Acórdão nº 01391/06.1BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 25 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelDrº Carlos Luís Medeiros de Carvalho
Data da Resolução25 de Março de 2010
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO “V…, SA”, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF do Porto, datada de 18.03.2008, que julgou improcedente a acção administrativa especial pela mesma deduzida contra o “MINISTÉRIO DA ECONOMIA E INOVAÇÃO” na qual aquela peticionava a anulação do despacho do Secretário de Estado do Turismo de 18.04.2006 que indeferiu recurso e manteve a decisão da IGJ n.º 93/05, de 25.11.2005, que lhe aplicou a multa de 2920,00 €.

Formula a recorrente nas respectivas alegações (cfr. fls. 236 e segs.

- paginação processo suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário), as seguintes conclusões que se reproduzem: “...

  1. O presente recurso jurisdicional vem interposto da douta sentença de fls. 223 a 232 que negou provimento à acção administrativa tendente à anulação do despacho de 18 de Abril de 2006 do Senhor Secretário de Estado do Turismo e da decisão nº 93/05 de 25 de Novembro da Inspecção-Geral de Jogos (IGJ) na parte em que aplicaram à Autora uma multa de € 2900,00 pela prática de 29 infracções administrativas por entrega das gratificações dos trabalhadores um dia depois do prazo devido.

  2. O Tribunal deu por provados os factos seguintes de fls. 224 e 225, os quais nenhuma censura merecem por parte da Recorrente.

  3. A sentença recorrida é nula porque o Tribunal deixou de pronunciar-se sobre questões que estava obrigado a apreciar, cfr. artigo 668.º, n.º 1, alínea d) do CPC aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA; ou, sem conceder, por omissão de qualquer fundamentação jurídica, fundamentação essa imposta pela alínea b), do n.º 1 do artigo 668.º do CPC.

  4. De acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 149.º do CPTA, “Ainda que declare nula a sentença, o tribunal de recurso não deixa de decidir o objecto da causa, conhecendo do facto e do direito”.

  5. De acordo com o Relatório da IGJ por 29 ocasiões, nos meses de Setembro, Outubro e Novembro de 2004, coincidindo sempre com as partidas de Sexta-feira, Sábado e véspera de feriado, “o depósito na conta da CDG de 88% das gratificações percebidas só foi efectuado no segundo dia útil seguinte ao da entrega na caixa compradora”.

  6. O n.º 7 da Portaria n.º 1159/90, de 27 de Novembro, na redacção da Portaria n.º 129/94, de 1 de Março, dispõe o seguinte: “No dia útil imediato ao da entrega referida no número anterior, a empresa concessionária procede ao depósito de 88% da importância das gratificações na conta bancária da CDG e dos restantes 12% em conta bancária do Fundo Especial de Segurança Social dos Profissionais de Banca dos Casinos”.

  7. Os montantes relativos às partidas de Sexta-feira, Sábado ou véspera de feriado terminam em dia não útil, pelo que só são entregues à empresa de transporte de valores no primeiro dia útil e acabam por ser depositados no dia útil seguinte.

  8. O princípio da proporcionalidade está previsto no n.º 2 do artigo 266.º da CRP e no n.º 2 do artigo 5.º do CPA, podendo dividir-se nas vertentes da adequação, necessidade e da proporcionalidade em sentido estrito.

  9. O cumprimento integral do princípio da proporcionalidade passa pela resposta afirmativa às seguintes premissas: a) Será exigível impor à Autora a obrigação de depósito das gratificações recebidas pelos funcionários na conta da CDG? b) Justificam-se os encargos que a Autora teria de suportar para depositar as gratificações no dia útil imediato ao fim da partida, quando esta termine em dia não útil, atento o fim de celeridade prosseguido por aquela norma? 10. Violou-se o princípio da proporcionalidade, na vertente da necessidade, na medida em que face à existência da CDG não se afigura necessário onerar a concessionária com as funções de depósito das gratificações, devendo caber-lhe somente funções informativas, nomeadamente relativas ao quadro de trabalhadores e suas ausências ao trabalho, como dispõem os n.ºs 25 e 26 da Portaria.

  10. O Tribunal está em erro quanto ao juízo comparativo a efectuar e a remissão para o acórdão n.º 365/2003 (que, a final, analisa a razoabilidade de uma taxa devida pelo uso privativo do domínio público) demonstra bem esse equívoco.

  11. No caso dos autos, a obrigação imposta pela Portaria exige da Autora encargos para proceder ao depósito das gratificações, sem que daí retire qualquer vantagem. Ora, se os encargos não têm uma contrapartida não poderá efectuar-se um juízo comparativo encargo/benefício! 13. Daí que seja despiciendo alegar o valor concreto dos custos necessários ao cumprimento da obrigação em dias úteis e em dias não úteis.

  12. Não poderá admitir-se que tal obrigação de depósito obrigue a encargos e procedimentos fora do comum e, como tal, desrazoáveis, uma vez que a concessionária nem tem qualquer benefício naquela obrigação de depósito.

