Acórdão nº 00028/15.6BEPRT-A de Tribunal Central Administrativo Norte, 28 de Setembro de 2018

Magistrado ResponsávelJoão Beato Oliveira Sousa
Data da Resolução28 de Setembro de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes da 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Norte:*RELATÓRIO Águas G..., S.A., Ré na Ação Administrativa que lhe moveu ERF, inconformada com a decisão do Despacho Saneador proferida nestes autos, que julgou improcedente a exceção da incompetência do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, em razão da matéria, dela vem interpor RECURSO para este Tribunal Central Administrativo Norte.

*Conclusões da Recorrente: 1.ª A Recorrente celebrou com o Município G... um Contrato de Concessão de Exploração e Gestão dos Serviços Públicos Municipais de Abastecimento de Água e Saneamento no Município G... em que se obrigou a integrar, até ao termo do período de transição, os trabalhadores afetos aos SMAS e os trabalhadores da Câmara Municipal de G... que constem do anexo XVII e que solicitassem tal integração.

  1. A referida integração que poderia ser feita por diversas modalidades, podendo os trabalhadores optar, livre e pessoalmente, pela que entendessem, sendo a respetiva opção obrigatória para a concessionária.

  2. Ora o Recorrido optou pelo regime de requisição, sujeitando-se ao regime estabelecido na cláusula 22.ª do Contrato de Concessão (em conformidade com o disposto no Art.º 10.º do Decreto-Lei n.º 147/95 de 21 de junho e Art.º 16.º do Decreto-Lei n.º 379/93 de 5 de novembro) e podendo a todo o momento solicitar o regresso aos quadros de pessoal da Camara Municipal de G....

  3. Em 2008, este regime de requisição teve de passar a respeitar as normas previstas no novo diploma legal, que veio estabelecer os regimes de vinculação, de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas - Lei n.º 12-A/2008 de 27 de fevereiro (LVCR).

  4. Sendo que, por força de tal regime jurídico, aquele funcionário passou ope legis, a estar abrangido pelo regime da mobilidade geral em cedência de interesse público (vide Art.º 102.º, n.º 1 da Lei n.º 12-A/2008 de 27 de fevereiro) desde 1 de janeiro de 2009.

  5. Atualmente, aquela cedência de interesse público, está regulada na Lei n.º 35/2014 de 20 de Junho (LTFP), Art.º 241.º e 242.º, mantendo a mesma identidade substancial em matéria de suspensão do estatuto/vínculo de origem prevista na LVCR.

  6. Tal cedência de interesse público, determinou a suspensão do vínculo de origem, não obstante se manter o vínculo de emprego público entre o Recorrido e a Câmara Municipal de G....

  7. Entre o Recorrido e a Recorrente, surgiu um vínculo jurídico-funcional “híbrido”, sujeito ao regime jurídico aplicável ao cessionário - “regime jurídico-funcional de destino” - (de Direito Privado) e algumas matérias ao regime do cedente - “regime jurídico-funcional de origem” (de Direito Público, designadamente, contagem na antiguidade, sistema de proteção social).

  8. O Recorrido, não tem com a Recorrente uma relação jurídica de emprego público, gozando de um estatuto jurídico especial, pois apesar de estarem assegurados alguns direitos e regalias decorrentes do respetivo vínculo de origem, certo é que estão sob a autoridade e direção de uma entidade privada, excluída do setor de emprego público.

  9. Assim, à relação jurídico-funcional estabelecida entre a Recorrente e os trabalhadores em cedência de interesse público, aplicam-se as regras de direito laboral privado (vide Acórdão proferido pelo Tribunal Administrativo de Almada, no âmbito do Proc. n.º 1120/10.9BEALM).

  10. A disposição do Art.º 244.º, n.º 3 da LTFP, que consagrou uma exceção à regra da suspensão do vínculo de origem, não é aplicável aos trabalhadores que se encontram em regime de cedência de interesse público, desde logo porque a matéria dos autos não permite aferir a verificação da “transmissão de unidade económica” no âmbito da Concessão, sendo que a Recorrente teria muita matéria para elencar e provar em sentido contrário (ex. o objeto negocial dos SMAS e ADG não é o mesmo, os SMAS foram apenas extintos em 2006, os meios humanos e técnicos foram destruturados, a “clientela” é outra face aos novos investimentos e cobertura de serviço etc.).

  11. Admitindo-se, que se havia verificado transmissão de unidade económica, aquela disposição legal não tem aplicabilidade ao presente litígio, dado que o Recorrido permanece afeto ao quadro de pessoal da Câmara Municipal de G..., não se registando qualquer “…sucessão na posição jurídica de empregador público…” e “…porque o ato transmissivo teria ocorrido antes da entrada em vigor da LTFP” (vide Parecer Jurídico, “IV- Da inaplicabilidade ao trabalhador do Art.º 244.º, n.º 3, da LTFP”).

    E, mais se diga, que o escopo inerente a tal norma - proteção e garantia dos trabalhadores, foi assegurado no âmbito do Contrato de Concessão.

