Acórdão nº 4/17.4GBBJA.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 05 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA MARGARIDA BACELAR
Data da Resolução05 de Abril de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, os juízes da Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: No Tribunal Judicial da Comarca de Beja - Juízo Central Cível e Criminal de Beja - Juiz 2, mediante acusação do Ministério Público, foi julgado em processo comum, perante o tribunal colectivo, com documentação das declarações oralmente prestadas em audiência, e no que ora releva, o Arguido a seguir identificado: Fza…, filho de (…) e de (…), natural da freguesia da (…), concelho de Beja, nascido a 3/07/1967, casado, residente na (…), concelho de Beja.

A final, foi decidido julgar a acusação parcialmente procedente, e, em consequência: 1. Condenar o arguido Fza… pela prática, em co-autoria material e como reincidente, de um crime de tráfico de produtos estupefacientes, p. e p. pelo art.º 21º do DL n.º 15/93, de 22/01 com referência ao disposto na Tabela I-C anexa àquele diploma legal, na pena de 6 (seis) anos de prisão efectiva.

Inconformado, o arguido Fza… interpôs recurso da referida decisão, que motivou formulando as seguintes conclusões: “I- A pena de prisão efetiva aplicada ao Recorrente é desadequada e injusta.

II- O Tribunal “a quo”, ao ditar tão pesada sanção, não ponderou todas as circunstâncias e factos, das quais não se fez prova.

III- Entre início de 2017 e 14 de Dezembro de 2018 não existe qualquer prova do envolvimento no tráfico de estupefacientes, por parte do Recorrente.

IV- O Recorrente esteve a cumprir pena de prisão no Estabelecimento Prisional (…), à ordem do processo n.º (…) da Secção Cível e Criminal da Instância Central de Beja, do Tribunal da Comarca de Beja, de forma ininterrupta de 22-01-2016 a 22-10-2019.

V- A atividade de tráfico de estupefacientes desenvolvida pelas arguidas Aza… e Mza… era realizada nas imediações da sua residência sita em (…), e mediante contacto prévio, telefónico ou pessoal, entre os consumidores e as arguidas.

VI- O Recorrente não conhece o arguido MPz… VII- Seria impossível ao Recorrente levar a cabo tais atividades ilícitas de tráfico, tanto porque não tinha liberdade de movimentos, e também, porque não tinha acesso a produto estupefaciente para ceder ou vender a outros.

VIII- Não existem quaisquer registos fotográficos e/ou videovigilâncias, com intervenção do Recorrente, em atividades relacionadas com a venda de produtos estupefacientes.

IX-Das escutas telefónicas realizadas ao Recorrente - não se encontra junto aos autos quaisquer gravações ou transcrições - em que o Recorrente combine ou acorde com consumidores a compra, cedência, venda, preços, quantidades ou entregas de produtos estupefacientes.

X- O Recorrente nunca procedeu à venda de produtos estupefacientes enquanto se encontrava em período de reclusão - e em contrário ao dado como provado no ponto 19 do Acórdão.

XI- Apesar da inúmera prova e respetivos apensos carreados aos autos - resulta como único incidente criminal praticado pelo Recorrente Fza… uma transação de produto estupefaciente ocorrida após o cumprimento de pena proferida no âmbito do processo n.º (…).

XII- Nada mais se provou relativamente ao arguido Fza…, nomeadamente a sua participação/comparticipação na actividade de tráfico mantida pelas arguidas Aza… e Mza…, nem tampouco a venda de produtos estupefacientes a consumidores, enquanto cumpria período de reclusão/saídas precárias no EP (…).

XIII- Todos os arguidos, à exceção do Recorrente, viram a sua conduta criminal consideravelmente diminuída - vindo a ser condenados por tráfico de menor gravidade, p. e p. pelo art.º 25º al. a) do DL n.º 15/93, de 22/01 com referência ao disposto na Tabela I-C anexa àquele diploma legal.

XIV- Insurge-se o Recorrente pela inflexibilidade do Tribunal “a quo” ao não ser aplicado o mesmo regime/condenação aplicado aos demais arguidos.

XV-A intervenção do Recorrente nos autos é diminuta em relação à dos demais arguidos.

XVI- O Tribunal “a quo” relevou em demasia o facto do Recorrente ser reincidente.

XVII- A reincidência não é condição impeditiva da aplicação ao disposto no artigo 25.º do DL n.º 15/93, de 22/01.

XVIII- Face à factualidade provada, deverá o Recorrente ser condenado nos termos do disposto no art.º 25.º, alínea a), do DL 15/93 de 22/01 e não conforme foi, nos termos do disposto no art.º 21.º, DL 15/93 de 22/01, ainda que como reincidente, nos termos e para os efeitos dos arts. 75.º, nºs. 1 e 2 e 76.º, ambos do Código Penal.

XIX- A condenação do Recorrente em pena de prisão perto dos limites médios, suspensa na sua execução mediante regime de prova, se revelaria adequada ao crime praticado.

XX- Do ponto de vista da prevenção especial, esta pena privativa da liberdade, não se afigura mais eficaz do que outra sem esta natureza, que seria suficiente para cumprir as finalidades da punição.

XXI- Entendemos, com o devido respeito, que o Tribunal “a quo” ao determinar a medida da pena, não terá sopesado todos os apontados factores, conforme prescreve o art.º 71º e seguintes do Código Penal.

XXII- Com o devido respeito, o douto tribunal “a quo” interpretou erroneamente as seguintes disposições legais: - art.º 40°, 70° e 71º do Código Penal.

