Acórdão nº 67/21.8T8ELV.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 30 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelFRANCISCO XAVIER
Data da Resolução30 de Junho de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acórdão da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora I – Relatório1.

Banco Invest, SA.

, instaurou acção executiva para pagamento de quantia certa contra C...

, apresentando o seguinte requerimento executivo: «Título Executivo: Livrança Factos: O ora Exequente é dono e legítimo portador de uma livrança, emitida a emitida a 4 de Agosto de 2017, no montante de € 8.023,50, com vencimento a 18 de Novembro de 2020. Mediante a aposição das assinaturas nos locais próprios, encontra-se a mesma subscrita por C....

A referida livrança foi entregue, em branco, ao Exequente no âmbito do contrato de crédito n.º 1010430, celebrado entre o Exequente e Executada. A Mutuária autorizou expressamente o Exequente a preencher a livrança em causa, apondo-lhe as datas de emissão e de vencimento, o local de pagamento e a importância do título pelo valor em dívida contratualmente estabelecido.

Perante o incumprimento do contrato e, após resolução do mesmo, veio o Exequente proceder ao preenchimento da livrança e apresentar a mesma a pagamento. No entanto, uma vez apresentada a pagamento, na data do seu vencimento, a livrança não foi paga pela obrigada cambiária.

Como resulta do Título supra identificado, o mesmo é executivo e a respectiva dívida certa, líquida e exigível.

Deste modo, o crédito que o Exequente detém sobre a ora Executada ascende a € 8.023,50 (correspondente ao capital em débito relativo à livrança vencida a 18 de Novembro de 2020). Ao valor em dívida (€ 8.023,50), acrescem juros de mora e imposto de selo, vencidos entre 18 de Novembro de 2020 e 12 de Fevereiro de 2021, no total de € 78,64.

Assim, pretende o ora Exequente, através da presente Acção Executiva, obter da Executada, o pagamento da importância de € 8.102,14, a que acrescem juros de mora e imposto de selo, até efectivo e integral pagamento».

  1. Por despacho de 17/02/2021 determinou-se o cumprimento do n.º 5 do artigo 724º do Código de Processo Civil, tendo a exequente requerido a junção aos autos da livrança dada à execução.

  2. Em 25/10/2021 foi proferido o seguinte despacho: «Não obstante o título da presente acção constituir uma livrança, uma vez que se mostra invocada a relação subjacente e a funcionalização da primeira à garantia da segunda, convida-se o exequente a, no prazo de 10 dias, esclarecer qual o contrato de crédito em causa e, bem assim, informar se deu cumprimento à obrigação de integração da executada no procedimento extrajudicial de regularização de situações de incumprimento (PERSI), previsto no DL n.º 227/2012, de 25 de Outubro, juntando a respectiva prova da comunicação de integração da executada no PERSI e da sua extinção».

  3. Em resposta, veio a exequente informar que, de facto, tinha celebrado contrato de crédito, que integrou a executada em PERSI duas vezes, sem sucesso, e que, «uma vez que não tinha condições para pagar os valores em mora e, muito menos, retomar o pagamento das prestações vincendas, prontificou-se a ora Executada a proceder à entrega da viatura. Para tanto, foi a ora Executada informada do procedimento a seguir. E, a verdade é que, perante tal situação, veio a ser celebrado “Acordo de Cessação”, a 28 de Maio de 2020, devidamente assinado pela ora Executada, na presença de colaborador do ora Exequente, através do qual, foi acordada a cessação do contrato de crédito n.º 1010430, assistindo ao ora Exequente, com o vencimento antecipado de todas as prestações do contrato, o direito a: i. Considerar suas as prestações vencidas e pagas; ii. Receber as prestações vencidas e não pagas, iii. Exigir o imediato pagamento das prestações vencidas antecipadamente; e, iv. Exigir juros sobre todos esses valores até ao seu efectivo pagamento, tudo sem prejuízo do direito do Banco em exigir a reparação integral dos seus prejuízos».

    Disse ainda a exequente que, nessa sequência foi vendida a viatura e informada a executada da quantia remanescente, a qual não pagou.

