Acórdão nº 41/18.1T9ODM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 08 de Novembro de 2022
Magistrado Responsável | EDGAR VALENTE |
Data da Resolução | 08 de Novembro de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - Relatório
No Juízo de Competência Genérica de … (J…) do Tribunal Judicial da Comarca de … corre termos o processo comum singular n.º 41/18.1T9ODM, tendo aí sido, após realização do julgamento, sido proferida sentença com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto supra, o Tribunal decide: a - Absolver a arguida dos crimes pelos quais vinha imputada
b - Condenar a arguida no pagamento à demandada da quantia de 28.216,95€, acrescida de 956,38€ de potência indevidamente tomada e encargos administrativos no valor de 70,70€, acrescida dos respectivos juros moratórios e vincendos, contados desde a citação até integral pagamento.” Inconformada, AA interpôs recurso de tal decisão, extraindo da motivação as seguintes conclusões (transcrição): “A - Verificação de erro notório na apreciação da prova, previsto no artigo 410.º, n.º 2, al. c) do Código de Processo Penal; violação da presunção de inocência através da violação do princípio in dubio pro reo 1. O tribunal dá como provado que “Foi a arguida que, em data não concretamente apurada, mas certamente entre o período de 23-06-2014 a 07-07-2014, por si ou com colaboração de terceira pessoa não identificada, rompeu o selo da tampa do contador de electricidade e procedeu à ligação à rede eléctrica pública, obtendo, dessa forma, energia eléctrica para exclusivo consumo nesse espaço comercial, em prejuízo da queixosa identificada em 1.” 2. A Recorrente negou o facto de ter procedido, por si ou por interposta pessoa, à reposição ilegítima do contador
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Não foi produzida prova em sede de julgamento que contrarie a posição da Recorrente e demonstre que a Recorrente procedeu à religação
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Nem tampouco consta da acusação, do pedido de indemnização cível ou da douta sentença, as circunstâncias de modo como a Recorrente procedeu terá efectuado a religação à rede elétrica
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Contudo, a Mme. Juiz a quo, conclui que a Recorrente procedeu à ligação à rede eléctrica, “por si ou com colaboração de terceira pessoa não identificada” e que a Recorrente consumou efectivamente o consumo, em autoria material ou em autoria moral
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E suportada nesta convicção condena a Recorrente no pagamento do pedido de indemnização cível tal como deduzido pela Recorrida
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Sem indicar os elementos de prova onde se alicerçou para criar a sua convicção
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Para além do raciocínio de ser a Recorrente a única beneficiária da energia consumida, pelo que a única interessada, afastando assim qualquer outra possibilidade
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Sem considerar que a absolvição da Recorrente pela prática dos dois crimes de furto, por não haver sido feita prova da efectivação do primeiro corte - alegadamente ocorrido em 23.04.2013 - nem da intenção de apropriação da energia conforme alegado pela Recorrida, atesta a inexistência de ilicitude do comportamento da Recorrida e deveria antes concluir pela inércia da Recorrida na falta de facturação da energia, 10. No âmbito de um contrato que a Recorrida não produziu qualquer prova de haver rescindido ou disso ter informado a Recorrente
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Ora, na ausência de prova da efectivação do corte em 23.04.2013, cai por terra a imputação de consumo ilegítimo desde então até 07.07.2014, bem como o respectivo valor peticionado pela Recorrida, inexistindo fundamento para a condenação da Recorrente no pagamento da indemnização deduzida pela Recorrida com base no consumo ilegítimo
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Pelo que, salvo o devido respeito, o entendimento da Mma. Juiz a quo, ultrapassa largamente o espectro da prova produzida, além de constituir um erro na apreciação da prova previsto no artigo 410.º, n.º 2, al. c) do Código de Processo Penal e viola o princípio da presunção de inocência previsto no artº 32 nº 2 da Constituição da República Portuguesa
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Desconformidade entre a motivação da decisão e a decisão específica sobre a matéria 13. O tribunal a quo entendeu que apesar de inexistir responsabilidade criminal, existe responsabilidade civil, uma vez que a Recorrente consumiu electricidade sem proceder ao devido pagamento
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A responsabilidade civil que poderá ser apreciada em processo penal é só aquela que emerge da violação do direito de outrem, com dolo ou mera culpa e da qual resultem danos
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Contudo, os pressupostos da responsabilidade civil por factos ilícitos não se verificam, desde logo por não se ter apurado a imputação à Recorrente de um facto ilícito e culposo
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A Recorrida celebrou um contrato para fornecimento de energia elétrica com a empresa BB Lda. e não com a Recorrente
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Tampouco se provou a autoria da Recorrente na religação alegada pela Recorrida
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Nem se provou ter a Recorrente consumido a energia eléctrica referente a esse mesmo contrato
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Carece de fundamento a condenação da Recorrente no pagamento do pedido de indemnização civil, pelo consumo de electricidade efectuado que havia sido contratado com outra entidade, nos termos do artigo 483.º do Código Civil
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O valor a que a Recorrente foi condenada a pagar à demandante carece igualmente de fundamentação
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A demandante CC, ora Recorrida no seu articulado peticiona a título de energia eléctrica subtraída no período entre 23.04.2013 e 06.07.2014 o valor de € 28.216,95, acrescida do valor da potência indevidamente tomada no montante de € 956,39 e ainda custos de encargos administrativos no valor de €70,70, perfazendo o total de €29.244,03
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Ora, o valor peticionado pela Demandante é referente ao período que dista entre 23.04.2013 e 06.07.2014, exactamente o período em que o tribunal considerou como não provado o facto ilícito deligação abusiva à rede eléctrica e subsequente consumo indevido
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De acordo com o ponto 15 da matéria de facto provada “(…) ocorreram consumos de energia medidos por sistema de contagem, durante o período de abril de 2013 a junho de 2014 (…)”
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O que significa que, a Recorrente, não efectivou o corte de energia e continuou a fazer a contagem do consumo da empresa da Recorrente e não facturou por razões que a esta não são imputáveis
C - Prescrição 25. Vem a douta sentença decidir que o prazo prescricional do pedido de indemnização civil (23.04.2013 a 07.07.2014) é o de 10 anos por aplicação do prazo prescricional do furto qualificado
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O Tribunal a quo entendeu não ter...
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