Acórdão nº 01418/15.0BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 16 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução16 de Março de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I- Relatório O Instituto da Segurança Social IP, no âmbito da Ação Administrativa Especial intentada por RMC, tendente, designadamente, à impugnação dos identificados atos que determinavam a necessidade de restituição de valores que lhe haviam sido atribuídos s título de prestações de desemprego (25.738,88€) inconformado com a Sentença proferida em 12 de maio de 2016, que julgou a Ação procedente, veio a apresentar Recurso Jurisdicional, em 15 de junho de 2016, no qual concluiu (Cfr. fls. 83 a 95 Procº físico): “

  1. Na sentença recorrida a Meritíssima Juíza do Tribunal “a quo” entende que o ato recorrido padece de vício de lei, pugna-se que a decisão recorrida o é no estrito cumprimento desta.

  2. Tal como consta na fundamentação de facto, parte IV da sentença recorrida: «após aprovação pelo Instituto de Emprego e Formação profissional do projeto para criação do próprio emprego apresentado pela Autora, em janeiro de 2010, o Instituto da Segurança Social concedeu-lhe as prestações correspondentes ao subsídio de desemprego, num montante único.».

  3. O projeto da Autora teve início em 11.06.2010 com vista à exploração de estabelecimento comercial, FSJ, sob forma de empresária em nome individual, trabalhadora independente para efeitos do regime de proteção social, D) Em 01 de agosto de 2011 a Autora constitui a sociedade por quotas RMC & Filhos, Lda., com vista ao comércio de medicamentos não sujeitos a receita médica, pelo que foi efetuada a análise ao processo com a prolação de sentido de decisão de restituição do valor que lhe foi pago a título de montante global das prestações de desemprego, de: €25.738,88 (vinte e cinco mil, setecentos e trinta e oito euros e oitenta e oito cêntimos), com o fundamento «no incumprimento injustificado do projeto de criação do próprio emprego antes do decurso de 3 anos nos termos do n.º 1 e alínea b) do n.º 9 do art. 12º da Portaria 985/2009, de 04 de setembro, e Despacho n.º 7131/2011, de 11 de maio, considerando que o posto de trabalho a criar pelo promotor tem que ser obrigatoriamente a tempo inteiro e mantido no prazo mínimo de 3 anos».

  4. Aquela decisão é também fundamentada no n.º 3 do art. 34º do Decreto-lei n.º 220/2006, de 3 de novembro, na redação que lhe foi conferida pelo Decreto-lei n.º 64/2012, de 15 de março, considerando que nas situações de criação do próprio emprego com recurso ao montante global das prestações de desemprego os beneficiários não podem acumular o exercício desta atividade com outra normalmente remunerada durante o período em que são obrigados a manter o posto de trabalho criado, norma aplicável às relações prestacionais constituídas ao abrigo da legislação anterior conforme determinado pelo próprio diploma legal no artigo 7º do Decreto-lei n.º 64/2012, de 15 de março, relativo à produção de efeitos.

  5. Na aplicação do direito ao caso sob análise entendeu a Meríssima Juíza do Tribunal “a quo” entendeu que: «Ora, o que resulta dos factos assentes, é que a Autora iniciou a execução do projeto aprovado em 01.06.2010, tendo permanecido em atividade durante os três anos que a lei impõe. Ainda que se considere que cessou a atividade em 17 de julho de 2014, o que, no entanto não se apurou, a realidade é que nessa data já os 3 anos haviam decorrido. Assim, do analisado resulta que a Autora se manteve no ativo durante os 3 anos posteriores ao início da execução do projeto, conforme a Portaria n.º 985/2009, prevê no seu artigo 12º n.º 9 al. b), não se verificando o vício da violação de lei.».

  6. Discorda-se neste ponto, constando no processo administrativo a impressão dos dados do sistema de segurança social com a cessação da atividade da interessada, de trabalhadora independente, informação obtida por cruzamento de dados com a administração fiscal, e como previsto legalmente, veja-se p. 1 e 3 do processo administrativo.

  7. E, tal como consta na fundamentação do ato recorrido, é invocado o art. 12º, no seu n.º 1 e alínea b) do n.º 9 do art. 12º da Portaria n.º 985/2009, de 4 de Setembro, prevendo o n.º 1 que: há lugar ao pagamento, por uma só vez, do montante global das prestações de desemprego, deduzido das importâncias eventualmente já recebidas, ao abrigo do previsto no artigo 34.º do Decreto -Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro, sempre que o beneficiário das prestações de desemprego apresente um projeto ao abrigo da alínea b) do n.º 2 do artigo 1.º e que origine, pelo menos, a criação de emprego, a tempo inteiro, do promotor destinatário.

  8. Foi sempre, a este propósito, requisito legal a criação de emprego a tempo inteiro, como exigência para a concessão daquele apoio, e só assim se explica a concessão do mesmo apoio, que visa especificamente esse fim: a criação de um emprego, trabalho, a tempo inteiro de, pelo menos, do promotor.

