Acórdão nº 01377/16.1BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 08 de Outubro de 2020
Magistrado Responsável | Cristina Travassos Bento |
Data da Resolução | 08 de Outubro de 2020 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores que constituem a Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I- Relatório A Autoridade Tributária veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou procedente a acção de reconhecimento de um direito, deduzida por G.
e a condenou como litigante de má – fé.
A Recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: “A. A Recorrente foi notificada da sentença, ora recorrida, em 23 de maio de 2018, na qual foi condenada como litigante de má fé no pagamento de 2 UC e no pagamento de uma indemnização de € 250,00.
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A Recorrente não se conforma com a douta sentença, da qual ora recorre, porquanto na AAE n.º 2857/13.6BEPRT, a Recorrente cumpriu com o doutamente decidido, reenquadrando a A. no regime de contabilidade organizada, em sede de IRS, relativamente aos rendimentos da categoria B, e reembolsando o montante de € 8.300,50, referente a imposto pago, não tendo pago os juros indemnizatórios dado ter sido absolvida dos mesmos.
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A Recorrente repudia a qualificação da sua atuação como litigante de má fé, uma vez que se limitou a cumprir a decisão judicial proferida pelo TAF Porto, no âmbito da AAE n.º 2857/13.6BEPRT.
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Dessa decisão judicial, que absolveu a Recorrente do pagamento de juros indemnizatórios, as partes conformaram-se, uma vez que nem a Recorrente nem a A. apresentaram recurso da mesma.
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Na sequência da sentença proferida na AAE n.º 2857/13.6BEPRT, a A. intentou ação administrativa para reconhecimento do direito a juros indemnizatório e consequente condenação da Recorrente no pagamento dos mesmos, a qual tomou o n.º 1377/16.1BEPRT.
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A Recorrente defendeu-se por excepção, alegando caso julgado e erro na forma de processo, uma vez que na AAE n.º 2857/13.6BEPRT, o Tribunal Administrativo do Porto absolveu a Recorrente do pagamento dos juros indemnizatórios, sendo que o Supremo Tribunal Administrativo já se pronunciou no sentido de a ação para reconhecimento de um direito assumir um carater complementar dos restantes meios contenciosos previstos no contencioso tributário (autos de recurso 1515/02, 1907/03, 524/03,1708/03 e 291/09).
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A douta sentença, ora recorrida, entendeu estar a Recorrente a atuar com má fé e decidiu pela condenação no pagamento de juros indemnizatórios e pela condenação como litigante de má fé em 2 UC e no pagamento de uma indemnização de € 250,00 á A.
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Contudo, neste campo o principio, decorrente do próprio direito de ação, a observar, consagrado no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa , é o de que o processo deve proporcionar às partes a ampla e incondicionada possibilidade de dirimir, com intensidade, liberdade e abrangência, as suas razões de facto e de direito, segundo um espirito de razoabilidade e equilíbrio mas igualmente sem inibições ou constrangimentos, que possam eventualmente advir do receio de futuras penalizações, assentes no entendimento que o tribunal vier a adoptar sobre o tema em discussão.
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Desde logo, para definir “litigância de má-fé” tem de se socorrer do Código de Processo Civil, aplicável supletivamente, nos termos da alínea e) do artigo 2.º do Código de Procedimento e do Processo Tributário e artigo 104.º da Lei Geral Tributária, que na descrição da figura do litigante de má-fé, deve ser considerado aquele que atue com dolo ou negligência grave ( art. 542.º n.º 2 do Código de Processo Civil), numa das seguintes vertentes:
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Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar (dolo ou negligência substancial); b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido fatualidade relevante para a decisão em causa (dolo ou negligência substancial); c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação ou use o processo ou os meios processuais de forma manifestamente reprovável (dolo ou negligência instrumental).
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Nesse sentido, o Supremo Tribunal Administrativo Pleno - Recurso n.º 24971 (1ª seção) e o Tribunal Central Administrativo Sul - Processo 6235/12, 07361/14, 06235/12 e 06726/13 e José Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil anotado, II, 3ª edição, Coimbra Editora, 1981, pagina 263.
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Apenas no caso de se verificarem duas situações - actuar contra o teor de informações vinculativas anteriormente prestadas aos interessados ou o seu procedimento no processo divergir do habitualmente adoptado em situações idênticas - pode a Recorrente ser condenada corno litigante de má-fé, o que não se encontra provado na hipótese dos autos, nem se verificou na situação recorrida, não podendo ser imputável à Recorrente qualquer ação dolosa ou de atuação negligente grave.
L. A Recorrente não actuou em juízo contra o teor de informações vinculativas anteriormente prestadas aos interessados (boa fé), nem a sua actuação divergiu do anteriormente adoptado em situações idênticas (princípio da igualdade), sendo que, se limitou a acatar e obedecer ao decidido na douta sentença proferido na AAE n.º 2857/13.6BEPRT, na qual a absolveu do pagamento de juros indemnizatórios.
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Pelo que o entendimento constante na douta decisão recorrida, quanto à condenação em litigância de má-fé em 2UC e no pagamento de uma indemnização de € 250,00 à A., não encontra sustentação nem na lei, nem na jurisprudência, mas antes de mais não encontra qualquer apoio na realidade dos factos.
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Por outro lado, o facto...
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