Acórdão nº 1063/21.0PBSTB-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 05 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelFÁTIMA BERNARDES
Data da Resolução05 de Abril de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na Secção Criminal, do Tribunal da Relação de Évora: 1. RELATÓRIO 1.1. Nos autos de inquérito n.º 1063/21.0PBSTB, que correm termos no DIAP de Setúbal, a Senhora Juiz de Instrução Criminal, por despacho de 16/11/2021, determinou que o arguido CATE...

, melhor identificado nos autos, continuasse a aguardar os ulteriores termos do processo sujeito à medida de coação de prisão preventiva, que lhe foi aplicada, na sequência de 1º interrogatório judicial de arguido detido, em 30/09/2021.

1.2. Inconformado com o assim decidido, o arguido interpôs recurso, para este Tribunal da Relação, extraindo da motivação de recurso apresentada, as conclusões que seguidamente se transcrevem: «I. Em 30 de Setembro de 2021, o recorrente foi presente ao Tribunal a quo de Setúbal, o qual, em sede de primeiro interrogatório judicial, decretou a sua prisão preventiva, enquanto suspeito da prática de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 22º, 23º, n.ºs 1 e 2, 131º, 132º, n.ºs 1 e 2, al. e), parte final, todos do Código Penal e um crime de detenção de arma proibida, em concurso aparente, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1 do CP e 86.º, n.º 1, als. d) e e) da Lei n.º 5/2006, de 23/02, tendo sido proferido Despacho em 16-09-2021, de que se recorre, onde lhe foi mantida a medida de prisão preventiva.

  1. O recorrente encontra-se preso no Estabelecimento Prisional de Lisboa, desde 30-09-2021.

  2. O presente recurso tem como objeto toda a matéria do despacho que manteve a prisão preventiva ao recorrente, o qual fundou-se na existência no perigo de continuação da atividade criminosa, no perigo de perturbação do inquérito e perigo de fuga.

  3. Conforme veremos, não se verificam as condições e os pressupostos legais exigíveis para aplicação de medida tão gravosa.

  4. O recorrente tem 28 anos de idade e não tem antecedentes criminais, nem sequer alguma vez foi acusado ou indiciado pela prática de qualquer outro crime.

  5. Sendo que os factos em investigação nos autos, a confirmarem-se ipsis verbis como indiciados, constituem um episódio isolado na sua vida, que, até aqui, tem sido orientada de acordo com os ditames do direito.

  6. A sua evidente ingenuidade e simplicidade estão patentes no comportamento que adotou aquando da sua detenção e prisão e no próprio 1º interrogatório e complementar, bem como no facto de não se ter furtado à justiça, tendo inclusive colaborado com esta.

  7. Desde a sua detenção, o ora recorrente, manifestou sempre a sua intenção de prestar declarações, mas que só o fazia na presença da sua advogada, a ora subscritora, pois esta encontrava-se impedida por se encontrar em isolamento profilático por ter tido conhecimento no dia 28-09-2021, que o seu filho estava infetado com o SARS-CoV-2, tendo contatado o recorrente informando de que não poderiam ir à esquadra, pois a mesma não o poderia acompanhar, por estar em isolamento, desde 28/09 /2021 (data do conhecimento do possível contágio) a 12/10/2021.

  8. Porquanto, na sequência dos factos ocorridos no dia 25/09 /2021, o recorrente tentou entrar em contato com a ora subscritora, sua advogada, no dia seguinte, o que não logrou.

  9. Tendo, na segunda feira (27-09-2021) agendado uma hora com a mesma, a qual se encontrava em Lisboa, tendo o recorrente ali se dirigido, com o intuito de se entregar pelos factos ocorridos no sábado anterior.

  10. Após terem conversado, combinaram deslocarem-se ao Departamento de Investigação Criminal da PSP, no (…), no dia seguinte (28/09/2021), pelas 9h30, para que o recorrente se entregasse à justiça.

  11. O que só não veio a ocorrer, face ao teste positivo ao SARS-CoV-2 do filho da ora subscritora, o que a colocou em isolamento profilático.

  12. Atendendo à situação concreta da ora subscritora, esteve a mesma em contato, na tarde do dia 28/09 /2021 com o Chefe (…), dando nota da pretensão do recorrente em apresentar-se pelos factos ocorridos no sábado, ao que o mesmo referiu que o recorrente já estaria identificado, mas que ainda não existiam outras diligências, pelo que caso não houvesse mais situações que poderíamos aguardar pelo levantamento do isolamento da ora subscritora ou, em alternativa, que houvesse algum desenrolar do processo.

  13. Jamais se antevia o que iria suceder no dia seguinte (29/09 /2021), a busca domiciliária e subsequente detenção do ora recorrente.

  14. Desde o primeiro momento, ainda na sua casa, o recorrente disponibilizou-se a colaborar com a justiça e o próprio processo, mas só o fazia na presença da sua advogada, tendo de imediato entrado em contato com esta, pelas 07h10m, a qual falou telefonicamente com um dos srs. Inspetores.

  15. Pelos senhores inspetores foi mais tarde transmitido à ora subscritora que as diligências a efetuar não se coadunavam com a espera do período de 15 dias, altura em que a ora subscritora, em princípio, já estaria em condições de assegurar as respetivas diligências.