  12. Assim entende a aqui Recorrente, que com o Recorrido existe um vínculo de Direito Privado regulado pelo Código de Trabalho e, sendo a matéria atinente à remuneração do Recorrido, enquanto dirigente sindical, não é matéria que contende com o regime jurídico de origem, isto é Direito do Emprego Público, pelo que estamos perante uma relação laboral de Direito Privado, entre sujeitos de direito privado e de atos de gestão privada (não está em crise a apreciação da violação de vínculos resultantes do Direito Administrativo, nem o exercício de um poder jurídico-administrativo).

  13. Aliás, este foi o entendimento plasmado no Acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, cujas partes ativas são trabalhadores em cedência de interesse público da aqui Recorrente, Águas G... S.A., (vide Proc. N.º 2888/12.3BEPRT).

  14. O modo como o Recorrido estrutura a causa de pedir e formula o pedido, não vincula os Tribunais para determinar a jurisdição competente para apreciar o presente litígio.

  15. No presente litígio não está em causa apreciar as Vicissitudes na Relação de Trabalho Subordinada, a apreciação da violação de vínculos resultantes do direito administrativo, nem o exercício de um poder jurídico-administrativo.

  16. Citando o Sr. Prof. Dr. Pedro Madeira de Brito, nos pontos 14 e 15 das “Conclusões” do seu Parecer:“14.º Na questão em análise ambas as partes na ação são sujeitos de Direito privado, o pedido e a causa de pedir da ação decorrem de uma relação laboral de Direito privado e de atos de gestão privada do empregador cessionário, no exercício de poderes privados e praticados ao abrigo do Direito privado, os quais não possuem qualquer reflexo cedência de interesse público ou na relação jurídica de emprego público que, estando suspensa, subjaz à cedência de interesse público, inexistindo, portanto, qualquer conexão com a ordem jurídico pública, com o Direito Administrativo e com o interesse público que lhe está subjacente; 15.º No caso concreto, o litígio a dirimir não emerge de um vínculo de emprego público ou de uma relação jurídica administrativa ou sujeita à legislação referente ao emprego público, não estando portanto verificados os pressupostos dos artigos 212.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa, 1.º, n.º 1, e 4.º, a contrario sensu, do ETAF e 12.º da LTFP, verificando-se uma situação de incompetência material da jurisdição administrativa, não devendo assim os Tribunais Administrativos e Fiscais apreciar a ação em análise.” NESTES TERMOS, e nos mais de Direito doutamente supridos pelos Ex.mos Senhores Juízes Desembargadores, se requer se dignem julgar o presente Recurso procedente, por provado, revogando o douto Despacho Saneador proferido pelo digníssimo Tribunal de 1.ª instância, no que concerne à declarada competência material dos Tribunais Administrativos e Fiscais, com todas as consequências legais.

    *Conclusões do Recorrido 1 – A decisão proferida pelo tribunal não padece de qualquer vício que determine a revogação; 2 – O Recorrido, é funcionário da Câmara Municipal de G... desde 1986; 3 – Desde 30 de Outubro de 2001, o Recorrido encontra-se a exercer funções de Assistente Operacional na Recorrida, em regime de cedência de interesse público; 4 – A Recorrida é a concessionária responsável pela exploração do Sistema Municipal de Abastecimento de Água e Drenagem e Tratamento de Águas Residuais do concelho de G...; 5 – A relação material estabelecida nos presentes autos consiste no não pagamento, pela Recorrente ao Recorrido, das remunerações que são devidas ao Recorrido desde Junho de 2013 até à presente data; 6 – O pedido formulado pelo Recorrido passa pela condenação da Recorrente a pagar ao Recorrido as remunerações que lhe são devidas desde Junho de 2013 até à presente data, com os eventuais acréscimos devidos; 7 – Sendo o Recorrido funcionário da Câmara Municipal de G... a exercer funções de Assistente Operacional na Recorrida, em regime de cedência de interesse público, a relação material controvertida definida nos presentes autos não é jurídico-laboral privada, como defende erradamente a Recorrente, na medida em que o vínculo de emprego público do Recorrido se mantém; 8 – A relação material controvertida estabelecida nos presentes autos integra-se no disposto no artigo 4.º, n.º 1, alíneas d) e f), do ETAF, pelo que compete aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação do litígio; 9 – A Recorrente não coloca em causa o facto de o Recorrido ser funcionário da Câmara Municipal de G... (nem o poderia fazer); 10 – O parecer que a Recorrente encomendou para acompanhar o presente recurso também reconhece que o Recorrido se encontra vinculado à Câmara Municipal de G...; 11 – A argumentação aduzida no presente recurso nunca poderia colher, visto que não tem qualquer aplicação à relação jurídico-laboral estabelecida entre a Recorrente e o Recorrido; 12 – Foi clara a vontade do legislador de incluir as empresas concessionárias na jurisdição administrativa e fiscal sempre que se coloquem questões relativas à interpretação, validade e execução de contratos de objecto...

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