Acórdão nº 00515/19.7BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 08 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelRosário Pais
Data da Resolução08 de Outubro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. M.

, devidamente identificada nos autos, vem recorrer da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, proferida em 30.03.2020, pela qual foi julgada improcedente o recurso por ela deduzida, nos termos do artigo 89.º-A da LGT, contra o ato de fixação da matéria coletável em sede de IRS referente aos anos de 2009 e 2010, no valor de 1.763.609,59€.

1.2. A Recorrente terminou as respetivas alegações formulando as seguintes conclusões: “01. O acto objecto dos presentes autos está assente unicamente no relatório da Policia Judiciária, Sector de Perícia Financeira e Contabilística do Norte, datado de 28 de Setembro de 2015 e produzido no inquérito crime com NUIPC 959/11.2IDBGC, do DCIAP – Secção Única, constatando-se que a AT nem sequer porfiou pela obtenção, junto de qualquer instituição de crédito, dos documentos bancários que estarão na base dessa informação a fim de formar a sua convicção e de confrontar a Recorrente com tais indícios e / ou provas.

  1. Tal omissão e displicência da AT faz enfermar o acto de diversas ilegalidades que deveriam ter determinado a invalidade do acto sob recurso – o que a Sentença recorrida não sancionou e que, por isso, são questões que se colocam à superior sindicância de V. Exas..

  2. A tese deste recurso é também a de que não obstante as sucessivas falhas da AT, a Recorrente, com os elementos que dispunha (e que por seu esforço obteve, pois que a AT, em violação do ónus da prova e do inquisitório, não lhos facultou) propôs-se a demonstrar na sua petição as entradas e saídas bancárias que demonstram ser errada a conclusão de que os créditos bancários invocados no procedimento constituem acréscimos patrimoniais – o que lhe foi vedado pelo Tribunal a quo que, em manifesta violação do poder / dever do inquisitório entendeu não ser sequer de escrutinar ou investigar indeferindo também a produção da prova testemunhal que a Recorrente entendeu ser necessária para tanto por via do despacho de 11/02/2020 e que ora está também sob censura ao abrigo do nº 3 do art.º 644.º do Código de Processo Civil.

  3. As questões que se submetem à superior sindicância do Tribunal de recurso podem, de forma sintética, assinalar-se do seguinte modo: i) nulidade da Sentença, por omissão de pronúncia, relativamente à violação do n.º 11 do artigo 89.ºA da LGT por parte da AT e, bem assim, pela inexistência de suporte documental no processo crime com o NUIPC 959/11.2IDBGC que sustentem os ficheiros de cálculo Excel (6º Volume do processo de inquérito, fls.

    2355) em que se baseou a Perícia Financeira e Contabilística da Policia Judiciária; ii) erro de julgamento da matéria de facto, por falta de suporte probatório nos auto que determinasse que fosse dado como provado o que se acha alinhado nos pontos nº 2, 3, 7 e 14 do probatório; iii) erro de julgamento por não julgar verificada a violação dos princípios do inquisitório e do ónus da prova por parte da AT no procedimento – em síntese por não ter o Tribunal recorrido censurado a AT por não ter obtido nem ter procurado obter, muito menos compilar e interpretar os elementos de prova legalmente exigíeis (documentos bancários e respectivo descritivo de movimentos) que sustentassem os sérios indícios que legitimassem a sua actuação [que a Sentença recorrida cataloga como “preterição de formalidade essencial” nas págs. 9 e 10]; iv) errada aplicação do n.º 3 do artigo 89.ºA da LGT, por não sancionar a violação por parte AT dos princípios da participação e audição no procedimento – em síntese porque a AT não possibilitou que a Recorrente cumprisse com o ónus de demonstração de não sujeição à tributação dos supostos “incrementos patrimoniais” [tema tratado pelo Tribunal a quo como “violação do princípio da participação e audição” na pág. 10 a 13]; v) erro de julgamento por não ter sancionado a violação do dever de fundamentação da AT – mormente por esta não ter, no procedimento, dado a conhecer à Recorrente quais os concretos movimentos bancários que careceriam de “justificação” [a que a Sentença se debruça nas pág. 13 e 14 como “vício da falta de fundamentação]; vi) violação do princípio do inquisitório por parte do Tribunal a quo que se demitiu de procurar a descoberta da verdade material relativamente à comprovada circulação de montantes “sob suspeita” pela conta bancária da Recorrente que (pelo menos) indiciam que os montantes que nela foram creditados não constituem acréscimo patrimonial da Recorrente; aqui se incluindo, por questão de sistematização lógica, o indeferimento da produção de prova testemunhal determinada pelo despacho de 11/02/2020 aqui também sob censura [censurando-se o julgamento vazado nas p. 14 a 17 da Sentença recorrida].