  16. O recorrente foi mantido durante todo o dia nas instalações da Polícia Judiciária, sendo que foi, entretanto, detido, pelas 21h30m, à ordem dos presentes autos.

  17. Mais uma vez, o recorrente reiterou que quanto a estes factos pretendia prestar declarações, mas que só o faria na presença da ora subscritora.

  18. Facto este confirmado pela ora subscritora, diretamente aos srs. Inspetores da Polícia Judiciária, tendo mantido contatos com estes até cerca das 22h do dia 29-09-2021, altura em que foi informada que o mesmo seria presente a juiz no dia seguinte.

  19. Pelas 9h30 do dia 30-09-2021, a ora subscritora entrou em contato com a sra. funcionária (…) do DIAP, a qual referiu já ter conhecimento de que o recorrente teria advogada, estando a mesma impossibilitada de comparecer, atenta a sua situação de isolamento, na sequência da informação dada pelos srs. Inspetores da Polícia Judiciária, ao que já teria nomeado uma defensora oficiosa.

  20. Não obstante o contato mantido com a Dra. (…), Advogada Nomeada Oficiosamente para o ato, o interrogatório acabou por passar para o período da tarde, o que fez com que fosse nomeada nova Advogada.

  21. A ora subscritora também entrou em contato com a Dra. (…), a qual lhe transmitiu que tendo em conta a situação concreta do caso e já tendo o recorrente, advogada, que se encontrava temporariamente indisponível para assegurar a defesa do recorrente, iria dar instruções ao recorrente para que não prestasse declarações, pois só o deveria fazer na presença da ora subscritora, pois era esta que já tinha conhecimento dos factos e que representaria o recorrente no processo.

  22. Motivo pelo qual, terá sido essa a posição do recorrente no 1º Interrogatório Judicial, não obstante não ser essa a sua intenção ab inicio, mas que as circunstâncias supervenientes da impossibilidade da presença da advogada que o recorrente pretenderia para assegurar a sua defesa, atendendo à relação de confiança que mantem com a mesma, o levaram a remeter -se ao silêncio.

  23. Na sequência da alta da ora subscritora e, em cumprimento da intenção desde sempre manifestada quer diretamente pelo próprio recorrente, quer pela ora subscritora, aos srs. Inspetores da Polícia Judiciária, o recorrente requere a sua audição para prestar declarações nos presentes autos.

  24. O que acabou por ocorrer no dia 10/11/2021, tendo sido ouvido em sede de interrogatório complementar nos termos do art. 144.º do CPP.

  25. O recorrente prestou declarações, as quais se encontram gravadas, assumindo a prática dos factos de que vem acusado, explicando o que sucedeu no dia dos factos, assumindo a sua culpa e encarando as consequências dos factos.

  26. Não obstante não ter sido tido em conta pelo Tribunal a quo, o recorrente, desde o primeiro momento pretendeu entregar-se, só não o fazendo por um facto superveniente de impossibilidade da sua advogada, ora subscritora, tendo desde sempre manifestado a sua intenção em colaborar, mas só na presença daquela.

  27. Bem como o facto de que se o recorrente pretendesse furtar-se à justiça, poderia tê-lo feito, pois teve muito tempo para isso, o que nunca foi sua intenção, como podia ter falado com as testemunhas, o que também não fez.

  28. Motivo pelo qual, não se entende, o entendimento do Tribunal a quo na existência de perigo de fuga, perturbação do inquérito e continuação da atividade criminosa, por parte do recorrente, quando este, se o quisesse fazer tê-lo-ia feito previamente, porquanto teve vários dias para o efeito e jamais o faria, muito menos agora.

  29. Ao contrário do entendimento do Tribunal a quo, o recorrente assumiu os factos, mostrouse arrependido, aceitando as consequências dos mesmos, indicou e solicitou meios de prova no intuito de colaborar com a justiça e com a descoberta da verdade material, com vista à boa decisão dos factos.

  30. O recorrente tem tido uma postura de colaboração, a qual foi "interrompida" por factos que lhe foram a ele pessoalmente alheios, mas que não querendo sentir-se desamparado sem a presença da sua advogada, acabou por precipitar a sua conduta inicial desde a sua detenção, não obstante sempre ter manifestado aos srs. Inspetores e no 1º interrogatório judicial, a sua intenção de colaborar, mas que só o faria na presença da sua advogada, tal não foi relevado.

  31. Ao requerer a sua audição, o recorrente não pretendeu agora colaborar com a justiça, nem alterar a sua estratégia de defesa, pelo contrário, manteve a sua palavra desde início de que pretendia colaborar, mas só na presença da sua advogada, ora subscritora.

  32. Antes de ser preso, o recorrente tinha paradeiro fixo e certo, vivendo com a sua companheira e os 2 filhos desta, num ambiente de absoluta tranquilidade, na Rua (…), onde também recebia os seus próprios filhos, sendo um ótimo pai e um companheiro dedicado.

  33. O recorrente tem um suporte familiar absolutamente exemplar.

  34. Trabalha em parceria com a sua companheira, na RIM, onde já tem o cargo de chefe, o que se arrisca a perder, dada a sua impossibilidade em prestar o trabalho.

  35. Do ponto de vista social, o recorrente é visto pela comunidade...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT