Acórdão nº 00513/19.0BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 08 de Outubro de 2020

Data08 Outubro 2020
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1998_01

Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. Relatório M., NIF (…), melhor identificado nos autos, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, proferida em 31/03/2020, que julgou improcedente o recurso da decisão de avaliação da matéria tributável por métodos indiretos, nos termos do artigo 89.º-A da LGT, que lhe fixou o rendimento líquido para efeitos de IRS, no ano de 2007, no valor de € 376.732,22.

No âmbito das alegações de recurso apresentadas pelo Recorrente, o mesmo elencou a final as conclusões que ora se reproduzem: A.

O presente recurso vem interposto da sentença proferida a fls. que julgou improcedente o recurso judicial interposto pelo Recorrente.

B.

Encontram-se erradamente julgados os seguintes pontos da matéria de facto: (i) Ponto 2 dos factos provados: “O mencionado procedimento inspectivo teve a sua génese no processo de inquérito NUIPC 959/11.2IDBGC, do DCIAP – Secção Única, no qual foi levantado o sigilo bancário a determinados intervenientes relacionados com o principal sujeito passivo visado naquele processo, entre eles o ora Recorrente, extraindo-se da informação bancária que que lhe respeita, que, no ano de 2007, existiram entradas pecuniárias nas suas contas bancárias no montante de 369.714,16€.* *A parte que se impugna, que se considera erradamente julgada, é a parte sublinhada (a parte inicial transcreveu-se para melhor compreensão).

(ii) Ponto 5 dos factos provados: Em termos comparativos, a divergência entre os valores declarados e o acréscimo patrimonial evidenciado na informação bancária referente ao Recorrente, é a seguinte: (…) incremento patrimonial (categoria G) 369.714,14€.

(iii) Ponto 10 dos factos provados: Na posse de informação bancária que revela a existência de entradas pecuniárias nas contas bancárias do recorrente no ano de 2007- informação essa obtida, em sede de inquérito supra identificado- a AT apurou, no âmbito do procedimento inspectivo, o seguinte rendimento colectável (…) 376.732,22€ .

C.

Estes três factos impugnados (o ponto 2 na parte sublinhada), devem ser dado como não provados, por total ausência de prova.

D.

Não consta dos autos qualquer prova (incluindo do RIT) capaz e suficiente para demonstrar que na conta do Recorrente entraram quantias pecuniárias de 369.714,16€ no ano de 2007.

E.

A AT limitou-se a transcrever conclusões do processo crime, retiradas de um despacho de arquivamento, supostamente baseadas em documentos que, aliás, nunca foram exibidos ao Recorrente.

F.

Não havendo documentos que o comprovem, nunca podia o tribunal recorrido ter dado como provado que aquelas entradas pecuniárias ocorreram.

G.

A AT considerou provadas as entradas sem consultar um único documento bancário e o tribunal recorrido seguiu igual caminho, ou seja, a AT diz que ocorreram as entradas porque a Polícia Judiciária diz que sim, e o tribunal dá como provadas essas entradas porque a AT diz que sim! H.

Devem ser aditados à matéria de facto provada os seguintes pontos: (i)“A AT, para a elaboração do RIT (relatório de inspecção tributária), não consultou ou teve acesso a qualquer documento bancário”.

Este facto deve ser aditado com base no relatório de inspecção (onde não constam quaisquer documentos bancários), bem como da confissão tácita da própria AT nos presentes autos.

(ii) No ano de 2017, o Recorrente depositou nas suas contas bancárias, pelo menos, um cheque emitido pela sua mãe no montante de € 3.000,00 (três mil euros).

Este facto resulta do documento n.º 2 da petição inicial.

I.

A determinação da matéria colectável por métodos indirectos tem carácter excepcional, só podendo ser utilizada quando for de todo impossível determiná-la com recurso aos métodos indirectos e, apenas, nas situações taxativamente previstas no art. 87º da LGT; J.

