Acórdão nº 02824/12.7BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 16 de Fevereiro de 2018
Magistrado Responsável | Alexandra Alendouro |
Data da Resolução | 16 de Fevereiro de 2018 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:*I – RELATÓRIO RHCV, Advogado, interpôs recurso jurisdicional do Acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Porto que julgou improcedente a acção administrativa especial proposta contra a ORDEM DOS ADVOGADOS, na qual peticionou a anulação de deliberação disciplinar que o condenou na pena de multa de € 750,00.
*Em alegações, o Recorrente apresentou as seguintes CONCLUSÕES: “
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O prazo de prescrição de procedimento disciplinar, começa com a prática do acto e decorre até à decisão definitiva, transitada em julgado.
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O poder disciplinar não se esgota na decisão administrativa que promove a instauração do procedimento, quando da decisão seja admitido recurso para o tribunal.
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Só com o trânsito em julgado da decisão judicial que aprecie a aplicação de pena em processo Administrativo é que termina o poder Sancionatório.
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Tendo decorrido o prazo de prescrição do procedimento no âmbito do processo judicial deve a prescrição ser aí declarada, porquanto o prazo de suspensão de anos iniciado em 26/02/2005 terminou em 27/08/2014.
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Os autos de processo disciplinar foram redistribuídos por cessação funções do Relator.
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Tendo o Relator nomeado proferido despacho a determinar a audição de testemunhas, apreciou, implicitamente, os pressupostos e fundamentos da acusação designadamente quanto à sua competência.
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Esse despacho firmou-se na ordem jurídica porquanto não houve recurso ou reclamação.
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Transitou em julgado. Após esse julgado, não poderia o Sr. Relator seguida, invocar impedimento que antes não invocara.
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Trata-se de oposição de despachos, devendo prevalecer o transitado em primeiro lugar.
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Tendo transitado o primeiro despacho em que se declarou competente e emitido no mesmo processo decisão em que se declara incompetente (escusa) a decisão em causa viola a norma do artigo 625º do CPC e o princípio do juiz natural consagrado no artigo 32º nº 9 da Constituição.
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Na fixação da pena em processo disciplinar, devem ser respeitadas as regras do código penal e de processo penal, designadamente a de fazer a distinção entre penas leves e graves; a intensidade do dolo ou negligência, as atenuantes de o acto ter sido praticado por motivos honrosos.
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O Relator que propôs a pena não aludiu a nenhuma dessas circunstâncias.
Pelo que se cometeu nulidade.
Em face do exposto, a decisão judicial deveria ter considerado a prescrição do procedimento no decurso da acção; bem como a nulidade insuprível praticado no procedimento disciplinar por violação de caso julgado e afastamento do "juiz natural" da causa.
Normas Jurídicas Violadas: artigo 9º do Código Civil, artigo 625º do CPC; artigo 70º, 71º e 72º n.º 2 b) do Código Penal e 112º n.º 4 do EOA.”.
*A Recorrida contra-alegou, concluindo da seguinte forma: A.
O procedimento disciplinar termina com a prolação de Acórdão pelo Conselho de Deontologia competente ou, no caso de haver recurso, com a prolação de decisão final, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 155.º, 156.º, 161.º e 167.º, todos do EOA.
B.
A prescrição do procedimento disciplinar teria lugar após decorridos nove anos e meio desde o momento da prática da infração, sendo a infração datada de 26 de Fevereiro de 2005, a prescrição do processo disciplinar ocorreria no dia 27 de Agosto de 2014, o que, à data da prolação do acórdão suspendendo, ainda não havia sucedido; C.
Pelo que, não se verifica a alegada prescrição do procedimento disciplinar; D.
O Recorrente e o Relator nomeado eram ambos intervenientes em ação judicial pendente à data dos factos, pelo que, aplica-se supletivamente o regime da suspeição do instrutor disposto no artigo 209.º, n.º 1, alínea c), da Lei n.º 35/2014, de 20 de Junho; E.
Existindo, assim, fundamento sério e válido para a escusa e o deferimento da mesma, não se verificando a nulidade invocada; F.
No acórdão do conselho superior da Recorrida são descritos todos os factos relevantes para a determinação da medida da pena, ou seja, os factos abrangidos pela infração e os factos abrangidos pelas circunstâncias atenuantes e, ainda, a referência à ausência de circunstâncias agravantes; G.
A medida de pena foi corretamente aplicada e encontra-se devidamente fundamentada, não se verificando, por isso, qualquer nulidade por violação dos artigos 110.º e 126.º, n.º 4, do EOA; H.
Pelo que, a decisão proferida pelo conselho superior da ordem dos advogados não merece qualquer censura, devendo, em consequência, a pretensão do Recorrente ser desestimada de essência.”.
*O Ministério Público foi notificado ao abrigo do disposto no artigo 146º, nº 1, do CPTA.
*II – DAS QUESTÕES A DECIDIR De acordo com as conclusões das alegações extraídas da respectiva motivação – artigos 5.º, 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 3, 4 e 5 e 639.º do CPC ex vi artigos 1.º e 140.º do CPTA – as questões a decidir resumem-se a aferir se a decisão recorrida padece das nulidades previstas no artigo 615.º n.º 1, alíneas b) e d) do CPC e de erro de julgamento por errada interpretação e aplicação do direito ao caso concreto, em violação dos artigos 9º do CC, 625º do CPC; 70º, 71º e 72º n.º 2 b) do CP e 112º n.º 4 do EOA.
