Acórdão nº 01183/07.4BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 27 de Maio de 2010
Magistrado Responsável | Francisco Rothes |
Data da Resolução | 27 de Maio de 2010 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
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RELATÓRIO 1.1 Num processo de execução fiscal instaurado contra Armindo Peixoto Alves (adiante Executado e Recorrente) e em que foi penhorado e vendido um bem imóvel, veio o “Banco Comercial Português, S.A.” (adiante Credor reclamante e Recorrente) pedir ao Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que declare «nula e de nenhum efeito a venda judicial» (() As partes entre aspas e com um tipo de letra diferente, aqui como adiante, são transcrições.
) com o fundamento de que não foi notificado da venda, como o impunha a sua qualidade de credor reclamante, atento o disposto nos arts. 886.º-A e 904.º, alínea a), do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi da alínea e) do art. 2.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).
1.2 O Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga julgou improcedente o incidente de anulação da venda, louvando-se, essencialmente, na doutrina do acórdão da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 28 de Março de 2007 (() Acórdão proferido no processo com o n.º 26/07, publicado no Apêndice ao Diário da República de 14 de Fevereiro de 2008 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2007/32210.pdf), págs. 697 a 702, com texto integral também disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/824594ba746469e5802572b9004bac84?OpenDocument.
). Considerou, em síntese, que a regulamentação da execução fiscal é feita exaustivamente no CPPT, inexistindo qualquer lacuna que justifique a aplicação supletiva do disposto nos arts. 886.º-A, n.º 1, e 904.º, alínea a), do CPC.
1.3 Recorreram dessa sentença para este Tribunal Central Administrativo Norte o credor reclamante “Banco Comercial Português, S.A.” e o Executado, sendo que ambos os recursos foram admitidos, para subirem imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
1.4 O Executado recorreu dessa sentença, apresentando as respectivas alegações, que resumiu em conclusões do seguinte teor: « I . Encontra-se assente e dado como provado que o Banco Comercial Português, S.A. reclamou os seus créditos no processo de execução fiscal n.º 0400200401021621 em que é executado o aqui recorrente.
II . No âmbito desse processo, foi determinada a venda por negociação particular de dois bens imóveis, um urbano e um rústico, sendo certo que sobre o primeiro o credor reclamante tinha sido graduado em segundo lugar, logo abaixo dos créditos referentes a Contribuição Autárquica.
III . O art.º 888.º-A n.º 4 do C.P.C. determina que o despacho que ordena a venda seja notificado ao exequente, ao aqui recorrente/executado e ao credor reclamante de créditos com garantia sobre os bens a vender.
IV . O credor reclamante não foi notificado previamente do despacho que determinou a venda por negociação particular nem ao despacho que nomeou o encarregado da venda e fixou o preço mínimo da mesma, tal como resulta dos factos provados.
V . Dispõe o artigo 201.º do C.P.C que as irregularidades cometidas só podem levar à anulação da venda quando forem consideradas susceptíveis de influenciar a venda e a omissão verificada influencia, sem qualquer dúvida, a venda.
VI . Os bens foram vendidos a um preço muito inferior ao seu valor real e abaixo do valor reclamado pelo credor com garantia real (hipoteca).
VII . A omissão impossibilitou que o credor reclamante pudesse obstar a venda por tão baixo preço, prejudicando séria e gravemente os interesses do aqui recorrente, mas também do credor reclamante e da própria Fazenda Pública, que deveria ter arrecadado pelo menos quatro vezes mais do que efectivamente arrecadou, atento o valor venal dos bens.
VIII . Aliás, é facto notório e não carece de alegação (art.º 264.º n.º 2 e 514.º, ambos do C.P.C.), que a omissão da notificação do credor reclamante do despacho que ordene a venda por negociação particular pode influenciar essa venda, como também é notório que prejudicou seriamente os interesses de todas as partes, incluindo o erário público.
IX . O art.º 886.º-A n.º 4 do C.P.C. é de aplicação subsidiária ao C.P.P.T., uma vez que neste inexiste lei que regule especialmente a situação em crise, sendo corolário lógico do disposto nos artigos 20.º n.º 2 e 268.º n.º 3, ambos da C.R.P..
X . A omissão da notificação daquele despacho ao credor reclamante de crédito com garantia real sobre os bens a vender, constitui nulidade processual que justifica a anulação da venda.
XI . Também a omissão de avaliação do prédio urbano nos termos do disposto no art.º 250.º do C.P.P.T. constitui irregularidade susceptível de influenciar a venda, tendo permitido a venda por valor muito inferior ao real, devendo ser sancionada com a nulidade de todos os actos praticados a partir dessa omissão.
