Acórdão nº 01811/09.7BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 23 de Setembro de 2010

Magistrado ResponsávelFrancisco António Pedrosa de Areal Rothes
Data da Resolução23 de Setembro de 2010
EmissorTribunal Central Administrativo Norte
  1. RELATÓRIO 1.1 A Administração tributária (AT), tendo verificado que E… (adiante Contribuinte ou Recorrente) no ano de 2006 efectuou suprimentos de valor superior a € 50.000,00 a uma sociedade de que é sócio, que revelam uma divergência não justificada superior a 50% relativamente aos rendimentos declarados para efeitos de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) relativamente àquele ano, entendeu proceder à correcção do rendimento colectável declarado com recurso ao método indirecto ao abrigo do disposto nos arts. 87.º, alínea d), e 89.º-A, da Lei Geral Tributária (LGT) (() Aqui como adiante, a redacção da LGT a que no referimos é a que estava em vigor à data dos factos, ou seja, a da Lei n.º 55-B/2004, de 30 de Dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2005).

    ).

    1.2 O Contribuinte recorreu judicialmente do acto de alteração dos rendimentos colectáveis declarados, nos termos do disposto no art. 146.º-B do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), aplicável ex vi dos n.ºs 7 e 8 do art. 89.º-A da LGT (() Dizem os n.ºs 7 e 8 do art. 89.º-A da LGT, na redacção da Lei n.º 55-B/2004, de 30 de Dezembro (antes eram os n.ºs 6 e 7, do mesmo artigo): «7 - Da decisão de avaliação da matéria colectável pelo método indirecto constante deste artigo cabe recurso para o tribunal tributário, com efeito suspensivo, a tramitar como processo urgente, não sendo aplicável o procedimento constante do artigo 91.º e seguintes.

    8 - Ao recurso referido no número anterior aplica-se, com as necessárias adaptações, a tramitação prevista no artigo 146.ºB do Código de Procedimento e de Processo Tributário».

    ).

    1.3 Na resposta, a Fazenda Pública suscitou a excepção da caducidade do direito de recorrer, alegando que a petição inicial deu entrada após o termo do prazo legal para o efeito. Mais sustentou que ao prazo em causa é inaplicável o disposto no n.º 5 do art. 145.º do Código de Processo Civil (CPC).

    1.4 O Contribuinte, na resposta à excepção, não só sustentou que a faculdade prevista no art. 145.º, n.º 5, do CPC, é aplicável à situação sub judice, como também invocou o justo impedimento da sua Mandatária judicial.

    1.5 A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga julgou procedente a excepção da caducidade do direito de recorrer e improcedente a invocação do justo impedimento.

    Isto, em síntese, porque considerou, – quanto que o prazo para o recurso, que o mesmo tem natureza substantiva e não processual, como decorre do art. 20.º, n.º 1, do CPPT, motivo por que não lhe é aplicável o disposto no n.º 5 do art. 145.º do CPC; – quanto ao justo impedimento, que o respectivo requerimento não foi apresentado tão logo o mesmo cessou, como o exige a segunda parte do n.º 2 do art. 146.º do CPC, pelo que se deve ter o incidente como deduzido fora de prazo e que, ademais, mesmo considerando que a Mandatária subscritora da petição estava impedida de praticar o acto, «não se verificam os pressupostos, de resto não alegados, de impedimento quanto às duas outras mandatárias, nem os factos invocados relativamente a elas o consubstanciam, nomeadamente nada referindo quanto à impossibilidade de serem contactadas ou de substabelecer em qualquer outro mandatário, o que também não resulta do atestado médico» (() Aqui como adiante, as partes entre aspas e com um tipo de letra diferente são transcrições.

    ).

    1.6 Inconformado com essa sentença, o Contribuinte dela interpôs recurso para este Tribunal Central Administrativo Norte, apresentando com o requerimento de interposição do recurso as respectivas alegações, que resumiu nas seguintes conclusões: « I. As normas vertidas nos nºs 4 e 5 do artº 145º do Código de Processo Civil são aplicáveis ao caso concreto.

    1. O artigo 20º do CPPT distingue entre procedimentos tributários e de interposição de impugnação judicial, por um lado e a contagem relativa à prática de actos no processo judicial, por outro, apesar de no nº 1, daquele artigo não se prever a possibilidade de excepção ao nele estatuído, casos existem em que os prazos se suspendem, por força de outras disposições.

    2. O prazo de caducidade não afecta a possibilidade de uso do direito da prática do acto nos três dias úteis subsequentes ao termo do prazo legalmente previsto, in casu, de dez dias.

    3. Os nº 5 e 6, do mesmo artº 145º do CPC – lei processual que se aplica ao direito tributário subsidiária e analogicamente – prevêem um regime geral que abrange o direito a propor acções e interpor recursos.

    4. A impossibilidade de aplicação daquele artigo viola claramente os direitos de defesa e igualdade, consagrados nos artºs 13º e 20º da Constituição, porquanto, permite um tratamento desigual, dependendo da posição processual da parte.

