Acórdão nº 00218/12.3BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 26 de Setembro de 2013

Magistrado ResponsávelNuno Filipe Morgado Teixeira Bastos
Data da Resolução26 de Setembro de 2013
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. Relatório 1.1. J..., n.i.f. 211 871 940, com domicílio indicado na Avenida…, Vila Real, recorre da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela nos autos de reclamação de decisão do órgão de execução fiscal, que interpôs a coberto dos artigos 276.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário, na sequência de uma decisão do Serviço de Finanças de Vila Real que no processo de execução fiscal n.º 2496200901052241 lhe indeferiu o pedido de dispensa da prestação da garantia e bem assim da decisão proferida pela Direção de Finanças de Vila Real no recurso hierárquico que interpôs daqueloutra decisão.

Com a interposição do recurso, apresentou as respetivas alegações e formulou as conclusões que a seguir se transcrevem, nos exatos termos em que foram exaradas (mas renumeradas por nós, uma vez que, no articulado respetivo, por evidente lapso de numeração, não havia 13.ª, 14.ª e 15.ª conclusões): 1.ª A sentença recorrida considerou que para além da matéria dada como provada, não se provou que “Em 18.06.2012, o Reclamante remeteu, via fax, o Requerimento inicial”.

  1. Ora, quanto ao facto não provados temos que, consideramos existir prova suficiente nos autos, que impõe decisão diversa da recorrida, no sentido de dar como provado que o ora recorrente remeteu, em 18.06.2012, via fax, o Requerimento Inicial.

  2. Entendemos que, atentos os circunstancialismos do caso, a prova documental que foi feita e as demais considerações jurídicas que se aludirão, é de concluir que o recorrente deduziu tempestivamente a sua defesa.

  3. Por outro lado, quanto aos factos dados como provados, nomeadamente quanto ao quesito número 7 da Base Instrutória, é essencial reiterar que atento a prova documental carreada para os autos, se impunha, e impõe, decisão diversa daquela que foi dada pelo Exmo. Sr. Juiz, porquanto consideramos e demonstrámos existir nos autos prova suficiente, coerente, e com razão de ciência, capaz de dar o quesito n.º 7 como não provado.

  4. A administração tributária não logrou realizar as diligências de prova peticionadas, de forma a comprovar os factos alegados pelo ora recorrente, tendo a final e injustificadamente indeferido o pedido formulado pelo recorrente.

  5. Para prova dos factos alegados, o recorrente juntou prova documental do seu recibo de vencimento e arrolou três testemunhas que têm conhecimento direto de factos relevantes para sustentar aquelas afirmações, pelo que a natureza conclusiva dos factos alegados impunha, com especial pertinência, que fossem ouvidas as testemunhas, pois poderiam fornecer ao Tribunal factos objetivos que confirmem ou infirmem a conclusão narrada naqueles artigos.

  6. Decidindo-se sobre a matéria de facto sem a produção de prova testemunhal requerida e tendo considerado como não provada toda a factualidade alegada no sentido de demonstrar o preenchimento dos pressupostos da dispensa de prestação de garantia, incorreu a decisão de arquivamento do recurso hierárquico em erro na decisão da matéria de facto.

  7. Pelo que o despacho de arquivamento referido recorrido que dispensou a inquirição das testemunhas infringiu o preceituado no artigo 99º da L.G.T. e nos artigos 114º, 115º, 118º e 119º do C.P.P.T., mais se tendo desrespeitado o dever de colaboração processual, em sede de instrução, sobre diligências e meios de prova e o princípio da verdade material e, por consequência, o princípio da oficiosidade da investigação e indagação das provas, que rege o procedimento tributário, por força do disposto nos artigos 58º da L.G.T. e do artigo 50º do C.P.P.T..

  8. O direito à produção de prova é um direito constitucional concretizado, uma vez que é uma das componentes do direito de acesso ao tribunal, do direito de intervenção das partes e das garantias de defesa.

  9. A Administração Fiscal deveria ter procedido às diligências de prova, para desfazer as dúvidas citadas e antes da decisão final ser proferida, daí que estejamos perante uma nulidade, devida pela omissão de ato ou formalidade que a lei prescreve, com influência no exame e na decisão da causa, conforme o artigo 201º do C.P.C..

  10. Mais: Informou o Tribunal recorrido que formou a sua convicção em resultado da análise dos documentos juntos do Processo de Execução Fiscal e dos documentos juntos aos autos, os quais não foram impugnados pelas partes, os quais se mostram expressamente indicados por referência a cada um dos factos dados como provados.

  11. Com respeito à matéria de facto, e quanto à motivação da decisão da matéria de facto, considera o recorrente que o Tribunal a quo igualmente não providenciou pela produção dos meios de prova solicitados pelo Recorrente no seu requerimento inicial., porquanto não foram notificados as testemunhas identificadas e arroladas pelo recorrente no Processo de Execução Fiscal para prestarem as respectivas informações.

