Acórdão nº 579/21.3T8EVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 13 de Julho de 2022

Magistrado ResponsávelMÁRIO BRANCO COELHO
Data da Resolução13 de Julho de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora: No Juízo do Trabalho de Évora, A… e B… propuseram acção declarativa com processo comum contra PROSEGUR – Companhia de Segurança, Lda.

, e RONSEGUR – Rondas e Segurança, S.A.

, formulando os seguintes pedidos: a) ser declarado ilícito o despedimento efectuado pela 1.ª Ré e esta condenada a reintegrar ou indemnizá-los, conforme opção a realizar, e a pagar-lhes as remunerações vencidas desde 01.01.2021 e as vincendas, e ainda subsídio nocturno, trabalho suplementar, subsídio de refeição, e dias de férias por gozar; b) caso assim não se entenda, deve a 2.ª Ré ser condenada a reconhecer que os contratos de trabalho se lhe transmitiram, com todos os direitos inerentes, incluindo antiguidade, remuneração e categoria profissional e que ao não ter admitido os trabalhadores ao seu serviço no dia 01.01.2021 procedeu ao seu despedimento ilicitamente, pelo que deve ser condenada a pagar as mesmas quantias.

Alegaram que exerciam a actividade de vigilância, sob as ordens e direcção da 1.ª Ré, nas instalações de uma terceira entidade. A 2.ª Ré sucedeu à 1.ª na prestação de tais serviços naquele local, mas recusou admitir os aqui AA..

A 1.ª Ré contestou e disse que os contratos se transmitiram para a 2.ª Ré, por transmissão do estabelecimento. Já a 2.ª Ré disse o contrário, que não existiu tal transmissão e que não sucedeu nos contratos de trabalho.

Realizado o julgamento, a sentença julgou a acção parcialmente procedente, nos seguintes termos: 1. condenou a 2.ª Ré a reconhecer que os contratos de trabalho celebrados entre os AA. e a 1.ª Ré se transmitiram para a primeira, com todos os direitos inerentes aos mesmos, incluindo antiguidade, remuneração e categoria profissional; 2. declarou ilícito o despedimento dos AA. pela 2.ª Ré; 3. condenou a 2.ª Ré a pagar ao 1.º A. a quantia global de € 8.758,09, a título de indemnização em substituição de reintegração; 4. condenou a 2.ª Ré a pagar ao 2.º A. a quantia global de € 11.942,85, a título de indemnização em substituição de reintegração; 5. condenou a 2.ª Ré a pagar a cada um dos AA. a quantia correspondente às retribuições que os mesmos deixaram de auferir desde o respectivo despedimento (1 de Janeiro de 2021), até ao trânsito em julgado da decisão – incluindo, no caso do 1.º A., o montante correspondente aos 5 dias de férias não gozados no ano de 2020 –, à qual deverão ser deduzidas (i) as importâncias que cada um dos trabalhadores tenha auferido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento, (ii) a retribuição relativa ao período decorrido desde o despedimento até 30 dias antes da propositura da acção, se esta não for proposta nos 30 dias subsequentes ao despedimento, e (iii) o subsídio de desemprego atribuído a cada um dos trabalhadores no período em causa, devendo a 2.ª Ré entregar essa quantia ao Instituto da Segurança Social, I.P., sendo a referida quantia a liquidar, se necessário, em sede de ulterior incidente de liquidação; 6. absolveu a 2.ª Ré do demais peticionado; 7. absolveu a 1.ª Ré de tudo quanto contra ela foi peticionado.

Inconformada, a 2.ª Ré recorre e conclui: I. Em 4 de Novembro de 2020, a Ronsegur e a sociedade Maporal – Matadouro do Porco de Raça Alentejana, S.A. celebraram um escrito denominado de ‘contrato de prestação de serviços de vigilância n.º 228/2020’, mediante o qual declararam que a primeira prestaria à segunda os serviços de vigilância/segurança, nas instalações desta sitas na Zona Industrial Matadouro, 7200-232 Reguengos de Monsaraz, com início no dia 1 de Janeiro de 2021, e mediante o pagamento de um preço acordado pelas partes.

  1. A partir de 1 de Janeiro de 2021, a Ronsegur passou a prestar os referidos serviços de vigilância nas instalações da sociedade Maporal – Matadouro do Porco de Raça Alentejana, S.A.

  2. A partir de 1 de Janeiro de 2021, C… e D… continuaram a exercer funções de vigilantes, nas instalações da sociedade Maporal – Matadouro do Porco de Raça Alentejana, S.A., sitas na Zona Industrial Matadouro, 7200-232 Reguengos de Monsaraz, agora por conta e no interesse da Ronsegur.

  3. Os referidos vigilantes C… e D… deslocaram-se à sede da Ronsegur, no dia 30 de Dezembro de 2020, onde assinaram documentos denominados de ‘contratos de trabalho’ e frequentaram uma acção de formação relacionada com o regulamento interno e manual de procedimentos da empresa, riscos profissionais e medicina do trabalho, e apresentação da plataforma de processamento de salários.

  4. A Ronsegur não utiliza, nos serviços por si prestados à sociedade Maporal – Matadouro do Porco de Raça Alentejana, S.A., fardas, impressos, bastões de ronda, alvarás ou licenças da Prosegur.