  4. A primeira causa de nulidade por omissão de pronúncia radica na circunstância de o Tribunal não ter apreciado a questão invocada (essencialmente) nos artigos 64º a 66º da p.i: saber se o modus operandi da AT foi conforme o nº 11 do artigo 89º-A, porquanto se entende que não foi observada a injunção de que o procedimento “inclua a investigação das contas bancárias” e, bem assim, que não foi, nos termos da mesmo norma, facultada à Recorrente oportunidade de “regularizar a situação tributária, identificando e justificando a natureza dos rendimentos omitidos e corrigindo as declarações dos respectivos períodos”.

  5. A segunda causa de nulidade da Sentença por omissão de pronúncia sobre o alegado nos artigos 177º a 180 º da p.i.: a base de trabalho da Polícia Judiciária para a elaboração do relatório pericial cujo resultado a AT importou acriticamente não teve como objecto elementos probatórios, mormente documentos bancários, antes constando desses autos de inquérito criminal meras folhas de cálculo Excel sem qualquer valor ou suporte probatório.

  6. O Tribunal a quo limitando-se a dar como provados os supostos acréscimos patrimoniais nos termos do RIT (e inerentemente por simples decalque do relatório pericial importado do inquérito crime) não cuidou de apreciar tal alegação, limitando-se a afirmar, relativamente à circunstância de a AT não ter trabalhado com base em elementos bancários mas apenas com a informação provinda do processo criminal que “não são em si os suportes de papel juridicamente relevantes (...) mas antes a informação que os mesmos contêm” (p. 10 da Sentença).

  7. O erro de julgamento da matéria de facto atém-se com os pontos que, sob os n.ºs 2, 3, 7 e 15 do probatório foram dados como provados.

  8. No que contende com o julgamento os pontos de factos 2, 7 e 15 a crítica atém-se na referência expressa, à existência de “informação bancária” como fonte das correcções perpetradas pela AT, quando dos autos não consta qualquer informação bancária.

  9. Com efeito, a única informação de que a AT se louva é a informação policial plasmada no extracto do relatório da Polícia Judiciária referida na conclusão 1., sendo que tal relatório não é mais do que um documento de inferência de dados aparentemente suportados em documentos bancários [mas não só, pois afirmou-se já que nesse inquérito foram utilizados como suporte ficheiros Excel sem suporte probatório, questão não apreciada pelo Tribunal recorrido] que os autos desconhecem quais seja e que a AT não tratou nem validou.

  10. Por outras palavras, a suposta informação bancária não é mais do que um documento produzido pela Polícia Judiciária onde se fazem menção a dados bancários que esse órgão de polícia criminal analisou, sendo ademais evidente desse documento que a “investigação policial” apenas visou os movimentos registados a crédito não tendo procedido a um análise holística dos mesmos, mormente de movimentos a débito que anulassem ou de alguma forma explicassem os supostos “incrementos” patrimoniais.

  11. Tarefa que – à luz dos princípios da boa fé, da descoberta material e para cumprimento do seu respectivo probatório – caberia à AT no âmbito de uma investigação que visasse imputar verdadeiros “incrementos” patrimoniais à Recorrente, e não meros registos bancários a crédito.

  12. Daí que seja se imponha que os pontos 2, 7 e 15 do probatório sejam dados como não provados, ou, pelo menos, que a respectiva redacção seja alterada de forma a que não se cristalize na ordem jurídica o facto (errado) de que a actuação da AT teve por base “informações bancárias”.

  13. Já o ponto nº 3 da matéria de facto vai impugnado pois inexiste qualquer prova que sustente este facto – sendo ademais curioso que a Sentença a quo fundamente tal resposta positiva aplicando um efeito cominatório à circunstância de a Recorrente não ter impugnado um facto alegado na... contestação.

  14. Imputa-se erro de julgamento ao Tribunal a quo por não ter julgado verificada a verificada a violação dos princípios do inquisitório e do ónus da prova por parte da AT no procedimento como decorrência da circunstância de AT, para proferir o acto objecto dos autos, não ter obtido, nem procurado obter, muito menos compilar e interpretar os elementos de prova legalmente exigíeis (documentos bancários e respectivo descritivo de movimentos) que sustentassem os sérios indícios que legitimassem a sua actuação.

  15. De acordo como o próprio RIT as informações provenientes do identificado inquérito crime seriam “susceptíveis” de se enquadrar no regime do 89º-A da LGT – razão pela qual se impunha que, para lá do que consta nesse relatório da Polícia Judiciária, a AT tivesse investigado os concretos movimentos bancários cuja soma constituirá os valores a crédito assinalados pelo processo criminal, tratando-os analisado e tratado (em colaboração com o contribuinte) do ponto de vista fiscal de forma a apurar se tal “susceptibilidade” se verificava, se não se verificava, ou se verificava só parcialmente e em que medida.

  16. Todavia, a AT não o fez, e, perante tais informações colhidas do inquérito crime – rectius: apenas com tais informações – a AT veio a considerar os movimentos bancários referidos nesse...

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