  12. Tal omissão de diligências probatórias privou, indubitavelmente, o Recorrente de provar a sua condição de extrema insuficiência económica, da sua manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, e de provar que a prestação de garantia no processo de execução fiscal significaria um extenso prejuízo irreparável ao executado.

  13. Assim, a omissão dessas diligências de prova acarreta a nulidade do processo e correspectivamente da sentença – artigo 201º, n.º 1 do CPC.

  14. Do tudo o exposto, quer em sede do Procedimento Administrativo, quer em sede da Reclamação dos actos do órgão de execução fiscal, deveria ter resultado que o salário do recorrente é impenhorável, uma vez que o mesmo é inferior ao salário mínimo nacional, bem como a insuficiência de meios para o recorrente satisfazer as suas necessidades básicas em caso de prestação de garantia no processo de execução fiscal.

  15. Ao decidir de forma contrária ao supra exposto, com o devido respeito e salvo melhor opinião, desde logo o Ilustre Chefe de Finanças Adjunto fez errada apreciação e valoração da matéria de facto, bem como incorreta interpretação e aplicação do direito ao caso concreto, e igualmente laborou em erro o Exmo. Sr. Juiz do Tribunal a quo ao dar como provado o quesito n.º 7, quando consideramos e entendemos que existe prova suficiente nos autos, séria, credível e com razão de ciência, capaz e susceptível de dar como não provado o referido quesito.

  16. Existem atos materialmente administrativos na execução que podem ser praticados pela Administração Tributária.

  17. A Administração Tributária, no seguimento do disposto no artigo 103º da L.G.T., só pode praticar atos materialmente administrativos, como o ato objeto de Recurso Hierárquico.

  18. A decisão sobre o pedido de dispensa de prestação de garantia consubstancia um verdadeiro e material ato administrativo, aliás veja-se neste sentido o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 80/2003, proferido no âmbito do processo n.º 151/02 e cujo relator foi o Juiz Conselheiro Benjamim Rodrigues (disponível em www.tribunalconstitucional.pt), e também o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09.05.2012 (processo n.º 0446/12, disponível em www.dgsi.pt), segundo o qual: “II - A Lei Geral Tributária atribui assim globalmente ao processo de execução fiscal a natureza de judicial, pese embora nele sejam praticados atos materialmente administrativos por órgãos da administração tributária. III - A decisão do pedido de dispensa de prestação de garantia previsto nos arts. 170º do Código de Procedimento e Processo Tributário e 52º nº 4 da Lei Geral Tributária deve qualificar-se como ato materialmente administrativo em matéria tributária, sujeito ao regime geral do ato administrativo”.

  19. O nosso ordenamento jurídico estabelece que são suscetíveis de Recurso Hierárquico quaisquer atos em matéria tributária que lesem direitos ou interesses legalmente protegidos – artigo 66º do C.P.P.T..

  20. Assim, o meio adequado a reagir ao indeferimento do pedido de prestação de garantia é o recurso hierárquico, e tudo nos termos do artigo 66º do C.P.P.T e 47º, n.º 1 do C.P.P.T., onde se estabelece que a mesma pretensão não pode ser apreciada sucessivamente por mais de dois órgãos integrando a mesma administração tributária.

  21. A Fazenda Pública ao não conhecer o Recurso Hierárquico interposto violou o disposto nos artigos 47º, n.º 1 e 66º do C.P.P.T., o artigo 80º da L.G.T. e o artigo 173º do C.P.A., pelo que a decisão de arquivamento do Recurso Hierárquico interposto foi desde logo nula por preterição de formalidades legais – artigo 99º, al. d) do C.P.P.T. por analogia.

    Sem prescindir, e caso assim não se entenda, o que não se concede ou concebe, 23.ª O princípio da adequação formal é ponto norteador de toda a tramitação processual, seja esta no âmbito da legislação administrativa, seja esta no âmbito da legislação civil, e assim, por consequência, é possível corrigir a forma de processo.

  22. Sem prescindir de entendermos e reiterarmos que o Recurso Hierárquico é o meio processual competente, com referência ao caso subjudício, julgamos que, se assim não se entender, é possível a convolação do Recurso Hierárquico apresentado, no meio processual que se achar indicado: a Reclamação dos Actos do Órgão de Execução Fiscal.

  23. E se essa convolação for possível, como de facto é, ela é obrigatória, tratando-se de nulidade susceptível de sanação – cfr. artigos 98, n.º 4 do CPPT e 97, n.º 3 da LGT.

  24. A reclamação dos actos do órgão de execução fiscal tem uma dupla natureza: é procedimento administrativo numa primeira fase, e processo judicial numa segunda fase.

  25. Pelo que na fase de procedimento administrativo é perfeitamente possível, exigível e obrigatória, se for o caso, a convolação do recurso hierárquico em reclamação dos actos do órgão de execução fiscal.

  26. Inclusivamente, o recorrente deduziu tempestivamente o Recurso Hierárquico, e até...

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