Acórdão nº 639/19.0T8PTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 07 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelTOMÉ DE CARVALHO
Data da Resolução07 de Abril de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo n.º 639/19.0T8PTM.E1 Comarca Judicial da Comarca de Faro – Juízo Central de Competência Cível de Portimão – J1 * Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Évora: * I – Relatório: Na presente acção declarativa de condenação proposta por “(…), Lda.” contra (…), a Ré interpôs recurso da sentença final.

* A sociedade Autora pediu que a Ré fosse condenada a indemnizá-la a na quantia global de € 54.475,34 (cinquenta e quatro mil, quatrocentos e setenta e cinco euros e trinta e quatro cêntimos), acrescida dos juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal supletiva (juros comerciais), calculados desde 15/01/2019 até efectivo e integral pagamento, liquidando-se desde já os primeiros em € 501,47.

Subsidiariamente, pretende-se a condenação da Ré nos mesmos termos, a título de enriquecimento sem causa.

* A Autora fundamenta a sua pretensão em serviços prestados à actividade profissional da Ré, na qualidade de administrador judicial, em sede de liquidação de activos em diversos processos de insolvência, que importaram despesas, suportadas por causa dos mesmos, e que não foram pagas pela Ré.

* Devidamente citada, a Ré contestou, alegando que todos os actos que praticou com o auxílio da Autora foram desenvolvidos em nome das massas insolventes dos vários processos de insolvência.

Quando havia vendas, os pagamentos à leiloeira eram feitos através do produto dessas vendas e suportados pelos adquirentes. Quando tal não acontecia, eram as massas insolventes que tinham o encargo de pagar à demandante as despesas em que tinha incorrido.

A Ré entende ser parte ilegítima e concluí que, se assim não se entender, a acção deve ser julgada improcedente. Aproveita ainda para deduzir pedido de condenação da Autora como litigante de má-fé.

* No exercício do contraditório, a Autora pugna pela improcedência da excepção de ilegitimidade.

* Proferida sentença, o Tribunal «a quo» decidiu: a) condenar a Ré a pagar à Autora o montante de € 30.000,00, com juros à taxa legal, a contar da data da presente sentença.

  1. absolver a Autora do pedido de condenação por litigância de má fé.

    * A recorrente não se conformou com a referida decisão e as alegações continham as seguintes conclusões: «1. Entende a recorrente que os concretos pontos dos artigos 4º, 5º, 6º, 12º, 32º a 34º, 42º, 64º a 67º, 72º, 75º, 78º, 80º, 83º e 84º da Contestação e dados como não provados foram incorrectamente julgados.

    1. O Tribunal formou convicção estribada na posição assumida pelas partes nos autos e na análise de toda a prova produzida oralmente e dos documentos juntos aos autos.

    2. Há factos incorrectamente julgados e meios probatórios que impunham decisão de facto diversa da decidida.

    3. Dos depoimentos das testemunhas que a Recorrente refere, também se retira matéria que confirmam o que era a sua pretensão, e bem como infirmam e não suportam a sentença proferida.

    4. A Recorrente não aceita que o Tribunal tenha formado a sua convicção estribada na posição assumida pelas partes nos autos e na análise de toda a prova produzida oralmente e dos documentos juntos aos autos, uma vez que não considerou todos os depoimentos e prova produzida em audiência.

    5. Isto também se retira do depoimento das testemunhas que a seguir se indicam e que se reportam à sua transcrição para maior facilidade e resumo destas conclusões: (…)[1] 4. Impõe-se considerar provado que: A Autora contratou os serviços da Ré, como e na qualidade de Administradora Judicial e em representação das diversas massas insolventes em que se encontrava nomeada (artigos 4º, 5º, 6º, 12º, 32º a 34º, 42º, 64º a 67º, 72º, 75º, 78º, 80º, 83º e 84º da contestação).

    6. Resulta provado que todas as testemunhas e até o próprio legal representante aceita que a Ré actuou sempre na qualidade de Administradora Judicial e não de parte.

    7. Nem se demonstra que a Ré tenha actuado a título pessoal.

    8. Não se provou que a Ré quisesse que a relação comercial com a Autora se repercutisse na sua esfera patrimonial pessoal.

    9. Este facto retira-se da própria P.I.. e das conclusões do Tribunal a quo quando refere que: “As testemunhas e documentos não podem confirmar a existência de uma relação contratual nos exatos termos em que a demandante a defende, porque não há modo de o confirmar, nomeadamente porque nunca foi celebrado documento nesse sentido entre as partes. Trata-se apenas de uma precisão que se faz, com o intuito de ilustrar o que acima se referiu”.

    10. E que (...) “No entanto, como se referiu, nem tudo aquilo que se comprova ter sido intervenção em processos por parte da demandante se traduz efetivamente em prejuízos incorridos pela mesma. Entendemos, como decorre do que se disse, que deve haver um ressarcimento, mas não um ressarcimento nos exatos moldes em que a mesma o pretende.” 10. De toda a prova produzida não existem elementos para se aferir o valor das despesas ou o valor pretendido pela Recorrida.