  13. Os encargos e procedimentos fora do comum estão identificados nos autos como sendo a necessidade de ter a tesouraria central a funcionar a dias não úteis e a necessidade de contratar a empresa de segurança também em dias não úteis, o que consubstancia um serviço de excepção.

  14. De qualquer modo, a ter razão o Tribunal, o juízo comparativo relevante para os autos seria entre o benefício para os trabalhadores da antecipação em um dia do depósito das gratificações e o custo acrescido que tal prazo impõe à Autora.

  15. Ora, benefício financeiro dessa antecipação (a capitalização em um dia de um montante que ronda os mil euros?!) é muito inferior às despesas acrescidas que tal antecipação acarreta à Autora! 18. O prazo imposto à Autora afigura-se assim desrazoável, como se pode comprovar, comparativamente, por a CDG poder efectuar os depósitos até ao 3.º dia útil de cada mês; (artigo 20.º da Portaria).

  16. Nestes termos, o n.º 7 da Portaria é inconstitucional e ilegal por violação do princípio da proporcionalidade, também na vertente da proibição do excesso.

  17. A melhor interpretação do n.º 7 da Portaria obriga a que a exigência da entrega no dia útil seguinte tenha por pressuposto que a partida termine em dia útil.

  18. Interpretação que se mostra reforçada pelos termos da exposição de motivos da Portaria n.º 129/94: “De harmonia com o disposto nos n.ºs 7 e 17 do título I das referidas regras, as empresas concessionárias procedem, no dia útil imediato àquele em que lhes são entregues as gratificações apuradas, ao depósito destas em conta aberta em nome da respectiva comissão de distribuição de gratificações (CDG)”; (sublinhado nosso).

  19. Ora, o termo “àquele” diz respeito ao dia útil em que termina a partida.

  20. Os factos provados não configuram 29 infracções unitárias, mas sim uma infracção continuada, de acordo com a noção do n.º 2 do artigo 30.º do Código Penal.

  21. Segundo o n.º 1 do artigo 18.º do Regime Geral das Contra-Ordenações, “A determinação da medida da coima faz-se em função da gravidade da contra-ordenação, da culpa, da situação económica do agente e do benefício económico que este retirou da contra-ordenação”.

  22. A multa de € 100,00 seria ajustada se a IGJ tivesse concluído pela prática de uma infracção continuada, mas aplicar esse valor a cada uma das infracções afigura-se manifestamente desproporcional atentas as circunstâncias provadas.

  23. Os actos impugnados ao terem aplicado uma norma que viola o princípio da proporcionalidade, ou por não a terem interpretado convenientemente, estão inquinado por vício de violação de lei.

  24. De igual vício e de erro nos pressupostos de direito padecem os mesmos despachos na parte em que decide pela prática de 29 crimes unitários e ao graduar cada um deles com a multa de € 100,00.

  25. Ao não ter decido desta forma, a sentença recorrida errou na aplicação do direito …”.

    Termina pugnando pela procedência do recurso jurisdicional e da acção administrativa pela mesma movida.

    O R., ora recorrido, apresentou contra-alegações (cfr. fls. 304 e segs.

    ), concluindo da forma seguinte: “...

    1. O acto impugnado é legal, fundamentado e limitou-se a aplicar a legislação em vigor; II. Não colhem os alegados vícios do acto; III. In casu, não houve, nem poderia haver violação do princípio da proporcionalidade, dado que se tratou da aplicação de uma norma constante duma Portaria aplicável a todos os casinos; IV. Contrariamente ao alegado pela A. e como por ela extensamente explicado, a contrario, houve benefício no incumprimento; V. A graduação da multa parece-nos adequada e nunca poderia ser acolhida a tese da A., dado que por 29 infracções lhe foi aplicada uma multa com montante similar ou inferior ao máximo estipulado para uma infracção …”.

    Termina no sentido da improcedência do recurso e confirmação da decisão judicial recorrida.

    O Mm.º Juiz “a quo” sustentou a decisão no sentido de que a mesma não padecia de qualquer nulidade (cfr. fls. 310).

    O Ministério Público (MºPº) junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto no art. 146.º do CPTA veio apresentar parecer/pronúncia no sentido da total improcedência do recurso jurisdicional (cfr. fls. 318 e 319), parecer esse que objecto de contraditório não mereceu qualquer resposta (cfr. fls. 320 e segs.

    ).

    Colhidos os vistos legais juntos dos Exmos. Juízes-Adjuntos foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.

  26. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela recorrente, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 144.º e 146.º do CPTA, 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4 e 690.º todos do CPC “ex vi” arts. 01.º e 140.º do CPTA.

    As questões suscitadas resumem-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma, por um lado, de nulidades [art. 668.º, n.º 1 als. b) e d) do CPC] e, por outro, de erro de julgamento traduzido na incorrecta e ilegal aplicação do princípio da proporcionalidade e do disposto nos arts. 266.º, n.º 2 da CRP, 05.º, n.º 2 do CPA...

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