Acórdão nº 00109/06.7BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 08 de Outubro de 2010

Magistrado ResponsávelFrancisco António Pedrosa de Areal Rothes
Data da Resolução08 de Outubro de 2010
EmissorTribunal Central Administrativo Norte
  1. RELATÓRIO 1.1 A Administração tributária (AT), na sequência de uma visita de fiscalização à sociedade denominada “B…, Lda.” (adiante Contribuinte, Impugnante ou Recorrente) e considerando que esta, com referência ao exercício do ano de 2002, registou na sua contabilidade, como suporte documental de custos, facturas que não correspondiam a reais prestações de serviços, procedeu à pertinente correcção do lucro tributável declarado naquele exercício, o que deu origem à liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) e respectivos juros compensatórios.

1.2 A Contribuinte impugnou esta liquidação adicional, sendo que, pese embora a panóplia de vícios imputados àquele acto (() No cabeçalho da petição inicial diz que a impugnação judicial é deduzida «com base nos fundamentos de inexistência de factos tributários subjacentes à liquidação, imposto não devido, erro na determinação, qualificação e quantificação da matéria colectável por “correcções meramente aritméticas” e do imposto considerado em falta, vício de forma, preterição de formalidades legais, violação de lei, de vício de fundamentação e outras irregularidades referidas no Art.º 99º do CPPT».

), a alegação aduzida só suporta os vícios de preterição de formalidade legal e de violação de lei. Alegou, em síntese, o seguinte: · o procedimento de inspecção excedeu o prazo de seis meses previsto no art. 36.º do Regime Complementar do Procedimento da Inspecção Tributária (RCPIT), que não podia ser prorrogado por se tratar de inspecção de âmbito parcial, sendo que a audiência do sócio-gerente da Contribuinte ocorreu já depois de esgotado o prazo legal para a inspecção, o que constitui preterição de formalidade legal; · as facturas em causa titulam operações reais, nelas descritas, que foram emitidas na forma legal e pagas por cheque, sendo que a Contribuinte é de todo alheia ao eventual incumprimento por parte dos fornecedores das respectivas obrigações fiscais, não havendo motivo para desconsiderar a veracidade das mesmas, que se presume, sendo que a AT não logrou ilidir tal presunção; · a Contribuinte não foi notificada para exercer o direito de audiência prévia antes da liquidação, como o impunha o art. 60.º, n.º 1, alínea a), da Lei Geral Tributária (LGT).

Concluiu pedindo que seja anulada a liquidação adicional de IRC do ano de 2002.

1.3 A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela julgou a impugnação judicial improcedente. Para tanto e em síntese, considerou que · nenhuma relevância advém para o caso sub judice do facto de ter sido ultrapassado, como foi, o prazo da inspecção, pois esse excesso de duração da acção inspectiva apenas poderia relevar em sede de caducidade do direito à liquidação, por força da cessação do efeito suspensivo do respectivo prazo; · a AT apurou factos que constituem indícios sérios de que as facturas em causa não correspondem a serviços realmente prestados, motivo por que à Contribuinte competia demonstrar a realidade dessas operações; · a prova não permite que se dê como firmada a realidade das operações.

1.4 Inconformada com essa sentença, a Impugnante dela recorreu para este Tribunal Central Administrativo Norte e o recurso foi admitido, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo.

1.5 A Recorrente apresentou as alegações de recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor: «1. - A douta sentença padece de vícios e erros na apreciação dos pressupostos de facto, pois existem elementos probatórios que anula[m] a liquidação impugnada, tais como: 2. - Existe inutilidade superveniente da lide, face ao disposto no Art.º 36º do RCPIT; 3. - Pois, o procedimento de inspecção era de âmbito parcial e logo não podia ser prorrogado para além dos seis meses; 4. - Existe oposição entre os fundamentos e os factos dados como provados e o decidido na sentença – Art.º 125º do CPPT; 5. - O ónus da prova recai sempre sobre a Administração Tributária, cfr. Art.º 74º da LGT; 6. - Ficou demonstrado que as facturas emitidas pelos subempreiteiros não corresponderam a operações simuladas; 7. – Consequentemente, deve-se considerar como custos os montantes constantes nas facturas em causa.

Nestes termos: Deve a douta sentença recorrida ser e substituída por outra que aprecie os vícios e erros alegados, anulando-se a liquidação de IRC, Tributações Autónomas e Juros Compensatórios referentes ao exercício de 2002, para que assim se faça JUSTIÇA» (() As partes entre aspas e com um tipo de letra diferente, aqui como adiante, são transcrições.