Cumpre apreciar e decidir.
*III – FUNDAMENTAÇÃO 1 – DE FACTO Com interesse para a decisão, a sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:
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O Conselho de Deontologia do Porto da Ordem dos Advogados instaurou ao Autor processo disciplinar decorrente de participação efectuada por colega, segundo a qual o Autor teria, enquanto Advogado subscritor de contestação deduzida em processo cível no dia 26 de Fevereiro de 2005, violado dever profissional, por levar a juízo negociação que havia sido tratada pelos mandatários forenses.
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No dia 19/12/2007 o Autor foi notificado da Acusação, apresentando Defesa escrita em 18/01/2008, na qual defendeu a absolvição da infração, indicou prova documental e arrolou testemunhas aos pontos 20 a 22 da Defesa, os quais referem: «20.
O Arguido sempre pugnou pela defesa dos mais elementares e basilares princípios deontológicos, nunca lhe tendo sido aplicado qualquer sanção por violação dos deveres aqui em causa.
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Antes, sempre se pautou pela cordialidade, honestidade, probidade, rectidão, lealdade e cortesia quer com outros Colegas, quer com os demais intervenientes neste “mundo” que é o exercício da advocacia e dos tribunais.
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Sempre usando das “armas” processuais de que dispunha, sem recurso a quaisquer artifícios ou meios menos dignificantes.». (Vide fls. 33 a 35 verso, e 41 a 43 verso do processo disciplinar).
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Em 04/03/2011, o Relator nomeado pediu escusa com fundamento no facto de ter relações profissionais em processo judicial com o Arguido; pedido que foi deferido, sendo nomeado novo Relator (vide fls. 59 e 63 do Processo Disciplinar - PD).
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Em 15 de Abril de 2011, o Conselho de Deontologia do Porto da Ordem dos Advogados, deliberou punir o Arguido com a multa de € 750,00, louvando-se no parecer do Relator, o qual continha o seguinte teor: «Queixas recíprocas entre os Srs. Advogados participante e participado chegaram aos serviços. Desistências recíprocas também chegaram.
Validada a desistência do Sr. Advogado participado, e desconsiderada a desistência da Sr ª. Advogada participante.
Em sede de processo disciplinar foi deduzida acusação por estes factos: 1. O Sr. Advogado arguido, enquanto mandatário dos Réus no processo nº 159/05.0TVPRT que correu termos na 4ª Vara Cível do Porto, subscreveu e apresentou Contestação da qual consta: Art. 40º - " Apesar do incumprimento por banda do A, os RR. estavam na disposição de lhe restituir o sinal entregue" Art.
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- "Restituição que o A não aceitou" Art.
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- "E que apenas aceitaria a restituição do sinal em dobro sob pena de accionamento judicial." Art.
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- "Os RR., porém como modo de evitar demandas - com os inerentes inconvenientes e incómodos, baseados no velho refrão cigano «que tenhas uma demanda, ainda que la ganhes...» acabaram por aceitar entregar o sinal em dobro." Art.
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- "É então, que o A apercebendo-se da susceptibilidade da família BC; já não aceitou a restituição do sinal em dobro. " Art.
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- "Apesar de tratado e acordado pelos mandatários aqui signatários. " 2. O Advogado invoca assim, uma negociação com vista a acordo que teve lugar entre este e a mandatária da parte contrária.
4 Os factos da acusação consideram-se provados documentalmente.
Em defesa à acusação, o Sr. Advogado participado: 1. Confirmou ter formulado aquela contestação.
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Disse que a Srª. Advogada participante violou os termos do acordo antes estabelecido.
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Razão única que o levou a invocar a factualidade na contestação.
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Em face da conduta desleal da contraparte considera que usou os meios de que dispunha para defender os interesses dos constituintes.
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Defende que os factos invocados não são sigilosos, pois que são o reflexo dos direitos que os AA se arrogaram na acção.
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Deveria ter sido ponderada a desistência apresentada.
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Sempre respeitou os deveres deontológicos.
Juntou documentos e arrolou testemunhas.
A testemunha Sr. Juiz Desembargador MPS declarou por escrito nada saber.
A testemunha Sr. Juiz Conselheiro MJSS declarou por escrito declarou nada saber dos factos em apreço; seguindo com elogios à postura profissional do Sr. Advogado participado.
A testemunha Srª. Dr.ª. CCM, negou ter ocorrido um acordo, antes desenvolve informação sobre a inexistência de conclusão positiva das negociações.
A testemunha Sr. Dr. ALM não pode ser inquirida, por não comparecer.
Dos factos da defesa considera-se provado o nº 7, tanto que nada consta do registo disciplinar do Sr. Advogado participado.
Quanto aos demais dão-se como provados em sintonia com os factos da acusação, sendo desconsiderado tudo quanto surge como explicação ou consideração não factual.
Não existem mais meios de prova a produzir, tudo estando em condições de relato final.
O tema é importante: o segredo profissional.
A essencialidade do dever de sigilo...
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