Acórdão nº 1236/20.3T8BJA.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 24 de Novembro de 2022
Magistrado Responsável | MÁRIO BRANCO COELHO |
Data da Resolução | 24 de Novembro de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam os Juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora: No Juízo do Trabalho de Beja, DD… demandou PROMARINHA – Gabinete de Estudos e Projectos, S.A.
, pedindo a sua condenação na quantia global de € 30.729,79, ou, subsidiariamente, na quantia global de € 12.607,86 euros, ambos os valores acrescidos de juros.
Alega ter sido admitido ao serviço da Ré com a categoria profissional de Praticante de Piloto, em navio que arvora a bandeira portuguesa. A cláusula de motivação do termo é nula, porquanto não justificada; a Ré não pagou ao autor a remuneração mínima prevista no CCT aplicável; a partir de 28.05.2019 não lhe deu qualquer ocupação nem pagou qualquer retribuição, o que levou o A. a denunciar o contrato a 04.09.2020.
Os pedidos relacionam-se com diferenças salariais, vencimentos não pagos, férias, subsídios de férias e de Natal, e horas de formação não ministrada.
Contestando, a Ré alegou a incompetência territorial do tribunal, a sua ilegitimidade passiva, a prescrição dos créditos reclamados (o contrato teria cessado a 27.05.2019, por abandono do trabalhador, e a acção foi proposta a 13.10.2020), que é mera agente de recrutamento e colocação de marítimos e celebrou o contrato em representação do armador, sendo a este que o A. obedecia e quem o fiscalizava, e que este abandonou o trabalho, pelo que nada lhe é devido.
Após julgamento, a sentença julgou a acção totalmente improcedente.
Para o efeito considerou que o contrato de trabalho cessou a 27.05.2019, com o desembarque do A., o que equivale a desvinculação definitiva. E também considerou que os créditos do A. se mostravam prescritos: apesar da suspensão dos prazos de prescrição entre 09.03.2020 e 03.06.2020, sempre o prazo findaria a 22.08.2020.
Inconformado, o A. recorre e formula as seguintes conclusões: A) No âmbito dos presentes autos foi dado como provado que o contrato celebrado entre o ora recorrente e a ora recorrida é, efectivamente, um contrato de trabalho e que a verificar-se algum incumprimento do referido contrato seria a Ré, ora recorrida, que teria que ser responsabilizada pelo mesmo; B) A questão com a qual o ora recorrente não concorda prende-se com a data que a Mma Juíza do Tribunal “a quo” considerou ter sido cessado o contrato de trabalho em questão; C) O ora recorrente e a ora recorrida celebraram um contrato de trabalho a bordo de um navio, o qual teve início em 19/04/2019, data em que o ora recorrente embarcou no navio “Furnas”; D) A Ré, ora recorrida, por sua iniciativa, nunca cessou por nenhuma via o contrato em questão que celebrou com o ora recorrente; E) No decurso da relação laboral mantida entre as partes, o ora recorrente teve a necessidade de, por motivos familiares, pedir para desembarcar alguns dias mais cedo face ao previsto, tendo enviado um email para a ora recorrida a dar conta da necessidade de, por essas razões, desembarcar do Navio no dia 27/05/2019; F) Considerou a Mma Juíza do Tribunal “a quo” que, com o envio do email atrás referido, o ora recorrente denunciou o seu contrato de trabalho, por, alegadamente, ter sido esse o entendimento da Ré, ora recorrida, tendo, nesse seguimento, considerado que a relação laboral mantida entre as partes havia cessado no dia 27/05/2019; G) Entendimento esse com o qual o ora recorrente não pode concordar; H) Com efeito, com o envio do email supra referido, o que o ora recorrente transmitiu á Ré, ora recorrida, foi a necessidade de desembarcar alguns dias antes do previsto, por motivos familiares, o que demonstra a existência de um acontecimento ocasional e pessoal do mesmo, que desencadeou aquela necessidade, encontrando-se demonstrado o carácter transitório do referido acontecimento; I) O ora recorrente nunca refere que é sua intenção cessar o vínculo laboral mantido com a ora recorrida, nem tão pouco invoca as normas previstas no nosso Código do Trabalho acerca da denúncia dos contratos de trabalho; J) À luz daquilo que é a prática corrente das relações laborais e ao abrigo do princípio da boa fé, cremos que o sentido a retirar do teor do email enviado pelo recorrente e supra referido, será similar aos casos em que os trabalhadores comunicam aos respectivos empregadores a necessidade de faltarem ao trabalho por motivos familiares – nomeadamente assistência a filhos em situações de doença – sendo que, nessas situações, não se verifica obviamente a cessação dos respectivos contratos de trabalho; K) Tendo sido precisamente essa a situação que se verificou no caso do ora recorrente; L) O ora recorrente apenas informou a sua empregadora – conforme lhe competia – da necessidade de se ausentar do Navio por motivos familiares, o que demonstra que havia uma razão por de trás daquela necessidade de desembarque, que nada tinha que ver com a intenção do mesmo em terminar o seu contrato de trabalho, vindo tal a ser manifestamente comprovado se se atentar nos vários emails enviados pelo ora recorrente para a Ré após esse desembarque, a dar conta da disponibilidade para voltar a embarcar ao serviço da mesma, tendo o primeiro desses emails datado logo do dia 23/06/2019; M) Entender-se que o ora recorrente denunciou o seu contrato de trabalho ao enviar o email para a ora recorrida a informar da necessidade de, por motivos familiares, desembarcar uns dias mais cedo face ao previsto, parece-nos, salvo o devido respeito, um entendimento manifestamente errado; N) E, tanto o ora recorrente não denunciou, nem pretendeu denunciar, o seu contrato de trabalho com o envio do email a que nos vimos a referir, que nem sequer a ora recorrida o entendeu dessa forma; O) Com efeito, o que alega a ora recorrida é que o ora recorrente abandonou o seu trabalho, e não que o mesmo procedeu a denúncia do seu contrato de trabalho, sendo ambas as figuras realidades jurídicas completamente diferentes e que não se confundem; P) Uma coisa é a denúncia de um contrato de trabalho (regulada nos arts. 400º e 401º do nosso C. Trabalho) e outra coisa é o abandono do trabalho, previsto e regulado no art. 403º do referido Código; Q) Acontece que para a ora recorrida poder considerar cessado o contrato de trabalho celebrado com o recorrente pelo alegado abandono de trabalho do mesmo, teria que ter comunicado a este os factos constitutivos do abandono ou da presunção do mesmo, por carta registada com aviso de recepção para a última morada conhecida do mesmo, conforme expressamente previsto no nº 3 do art. 403º do nosso C. Trabalho, o que a recorrida não logrou fazer; R) Razão pela qual não se pode considerar cessado o contrato de trabalho com base no suposto abandono do trabalho por parte do recorrente por, desde logo, não se verificarem os respectivos requisitos legais; S) Ora se nem a própria recorrida entendeu e interpretou o email enviado pelo recorrente como uma denúncia do contrato de trabalho do mesmo, não nos parece plausível e aceitável que seja o Tribunal “a quo” a determinar que o sentido a retirar do teor do email enviado pelo recorrente seja esse, quando, repita-se, nem sequer a recorrida – destinatária...
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