Acórdão nº 01235/17.2BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 06 de Abril de 2018

Magistrado ResponsávelLuís Migueis Garcia
Data da Resolução06 de Abril de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: VCII, Ldª (Rua B…, Braga), interpõe recurso jurisdicional de sentença proferida pelo TAF de Braga, que julgou improcedente processo cautelar de suspensão de eficácia intentado contra o Município de VC (Passeio …, Viana do Castelo).

*Conclui a recorrente: 1.

O presente recurso assenta, por um lado, na errada aplicação do disposto no art. 118º nº 1 do CPTA e na incorreta apreciação da matéria de facto e do Direito aplicável.

  1. O Tribunal a quo fez uma errada aplicação do disposto no art. 118º nº 1 do CPTA, ao dispensar a produção de prova testemunhal porquanto estamos perante obras que, em teoria, podem ou não determinar a obrigação ou isenção de controlo prévio, assistindo à Recorrente o direito de oferecer a sua prova no sentido de demonstrar essa isenção e é o próprio Tribunal a quo que admite a necessidade de produção dessa prova, quando afirma "Mostra-se controvertido nos autos a natureza das obras levadas a cabo pela Requerente, o que parece carecer de produção de prova testemunhal e/ou pericial não se vislumbrando qualquer violação grosseira do disposto no art. 6º nº 1 ali. b) do RJUE." - veja-se pág. 17º, seu 1º parágrafo.

  2. O entendimento que as obras em causa não se integram no disposto no art. 6º nº 1 ali. b) do RJUE, mas antes no disposto no art. 4º nº 4 ali. c) do mesmo diploma, não tem acolhimento no RJUE.

  3. O art. 6º nº 1 ali. b) do RJUE não está condicionado na sua aplicação ao disposto no art. 4º, nº 4 ali. c), o que permite cabalmente concluir que só as obras de alteração no interior de edifícios ou suas frações que impliquem modificações na estrutura de estabilidade, das cérceas, da forma das fachadas e da forma dos telhados ou coberturas, é que estão sujeitas a comunicação prévia.

  4. O auto de embargo nada diz ou refere sobre as obras colidirem com a estrutura do prédio.

  5. O embargo foi efetuado no pressupostos das obras realizadas e a realizar e não versou sobre a utilização possível daqueles espaços, pelo que, a pronúncia quanto a esta temática pelo Julgador, extravasa claramente o objeto desta lide, centrada somente na tipificação das obras.

  6. Não se aceita a argumentação de que a unidade "E" não tem um alvará específico que regule o seu uso - facto provado nº 19 -, querendo daí desconsiderar-se indevidamente a licença de utilização do "Complexo Turístico de Viana", a já evidenciada com nº 372/2006, sendo apenas esta a definidora do uso possível dos espaços.

  7. Os licenciamentos específicos exigíveis para cada atividade ali desenvolvida, o que acontece no caso da restauração e bebidas, nos termos do Decreto Regulamentar 25/93 de 17.08 e do DL nº 234/2007 de 19.06 (Regime jurídico da instalação e a modificação de estabelecimentos de restauração ou de bebidas), antecessores do DL nº 48/2011 de 01.04, em nada se confundem com a licença de utilização emitida.

  8. O pedido de licença de utilização do "Complexo Turístico da Marina", datado de 01.09.2005, não pode servir para justificar o uso permitido por aquela licença de utilização, com o nº 372/2006.

  9. Ao Tribunal impõe-se o dever de observar o âmbito da própria licença admitida, por ser essa que concede o direito, e ela é clara como água ao só mencionar "Complexo Turístico de Viana", que só pode ter na sua essência a concessão outorgada, porque é daí que decorre o uso previsto e possível, centrado nas atividades de restauração e lazer.

  10. No procedimento administrativo não vigora o princípio do pedido qua tale e, observando-se o mesmo em pormenor, vê-se que é pedida licença para as partes comuns, enquanto que a licença de utilização emitida menciona 3.422,35m2 que mais não é do que a totalidade do empreendimento.

  11. É certo que, igualmente, nesse requerimento se fala em restauração e bebidas, mas o exercício dessa atividade não excluía o direito de utilizar, naquele ou noutro momento, o complexo para outras atividades compatíveis com as finalidades previstas no contrato de concessão, como de resto a licença, emitida dez meses depois do pedido, veio consagrar.

  12. Seria um contrassenso obter-se a exploração de algo para um determinado conjunto de fins (restauração e lazer) e depois (auto)restringir-se o uso para apenas uma dessas finalidades. Se assim fosse ou pudesse ser estar-se-ia a limitar e a restringir fortemente o nível de retorno do investimento realizado, decorrente das benfeitorias no complexo, no valor total de € 2.000.000,00 (dois milhões de euros), o que seria manifestamente descabido.

