Acórdão nº 1866/21.6T8FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 30 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA ADELAIDE DOMINGOS
Data da Resolução30 de Junho de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal da Relação de ÉVORA I – RELATÓRIO Ação Declarativa de condenação, sob a forma de processo comum.

Autora I.A.

Réus T.S. (1.º) L.S.

(2.º) M.S.

(3.ª) Pedido Condenação solidária dos Réus a pagar à Autora a quantia de €132.500,00, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação até efetivo e integral pagamento.

Causa de pedir A autora e o réu T.S. casaram-se em 23-04-1983, sob o regime supletivo da comunhão de adquiridos, e divorciaram-se por sentença de 31-05-2010, transitada em julgado em 05-07-2010.

Em 05-12-1990, através de escritura pública de doação, H. declarou que, por conta quota disponível e com reserva de usufruto doava a T.S. e mulher I.S., e a L.S. e mulher M.S., em comum e em partes iguais, um prédio misto, no Sítio de (…), freguesia de (…), concelho de (…), descrito na Conservatória de Registo Predial de (…) sob o n.º (…), o que estes aceitaram.

Através de escritura pública de compra e venda realizada em 21-05-2009, L.S. e T.S., e respetivas mulheres, que deram o seu consentimento, declararam vender à sociedade VERTIGEM – IMÓVEIS E PARTICIPAÇÕES, S.A.

o imóvel em causa, pelo preço global de €530.000,00, preço recebido pelos Réus.

A Autora, como comproprietária do prédio, tem direito a receber uma parte do preço (€132.500,00), que não recebeu, incorrendo os Réus na obrigação de procederam ao respetivo pagamento.

Contestação Do Réu T.S., alegando, em suma, que a Autora foi considerada principal culpada do divórcio invocando os efeitos do artigo 1791.º do Código Civil na redação então em vigor, e, de qualquer modo, o valor do bem reverteu para o casal para pagar dívidas de ambos; a vontade do doador foi doar o imóvel apenas aos 1.º e 2.º Réus; o bem foi vendido e a Autora e a 3.ª Ré deram o seu consentimento; após o decretamento do divórcio, foi instaurado processo de inventário para partilha dos bens comuns do casal (n.º 875/08.5TMFAR-C, que correu termos no Tribunal de Família e Menores de Faro) no qual a ora Autora, atento o valor que deu à causa, reconheceu não existir o direito que agora se arroga.

Concluiu pela improcedência da ação e a condenação da Autora como litigante de má-fé.

Dos Réus L.S. e M.S. que apresentaram defesa por exceção e por impugnação.

Por exceção invocaram que não celebraram com a Autora nem a doação, nem a compra e venda, pelo que nenhuma responsabilidade lhes pode ser assacada.

Por impugnação, defenderam a improcedência da ação.

Também pediram a condenação da Autora como litigante de má-fé.

Contraditório Em relação às exceções e incidentes de litigância de má-fé.

Audiência prévia Foi proferido despacho a convidar as partes a pronunciarem-se sobre a possibilidade de se conhecer do mérito da ação, em face do decidido nos autos de inventário/partilha que correram os seus termos sob o n.º 875/08.5TMFAR, do 2.º Juízo do Tribunal da Família e Menores de Faro, dispensando-se a realização da audiência prévia.

Atenta a oposição da Autora, realizou-se audiência prévia, no âmbito da qual, a mesma pugnou pela procedência da ação, mantendo a posição já expressa nos seus articulados, discutindo-se a probabilidade da ação vir a ser julgada improcedente.

Saneador-Sentença Julgou a causa nos seguintes termos: «Em conformidade com o exposto, decido considerar procedente a exceção de autoridade de caso julgado e manifesta improcedência da ação e, por conseguinte, decido absolver todos os réus dos pedidos.

Custos dos incidentes de má fé, com custas a cargo da autora, no valor de 3 Uc´s e indemnização a cada parte (1.º réu e 2ºs réus), no valor de € 1 000,00 (mil euros) para cada um.

Custas devidas, na ação, pela autora, por lhe ter dado causa e ter ficado vencida (artigo 527.º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil), sem prejuízo do benefício de apoio judiciário que lhe foi concedido.» Recurso Apelou a Autora pugnando pela revogação da sentença decorrente da improcedência da exceção de autoridade de caso julgado sem o prosseguimento dos autos, e, sem prescindir, defendeu que nos autos não existem elementos suficientes para ser proferida decisão de mérito, devendo os autos prosseguir, e ainda sem prescindir, que seja julgada improcedente a condenação da Autora como litigância de má-fé, apresentando as seguintes CONCLUSÕES: «(Da excepção de autoridade de caso julgado) 1. Na presente acção encontram-se provados os seguintes factos: 2. Através de escritura pública de doação celebrada no Cartório Notarial de (…) no dia 5 de dezembro de 1990, H. declarou que, por conta quota disponível e com reserva de usufruto, doava a T.S. e mulher I.S. e L.S. e mulher M.S., em comum e em partes iguais, um prédio misto, no Sítio de (…), freguesia de (…), concelho de (…), descrito na Conservatória de Registo Predial de (…) sob o n.º (…), o que estes aceitaram.

