Acórdão nº 00948/17.3BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 02 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelJoão Beato Oliveira Sousa
Data da Resolução02 de Março de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes da 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Norte:*RELATÓRIO VCII, Lda. veio interpor recurso da sentença pela qual o TAF de BRAGA julgou improcedente a presente acção cautelar e, em consequência, recusou a concessão da providência cautelar de suspensão de eficácia de acto administrativo requerida contra o Município de Viana do Castelo.

*Conclusões da Recorrente: CONCLUSÕES: 1.

O presente recurso assenta, por um lado, na errada aplicação do disposto no art. 118º nº 1 do CPTA e na incorreta apreciação da matéria de facto e do Direito aplicável.

  1. O Tribunal a quo fez uma errada aplicação do disposto no art. 118º nº 1 do CPTA, ao dispensar a produção de prova testemunhal porquanto estamos perante obras que, em teoria, podem ou não determinar a obrigação ou isenção de controlo prévio, assistindo à Recorrente o direito de oferecer a sua prova no sentido de demonstrar essa isenção e é o próprio Tribunal a quo que admite a necessidade de produção dessa prova, quando afirma "Mostra-se controvertido nos autos a natureza das obras levadas a cabo pela Requerente, o que parece carecer de produção de prova testemunhal e/ou pericial não se vislumbrando qualquer violação grosseira do disposto no art. 6º nº 1 ali. b) do RJUE." - veja-se pág. 17º, seu 1º parágrafo.

  2. O entendimento que as obras em causa não se integram no disposto no art. 6º nº 1 ali. b) do RJUE, mas antes no disposto no art. 4º nº 4 ali. c) do mesmo diploma, não tem acolhimento no RJUE.

  3. O art. 6º nº 1 ali. b) do RJUE não está condicionado na sua aplicação ao disposto no art. 4º, nº 4 ali. c), o que permite cabalmente concluir que só as obras de alteração no interior de edifícios ou suas frações que impliquem modificações na estrutura de estabilidade, das cérceas, da forma das fachadas e da forma dos telhados ou coberturas, é que estão sujeitas a comunicação prévia.

  4. O auto de embargo nada diz ou refere sobre as obras colidirem com a estrutura do prédio.

  5. O embargo foi efetuado no pressuposto das obras realizadas e a realizar e não versou sobre a utilização possível daqueles espaços, pelo que, a pronúncia quanto a esta temática pelo Julgador, extravasa claramente o objeto desta lide, centrada somente na tipificação das obras.

  6. Não se aceita a argumentação de que a unidade "F" tem um alvará de utilização para estabelecimento de restauração e bebidas, querendo daí subalternizar-se indevidamente a verdadeira licença de utilização do "Complexo Turístico de Viana", a já evidenciada com nº 372/2006, sendo apenas esta a definidora do uso possível dos espaços.

  7. Os licenciamentos específicos exigíveis para cada atividade ali desenvolvida, o que acontece no caso da restauração e bebidas, nos termos do Decreto Regulamentar 25/93 de 17.08 e do DL nº 234/2007 de 19.06 (Regime jurídico da instalação e a modificação de estabelecimentos de restauração ou de bebidas), antecessores do DL nº 48/2011 de 01.04, em nada se confundem com a licença de utilização emitida.

  8. O pedido de licença de utilização do "Complexo Turístico da Marina", datado de 01.09.2005, não pode servir para justificar o uso permitido por aquela licença de utilização, com o nº 372/2006.

  9. Ao Tribunal impõe-se o dever de observar o âmbito da própria licença admitida, por ser essa que concede o direito, e ela é clara como água ao só mencionar "Complexo Turístico da Marina", que só pode ter na sua essência a concessão outorgada, porque é daí que decorre o uso previsto e possível, centrado nas atividades de restauração e lazer.

  10. No procedimento administrativo não vigora o princípio do pedido qua tale e, observando-se o mesmo em pormenor, vê-se que é pedida licença para as partes comuns, enquanto que a licença de utilização emitida menciona 3.422,35m2 que mais não é do que a totalidade do empreendimento.

  11. É certo que, igualmente, nesse requerimento se fala em restauração e bebidas, mas o exercício dessa atividade não excluía o direito de utilizar, naquele ou noutro momento, o complexo para outras atividades compatíveis com as finalidades previstas no contrato de concessão, como de resto a licença, emitida dez meses depois do pedido, veio consagrar.

  12. Seria um contrassenso obter-se a exploração de algo para um determinado conjunto de fins (restauração e lazer) e depois (auto)restringir-se o uso para apenas uma dessas finalidades. Se assim fosse ou pudesse ser estar-se-ia a limitar e a restringir fortemente o nível de retorno do investimento realizado, decorrente das benfeitorias no complexo, no valor total de € 2.000.000,00 (dois milhões de euros), o que seria manifestamente descabido.

  13. Pelo exposto, considera-se que está preenchido o requisito do fumus boni iuris e os demais requisitos para o decretamento da providência cautelar requerida.

NESTES TERMOS, Deve o presente recurso ser considerado procedente e, em conformidade, ser a Douta Sentença proferida substituída por Douto Acórdão que decrete a providência cautelar requerida.

*Em contra alegação concluiu o Recorrido: CONCLUSÕES: I.

Salvo o devido respeito, a douta sentença recorrida não merece qualquer reparo porquanto não se encontra preenchido o requisito do fumus boni iuris; II.

Da leitura dos processos administrativos, de todos os documentos juntos aos autos, inclusivamente de todas as fotos juntas com os articulados correspondentes e da posição das partes, designadamente da ora requerente, resultam de forma clara, objectiva e inequívoca dois factos, a saber, a recorrente realizou obras na Unidade “F” do edifício do Complexo Turístico da Marina de Viana do Castelo, modificando as suas características físicas, designadamente, as suas divisões interiores e o edifício em causa localiza-se em área abrangida pelo Plano de Pormenor da frente Ribeirinha e Campo da Sra. da Agonia, aliás factos dados como provados nos itens 17 e 20 da douta sentença recorrida; III.

Partindo destes dois factos provados, o Tribunal a quo apenas tinha que subsumir os mesmos ao direito aplicável, o que fez, porquanto o Tribunal entendeu, como não poderia deixar de ser, que no caso concreto a modificação das características físicas de uma edificação ou sua fracção, designadamente das respectivas divisões interiores em área abrangida por plano de pormenor, constitui uma operação urbanística sujeita a procedimento de controlo prévio, no caso, a comunicação prévia, sendo aplicável as disposições conjugadas dos arts. 2.º/d) e 4.º/4/c) do RJUE; IV.

Não tem, por isso, qualquer relevância ou interesse a produção de prova testemunhal nos presentes autos, quando a matéria em causa se encontra provada documentalmente e resulta ainda da posição das partes nos autos, porquanto nunca a recorrente pôs sequer em causa os dois referidos factos; V.

A questão da integração das obras realizadas no âmbito do RJUE, ou seja, a questão de saber se a operação urbanística levada a cabo pela recorrente estava sujeita ou isenta de controlo prévio é uma questão jurídica, de direito, e como tal, não sujeita a produção de prova, a qual só pode recair sobre factos, sendo que, sobre estes a prova já foi produzida documentalmente de forma cabal; VI.

As obras que a recorrente está a executar na Unidade “F” do Complexo Turístico da Marina de Viana do Castelo estão sujeitas a comunicação prévia porquanto implicam demolição...

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