XII . Ao pronunciar-se pela improcedência do pedido de anulação da venda, como pretendido pelo credor reclamante, o tribunal a quo interpretou e aplicou erradamente os diversos preceitos legais supra referidos, violando assim, o disposto nos artigos 201.º, 229.º, 886.º-A n.º 4 e 909.ºn.º 1 al. c), todos do Código de Processo Civil, com referência ao artigo 2.º ai. e), 250.º e 257.º, ambos do Código de Procedimento e de Processo Tributário, bem como os artigos 20.º n.º 2 e 268.º n.º 3 da Constituição da República Portuguesa.
Termos em que deve dar-se provimento ao presente recurso e, em consequência, ser a douta sentença recorrida revogada e substituída por outra que julgue a nula a venda efectuada bem como todos os actos processuais subsequentes.
Assim, Senhores Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo do Norte, farão Vossas Excelências, como sempre, serena e objectiva JUSTIÇA».
1.5 O credor “Banco Comercial Português, S.A.” apresentou a motivação do seu recurso, que sintetizou em conclusões do seguinte teor: « I. A aliás douta decisão recorrida não deve manter-se pois não consagra a justa e correcta aplicação das normas legais e dos princípios jurídicos aplicáveis; II. O Recorrente impugna a decisão da matéria de facto, principalmente com fundamento na sua insuficiência, uma vez que há factos que deveriam ter sido considerados como provados e que são relevantes para a boa decisão da causa nomeadamente para prova de que a alegada irregularidade cometida (não notificação do Banco Recorrente) influiu no exame ou na decisão da causa.
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Assim, face à documentação junta a fls. dos autos em apreço, deveria ter sido considerado como provado, em complemento da aliena e) dos factos provados que foi atribuído o valor de 140.000 € para a venda do referido imóvel penhorado, tendo sido determinado que o referido bem ia à venda por 70% do referido valor, ou seja, por 98.000 €.
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Deveria constar no ponto f) qual o valor mínimo que foi fixado em 27/02/2006 para a venda por negociação particular.
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Deveria ter sido considerado como provado, em complemento do que foi considerado provado na alínea K), que o Recorrente não só não foi notificado previamente aos despachos (ou seja não houve a sua audição prévia) a que se alude nesta alínea, como, mais importante ainda, não foi notificado desses despachos que determinaram a venda por negociação particular do imóvel; VI. Com efeito, deveria ter sido considerado como provado que o Banco Reclamante/Recorrente não foi notificado do despacho que determinou a venda por negociação particular, do valor mínimo fixado e do encarregado nomeado para essa venda e, bem assim, do despacho que aceitou a proposta obtida de 42.000 €; VII. De resto, deveria, ainda, ter sido considerado como provado que o Banco não foi notificado da proposta obtida de 42.000 € e do termo de adjudicação a que se alude nos pontos g) e i) da matéria considerada como provada.
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Por último, resta referir que o requerimento de anulação da venda foi apresentado em 12/09/2007, via fax e correio registado, e não em 13/09/2007 como se refere no ponto l) da mencionada matéria de facto provada.
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Assim sendo, entende o Recorrente, que foram incorrectamente julgados ou que impõem uma decisão diversa da considerada na douta decisão recorrida, os factos constantes das alíneas e), f), g), i) e k) da matéria de facto considerada como provada.
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Os meios probatórios que impunham uma decisão diversa da sentença recorrida sobre tais factos são o ofício n.º 3954 junto com o requerimento de anulação de venda sob o doc. n.º 1 e a restante documentação junta aos autos de execução fiscal em apreço; XI. Contrariamente ao considerado pelo Tribunal “a quo”, o problema em discussão no caso em apreço não é “saber se a imposição legal de audição do credor reclamante previamente ao despacho que ordena a venda decorrente da citada norma do art. 886-A do CPC é aplicável em execução fiscal”.
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Com efeito, a questão a dirimir no caso “sub judice” é a seguinte: integra nulidade susceptível de determinar a anulação do processado posterior, incluindo, assim, a venda realizada, a omissão de notificação ao credor reclamante do despacho que determinou a venda por negociação particular do imóvel penhorado (conforme dispõe o artigo 886-A, n.º 4 do CPC, aplicável por força da remissão prevista no art. 2.º alínea e) do CPPT)? XIII. A verdade é que o CPPT não se pronuncia sobre a necessidade ou não do credor com garantia real ser notificado do despacho que determinou a venda (seja qual for a modalidade de venda ou valor mínimo que tenham sido fixados), nos seus artigos 248.º a 258.º.
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Com efeito, o CPPT apenas refere que quando a venda se processe por meio de propostas em carta fechada, assiste ao credor reclamante, citado nos termos do 239.º do CPPT, o direito de assistir à abertura de propostas (cfr. art. 253.º do CPPT e que lhe assiste, igualmente, o direito de apresentar proposta de aquisição (qualquer que seja a modalidade da venda) embora não esteja dispensado do depósito do preço – cfr. art. 256.º, alínea h) do CPPT.
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Os credores reclamantes com garantia real gozam, na fase da venda, de uma posição processual quase paralela à do exequente, sendo titulares de um interesse jurídico idêntico...
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