  5. Os trabalhadores da Ronsegur que exercem funções nas instalações da sociedade Maporal – Matadouro do Porco de Raça Alentejana, S.A. utilizam fardas e registos de relatórios (de ocorrências ou registo de entradas/saídas de pessoas) fornecidas pela Ronsegur, com o modelo e imagem identificativos da mesma.

  6. Além dos equipamentos acima referidos, os trabalhadores da Ronsegur utilizam igualmente o sistema de videovigilância, o sistema de alarme e a báscula de pesagem acima referenciados, no âmbito das respectivas funções.

  7. A Ronsegur tem métodos de trabalho próprios, códigos de conduta próprios, normas de serviço próprias e procedimentos internos próprios, diversos dos da Prosegur.

  8. A Ronsegur organizou a afectação dos seus vigilantes, elaborou mapas de horário de trabalho, planeamento de férias e substituição de trabalhadores tendo em vista o início da prestação de serviços de vigilância nas instalações da Maporal – Matadouro do Porco de Raça Alentejana, S.A.

  9. A Prosegur não entregou à Ronsegur alvarás ou licenças para o exercício da actividade, nem quaisquer informações sobre as instalações da Maporal – Matadouro do Porco de Raça Alentejana, S.A. ou, ainda, as chaves das respectivas instalações.

  10. Não houve transferência da Prosegur para a Ronsegur de quaisquer bens ou equipamentos para a prossecução da actividade no referido cliente.

  11. A Ronsegur não reconheceu os autores como seus trabalhadores.

  12. O sistema de videovigilância, o sistema de alarme e a báscula acima referidos pertencem à Maporal – Matadouro do Porco de Raça Alentejana, S.A.

  13. A situação, de facto e de direito, e com base nos factos provados impunha decisão diversa.

  14. O artigo 285.º, n.º 1, do Código do Trabalho determina a transmissão para o adquirente da posição de empregador dos trabalhadores de uma empresa, estabelecimento ou parte de empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, caso ocorra uma transmissão, a qualquer título, da sua titularidade.

  15. A unidade económica é o conjunto de meios organizados que constitui uma unidade produtiva, com autonomia técnico-organizativa e identidade própria, destinada ao exercício de uma actividade económica, principal ou acessória.

  16. Na base da norma nacional está, de facto, o conceito de entidade económica resultante da Directiva 2001/23/CE, que nos diz no seu artigo 1.º, alínea b), que “é considerada transferência, na acepção da presente directiva, a transferência de uma entidade económica que mantém a sua identidade, entendida como um conjunto de meios organizados, com o objectivo de prosseguir uma actividade económica, seja ela essencial ou acessória”.

  17. A autonomia técnico-organizativa, referida no artigo 285.º, n.º 5, deve ser interpretada à luz da Directiva: a unidade económica deve ser estável e dispor de uma suficiente autonomia funcional”.

  18. A jurisprudência do Tribunal de Justiça tem evoluído no sentido de considerar que em determinados sectores de actividade, como de serviços de vigilância ou de limpeza, em que a actividade produtiva reside fundamentalmente na mão de obra, esta actividade laboral pode ser considerada uma “entidade económica” no sentido da Directiva XX. Porém, não podemos falar em transmissão quando esta operação não for acompanhada de uma cessão, entre uma empresa e a outra, de elementos significativos do activo, corpóreos ou incorpóreos, e do reemprego, pela nova empresa, de uma parte essencial dos efectivos, em termos de número e de competências, que o seu predecessor afectava à execução do seu contrato”.

  19. A Lei nº 34/2013 de 16.05, alterada pela Lei n.º 46/2019, de 08.07 (que veio reforçar as exigências aos profissionais e empresas de segurança privada), impõe uma série de requisitos que condicionam a actividade das empresas de segurança, como sejam a necessidade de obtenção de licenças, alvarás e deveres de prestação de caução, bem como um conjunto de deveres de grande exigência quanto ao modus operandi destas empresas e ainda a sujeição a regras procedimentais estritas no que respeita aos sistemas de controlo e vigilância e aos sistemas de alarmes que utilizem.

  20. Tudo isto é revelador das exigências técnicas e materiais imprescindíveis à actividade desenvolvida no âmbito dos serviços de vigilância e segurança, exigindo, por isso, o legislador, em relação a estes trabalhadores, uma formação profissional específica, a que acresce a obrigatoriedade de deter carteira profissional e a de se sujeitarem a requisitos de aptidão específicos, bem como à utilização de um uniforme que permita a sua identificação.

  21. Ora, a complexidade e as exigências técnicas, materiais e de formação profissional dessa actividade de segurança privada, que são imprescindíveis para o exercício da actividade, nos termos que decorrem do respectivo enquadramento legal e se espraiam nos factos que se provaram nos autos, não permitem, em nosso entender, que se equipare esta actividade a outras exclusivamente assentes em mão de obra/no “capital humano”, como por exemplo os serviços de limpeza de escritórios e/ou casas particulares.

  22. Ademais, os trabalhadores da Prosegur que foram contratados pela Ronsegur só o foram, mediante contrato de trabalho a termo certo e após terem formação.

  23. Não se extrai do quadro factual traçado em juízo que o conjunto de...

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