    5. O artigo 20º da Constituição da República Portuguesa, expressamente pugna pela eliminação de todos os obstáculos, sem fundamento, à obtenção de uma decisão de mérito, de modo a que opere a justa e definitiva composição do litígio privilegiando-se, assim, claramente a obtenção de decisão de fundo sobre a mera decisão de forma.

    6. O acto foi praticado no cumprimento de todos os pressupostos legais, sendo, em consequência, válido e atempado.

    7. O actual conceito de justo impedimento integra um conceito bastante mais amplo do que aquele que vigorava antes.

    8. Com a alteração do artigo 146º nº1 do CPC procurou-se flexibilizar a definição conceitual de justo impedimento, em termos de permitir uma jurisprudência criativa.

    9. De acordo com o conceito de justo impedimento exposto, cabe à parte o ónus de alegar e provar a ocorrência de evento que obstou, de modo praticamente absoluto, à prática atempada do acto, e ainda que, atentas as circunstâncias especiais da vida em que ele surgiu, não lhe era exigível outra conduta. Incumbe-lhe também oferecer, e desde logo, a respectiva prova.

    10. Contrariamente ao afirmado na douta decisão ora posta em crise, foi devidamente alegado e indicada a respectiva prova, tanto do impedimento da signatária, como de que as restantes mandatárias constituídas se encontravam ausentes e incontactáveis.

    11. Transpondo a afirmação para a situação dos autos, tem de se entender que a advogada praticou o acto para que se encontrava mandatada, no primeiro dia em que se encontrou habilitada para o fazer e que foi no primeiro dia útil seguinte ao terminus do prazo.

    12. Razão pela qual, se entende que a Meritíssima Juiz [do Tribunal] a quo, deveria, para além de verificar o impedimento, reconhecer que a advogada se apresentou a praticar o acto para que estava mandatada, atempadamente.

    13. Assim, não podia ter sido julgado improcedente o pedido vertido naquele recurso por verificação da excepção de caducidade.

    14. O n.º 2 do artigo 146.º do CPC, impõe ao Requerente o ónus de indicação os meios de prova dos factos integradores desse justo impedimento.

    15. O que a Requerente fez não tendo no entanto a Meritíssima Juiz [do Tribunal] a quo ouvido as testemunhas indicadas.

    16. Assim, pelo exposto a sentença recorrida, violou o disposto nos artºs 20º do CPPT, 145º e 146º do CPC e os artºs 13º e 20º da CRP.

    TERMOS EM QUE, Dando como procedente e provado o presente recurso, farão Vossas Excelências a habitual JUSTIÇA!».

    1.5 O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.

    1.6 A Fazenda Pública não contra-alegou.

    1.7 Recebidos neste Tribunal Central Administrativo Norte, os autos foram com vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento, pois entendeu que a sentença fez correcto julgamento, quer relativamente à natureza do prazo para reclamar, e consequente inaplicabilidade do disposto no art. 145.º, n.ºs 5 e 6, do CPC, quer quanto ao prazo para alegar o justo impedimento.

    1.8 Foram dispensados os vistos dos Juízes adjuntos, atento o carácter urgente do processo (cf. art. 36.º, n.º 2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, aplicável ex vi do art. 2.º alínea c), do CPPT, e art. 146.º-D, n.º 1, aplicável ex vi do art. 146.º-B, n.º 5, deste Código, e do art. 89.º-A, n.ºs 7 e 8, da LGT).

    1.9 As questões a apreciar e decidir são as de saber se a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga fez ou não correcto julgamento – quando julgou que é inaplicável ao recurso previsto no art. 89.º-A, n.º 7, da LGT, que remete para a tramitação prevista no art. 146.º-B do CPPT, a faculdade prevista no n.º 5 do art. 145.º do CPC (cf. conclusões de recurso I a VII); – quando julgou intempestiva a invocação do justo impedimento na apresentação do recurso judicial (cf. conclusões de recurso XII e XIII); – quando considerou insuficientes a alegação da factualidade com vista a integrar o justo impedimento no que respeita às duas Mandatárias do Contribuinte que não subscreveram a petição e a indicação dos respectivos meios de prova (cf. conclusões de recurso VIII a XI).

    * * *2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO 2.1.1 A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga procedeu ao julgamento da matéria de facto nos seguintes termos: « Factos assentes com interesse para a decisão e apoio nos documentos existentes nos autos: 1. Na sequência da ordem de serviço nº 01200901899, de 9/7/2009, o recorrente foi submetido a uma acção de inspecção interna, tendo por âmbito o IRS e abrangendo o ano de 2006, a qual decorreu entre 9/7/2009 e 28/9/2009.

  2. Nessa inspecção apurou-se que, no exercício de 2006, o recorrente realizou na empresa de que é sócio, H…, Lda., NIPC 5…, suprimentos no montante total de 1.249.608,41 €.

  3. Mais se apurou que no ano de 2005 adquiriu uma viatura da marca BMW, Modelo 525 D, com a matrícula …AE, no valor de 76.900,00 €.

  4. No ano de...

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