).

1.6 A Fazenda Pública não contra alegou.

1.7 Recebidos os autos neste Tribunal Central Administrativo Norte, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso, com a seguinte fundamentação: «A violação do art. 36.º do RCPIT, que também foi avaliada pela sentença recorrida, não tem qualquer efeito invalidante da liquidação, nem a impugnante – quer na petição inicial, quer agora, em sede do presente recurso jurisdicional – alguma vez alegou qualquer fundamentação nesse sentido.

A oposição entre os fundamentos e os factos dados como provados, como causa da nulidade da sentença, consignada no art. 125.º do CPPT, não foi minimamente alegada, pelo que o tribunal “ad quem” dela não pode conhecer.

Finalmente, defenda a recorrente que o tribunal deveria anular a liquidação impugnada porque a AT não demonstrou estarem subjacentes às facturas, que contabilizou como custos, operações simuladas.

Ora, sobre essa questão, também se torna evidente que era a impugnante que tinha o ónus probatório da existência dos factos que alegou como fundamento do seu direito de ver tais montantes relevados negativamente no rendimento tributável, demonstrando que as facturas em causa correspondem a operações realmente efectuadas pela empresa que as emitiu e dos valores nela referidos, e, assim, comprovar os custos que contabilizou, e não o fez como ficou explícito no probatório, no seguinte excerto: “não se provou que as facturas em causa nos autos respeitem a serviços efectivamente prestados pelos respectivos emitentes”.

E se o Tribunal “a quo” errou no julgamento da matéria de facto, impunha-se que isso fosse alegado e demonstrado no presente recurso, mas não foi minimamente feito».

1.8 Foram colhidos os vistos dos Juízes adjuntos.

1.9 As questões suscitadas pela Recorrente são as de saber se a sentença recorrida: 1.ª - enferma de nulidade por oposição entre os fundamentos e a decisão (cf. conclusão 4); 2.ª - fez correcto julgamento ao considerar que o excesso do prazo legal para o procedimento de inspecção não tem efeito invalidante da liquidação que teve por base as conclusões a que chegou a AT na sequência dessa acção inspectiva (cf. conclusões 2 e 3); 3.ª - fez correcto julgamento, designadamente das regras da distribuição do ónus da prova, ao considerar legítima a actuação da AT, de desconsiderar na determinação da matéria tributável os custos que estavam suportados pelas facturas em causa e ao considerar que não ficou demonstrado que as facturas em causa titulem operações reais (cf. conclusões 5 a 7).

* * *2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO 2.1.1 Na sentença recorrida o julgamento da matéria de facto foi efectuado nos seguintes termos: «Com interesse para a decisão a proferir, considero provados os seguintes factos: 1) A escrita da impugnante foi objecto de uma acção inspectiva por parte dos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção Distrital de Finanças de Vila Real, destinada à verificação do cumprimento das obrigações tributárias em sede de IRC e IVA, abrangendo o exercício de 2002.

2) Em resultado da acção de fiscalização e por aplicação da avaliação directa, foi efectuada a liquidação n.º 2005 83101222874 de IRC referente ao exercício de 2002, no valor a pagar de € 66.977,90, sendo de IRC € 59.917,26, de Tributações Autónomas € 1.029,43 e de Juros Compensatórios € 6.031,21.

3) A acção de fiscalização iniciou-se no dia 07-03-2005 e terminou no dia 02-11-2005 – relatório da inspecção cujo teor dou aqui por reproduzido.

4) Por despacho de 23-08-25 do Director de Finanças de Vila Real, o prazo da conclusão do procedimento inspectivo foi ampliado por um período de três meses.

Factos não provados: não se provou que as facturas em causa nos autos respeitem a serviços efectivamente prestados pelos respectivos emitentes, como à frente se demonstrará».

2.1.2 Pese embora a Recorrente sustente que «Ficou demonstrado que as facturas emitidas pelos subempreiteiros não corresponderam a operações simuladas» (conclusão 6), não podemos considerar que tenha atacado o julgamento da matéria de facto nos termos que a lei impõe, designadamente, que tenha dado cumprimento ao disposto no art. 690.º-A, do Código de Processo Civil (CPC) (() Na redacção do Decreto-Lei n.º 183/2000, de 10 de Agosto, dizia o art. 690.º-A, do CPC, nos seus n.ºs 1 e 2: «1 - Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) Quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados...

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