Acórdão nº 01015/13.4BEPRT-A de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelRogério Paulo da Costa Martins
Data da Resolução15 de Junho de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: AFRBR veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 04.07.2016, pela qual, na acção administrativa comum, com processo ordinário, intentada pela ora Recorrente contra o CHGE, E.P.E.

, HT, RMGFA, MTGVP, JMMMS, JCMR, e em que são intervenientes FD, S.A.

, APCS, S.A. e CSG, foi indeferida a reclamação de custas de parte apresentada pela Autora, por não ter sido acompanhada do depósito da totalidade do valor da nota em cumprimento do disposto no nº 2 do artigo 33º da Portaria nº 419-A/2009, na redacção introduzida pela Portaria nº 82/2012, de 29/03.

Invocou para tanto, em síntese, a inconstitucionalidade orgânica e formal da norma constante do nº 2 do artigo 33º da Portaria nº 419-A/2009, de 17.04, com a redacção que lhe foi dada pela Portaria nº 82/2012, de 29.03; que o pedido de custas de parte é extemporâneo, pelo que o depósito em causa não tinha de ser efectuado, por ser inexigível; que a imposição à Autora do depósito no valor de 6.600 euros seria manifestamente excessivo; que em rigor só o despacho datado de 4 de Julho, enviado em 6 de Julho, veio a condenar a ora Autora pelas custas, e só com ele se iniciou o prazo para a apresentação oportuna pelos Réus da nota justificativa de custas de parte, pelo que, só após a apresentação oportuna (e não prematura, como sucedeu) pelos Réus da nota justificativa de custas de parte, poderá a Autora proceder à reclamação das custas de parte.

*Os Recorridos não apresentaram contra-alegações.

*O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer.

*Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.

*I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: A. A Autora, ora Recorrente, apresentou reclamação à nota discriminativa e justificativa das custas de parte apresentada pelos Réus no valor de 6.600 euros.

  1. Tal reclamação foi indeferida, com fundamento na falta de depósito da totalidade do valor da nota, por despacho de que ora se recorre.

  2. A Recorrente não se conforma com o despacho recorrido por considerar que este não aplica validamente o Direito, em particular aplicando uma norma inconstitucional.

  3. O Código de Processo e o Regulamento das custas processuais não apresentam qualquer norma relativa à reclamação das custas de parte, não prevendo igualmente que tal questão será objeto de regulamentação por Portaria.

  4. A matéria da reclamação das custas de parte só se encontra regulada na Portaria n.º419-A/2009, de 17.04, em particular no seu artigo 33.º.

  5. O n.º 2 do referido artigo 33.º prevê, na sua redação actual, a obrigatoriedade de depósito como condição da reclamação da nota justificativa.

  6. A obrigatoriedade de depósito do valor da nota justificativa como condição da reclamação das custas constitui uma restrição ao direito de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, consagrado no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa – cfr. Acórdão n.º678/2014 e Acórdão n.º189/2016, ambos do Tribunal Constitucional.

  7. O direito de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, consagrado no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa é análogo a um direito, liberdade e garantia – cfr. “Constituição da República Portuguesa Anotada” (Jorge Miranda, Rui Medeiros), Tomo I, 2.ª ed. Coimbra 2010, p.304 e Acórdão n.º237/90 do Tribunal Constitucional.

    I. É “igualmente pacífico que o regime jurídico material e orgânico dos direitos, liberdades e garantias se deve aplicar ao direito de acesso à justiça” – cfr. Acórdão n.º189/2016 do Tribunal Constitucional e “Constituição da República Portuguesa Anotada” (Jorge Miranda, Rui Medeiros), Tomo I 2.ª ed. Coimbra 2010, p.308.

  8. Estabelece o artigo 165.º, n.º1, alínea b), da Constituição da República Portuguesa que é da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre direitos, liberdades e garantias, pelo que qualquer restrição ao direito de acesso à justiça e à tutela jurisdicional efetiva deve ser regulada por Lei da Assembleia da República ou Decreto-Lei autorizado.

  9. A Portaria n.º 82/2012, de 29.03, veio com a exigência do depósito da totalidade da conta de custas de parte constituir ex novo uma condicionante do acesso à justiça e à tutela jurisdicional efetiva.

    L. Estamos perante uma restrição ao direito fundamental ao acesso ao direito, sem que, para tal, exista uma habilitação para o efeito.

  10. A norma constante do n.º 2 do artigo 33.º da Portaria n.º 419-A/2009, de 17.04, padece de inconstitucionalidade orgânica, por violação do princípio da competência reservada da Assembleia da República, decorrente da alínea b) do n.º1 do artigo 165.º da Constituição da República Portuguesa, em conjugação com o artigo 20.º, n.º1, da Constituição da República Portuguesa.

  11. Razão pela qual andou mal o despacho de que ora se recorre quando aplicou aquela norma como fundamento para o indeferimento da reclamação de custas de parte apresentada pela autora, pelo que deve o referido despacho ser revogado nessa parte, devendo ser a reclamação apresentada admitida; Sem prescindir, O. Tendo a Autora invocado que o pedido de custas de parte era extemporâneo, o depósito em causa não tinha de ser efectuado, por ser inexigível – cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 10.06.2015.

  12. Razão pela qual o despacho de que se recorre andou mal ao não admitir a dita reclamação com fundamento na falta de depósito do valor da nota, pelo que, tal deverá ser revogado, admitindo-se a reclamação de custas de parte apresentada pela Autora.

    Sem prescindir, Q. A imposição à Autora do depósito no valor de 6.600 euros seria manifestamente excessivo – cfr. Salvador da Costa (Regulamento das Custas Processuais Anotado, 5.ª edição, 2013) e Tribunal da Relação do Porto, em despacho de 19.02.2014).

  13. Razão pela qual o despacho de que se recorre andou mal ao não admitir a dita reclamação com fundamento na falta de depósito do valor da nota, pelo que, tal deverá ser revogado, admitindo-se a reclamação de custas de parte apresentada pela autora; Sem prescindir, S. Em rigor, só o despacho datado de 4 de Julho, enviado em 6 de Julho, veio a condenar a ora Autora pelas custas, e só com ele se iniciou o prazo para a apresentação oportuna pelos réus da nota justificativa de custas de parte.

  14. Pelo que, só após a apresentação oportuna (e não prematura, como sucedeu) pelos réus da nota justificativa de custas de parte, poderá a Autora proceder à reclamação das custas de parte.

  15. Assim, também por este...

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