  13. Pelo exposto, considera-se que está preenchido o requisito do fumus boni iuris e os demais requisitos para o decretamento da providência cautelar requerida.

*O recorrido apresentou contra-alegações, finalizando: I.

Salvo o devido respeito, a douta sentença recorrida não merece qualquer reparo porquanto não se encontra preenchido o requisito do fumus boni iuris; II. Da leitura dos processos administrativos, de todos os documentos juntos aos autos, inclusivamente de todas as fotos juntas com os articulados correspondentes e da posição das partes, designadamente da recorrente, resultam de forma clara, objectiva e inequívoca dois factos, a saber, a recorrente realizou obras na Unidade “E” do edifício do Complexo Turístico da Marina de VC, modificando as suas características físicas, designadamente, as suas divisões interiores e o edifício em causa localiza-se em área abrangida pelo Plano de Pormenor da FR e CSA, aliás factos dados como provados nos itens 1 e 22 a 24 da douta sentença recorrida; III. Partindo destes dois factos provados, o Tribunal a quo apenas tinha que subsumir os mesmos ao direito aplicável, o que fez, porquanto o Tribunal entendeu, como não poderia deixar de ser, que no caso concreto a modificação das características físicas de uma edificação ou sua fracção, designadamente das respectivas divisões interiores em área abrangida por plano de pormenor, constitui uma operação urbanística sujeita a procedimento de controlo prévio, no caso, a comunicação prévia, sendo aplicável as disposições conjugadas dos arts. 2.º/d) e 4.º/4/c) do RJUE; IV. Não tem, por isso, qualquer relevância ou interesse a produção de prova testemunhal nos presentes autos, quando a matéria em causa se encontra provada documentalmente e resulta ainda da posição das partes nos autos, porquanto nunca a recorrente pôs sequer em causa os dois referidos factos; V. A questão da integração das obras realizadas no âmbito do RJUE, ou seja, a questão de saber se a operação urbanística levada a cabo pela recorrente estava sujeita ou isenta de controlo prévio é uma questão jurídica, de direito, e como tal, não sujeita a produção de prova, a qual só pode recair sobre factos, sendo que, sobre estes a prova já foi produzida documentalmente de forma cabal; VI. As obras que a recorrente está a executar no interior da Unidade “E” do Complexo Turístico da Marina de VC, a qual é composta por dois pisos, estão sujeitas a comunicação prévia porquanto consistem em demolição/eliminação de escada em betão armado de comunicação entre pisos, execução de laje de pavimento em vigotas de betão pré-esforçado, fechando o acesso da escada, alteração da compartimentação ao nível do piso inferior, projectando-se a construção de um vestiário e de um balneário com 5 duches, este no local da escada, implicando as mesmas a alteração por completo das divisões interiores e da fisionomia interna da referida Unidade, e bem assim, da própria estrutura resistente da mesma, através da criação de um espaço mais amplo e aberto, e que inclua um espaço de balneários, de modo a afectá-lo ao uso de ginásio, pelo que as obras em causa não se integram no disposto no art. 6.º/1/b) do RJUE, mas antes no disposto no art. 4.º/4/c) do mesmo diploma, tal como considerou – e bem – a douta sentença recorrida; VII. Nos termos do art. 4.º/4/c) do RJUE, quaisquer operações urbanísticas que envolvam obras de construção, de alteração ou de ampliação em área abrangida por operação de loteamento ou plano de pormenor, independentemente de mexerem ou não com a estrutura de estabilidade da edificação, estão sujeitas a comunicação prévia, nos termos do disposto nos arts. 34.º e 35.º do RJUE, procedimento que, no caso, foi omitido pela recorrente, o que justificou, para além do mais, a emissão do acto suspendendo pelo recorrido; VIII. E, a conduta da recorrente é tanto mais grave quanto é certo que, nos termos da cláusula 11.º/3/b) do Contrato de Concessão de Exploração celebrado entre as partes em 19.05.2005, a execução de obras pela concessionária sem prévio consentimento da CMVC constitui fundamento de rescisão do referido contrato; IX. O acto suspendendo nos autos é o despacho do Sr. Vereador da Área de Planeamento e Gestão Urbanística da CMVC, datado de 23.06.2017, que tem o seguinte teor: “Embargue-se” e que se encontra aposto no cabeçalho do auto elaborado pelos serviços de fiscalização do recorrido, assentando, pois, no teor da participação dos referidos serviços, tendo adoptado por remissão a fundamentação que consta da mesma, a qual faz parte integrante do acto suspendendo; X. Sendo assim, quer da informação dos serviços de fiscalização do requerido, quer da participação...

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