  4. Em 04/11/2021 foi proferido o seguinte despacho: «Resultando da alegação que, aparentemente, terá havido lugar a extinção do contrato de crédito invocado no requerimento executivo através do «acordo de cessação», notifique a exequente para se pronunciar sobre a eventual verificação de factos impeditivos ou extintivos da obrigação exequenda/falta de título executivo, uma vez que dá como título à presente execução uma livrança subscrita no âmbito do contrato de crédito n.º 1010430, que, como pela própria é invocado, foi cessado por acordo de 28-05-2020, o que resulta igualmente do documento anexo».

  5. Em resposta, veio a exequente invocar, no essencial o seguinte: (i) a causa de pedir resume-se à factualidade constante do título, sendo que o título vale por si, por preencher os requisitos do artigo 75.º da LULL; (ii) que sempre valeria como mero quirógrafo – cf. artigo 703.º, n.º 1, al. c) do Código de Processo Civil (os títulos de crédito, ainda que meros quirógrafos, desde que, neste caso, os factos constitutivos da relação subjacente constem do próprio documento ou sejam alegados no requerimento executivo); (iii) verificados esses requisitos, por reconhecida se tem a exequibilidade, presumindo-se a existência do direito que o título corporiza, que só é susceptível de ser afastada pela prova da inexigibilidade ou inexistência do direito, a alegar e provar pelo Executado em sede de oposição à execução; no entanto, não pode o ora Requerente deixar de realçar que não é ao Tribunal que compete oficiosamente suscitar ou, sequer, apreciar tal questão.

  6. Em 15/11/2021 foi proferida a seguinte decisão: «Quanto à delimitação da causa de pedir, é manifesto que sendo certo que a mesma compreende o título, não se resume àquele. Isto é evidente se lermos o art. 703.º, n.º 1 al. c) do CPC, aliás invocado pela exequente: «os títulos de crédito, ainda que meros quirógrafos, desde que, neste caso, os factos constitutivos da relação subjacente constem do próprio documento ou sejam alegados no requerimento executivo». Prevê ainda o art. 724.º, n.º 1, al. e) do mesmo diploma que no requerimento executivo o exequente expõe sucintamente os factos que fundamentam o pedido, quando não constem do título executivo.

    Ou seja, decorre da letra da lei que a causa de pedir engloba factos que podem constar do título e/ou figurar em articulado autónomo, independentemente da qualidade do título apresentado.

    Por outro lado, é também isso que resulta da leitura compreensiva do regime da execução: como bem nota RUI PINTO, Manual da Execução e Despejo, Coimbra: Coimbra Editora, 2013 p. 146, «a execução tem causa de pedir e pedido (…) e justamente no plano procedimental, ela assenta sempre num acto postulativo, portanto, dirigido ao Estado: a realização coactiva de uma prestação. Como tal conhece, como todo o acto postulativo, a sua própria possibilidade de procedência ou de improcedência do pedido. Todavia, essa procedência é instrumental da procedência declarativa, efectiva ou presumida por título extrajudicial. Ela, por si, nada certifica, antes impõe. Essa instrumentalidade é assegurada pelo título executivo» (sublinhado nosso).

    Mais, acrescenta que não podemos reconduzir o título e a obrigação a pressupostos processuais; antes, como refere, a p. 147, «a exigência de título ou de certeza da liquidez da obrigação constitui claramente um requisito de tipo diferente dos pressupostos processuais – v.g. diferentes da competência ou da personalidade, capacidade ou legitimidade. Estes, como no processo declarativo, são condições de conhecimento do pedido executivo», respeitando à relação processual. Por seu turno, «o título e a obrigação não são pressupostos processuais, pois não respeitam à relação processual. O título não determina se o tribunal pode conhecer do pedido do credor autor; pelo contrário, o título e a obrigação respeitam à relação material e determinam se o tribunal pode ou não satisfazer o pedido do credor de realização coactiva da prestação, ou seja, a procedência do pedido executivo» (sublinhado nosso), constituindo por isso o título uma condição da acção.

    Ou seja, para cada pedido típico de uma acção executiva (realização coactiva de uma prestação) constitui causa de pedir a relação material...

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