Acórdão nº 00656-A/96-Porto de Tribunal Central Administrativo Norte, 25 de Fevereiro de 2011

Magistrado ResponsávelCarlos Luís Medeiros de Carvalho
Data da Resolução25 de Fevereiro de 2011
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO “JUNTA FREGUESIA DE SÃO PEDRO DA TORRE”, devidamente identificada nos autos, inconformada, interpôs recurso jurisdicional da decisão do TAF do Porto, datada de 31.03.2008, que nos autos de execução de julgado anulatório pela mesma movida contra “MUNICÍPIO DE VALENÇA”, “VALORMINHO - VALORIZAÇÃO E TRATAMENTO DE RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS, SA”, “INSTITUTO DE RESÍDUOS” e “COMISSÃO DE COORDENAÇÃO DESENVOLVIMENTO REGIONAL NORTE”, todos igualmente identificados nos autos, julgou inexistir causa legítima de inexecução e especificou “… que a execução deve consistir na realização de inquérito público de acordo com o estabelecido na Lei n.º 83/95, de 31 de Agosto, o qual deve preceder a deliberação camarária ...

” e fixou “… em 120 dias o prazo para a prática do referido acto de execução ...

” e “… nos termos do artigo 169.º, n.º 2, do CPTA, em 10% do salário mínimo nacional mais elevado, a sanção pecuniária compulsória a pagar por cada dia de atraso que, para além do prazo limites atrás estabelecido, se possa vir a verificar na execução desta decisão ...

”.

Formula a recorrente nas respectivas alegações (cfr. fls. 681 e segs.

- paginação processo suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário), as seguintes conclusões que se reproduzem: “...

  1. Por douto acórdão proferido pelo STA em 22 de Janeiro de 2004 - (correcção introduzida por este Tribunal ao teor das conclusões não «Abril» como consta do teor das alegações) - foi declarado nulo o acto da Câmara Municipal de Valença que determinou a localização do Aterro Sanitário de São Pedro da Torre, por esse mesmo acto não ter sido precedido de audiência prévia, como determinado na Lei n.º 85/93.

  2. Face a essa decisão o referido acórdão não conheceu dos demais vícios apontados ao acto pela ora recorrente.

  3. O Município de Valença, chamado a decidir sobre a execução em concreto do referido acórdão, deliberou que a execução consistiria na remoção dos resíduos sólidos urbanos existentes no aterro sanitário.

  4. Tendo ponderado a possibilidade de renovar o acto declarado nulo, expressamente afastou tal possibilidade.

  5. E alegando razões de ordem financeira o Município de Valença veio a declarar a inexistência de justa causa de inexecução do referido acórdão.

  6. Por discordar das razões invocadas, a recorrente intentou os presentes autos de execução de sentença, pedindo fosse declarada a inexistência de justa causa de inexecução, a condenação dos executados à imediata cessação de laboração do aterro sanitário, a proceder à sua remoção ou à sua selagem com a consequente monitorização dos resíduos sólidos.

  7. A recorrente não pediu a renovação do acto declarado nulo.

  8. Ao decidir para além do pretendido pelas partes nestes autos e em objecto diverso do pedido, a decisão recorrida viola o princípio do dispositivo a que está obrigada.

  9. A decisão ora recorrida, ao determinar que a execução do acórdão se resume à renovação do acto com prévia realização de inquérito público, nos termos do disposto na Lei n.º 83/95, extravasa os seus poderes jurisdicionais por pretender impor à entidade administrativa um tipo de conduta que não foi requerida por si ou pela recorrente, violando o art. 111.º, n.º 1 da Constituição da República.

  10. A decisão ora recorrida extravasa os poderes do Tribunal em processo de execução ao pronunciar-se pela não verificação de nulidade do acto declarado nulo (e do eventual acto renovatório), por violação do PDM de Valença, quanto tal matéria não foi objecto de decisão por parte do Supremo Tribunal Administrativo.

  11. Pelo que a decisão recorrida é nula por força do disposto nas alíneas d) e e) do n.º 1 do artigo 668.º do Código de Processo Civil.

  12. O aterro sanitário, em causa, que foi construído no local determinado pelo acto recorrido, está em pleno funcionamento desde 1997, encontrando-se, actualmente, perto do seu limite máximo de capacidade.

  13. Estando o procedimento administrativo terminado, o aterro sanitário construído e em pleno funcionamento é agora impossível proceder-se à renovação do acto da Câmara Municipal de Valença, de escolha do local para a sua instalação, mediante a realização de um procedimento de inquérito público, uma vez que o mesmo seria irrelevante - a escolha já foi feita e o aterro aí instalado está em pleno funcionamento.

  14. Pelo que o acto da Câmara Municipal de Valença declarado nulo não é renovável.

  15. A audiência prévia dos interessados tem de ter lugar antes da tomada de decisão da administração, de modo a serem tidas em linha de conta as sugestões, reclamações e preocupações dos cidadãos eventualmente afectados pela instalação do aterro sanitário.

