nos artigos 48º e 49º da LGT e 326º e 327º do CC.

  21. Demonstrada a prescrição da dívida, pelo menos desde 30/03/2017, e exigida pela administração tributária, no âmbito do processo de execução fiscal mencionado, desde já pugna a Recorrente pela sua extinção.

  22. Sem prescindir, verifica-se um claro vício de falta de fundamentação da decisão que incidiu sobre o pedido de alargamento do número de prestações e que não mereceu consideração, ainda que não tenha sido acolhida pela decisão recorrida.

  23. A Recorrente/Executada, requereu que fosse aumentado o número de prestações para pagamento, pois se é verdade que se mantêm os encargos e demais obrigações de pagamento pendentes, que decorrem do exercício da atividade pela Recorrente, também é verdade que estas se tornam incomportáveis com o pagamento mensal de um valor de quase 20.000€.

  24. Nestes termos, uma vez que a dívida excede 500 unidades de conta, requereu a executada ao órgão de execução fiscal que fosse alargado o número de prestações mensais para 5 anos, nos termos do disposto no artigo 96.º, n.º 5 do CPPT.

  25. Perante o pedido apresentado nestes termos, o tribunal a quo acompanha a primeva decisão do órgão de execução fiscal, entendendo "legalmente possível aplicar o n.º 5do art.º 196 do CPPT”, não assistindo razão à Recorrente.

  26. Acrescenta...

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