Acórdão nº 00543/14.9BEMDL-A de Tribunal Central Administrativo Norte, 28 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelHélder Vieira
Data da Resolução28 de Junho de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I – RELATÓRIO Recorrente: Município de SJP Recorrido: ATMAD Vem interposto recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, que julgou improcedente invocada excepção da incompetência material do tribunal relativamente à taxa de recursos hídricos e respectivos juros.

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da respectiva alegação, do seguinte teor: “1. O tribunal ao julgar competente para decidir e julgar o presente pedido relativo a cobrança das taxas de recursos hídricos viola o disposto nos artigos 1.°, n.º 1, 4.°, n.º 1, al. a), 44.°, n.º 1, e 49.°, todos do ETAF.

  1. Pois, estando em causa o pedido de condenação do R. a pagar à A. a Taxa de Recursos Hídricos e respetivos juros, a decisão pressupõe a apreciação de normas de direito fiscal substantivo, o que determina a incompetência do Tribunal a quo em razão da matéria.

  2. Sendo competentes os Tribunais Tributários, nos termos conjugados dos arts.º 212°, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa, e nos arts.1°, n°1, 4°, n° 1, al. a), 44°, n° 1, e 49°, todos do ETAF.

  3. Sendo, em consequência, incompetente em razão da matéria, para dirimir esta questão o presente Tribunal Administrativo de Mirandela.

  4. De igual modo o meio processual utilizado não é o adequado - a Acção administrativa comum.

  5. O artigo 77.° n.º 2 da Lei da Água – DL n.º 58/2005 de 29.12, determina que estão sujeitos ao pagamento de TRH todos os utilizadores dos recursos hídricos que utilizem bens do domínio público e todos os utilizadores de recursos hídricos públicos ou particulares que beneficiem de prestações públicas que lhes proporcionem vantagens ou que envolvam a realização de despesas públicas.

  6. Dispondo ainda no artigo 80.° que a taxa é cobrada pelas autoridades licenciadoras aquando da emissão dos títulos de utilização privativa.

  7. No decreto-lei 97/2008 de 11/06, art.º 14 determina que a liquidação compete à ARH, sendo o pagamento é feito empregando todos os meios genericamente previstos na LGT. art.º 16.º n.º 4.

  8. Pelo que, neste quadro normativo, a cobrança das taxas de recursos hídricos, o Tribunal é chamado a interpretar e aplicar normas de direito tributário por forma a dirimir um litígio que emerge do exercício da função tributária da administração pública. cfr. Arts 20, 21, 22.°, do DL 97/08 e 82.° da lei n°58/05).

  9. Pelo que a causa de pedir e o pedido não se enquadram no domínio da responsabilidade fundada no incumprimento do contrato de concessão enquanto fonte duma relação jurídica administrativa.

  10. E sim numa decorrência de relação jurídica fiscal visto estar em discussão a legalidade da interpretação e aplicação de disposições de direito fiscal, ou que se situa no campo da atividade tributária.

Termos em que, deve o presente recurso ser julgado procedente e a final ser declarado o Tribunal Administrativo de Mirandela incompetente em razão da matéria, absolvendo-se o R. da instância assim se fazendo JUSTIÇA.”.

*O Recorrido contra-alegou em termos que se dão por reproduzidos e, tendo formulado conclusões, aqui se vertem: “a) Vem o Recorrente Município de SJP, arguir a incompetência do tribunal em razão da matéria, mas falece de fundamento e razão, porquanto, b) nos termos do artigo 4.º, n.º 1, do ETAF, “Compete aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios que tenham nomeadamente por objecto: f) Questões relativas à interpretação, validade e execução de contratos de objecto passível de acto administrativo, de contratos específicos do respectivo regime substantivo, ou de contratos em que pelo menos uma das partes seja uma entidade pública ou um concessionário que actue no âmbito da concessão e que as partes tenham expressamente submetido a um regime substantivo de direito público”.

  1. Concluindo-se, assim, pela incompetência absoluta dos tribunais civis, por serem incompetente em razão da matéria para conhecer do presente litígio e por tal serem competentes os tribunais administrativos (Cfr. Artigo 96.º do CPC).

  2. Ora, nos termos e ao abrigo do artigo 37.º, n.º 2, alínea e), do Código de Processo nos Tribunais Administrativo, o tribunal competente, em razão da matéria, para conhecer do objecto da presente ação, é o tribunal Administrativo e não o fiscal.