Termos em que deve ser concedido provimento ao presente RECURSO e, em consequência deve alterar-se o douto Acórdão recorrido, e com efeito dever-se-á: - Condenar o Recorrente pelo crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, nos termos do disposto no art.º 25.º, alínea a), do DL 15/93 de 22/01 e não conforme foi, nos termos do disposto no art.º 21.º, DL 15/93 de 22/01, ainda que como reincidente, nos termos e para os efeitos dos arts. 75.º, nºs. 1 e 2 e 76.º, ambos do Código Penal.

- Suspender a execução da pena de prisão que vier a ser aplicada ao Recorrente; Assim, farão VV. Exª.s, Venerandos Desembargadores, a costumada JUSTIÇA!” O Ministério Público respondeu às motivações de recurso apresentadas pelo Arguido Recorrente, pugnando pela improcedência do mesmo.

Neste Tribunal o Exmo. Procurador-Geral Adjunto teve vista dos autos, emitindo parecer no sentido do não provimento do recurso.

O recorrente, notificado nos termos e para os efeitos previstos no art.º 417º, nº 2 do CPP, quedou-se pelo silêncio, nada tendo vindo alegar.

Colhidos os vistos legais e efectuada a conferência prevista no art.º 419º do CPP, cumpre agora apreciar e decidir.

FACTOS CONSIDERADOS PROVADOS NO ACÓRDÃO RECORRIDO São os seguintes os factos que o acórdão recorrido indica como estando provados “1. A arguida Aza… é casada com o arguido Fza… e é mãe da arguida Mza….

  1. À data dos factos em apreciação nos autos, Fza… encontrava-se a cumprir pena de prisão no Estabelecimento Prisional de (…), à ordem do processo n.º (…) da Secção Cível e Criminal da Instância Central de Beja, do Tribunal da Comarca de Beja.

  2. Desde data não concretamente apurada, mas que se situará, pelo menos, a partir do início do ano de 2017 até 14 de Dezembro de 2018, os arguidos Mza…, Aza… e Fza…, em comunhão de esforços, dedicaram-se à actividade de venda e distribuição de produtos estupefacientes a consumidores, concretamente canábis, mediante cobrança de um preço superior ao despendido na compra, como forma de obterem proventos para custear o seu sustento e proporcionar melhores condições de vida.

  3. O produto estupefaciente era guardado e ocultado no interior da habitação sita na (…), local de residência dos arguidos Mza…, Aza… e Fza… .

  4. Nesse local, as arguidas Mza… e Aza… eram procuradas por vários consumidores, que ali se dirigiam com regularidade, quer apeados como de veículo automóvel ou bicicleta, a fim de adquirirem produtos estupefacientes.

  5. Por vezes esses consumidores batiam à porta da residência, onde falavam indistintamente com Mza… e Aza…, e depois ficavam a aguardar em frente à habitação ou nas imediações, até que uma das arguidas lhes fosse entregar o produto estupefaciente contra o recebimento de dinheiro.

  6. Outras vezes, os consumidores contactavam previamente as arguidas Mza… e Aza… por meio dos telemóveis com os n.º (…), (…) e (…), para combinar as entregas.

  7. Para que as conversas mantidas ao telefone não levantassem suspeitas, as arguidas e os consumidores utilizavam uma linguagem codificada por forma a transmitirem a quantidade de produto estupefaciente pretendida, tais como: “é cinco minutos”, “é dez minutos”, “uma hora” ou “meia hora”, querendo tal significar, cinco euros, dez euros, uma ou meia bolota de haxixe, respectivamente.

  8. Após os contactos telefónicos, as entregas aos consumidores eram geralmente efectuadas nas imediações daquela residência, designadamente na Rua (…) junto à (…) ou junto aos caixotes do lixo, bem como na (…).

  9. Em 10/05/2017, 21/02/2018, 23/02/2018, 18/04/2018, 26/04/2018, 02/05/2018, 11/06/2018, 09/07/2018, 10/07/2018, 13/09/2018 e 17/09/2018 foram realizadas vigilâncias pela G.N.R. junto à residência das arguidas, tendo estas sido vistas a dirigirem-se junto de vários indivíduos a quem entregaram pequenos invólucros mediante a troca de dinheiro.

  10. O arguido Fza… apesar de estar a cumprir pena de prisão, também participava a partir da cadeia na actividade tráfico levada a cabo pelas arguidas Mza… e Aza…, utilizando, para o efeito, um telemóvel que aí conseguiu introduzir ou utilizando um outro telemóvel da arguida Aza… quando se encontrava em saídas precárias.

  11. Através deste último, o arguido Fza… era contactado por consumidores, com os quais concertava entregas de produto estupefaciente nas imediações da sua residência na (…), nomeadamente, junto a (…) ou (…).

  12. Após, telefonava para as arguidas e pedia-lhes para se deslocarem ao local combinado para procederem à entrega do produto estupefaciente contra a entrega do preço, o que sucedeu, nomeadamente, em: - 7 de Setembro de 2018, pelas 21h43; - 8 de Setembro de 2018, pelas 18h00; - 8 de Setembro de 2018, pelas 20h00; - 10 de Setembro de 2018, pelas 16h36; - 27 de Outubro de 2018, pelas 9h22.

  13. Assim, Mza… Aza… e Fza…, de comum acordo e actuando de forma concertada, venderam, em datas não concretamente apuradas, mas situadas desde, pelo menos, o início...

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