Acórdão nº 01555/17.6BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 23 de Novembro de 2018

Magistrado ResponsávelRogério Paulo da Costa Martins
Data da Resolução23 de Novembro de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: AAMPF, MFOLP e RMTJ vieram interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 30.04.2018, pela qual foi julgada (totalmente) improcedente a acção que intentaram contra do Fundo de Garantia Salarial para anulação do acto de indeferimento do pedido de pagamento dos créditos requeridos por cessação de contrato de trabalho e para a condenação da Entidade Demandada ao pagamento de todos os créditos requeridos.

Invocaram para tanto, em síntese, que: uma interpretação literal da norma prevista no artigo 2°, n.° 8 do Regime Material do Fundo de Garantia Salarial, sem comportar a possibilidade de interrupção ou suspensão, ofende directamente o conteúdo da Directiva 2008194/CE, em concreto do artigo 11.º; tal interpretação configurará também um desrespeito pelas normas e princípios do Direito da nossa Ordem Interna, ou seja, para além das normas gerais do Direito Civil, referentes aos regimes da prescrição e caducidade de prazos, com tal interpretação, também se coloca em causa o princípio da legalidade (administrativa) previsto no artigo 3.° do novo Código de Procedimento Administrativo, e no artigo 266.°, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, o princípio da prossecução do interesse público e da protecção dos interesses legalmente protegidos dos cidadãos (neste caso do trabalhador, previsto no artigo 4.° do novo Código de Procedimento Administrativo, e nos artigo 266.°, n.° 1, e 59.° da Constituição da República Portuguesa, da justiça e da razoabilidade, previsto no artigo 8.° do novo Código de Processo Administrativo, e no artigo 266.°, n.° 2, da Constituição da República Portuguesa, da boa-fé, previsto no artigo 10.° do novo Código de Procedimento Administrativo, e no artigo 266.°, n.° 2, da Constituição da República Portuguesa, e do direito a uma tutela jurisdicional efectiva dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, previsto no artigo 268.°, n.° 4 da Constituição da República Portuguesa; invocam, finalmente, que é inconstitucional uma interpretação restritiva do artigo 100.° do Código de Insolvência e da Recuperação de Empresas, no sentido de não ser tal norma aplicável ao Fundo de Garantia Salarial enquanto devedor subsidiário dos trabalhadores enquanto credores privilegiados na insolvência.

*O Fundo de Garantia Salarial contra-alegou, defendendo a improcedência do recurso.

*O Ministério Público neste Tribunal emitiu parecer também no sentido de ser negado provimento ao recurso.

*Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.

*I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: I - Os Apelantes vêm interpor recurso do Despacho Saneador - Sentença, que determinou a total improcedência dos seus pedidos, e, em consequência da acção.

II - In casu, pretendiam os Apelantes impugnar o acto de indeferimento do pedido de pagamento de créditos laborais, na sequência da cessação do contrato e da declaração de insolvência da entidade patronal.

III – O Réu contestou, alegando que o contrato de trabalho dos Autores cessou em 10.09.2015, e que, quando o pedido foi apresentado, já se encontrava em vigor o Decreto-Lei n.° 59/2015 (vigente a 04.05.2015), o qual refere no artigo 2.°, n.° 8, que os créditos devem ser requeridos dentro de um ano após a cessação do contrato de trabalho, tendo sido o fundamento para o indeferimento o seguinte: "O requerimento não foi apresentado no prazo de 1 ano a partir do dia seguinte àquele em cessou o contrato de trabalho, nos termos do n.° 8 do art.° 2 do Dec. -Lei n.° 59/2015, de 21 de Abril." IV - A questão essencial a decidir nestes autos é a de saber se os Autores, e agora os aqui Apelantes têm direito aos créditos salariais que reclamam.

V - Considerou o Tribunal recorrido que o que está em causa um prazo de caducidade, pelo que não seria possível aplicar o regime de interrupção e suspensão da prescrição, sendo-lhe antes aplicável o regime previsto no artigo 328.° do Código Civil, o qual determina que o prazo de caducidade não se suspende nem se interrompe, senão nos casos em que a lei o determine, sendo que, resulta do n.° 1 do artigo 331.° do Código Civil, que apenas impede a caducidade a prática do acto.