    11. Nisto aceita o Tribunal a quo que: “Como se referiu, o pagamento de despesas de deslocação deve ocorrer por cada deslocação efetivamente efetuada, e não por informação alusiva à deslocação prestada em cada processo, no sentido de que se um funcionário se tiver deslocado a um determinado sítio e tiver aproveitado para efetuar três relatórios para três processos distintos, não poderá ser reclamado o pagamento de três deslocações, mas apenas de uma só.

    12. Do mesmo modo, não pode ser reclamado o montante constante de uma qualquer tabela referente a deslocações, mas apenas o montante de gastos efetivamente tidos, em particular com combustível e portagens.

    13. Assim, entende-se que o adequado aqui será recorrer à equidade, tendo também em conta que a mesma permite ainda fazer um juízo que possa abarcar outros fatores que jamais serão diretamente relacionados em documentação, como seja o desgaste das viaturas utilizadas pela leiloeira, do mesmo modo que evita que se relegue para o momento posterior a liquidação de despesas cuja prova jamais poderá ocorrer, porque se evidência dos autos que não foi feita a comprovação das mesmas, nem é a mesma possível, antes ocorrendo o recurso a montantes fixos que a demandante praticava em relação a despesas de deslocação”.

    14. O Tribunal a quo afere um juízo de equidade para atingir um montante de 55% do valor peticionado pela Recorrida, sem que o justifique de forma circunstanciada e desta forma faz errada aplicação do artigo 566.º do Código Civil.

    15. Os montantes indemnizatórios arbitrados à Recorrida são excessivos e desproporcionais atenta a factualidade dada como provada.

    16. Salvo o devido respeito, que é muito, a Recorrente entende que o Tribunal a quo fez uma incorrecta aplicação do Direito aos factos dados como provados.

    17. E porque assim é, não podemos deixar de ter presente, tal como nos dá conta o Acórdão do STJ, 28/10/2010 (proc. n.º 272/06.7TBMTR.P1.S1)[5], que contrariamente ao que acontece com os danos não patrimoniais, o recurso à equidade, consentido pelo citado artigo 566.º, n.º 3, para obter uma exata e precisa quantificação de danos patrimoniais, «desempenha uma função meramente complementar e acessória, representando apenas um instrumento para suprir possíveis insuficiências probatórias relativamente a um dano, inquestionavelmente sofrido pelo lesado, mas relativamente indeterminado quanto ao seu exato montante», ou seja, «o apelo à equidade é, neste caso, puramente complementar e acessório da aplicação da teoria da diferença, pressupondo que o «núcleo essencial» do dano está suficientemente concretizado e processualmente demonstrado e quantificado – não devendo o juízo equitativo representar um verdadeiro e arbitrário “salto no desconhecido”, dado perante matéria factual de contornos manifestamente insuficientes e indeterminados».

    18. Desde logo entendemos inexistir fundamento para calcular os montantes das indemnizações devidas pelos danos em causa com recurso à equidade, nos termos do disposto no artigo 566.º, n.º 3, do CPC, que, conforme já se deixou dito, no que concerne à quantificação dos danos de natureza patrimonial desempenha uma função puramente complementar e acessória em relação à aplicação da teoria da diferença, consagrada no n.º 2 deste mesmo artigo.

    19. A equidade traduz, no nosso sistema jurídico, um método facultativo que o julgador tem ao seu dispor para que possa decidir sem aplicação de regras formais, ainda que essa decisão tenha de ser tomada “à luz de diretrizes jurídicas dimanadas pelas normas positivas estritas”.

    20. Não existiu qualquer critério fundamentado e circunstanciado de aplicação do juízo de equidade em se fixar a quantia peticionada em 55% .... Não existiu qualquer critério fundamentado e circunstanciado de aplicação do juízo de equidade em se fixar a quantia peticionada em 55% .... porque não 25%? 21. Falta a fundamentação de facto à decisão.

    21. Quanto muito existem elemento para se fixar em sede de liquidação, mas nunca na formulação encontrada pelo Tribunal a quo.

    22. Os valores peticionados pela Recorrida foram impugnados pela Recorrente.

    23. Não se fez qualquer prova de que os valores em causa e peticionados pela Recorrida tinham qualquer correspondência com os valores cobrados pelo mercado.

    24. Não há critério para aplicação de um valor que não seja um limite máximo como faz a Sentença quando fixa um máximo de € 30.000,00, mas em sede de liquidação de sentença.

    25. Em recurso ao juízo de equidade poderia o Tribunal ter solicitado um laudo de honorários ou pedir os valores médio de mercado para atingir um propósito e aí, sustentado, poderia ajuizar com recurso à equidade.

    26. O Juízo de equidade não representa a fixação de um valor indiscriminado e insustentado numa mera percentagem de um valor contraditado; mas é uma ponderação em relação a valores para atingir um princípio de justeza.

    27. Como se referiu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21/1/16, «… o juízo de equidade das instâncias, alicerçado, não na aplicação de um estrito critério normativo, mas na ponderação das particularidades e especificidades do caso...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT