Acórdão nº 00393/11.4BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Maio de 2020

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução15 de Maio de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo do Norte: I. RELATÓRIO 1.1.A S., S.A., com sede em (...), (...), instaurou ação administrativa especial, contra o INSTITUTO DE FINANCIAMENTO DA AGRICULTURA E PESCAS, I.P., com sede na Rua (…), (…), visando a anulação ou declaração de nulidade da ((i) decisão do Vogal do Conselho Diretivo do IFAP de modificação unilateral do contrato de atribuição de ajudas a medidas florestais na agricultura e lhe determinou o pagamento/reembolso da quantia de € 22.922,03; (ii) da decisão do Vogal do Conselho Diretivo do IFAP que rejeitou o recurso hierárquico impróprio e que, apreciando-o como reclamação, indeferiu as pretensões da A. e da (iii) decisão do Vogal do Conselho Diretivo do IFAP que manteve a decisão referida em b).

Alegou, para o efeito, em síntese, que as decisões: Violam o regime da revogabilidade dos atos administrativos previstos no art.º 140.º, n.º 1, al. b) e 141.º do CPA; Padecem de falta de fundamentação pois assentam em juízos meramente conclusivos. Na decisão referida em a) não é invocada qualquer disposição legal que fundamente a decisão e omite-se a discriminação das ajudas atribuídas às áreas expropriadas e os cálculos que levaram à exigência das quantias em causa, tanto mais que em anteriores ofícios de 18.3.2010 e 17.4.2010 se realizaram cálculos distintos; Padecem de erro nos pressupostos uma vez que o direito de rescisão ou modificação unilateral pressupõe o incumprimento contratual por parte do beneficiário, sendo certo que a A. sempre cumpriu com as obrigações contratuais e legais a que está adstrita e a redução da área afeta ao projeto não lhe é imputável decorrendo de expropriação não previsível; Ademais, nos termos do art.º 47.º, n.º 1 al. c) do Regulamento (CE) 1974/2006, os Estados Membros podem reconhecer como força maior ou circunstâncias excecionais e, nessa medida, não exigir o reembolso de parte ou da totalidade da ajuda recebida pelo beneficiário nas hipóteses de expropriação de uma parte importante da exploração agrícola se essa expropriação não era previsível na data em que o compromisso foi assumido; As decisões violam os princípios da legalidade, da proporcionalidade e adequação, da justiça, da igualdade, da proteção da confiança, tendo sido violado o principio da boa fé e abuso de direito porquanto a A. deu a conhecer atempadamente a situação de expropriação, tendo reiterado a necessidade de uma resposta urgente quanto às consequências da expropriação e por forma a apresentar tais valores à entidade expropriante de modo a ser ressarcida dos mesmos, sendo que esta não deu uma resposta atempada; As decisões referidas em b) e c) padecem de (i) erro nos pressupostos porquanto se tratavam de recursos hierárquicos impróprios, de ato praticado pelo delegado para o órgão delegante, e deveriam ter sido admitidos, (ii) violam o artigo 172.º do CPA pois cabia ao órgão delegado apenas remeter o recurso para o órgão delegante, não podendo decidir o recurso hierárquico improprio; Padecem de vicio de desvio de poder pois a A. utilizou as ajudas nos fins para que foram concedidas, sem agora poder beneficiar das medidas; As decisões violam de forma arbitrária, desproporcional e onerosa as legitimas expetativas e confiança da A., e o seu autor não tinha poder para praticar os atos.

1.2.

Regularmente citado, o Réu contestou, defendendo a caducidade do direito de ação, e pugnando pela improcedência da ação, sustentando, em suma, não ser aplicável, em sede de incentivos financeiros, o regime da revogabilidade previsto no art.º 141.º do CPA, prevalecendo o princípio da repetição do indevido, e sendo certo que o período de vigência do contrato é de 1998 a 2017; A decisão final remete para o ofício de audiência prévia, encontrando-se este devidamente fundamentado e constatando-se que a A. compreendeu as razões subjacentes ao ato; Considerando que no decurso da execução do contrato ocorreu uma alteração nos pressupostos que determinaram a elegibilidade da candidatura da A. nos termos em que a mesma foi aprovada, o contrato deve ser modificado nos termos do art. 6.º, n.º 2 e 5 do DL 31/94 e Reg (CEE) 2080/92; Ademais sendo obrigações do beneficiário manter integralmente os requisitos da concessão de ajuda e as condições que determinam o cálculo do montante das ajudas, o não cumprimento das obrigações ou o desaparecimento ou inexistência das condições e requisitos de elegibilidade determina a modificação ou rescisão dos contratos e o reembolso das ajudas indevidamente recebidas, com juros (clausulas C.3, C.7 e E.1 do contrato); A expropriação traduz-se numa impossibilidade superveniente e definitiva de prosseguimento do projeto e de cumprimento das obrigações a que o beneficiário estava adstrito que desonera as partes das obrigações respetivas, pelo que em relação à parte expropriada o IFAP encontra-se desobrigado do pagamento do remanescente da ajuda, e embora não seja a expropriação imputável ao beneficiário, porque implica o incumprimento das obrigações futuras devem ser restituídas as verbas afetas à área expropriada, procedendo o beneficiário o seu reembolso nos termos prescritos para o enriquecimento sem causa; Não ocorre qualquer violação da boa fé, agindo a entidade demandada de acordo com a legalidade; Não existe órgão hierárquico superior ao Conselho Diretivo do IFAP, sendo os órgãos praticados por delegação praticados pelo órgão colegial, donde apenas é admissível a reclamação e não recurso hierárquico; Não ocorrem os vícios de desvio de poder, nem violação dos princípios da proporcionalidade, confiança e justiça; Não há incompetência porque os atos foram praticados ao abrigo de deliberação de competências.