  3. Sendo evidente a competência material do tribunal administrativo, deverá improceder o presente recurso.

  4. Sendo que, a relação jurídica administrativa é uma relação entre sujeitos de direito que atuem no exercício de poderes ou deveres públicos, conferidos por normas de Direito administrativo, normas estas que, num contexto de prossecução do interesse coletivo e ou de autoridade pública, organizam as entidades públicas, procedimentalizam a atividade respetiva, submetem a administração pública a deveres ou atribuem direitos aos particulares face à administração pública.

  5. Enquanto que, a relação jurídica fiscal é uma relação entre sujeitos de direito que atuem no exercício de poderes ou deveres públicos, conferidos por normas de Direito Tributário.

  6. Até, porque, a natureza da relação jurídica litigada numa acção administrativa resulta daquilo que se discute nos articulados e do pedido formulado.

  7. Se, com um único pedido de condenação no pagamento de faturas por prestação de serviços no quadro da execução de um contrato administrativo, os articulados da ação administrativa não discordam sobre a legalidade de um tributo incluído, por imposição legal, na fatura, mas discutem, sim, a legalidade daquela faturação dos serviços, não deve o tribunal administrativo cindir o pedido apresentado pelo autor j) e, por estar em causa entre as partes uma relação de contrato administrativo, o tribunal administrativo deve considerar-se com competência em razão da matéria. Como muito bem o fez, o tribunal a quo.

  8. É precisamente o que resulta do ETAF, do CPTA e da legislação que regula a faturação pelos serviços prestados no âmbito do Sistema Multimunicipal de Abastecimento de Água e de Saneamento das Águas do Norte, para captação, tratamento e distribuição de água para consumo público e para recolha, tratamento e rejeição de efluentes dos municípios supra referidos, em 3. supra.

  9. Reitera-se, o litígio objeto dos autos não é relativo a uma questão fiscal, nem envolve diretamente a interpretação e aplicação de disposições de direito fiscal, ou que se situem no campo da atividade tributária, respeita antes ao pagamento de dívidas resultantes do não cumprimento pontual do contrato.

  10. Mais, a ação não tem por objeto um ato tributário ou o reconhecimento de um direito ou interesse legalmente protegido em matéria fiscal, mas a satisfação de um crédito emergente de um contrato administrativo.

  11. O contrato celebrado entre o Recorrente e a Recorrida, na medida em que se refere ao funcionamento de serviços públicos deve ter-se como administrativo, pelo que as relações emergentes desse contrato constituem relações jurídicas administrativas, cujos litígios delas resultantes devem ser dirimidas pelos Tribunais Administrativos.

  12. Sendo que, o que substantivamente está em causa, no caso concreto, é o pagamento de uma quantia correspondente aos Contratos assinados entre as partes, e aos serviços efetivamente prestados pela ora Recorrida, e não pagos pelo Recorrente.

  13. Mais, entre o Recorrente e a Recorrida não se estabeleceu, nem podia estabelecer-se, qualquer relação tributária, pois o que existe é uma relação de natureza administrativa emergente da outorga do contrato administrativo de fornecimento de água para o consumo humano.

  14. Na verdade, a Recorrida formulou pedido de condenação do Recorrente a pagar o valor devido no âmbito dos serviços prestados, e devidamente previstos nos Contratos celebrados entre as partes.

  15. Fundou a sua pretensão na celebração de um contrato de fornecimento entre as partes, através do qual a Recorrida se obrigou a fornecer água àquele município - em ''alta" - destinada ao subsequente abastecimento público - "em baixa" mediante o pagamento pelo Recorrente dos valores que se mostrassem devidos.

  16. Como facilmente se constata, a presente ação não tem por objeto um ato tributário ou o reconhecimento de um direito ou interesse legalmente protegido em matéria fiscal, mas a satisfação de um crédito emergente de um contrato administrativo, pelo que "(...) se o litígio está centrado no volume de água que a recorrida recebeu e não pagou e no volume de efluentes que entregou e não pagou, então o que está em causa é uma relação jurídica administrativa e não uma questão fiscal.” t) Mas não só, no contencioso administrativo vigora o princípio da suficiência da jurisdição...

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