A AT, na situação dos autos, invocou a alínea f) do n.º 1 do referido art. 87º/LGT para fundamentar a utilização de métodos indirectos na determinação da matéria colectável e fundamentou da seguinte forma: (…) no decurso do processo de inquérito NUIPC 959/11.2IDBGC (…) no decurso do ano de 2007, foram detetadas entradas de valores nas contas bancárias do sujeito passivo, no montante de 380.214,14 €.

K.

A AT não podia utilizar as informações recolhidas no processo crime para fundamentar a decisão de avaliação da matéria colectável através de métodos indirectos, só podendo fundamentar os métodos indirectos com base em informações que tenha recolhido durante a sua inspecção tributária.

L.

Durante a inspecção, a AT não recolheu quaisquer informações donde resulte um acréscimo de património do Recorrente, pelo que não se verifica o fundamento legal invocado (art. 87º/1/f) para recorrer aos métodos indirectos.

M.

É verdade que a AT, através de despacho da sua Diretora-Geral, proferido em 08.10.2019, derrogou o denominado sigilo bancário e determinou que os funcionários da inspecção tributária pudessem aceder directamente a todas as contas e documentos bancários existentes nas instituições bancárias, por referência ao ano de 2007, mas também é verdade que a AT não acedeu directamente a qualquer conta bancária, nem obteve documento bancário.

N.

Aceder a elementos de prova não é o mesmo que aceder a conclusões de despachos de arquivamento em processos crime.

O.

As conclusões do relatório da polícia judiciária e do despacho de arquivamento do Ministério Público não são documentos bancários ou elementos de prova (art. 63º-B/10 da LGT).

P.

A AT só estaria habilitada a saber qual o acréscimo patrimonial, e se o mesmo era suficiente para recorrer à determinação da matéria tributável com base nos métodos indirectos, se tivesse consultado e analisado os documentos bancários.

Q.

A decisão de recorrer à avaliação da matéria colectável através de métodos indirectos é nula, ou melhor, inexistente.

R.

Ao não ter decidido assim, a sentença recorrida violou os artigos 87º/1/f e 89º-A/1/5, ambos da LGT.

S.

É certo e sabido que à AT basta provar os requisitos previstos no art. 89º-A/1 da LGT e que, se assim acontecer, ao contribuinte cabe “demonstrar a comprovação de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna ou do acréscimo de património ou da despesa efectuada” (89º-A/3).

T.

Ao Recorrente, porque a AT não os possuía, não foram exibidos quaisquer documentos, logo foi-lhe vedada a possibilidade de demonstrar que essas eventuais entradas não correspondiam a incrementos patrimoniais.

U.

A AT só poderia concluir que todas as entradas correspondem a incrementos patrimoniais se tivesse dado a oportunidade ao Recorrente de visualizar e analisar os extractos e, depois, só depois, caso o Recorrente não justificasse essas entradas é que as poderia considerar injustificadas.

V.

Ao Recorrente foi vedado o direito a comprovar a veracidade dos rendimentos declarados (89º-A/3 LGT), porquanto a AT recusou informá-lo dos movimentos bancários que considerou como entradas injustificadas, logo, esta não podia, sem mais, considerá-las como tal.

X.

Ao não entender assim, a decisão recorrida violou o artigo 89º-A/1/3/4 da LGT.

Z.

Pelas razões expostas, deve a sentença recorrida ser revogada e, em consequência, ser julgado procedente o recurso judicial dos autos.” **A Recorrida, Autoridade Tributária e Aduaneira, apresentou contra-alegações em defesa da improcedência do recurso, embora sem formular conclusões.

** Dada a natureza urgente do processo, há dispensa de vistos prévios (artigo 36.º, n.º 2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos ex vi artigo 2.º, n.º 2, alínea c) do Código de Procedimento e de Processo Tributário).

II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, cujo objeto do recurso está delimitado pelas conclusões das respetivas alegações - cfr. artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 4 e 5, todos do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigo 2.º, alínea e) e artigo 281.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) –, e que se centram em saber, em suma, se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de facto e de direito ao concluir pela legalidade do recurso aos métodos indiretos para o apuramento do rendimento coletável do ano de 2007.

** III - FUNDAMENTOS III.i - DE FACTO No âmbito da...

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