  1. Pela Ap. 10 de 21 de dezembro de 1990 a doação do referido imóvel foi registada a favor de L.S., no estado de casado com M.S. e de T.S., no estado de casado com I.S..

  2. Através de escritura pública de compra e venda realizada no cartório Notarial de (…), datada de 21 de maio de 2009, L.S. e T.S. declararam vender à sociedade “VERTIGEM – IMÓVEIS E PARTICIPAÇÕES, S.A.” o imóvel em causa pelo preço global de €530.000,00 (quinhentos e trinta mil euros), por eles recebido e que sobre o imóvel incide uma hipoteca cujo cancelamento se encontra assegurado.

  3. Pela Apresentação 838, de 15 de junho de 2009 foi retificado o registo acima referido (Ap. 10) no sentido de nele passar a constar a aquisição do imóvel a favor de I.S. e M.S..

  4. A Autora peticionou que os Réus fossem condenados, de forma solidária, a pagar-lhe a quantia de 132.500,00€ (cento e trinta e dois mil e quinhentos euros), correspondente à parte do preço que a mesma entende ter direito, na qualidade de comproprietária do prédio acima referido.

  5. O tribunal a quo entendeu existir autoridade de caso julgado formado em anterior decisão judicial proferida nos autos de inventário, que correram termos no 2.º Juízo do Tribunal de Família e Menores de Faro, sob o n.º 875/08.5TMFAR-C, em que foram intervenientes a Autora e o Réu T.S..

  6. Na sentença proferida no Apenso C dos autos de inventário, o único facto provado relativamente a um imóvel foi o seguinte: “3. O imóvel doado ao cônjuge marido ocorreu por escritura de doação celebrada em 5.12.1990.” 5. Dos factos provados na sentença proferida naqueles autos de inventário nada consta sobre: identificação do imóvel; intervenientes na escritura; cartório em que foi celebrada; a favor de quem foi registado o imóvel; se houve averbamentos e/ou rectificações do registo; se o imóvel foi vendido posteriormente, a quem, e por qual preço; quem recebeu o preço.

  7. Por outro lado, e com relevo para a decisão da causa, ficou provado no presente processo que “do Av. – Ap. 838, de 15 de junho de 2009 foi retificado o registo referido em 3. (Ap. 10) no sentido de nele passar a constar a aquisição do imóvel a favor de I.S. e M.S.”.

  8. Tendo em conta a extensão e importância dos factos acima referidos, e considerando que o Tribunal de Família e Menores de Faro não se pronunciou sobre os mesmos, nem sequer os analisou, entende a Recorrente que não se pode considerar que a questão em apreço nos presentes autos já tenha sido devidamente analisada por aquele tribunal.

    Acresce que, 8. Na parte do “Dispositivo” da sentença, que corresponde à decisão propriamente dita, o Tribunal de Família nada decide no que respeita à natureza daquele bem.

  9. O Tribunal de Família limita-se a fazer uma análise perfunctória sobre o assunto, e, com base no único facto que considerou provado naqueles autos a esse respeito, decide não relacionar como bem comum o produto da referida venda.

  10. A única decisão efectivamente tomada sobre o assunto foi a não inserção do produto da venda na relação de bens comuns – e já não uma decisão definitiva quanto à natureza do bem.

  11. A decisão do Tribunal de Família, no sentido de não incluir o produto da venda na relação dos bens comuns, não impediu que as partes, mais tarde, pudessem recorrer aos meios comuns para discutir a natureza do bem, exercendo os direitos de que entendessem ser titulares – como pretende a Autora no presente processo.

  12. Assim, ao decidir como decidiu, o tribunal a quo violou o n.º 1 e n.º 2 do artigo 580.º do Código de Processo Civil.

    (Da manifesta improcedência da acção) 13. Para além da autoridade de caso julgado, o Tribunal a quo considerou que o pedido da Autora se encontra afectado pela manifesta improcedência da sua pretensão.

  13. Quanto ao Réu T.S., seu ex-marido, a Recorrente não se pode conformar com o entendimento do Tribunal.

  14. Em face dos factos provados no presente processo, a parte da Autora no produto da venda do imóvel seria um bem próprio seu, e não um bem comum – nos termos conjugados da alínea b), do n.º 1 do artigo 1722.º, e da alínea b), do artigo 1723.º do Código Civil.

  15. Ainda que tenha ficado demonstrado que o Réu...

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