  9. Sendo como tal requisitos legais a viabilidade económico-financeira do projeto, n.º 4 do art. 6º da Portaria n.º 985/2009, de 4 de setembro, a criação de emprego a tempo inteiro do promotor, prevendo-se a possibilidade de existir apoio técnico ao mesmo no art. 11º da Portaria n.º 985/2009, de 4 de setembro, e as obrigações de manutenção da atividade da empresa, al. a) do n.º 1 do art. 15º da Portaria n.º 985/2009, de 4 de setembro, e de assegurar todas as condições necessárias ao acompanhamento e verificação da sua atividade, a realizar pelas entidades credenciadas, n.º 2 do art. 15º da Portaria n.º 985/2009, de 4 de setembro, com o fim de garantir que se está perante um projeto sólido que se implemente no seu respetivo mercado, a fim de assegurar o emprego criado, escopo da sua concessão.

  10. Face à constatação de criação de nova atividade normalmente remunerada, atividade profissional usual: como trabalhador por contra de outrem, membro de órgão estatutário, o Instituto da Segurança Social, ainda antes da prolação do art. 34º na redação que lhe foi conferida pelo Decreto-lei n.º 64/2012, de 15 de março, reanalisava o processo nos moldes em que o fez no presente caso, considerando que a citada norma legal, art. 12º da Portaria n.º 985/2009, de 4 de setembro, exigia a criação de emprego a tempo inteiro, pelo período de três anos, L) Entendendo-se que: sempre que um interessado, dentro do período dos 3 anos, definido legalmente, deixava de se dedicar a tempo inteiro à atividade proposta, e financiada através da concessão daquele incentivo, entrava em incumprimento injustificado.

  11. Refira-se a este propósito o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, 00129/11.0BEAVR, da 1ª Secção - Contencioso Administrativo, datado de: 10 de outubro de 2014, e em que foi Relator: Frederico Macedo Branco, que sobre a então Portaria nº 196-A/2001, de 10 de março, que no seu sumário dispõe: «Tendo-se um trabalhador vinculado ao cumprimento da legislação aplicável, ao abrigo da qual lhe foi deferida a concessão da totalidade do subsídio de desemprego - Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de Novembro regulamentado pela Portaria n.º 196-A/2001 de 10 de Março (com as alterações efetuadas pela Portaria n.º 255/2002 de 12 de Março -, e o Despacho n.º 21094 de 10 de Outubro, não poderá exercer qualquer atividade remunerada, que durante o período em questão, em termos análogos, determinasse a perda das prestações do subsidio de desemprego.».

  12. No caso sob apreço, verifica-se que a promotora apresentou projeto a levar a cabo pela mesma em nome individual, exploração do estabelecimento de FSJ, e inicia atividade enquanto membro de órgão estatutário, gerente de uma sociedade comercial que constitui com os seus filhos, atividade remunerada, e que exige o seu empenhamento e acompanhamento diário com vista à efetiva implementação no mercado concorrencial deste novo ente societário, O) O que não poderia fazer porquanto: conflituaria com os deveres gerais do regime de proteção do desemprego, porquanto, e como referido no douto Acórdão, não poderia durante aquele período, fazê-lo ao abrigo do regime legal de desemprego: não podendo cumular a sua atividade com uma atividade normalmente remunerada, nos termos do n.º 3 art. 60º do Decreto-lei n.º 220/2002, de 3 de novembro, na redação que lhe foi conferida pelo Decreto-lei n.º 72/2010, de 18 de junho: as prestações de desemprego apenas são cumuláveis com rendimentos de trabalho independente ou por conta de outrem nos termos previstos no presente decreto-lei. 4 - Durante o período de concessão das prestações de desemprego é proibida a sua acumulação com rendimentos provenientes do exercício de trabalho, ou atividade, a qualquer título, em empresa com a qual o beneficiário manteve uma relação laboral cuja cessação tenha dado origem ao reconhecimento do direito àquelas prestações, ou em empresa ou grupo empresarial que tenha uma relação de domínio ou de grupo com aquela.

  13. Prevendo o n.º 2 do art. 64º daquele diploma legal, Decreto-lei n.º 220/2006, de 3 de novembro, que: «constitui contraordenação punível com coima de € 250 a € 1000 o exercício de atividade normalmente remunerada durante o período de concessão das prestações de desemprego, ainda que não se prove o pagamento de retribuição, sem prejuízo das situações admitidas nos termos do presente decreto-lei.» Q) Assim, a interpretação dada na sentença recorrida ao ignorar os antecedentes deste regime e todo o regime legal de proteção no desemprego, não fazendo uma interpretação sistemática daquelas normas: art. 12º, n.º 1, e n. 12, al. b), da Portaria n.º 985/2009, de 4 de setembro, conjugada com o art. 34º n.º 3, para além de ignorar a letra da lei, e o expressamente disposto na norma relativa à produção de efeitos, art. 7º do Decreto-lei n.º 64/2012, de 15 de março.

  14. Atento o enquadramento, entende-se o porquê de o legislador expressamente referir que aquela alteração legal se aplica às relações jurídicas prestacionais constituídas ao abrigo da legislação anterior, no artº 7º do Decreto-Lei nº 64/2012, de 15 de março, norma relativa à “produção de...

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