VI - E que não prevendo o Regime Material do Fundo de Garantia Salarial qualquer situação de interrupção ou prescrição, não é aplicável o invocado artigo 100.°, do Código de Insolvência e da Recuperação de Empresas ao Fundo de Garantia Salarial, até porque entende o julgador ser tal preceito normativo aplicável apenas ao devedor originário.

VII - Não se conformam os Apelantes com a interpretação que o julgador efectuou em relação à norma prevista no artigo 100.° do Código de Insolvência e da Recuperação de Empresas.

VIII - O julgador, não fundamenta tal afirmação de que o invocado artigo 100.° se aplica apenas ao devedor originário, como também não contempla a possibilidade de tal normativo determinar a suspensão do prazo de caducidade previsto no artigo 8.°, n.º 2, do Regime material do Fundo de Garantia Salarial, caso se verificasse ser o artigo 100.° do Código de Insolvência e da Recuperação de Empresas aplicável ao devedor subsidiário.

IX - Na petição inicial, a este respeito, os Apelantes expuseram o seu argumento.

X - Assegurando o Fundo de Garantia Salarial o pagamento ao trabalhador de créditos emergentes do contrato de trabalho ou da sua violação ou cessação, desde que reunidas determinadas condições, tal se trata de uma responsabilização subsidiária do Fundo, podendo depois o mesmo fazer uso da sub-rogação dos direitos e privilégios creditórios do trabalhador perante a entidade patronal insolvente (cfr. artigo 336.° do Código do Trabalho, e artigo 4.° do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial).

XI - Sendo a declaração de insolvência uma condição legal, essencial para que o trabalhador pudesse reclamar ao Fundo de Garantia Salarial o pagamento dos seus créditos salariais.

XII - Um dos efeitos da declaração de insolvência é o constante do artigo 100.° do Código de Insolvência e da Recuperação de Empresas, que nos diz "A Sentença de declaração da Insolvência determina a suspensão de todos os prazos de prescrição e de caducidade, oponíveis pelo devedor, durante o decurso do processo." XIII - Sendo o Fundo de Garantia Salarial um devedor subsidiário, não poderá opor enquanto decorrer o processo de insolvência a caducidade do prazo a que aludirá o artigo 2.°, n.° 8 do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial ao aqui requerente, pois tal prazo encontrar-se-á suspenso.

XIV - Acresce que, tendo os trabalhadores/Autores reclamado tempestivamente os seus créditos no processo de insolvência, e o Administrador reconhecido os mesmos, enquanto representante legal da insolvente, também, ao efectuar esse reconhecimento impediu os efeitos da caducidade.

XV - Só a partir do momento em que o Administrador reconheceu os créditos dos trabalhadores/Autores (23.09.2016), ou pelo menos a partir do momento em que foi declarada a insolvência da entidade patronal (16.05.2016), momento do qual o Fundo de Garantia Salarial teve conhecimento (sendo obrigatória a comunicação da declaração da insolvência ao Fundo de Garantia Salarial), é que se poderá considerar que os trabalhadores/Autores puderam exercer legalmente o seu direito, iniciando-se, reiniciando-se, ou retomando-se o prazo a que alude o artigo 2.°, n.° 8 do Regime Material do Fundo de Garantia Salarial.

XVI - Ou seja, consideram os Apelantes que ocorreu a suspensão do prazo de caducidade previsto no artigo 2.°, n.° 8, do Regime Material do Fundo Garantia Salarial, por força da aplicação do artigo 100.° do Código de Insolvência e da Recuperação de Empresas, pelo menos, entre a data de declaração de insolvência e o término do prazo para a reclamação de créditos, ou entre a data de declaração de insolvência e o reconhecimento dos créditos pelo Administrador de Insolvência.

XVII - Só com uma das interpretações a que atrás aludimos, da norma constante do artigo 2.°, n.° 8, que não uma interpretação literal, é que se poderá salvaguardar os objectivos de justiça labora subjacentes à criação do Regime Material do Fundo Garantia Salarial.

XVIII - Pois, caso assim não seja, então podemo-nos deparar com gritantes injustiças, bastando pensarmos nas situações em que o processo de insolvência, desde que é requerida, até ao momento em que é decretada demora mais de 1 ano, ou 2, ou 3...e que, nessas situações, o trabalhador ficaria...

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