Acórdão nº 00862/16.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 04 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelAlexandra Alendouro
Data da Resolução04 de Maio de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:*I – RELATÓRIO C.

interpõe recurso da decisão do TAF do Porto que julgou improcedente a acção administrativa especial por si proposta contra o FUNDO DE GARANTIA SALARIAL (FGS) tendente à condenação do FGS a proferir novo acto – em substituição do acto praticado pelo Presidente do Conselho de Gestão do FGS de indeferimento, ao abrigo do artigo 2.º n.º 8, do Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de Abril, por intempestividade, do requerimento que apresentou para pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho – deferindo o pedido.

*Em alegações, a Recorrente concluiu assim: 1.ª Antes do mais, cumpre referir que sobre exatamente a mesma questão de facto e de Direito, que a discutida nos presentes autos, o TAF do Porto foi chamado a pronunciar-se em 8 processos.

  1. Com efeito, trata-se de 8 trabalhadores que resolveram o contrato de trabalho com a sua ex-empregadora (C.) na mesma data e com os mesmos fundamentos (retribuições em atraso); que reclamaram os seus créditos, junto do Administrador Judicial Provisório; que intentaram a ação judicial no Tribunal do Trabalho de Valongo na mesma data; que viram essas ações judiciais serem procedentes por sentenças proferidas no âmbito desses autos de jurisdição do Trabalho; que, na mesma data, apresentaram junto do ora recorrido os seus requerimentos; e que, todos, viram indeferidos os seus requerimentos pelo ora recorrido.

  2. Por isso, pode dizer-se, com todo o rigor, que se tratam de factos em tudo iguais, sendo que as únicas diferenças que existem prendem-se única e simplesmente com o valor dos créditos reclamados, o que nenhuma influência têm na boa decisão da causa.

  3. Os 8 trabalhadores da insolvente C., porque viram os seus requerimentos para pagamento de créditos emergente dos contratos de trabalho, indeferidos pelo ora recorrido, intentaram as competentes ações administrativas no TAF do Porto.

  4. Nos processos 864/16.6BEPRT; 869/16.7BEPRT; 868/16.9BEPRT; 885/16.9BEPRT; 866/16.2BEPRT; 870/16.0BEPRT; 886/16.7BEPRT, as decisões dos M.º Juízes de Direito daquele Tribunal foram unanimes em condenar a Entidade Demanda (o ora recorrido) a pagar aos trabalhadores da insolvente os créditos por eles reclamados.

  5. Não obstante essas decisões, o certo é que o M.º Juiz a quo resolveu “inovar” e criar uma argumentação, com a qual discordámos em absoluto, como adiante demonstraremos.

  6. De facto, como vem sido defendido pelos trabalhadores que vêm os seus requerimentos indeferidos pelo FGS com a imutável e repetida decisão de que “O requerimento não foi apresentado no prazo de 1 ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho, nos termos do n.º 8 do Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de Abril”, a questão de pura e simplesmente aplicar a nova lei, com o único fito de ali se encontrar um aparente motivo de indeferimento, não é assim tão linear.

  7. É que, até à entrada em vigor do novo regime do FGS, continuava a ser aplicado o disposto nos artigos 316.º a 326.º da Lei n.º 35/2004, de 29-07, que, ao contrário do que dispõe o n.º 8 do art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de Abril, não estabelecia o prazo de um ano para apresentação do requerimento, contado desde a data da cessação do contrato de trabalho do requerente.

  8. Com efeito, o n.º 3 do art.º 319.º da Lei n.º 35/20015, de 29-07, estabelecia que o FGS apenas assegurava o pagamento dos créditos que lhe sejam reclamados até três meses antes da respetiva prescrição.

  9. Ora, considerando que o prazo de prescrição dos créditos laborais é de um ano a partir do dia seguinte aquele em cessou o contrato de trabalho e que a prescrição pode, nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 323.º do CC, ser interrompida pela citação judicial, importa ter presente que a ora recorrente intentou no Tribunal do Trabalho a competente ação judicial contra a sua ex-entidade empregadora, a prescrição se interrompeu em 09/12/2014.

  10. Lançando mão do disposto no n.º 1 do art.º 326.º do CC, vemos que o prazo de prescrição retoma a sua contagem a partir do trânsito em julgado da decisão que pôs termo ao processo.

  11. Sucede que, no caso concreto, e porque não ficou provado quando é que tal aconteceu, devemos socorrer-nos da data em que foi proferida sentença pelo Tribunal do Trabalho, isto é, 06/03/2015.

  12. Assim, recorrendo ao regime que vigorava nessa altura, a ora recorrente poderia ter apresentado o seu requerimento, junto do ora recorrido, até ao dia 06/12/2015.

  13. Pelo que, tendo ela apresentado o dito requerimento no dia 03/06/2015, forçoso será concluir que, à luz do regime imposto pela Lei n.º 35/2004, de 29-07, estava em prazo para solicitar o pagamento, como, de resto, o fez.

  14. Ora, e sendo certo que à luz do disposto no n.º 8 do art.º 2.º do novo regime do FGS, o requisito aí previsto não teria sido cumprido pelo ora recorrido, ou seja, entre a data que cessou o contrato de trabalho e a data em que o ele reclamou o pagamento dos seus créditos junto do ora recorrente, havia decorrido mais de um ano.

  15. Porém, a entrada em vigor de uma nova lei não provoca um corte radical na continuidade dos factos e situações que vinham projetando-se.

  16. Salvo o devido respeito, muito mal andou o Tribunal a quo ao considerar o prazo para requerer junto do FGS o pagamento dos créditos laborais, como sendo um prazo de caducidade.

  17. É que, não podemos olvidar que o verdadeiro direito de crédito do trabalhador sobre a insolvente deriva de um crédito laboral, crédito esse que prescreve no prazo de um ano a partir do dia seguinte aquele em cessou o contrato de trabalho.

  18. Esse, e só esse, é o único prazo que baliza o crédito dos trabalhadores sobre os seus ex-empregadores, não podendo, por isso, esse direito ficar quartado por um outro prazo (de caducidade, na tese do Tribunal a quo).

  19. Até porque, e ao contrário do que refere o Tribunal a quo, está em causa a subsistência de um direito substantivo e não um mero prazo impositivo para o exercício do direito de requerer o pagamento do crédito ao ora recorrido; veja-se que na grande maioria das insolvências o património das empresas é absolutamente inexistente.

  20. Ao decidir da forma que decidiu, o Tribunal a quo violou o disposto no art.º 390.º do Código do Trabalho e no art.º 316.º e seguintes da Lei n.º 35/2004, de 29/07; Lei n.º 110/2009, de 16 de setembro, alínea b) do n.º 4 do art.º 2.º do CIRS.

Termos em que deverão V. Exas. revogar a sentença proferida nos autos, e, substitui-la por Acórdão que julgue totalmente procedente o pedido contra o ora recorrido formulado (…)”* O Recorrido não contra-alegou.

*O Ministério Público, notificado nos termos e para os efeitos previstos no artigo 146º, nº 1, do CPTA, emitiu douto parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso.

**II – OBJECTO DO RECURSO: Apreciar e decidir as questões suscitadas, nos limites das conclusões das alegações de recurso – artigos 5.º, 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 3, 4 e 5 e 639.º do CPC/2013, ex vi artigos 1.º do CPTA/2004 – que se resumem ao erro de julgamento imputado à decisão recorrida por errada interpretação e aplicação do direito.

Cumpre decidir.

**III – FUNDAMENTAÇÃO A – DE FACTO O Tribunal a quo considerou provados...

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