Acórdão nº 414/20.0T8FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 28 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelMANUEL BARGADO
Data da Resolução28 de Abril de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora I - RELATÓRIO A.V.V.

e mulher I.V.

, instauraram a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra J.S.N.

, V.N.

e mulher A.L.S.

, pedindo que os réus sejam condenados a pagar aos autores a quantia de € 30.000,00 a título de indemnização por abuso do direito.

Alegam, em síntese, que o exercício do direito de preferência por parte dos réus quanto ao prédio rústico denominado “Barreiro”, Vale de Gralhas, freguesia de Estoi, concelho de Faro, constitui um abuso do direito, na medida em que os réus sempre o pretenderam destinar à construção e não à agricultura.

Os réus contestaram, excecionando e impugnando.

Por exceção invocaram a ilegitimidade da autora e a prescrição do direito dos autores.

Por impugnação alegam ter adquirido o aludido prédio por forma a aumentar a sua área agrícola, sendo o réu J.S.N. agricultor de profissão, e com a ajuda do seu filho, o réu V.N., tem limpado aquele prédio pelo menos duas vezes por ano, sendo que desde a sua aquisição, por via judicial, foram plantadas no mesmo diversas árvores, designadamente alfarrobeiras e figueiras, de onde são colhidos os seus frutos, não tendo alguma vez edificado no prédio qualquer construção, nem apresentaram qualquer pedido de projeto de construção na Câmara Municipal competente.

Terminam pedido a sua absolvição do pedido e a condenação dos autores como litigantes de má-fé em multa e indemnização a favor dos réus em quantia nunca inferior a € 2.500,00.

Responderam os autores, concluindo pela sua absolvição do pedido de condenação como litigantes de má-fé.

Notificados para se pronunciarem sobre as exceções invocadas, vieram os autores pugnar pela sua improcedência.

Em sede de audiência prévia foi facultada às partes a discussão de facto e de direito sobre a matéria de exceção, tendo as mesmas sido expressamente notificadas para a possibilidade de o tribunal conhecer do mérito da causa.

Por considerar resultar patente dos articulados a delimitação concreta dos termos do litígio, a simplicidade da causa e a desnecessidade de suprir insuficiências ou imprecisões, nem garantir o exercício do contraditório, a Sr.ª Juíza a quo proferiu despacho saneador que julgou a autora mulher parte ilegítima e improcedente a ação, “absolvendo da mesma os réus”, tendo ainda absolvido o autor do pedido de condenação por litigância de má-fé.

Inconformados, os autores apelaram do assim decidido, tendo finalizado a respetiva alegação com as conclusões que a seguir se transcrevem: «1. Por sentença datada de 0-09-2021 o tribunal “a quo” 04-09-2021 julgou a presente ação improcedente, absolvendo da mesma os Réus.

  1. Os Autores não se conformam com a sentença de que ora se recorre.

  2. Em sede de audiência prévia foi facultada às partes a discussão de facto e de direito das excepções dilatórias invocadas na contestação, tendo as mesmas sido expressamente notificadas para a possibilidade do tribunal conhecer do mérito da causa.

  3. Tendo os Autores ora Recorrentes manifestado expressamente que os presentes autos impunham a necessidade de produção de prova.

  4. Nessa senda o tribunal “a quo” proferiu de imediato saneador-sentença, sendo certo que os presentes autos não se encontravam devidamente debatidos nos articulados e a matéria de facto é indubitavelmente controvertida e impunha a produção de prova.

  5. Por outro lado e conforme infra melhor se explanará a sentença recorrida é omissa quanto aos factos dados como não provados, apenas fazendo referência aos factos dados como provados n.º 1 a 8.

  6. Não tendo sequer sido concedida às partes oportunidade processual para pronunciarem sobre o objecto do litígio e sobre a selecção da matéria de facto.

  7. O que faz com que estejamos perante uma nulidade processual ao abrigo do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Civil.

  8. Sem prescindir, não há qualquer referência aos factos dados como provados.

  9. O que faz com que estejamos perante uma omissão de pronúncia, isto é o tribunal "a quo" deixou de decidir sobre essa questão, não constando nenhum facto provado dado como não provado, o que faz com que estejamos perante uma causa de nulidade da sentença recorrida e a mesma deverá ser revogada por omissão de pronúncia, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alíneas c) e d) do Código de Processo Civil.

  10. Termos em que deverá a sentença recorrida ser revogada nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alíneas c) e d) do Código de Processo Civil.

  11. A sentença recorrida viola ainda o disposto no artigo 30.º e 34.º do Código de Processo Civil e o conceito de legitimidade.

  12. Devendo a Autora ser julgada como parte legítima pois a Autora é casada com o Autor no geral supletivo da comunhão de adquiridos.

  13. Termos em que deverá a sentença recorrida ser revogada e consequentemente deverá a Autora ser declarada parte legítima.

  14. A sentença de que ora se recorre viola o disposto no artigo 334.º do Código Civil e o instituto do abuso de direito.

  15. Devendo ser considerando que o prazo de prescrição possa ser invocado in casu ao que acresce que não foi realizada prova de quando é que os Autores tiveram conhecimento do direito que lhes compete.

  16. Termos em que deverá a sentença recorrida ser revogada e consequentemente deverão os presentes autos seguir os seus ulteriores termos.

Nestes termos e nos melhores de direito deverá o presente recurso de apelação ser julgado procedente por provado e em consequência deverá a sentença recorrida ser declarada nula e deverão os autos seguir os seus ulteriores termos, com o que se fará Justiça!» Não foram apresentadas contra-alegações.

Corridos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

II – ÂMBITO DO RECURSO Sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações, sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (arts. 608º, nº 2, 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do CPC), as questões a decidir, atenta a sua precedência lógica, consubstanciam-se em saber: - se a decisão recorrida é nula por falta de fundamentação e por omissão de pronúncia; - se a autora é parte legítima; - se prescreveu o direito de indemnização com fundamento no abuso do direito a que se arrogam os autores; III – FUNDAMENTAÇÃO OS FACTOS Na 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos: 1- Por escritura de 27.12.2000, o A. declarou comprar o prédio rústico denominado “Barreiro”, sito em Vale de Gralhas, na freguesia de Estói, concelho de Faro, descrito na Conservatória do Registo Predial de Faro sob o nº (…) e inscrito na matriz sob o artigo (…); 2- Os RR J. e V.N. instauraram contra o A. e outros acção declarativa que sob o nº 1437/04.1TBFAR correu termos no (extinto) 2º Juízo Cível do Tribunal Judicial da Comarca de Faro; 3- Nessa acção, os ali AA formularam pedido de reconhecimento do direito de preferência na venda do prédio identificado em 1; 4- O ora A. foi ali citado para, querendo, deduzir contestação, em Setembro de 2004; 5- Os RR naquela acção, apesar de citados, não deduziram contestação; 6- Foi ali proferida sentença em 25.05.2005 que, julgando procedente o pedido, considerou verificado o direito de preferência invocado pelos ali AA (e aqui RR) declarando transmitida para o ali autor V.N. a propriedade do prédio identificado em 1; 7- A sentença referida em 6...

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