1.3.

A A. apresentou resposta.

1.4.

Foi proferido despacho saneador.

1.5.

Foram apresentadas alegações tendo as partes mantido as posições vertidas nos articulados iniciais.

1.6.

O TAF de Mirandela proferiu sentença que julgou a ação procedente, constando da mesma o seguinte segmento decisório: «Nestes termos, e pelas razões aduzidas, julga-se procedente a presente ação e, em consequência, anulam-se as decisões do vogal do Conselho Diretivo do IFAP contidas nos ofícios 033362/2010, 018183/2011 e 026232/2011.

Custas pela Entidade Demandada (cfr. artigo 527.º, n.º 1 e 2 do Código de Processo Civil ex vi artigo 1.º do CPTA, artigo 6.º, n.º 1 e tabela I-A do RCP).

Registe e notifique.» 1.7.

Inconformado com a decisão, o Apelante interpôs recurso jurisdicional, no qual formulou as seguintes conclusões: «A. Por sentença proferida em 1/2/2019, pelo Tribunal foi julgada procedente a ação administrativa interposta por S., SA, e em consequência foi determinada a anulação das decisões do vogal do Conselho Diretivo do IFAP contidas nos ofícios ref.ª 033362/2010, 018183/2011 e 026232/2011, no entendimento que: Há violação do princípio da proporcionalidade; Não existia qualquer motivo para a rejeição dos recursos hierárquicos impróprios apresentados pela A. para o conselho diretivo; Não dispunha o vogal de qualquer competência para a decisão de rejeição do recursos hierárquico impróprios interpostos pela A..

B. Considerou o Tribunal a quo, que há violação do princípio da proporcionalidade por as decisões não incidirem apenas sobre o direito da recorrida ao prémio anual por perda de rendimento, na proporção da área expropriada e do período de atribuição do prémio que ainda restava após a expropriação.

C. Este entendimento não parece correto, pois, em face da expropriação de parte da exploração da recorrida, e embora a mesma não resultasse da sua vontade, nem tão pouco lhe fosse imputável, tal facto implica objetivamente o incumprimento das obrigações a que esta se encontrava legal e contratualmente adstrita, encontrando-se o recorrente desobrigado do pagamento do remanescente da ajuda, e obrigado a recuperar os montantes indevidamente recebidos nos termos da Cláusula E.1. do contrato de atribuição da ajuda, bem como segundo as regras do enriquecimento sem causa, previstas no Artº 473º do Código Civil.

D. Com efeito, nos termos dos nºs 1, 2 e 3 do Artº 84.º da Lei n.º 168/99, a requisição de bens imóveis confere ao requisitado o direito a receber uma justa indemnização que visa ressarcir o prejuízo que para este advém da requisição, e que tem em conta o período da requisição, o capital empregue para a construção ou aquisição e manutenção dos bens requisitados e o seu normal rendimento, a depreciação derivada do respetivo uso e, bem assim, o lucro médio que o particular deixa de perceber por virtude de requisição.

E. Quer isto significar que, muito embora a impossibilidade de dar continuação ao projeto, nos termos inicialmente previstos, não resulte da vontade da recorrida, e tão pouco lhe seja imputável, esta implica objetivamente o incumprimento futuro das obrigações a que se vinculara, devendo no entanto, ser restituídas todas as verbas afetas à área expropriada, inexistindo desta forma o vício de violação do princípio da proporcionalidade.

F. Considera o Tribunal a quo, que inexistem motivos para a rejeição dos recursos hierárquicos impróprios apresentados pela A. para o conselho diretivo.

G.

Salvo melhor opinião, este entendimento não é correto, pois, nos termos do Artº 166.º do CPA, o recurso hierárquico só existe desde que praticado por órgãos sujeitos aos poderes hierárquicos de outros órgãos e que a lei não exclua tal possibilidade.

H. Relativamente aos atos administrativos praticados pelo IFAP, I.P., não é admissível o recurso hierárquico por inexistência de sujeição ao poder hierárquico de outro órgão, pois, os atos do Conselho Diretivo, mesmo quando praticados por delegação de competências, são praticados pelo órgão colegial, apenas cabendo, em termos de impugnação graciosa, a figura da reclamação prevista nos Artºs 161º e ss do CPA e, em termos de impugnação contenciosa os meios previstos na lei.

I. Não existindo na estrutura orgânica do IFAP, IP., um órgão hierarquicamente superior ao órgão decisório...

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