  16. A audiência prévia não se resume a uma mera formalidade do procedimento administrativo, constitui um seu elemento fundamental, de acordo com o princípio democrático e da participação na vida pública, garantido pelo disposto na Lei n.º 83/95 e pelos arts. 48.º e 52.º da Constituição da República.

  17. Este direito de participação procedimental, existe para garantir a protecção de direitos fundamentais dos cidadãos - no caso, o direito ao ambiente sadio e ecologicamente equilibrado.

  18. A sua preterição origina um vício próprio e interno do acto que põe em causa a sua própria vigência e que constitui um vício insuprível a partir do momento que o acto é produzido.

  19. Daí que a falta de audiência prévia, nos casos previstos na Lei n.º 83/95, correspondendo à violação de um direito fundamental é geradora de nulidade do acto em causa.

  20. Não se confundindo, como o faz a decisão recorrida, com o mero direito de audição prévia consagrado no art. 100.º do CPA.

  21. Violou assim a decisão recorrida os artigos 48.º, 52.º, 111.º n.º 1, da Constituição da República; arts. 95.º, n.º 1, 173.º, n.º 1, 179.º, n.º 1, do CPTA e 660.º, n.º 2 e 661.º, n.º 1 do CPC …”.

    Conclui no sentido da revogação da “… decisão recorrida, determinando-se que a execução do acórdão do STA em crise nestes autos seja efectuada mediante a imediata cessação de laboração do aterro sanitário e a remoção dos resíduos sólidos aí depositados ou a selagem aterro sanitário com a sua consequente monitorização conforme o que for determinado pela autoridade administrativa com competência na matéria, conforme pedido pela recorrente …”.

    O executado Município apresentou contra-alegações e interpôs recurso jurisdicional subordinado na parte em que desatendeu a excepção de ilegitimidade passiva e julgou inexistir causa legítima de inexecução (cfr. fls. 755 e segs.

    ), nas quais termina concluindo do seguinte modo: “...

    1. Verifica-se a ilegitimidade passiva dos executados, por não terem intervido nos autos, na posição de contra-interessados, os accionistas da Valorminho, S.A. individualmente considerados, e não esta própria.

    2. Não obsta a tal ilegitimidade o facto de a «Valorminho - Valorização e Tratamento de Resíduos Sólidos, S.A.» ser representada por um conselho de administração.

    3. Uma coisa é a sociedade anónima de que fazem parte os respectivos accionistas, sendo que o conselho de administração apenas representa legitimamente a sociedade; outra coisa são os accionistas individualmente considerados e que são representados apenas pelos seus órgãos legítimos, dotados das competências e atribuições fixadas por lei, na defesa dos seus interesses e direitos.

    4. Foi a própria exequente a imputar a cada um deles as mais diversas responsabilidades, a alegar que deveriam suportar os mais variados «custos», proceder ao aumento das tarifas, suportar as mais variadas responsabilidades e resolver as mais diversas questões decorrentes da execução.

    5. Em caso de encerramento e desactivação do aterro, sempre cada um dos Municípios passaria a ter de tratar da solução a dar aos RSU produzidos nas respectivas áreas geográficas, independentemente da questão da indemnização pelos prejuízos sofridos, da responsabilidade da executada.

    6. O próprio Estado Português tem interesse manifesto no desfecho da execução e é afectado pelo eventual encerramento do aterro, pois que o mesmo concessionou à Valorminho S.A. a exploração e gestão do sistema multimunicipal de valorização e tratamento de resíduos sólidos urbanos do Vale do Minho, tanto mais que a selagem e desactivação do aterro sanitário contrariam a política ambiental definida para o País e eliminam uma célula importante dessa política relativamente ao Alto Minho, tal como implicam a impossibilidade de cumprimento do contrato de concessão celebrado, sendo que as actividades concessionadas incumbem, em primeira linha, ao Estado.

    7. Todos esses contra-interessados, enquanto pessoas colectivas individualmente consideradas e com interesses próprios a defender, seriam, sem qualquer dúvida, prejudicados com a satisfação das pretensões deduzidas pela exequente, tendo, por isso, manifesto interesse na manutenção dos actos consequentes ao acto declarado nulo.

    8. Deveria ter sido concretamente apreciada a causa legítima de inexecução invocada e os seus fundamentos.

    9. Apesar de ter sido entendido na douta sentença que a execução da douta decisão anulatória deveria consistir na prática de novo acto precedido da formalidade essencial omitida - o inquérito público a que se refere a Lei 83/95, de 31 de Agosto -, devia a causa legítima de inexecução invocada pela executada (quer no que respeita à impossibilidade absoluta alegada, quer no que respeita à verificação de grave prejuízo para o interesse público) ter sido concretamente apreciada, atento o pressuposto nela invocado de que não seria legalmente admissível a prática de novo acto, que sempre seria nulo, e depois de ordenadas as diligências instrutórias pertinentes e necessárias.

    10. Tratava-se da observância do princípio da tutela judicial efectiva e da obrigatoriedade de conhecimento de todas as questões suscitadas pelas partes.

    11. Não o tendo sido feito, no caso de se vir a entender que não é legalmente possível a...

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