Acórdão nº 20/21.19EFAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 21 de Junho de 2022
Magistrado Responsável | ANA BACELAR |
Data da Resolução | 21 de Junho de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação do Évora I.
RELATÓRIO No processo de inquérito que, com o n.º 20/21.1PEFAR, correu termos pela 1.ª Secção de Faro do Departamento de Investigação e Ação Penal dos Serviços do Ministério Público de Faro, o Ministério Público acusou AA pela prática, em autoria material, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, previsto e punível pelo artigo 3.º, n.ºs 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro.
O Arguido requereu a abertura da instrução, com vista à prolação de decisão instrutória de não pronúncia.
E distribuído que foi o processo – ao Juízo de Instrução Criminal de Faro [Juiz 1] da Comarca de Faro –, por decisão judicial datada de 4 de março de 2022, foi rejeitado o requerimento para abertura de instrução.
Inconformado com esta decisão, o Arguido dela interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões [transcrição]: «1. Por despacho datado de 04-03-2022 o tribunal “a quo” rejeitou o requerimento de abertura de instrução apresentado pelo arguido, por o mesmo não respeitar as exigências de forma legalmente exigidas.
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O Arguido ora Recorrente não se conforma com o despacho de que ora se recorre porquanto o arguido ora recorrente apresentou em tempo o Requerimento de abertura de Instrução, assinado digitalmente, isto é com a assinatura digital aposta e com a inscrição de que o documento se encontrava assinado digitalmente e remeteu o RAI via correio eletrónico dirigido ao Ministério Público – DIAP de Faro.
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O correio eletrónico foi enviado no dia 02/02/2022 pelas 19:57horas, consta da comunicação enviada o dia e hora da expedição, sendo certo que o RAI foi enviado do e-mail ..., e-mail esse pertencente à sociedade de Advogados para a qual labora a mandatária subscritora e que se encontra devidamente registado como e-mail oficial no portal da Ordem dos Advogados.
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Ao que acresce que o próprio e-mail contém o timbre da sociedade de Advogados, encontra-se devidamente identificado e assinado pelo mandatário subscritor e está ele próprio autenticado digitalmente.
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Por outro lado, o despacho recorrido falsamente faz referência a que não foi carreado para os autos o original no prazo legalmente concedido de 10 dias, o que não corresponde à verdade dado que no dia seguinte 03-03-2022 foi endereçado ao Tribunal o original do Requerimento de Abertura de Instrução, o qual foi subscrito e remetido pela mandatária subscritora.
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Andou mal o tribunal “a quo” ao considerar que o envio do original do RAI remetido por correio eletrónico trata-se de uma repetição do ato sem as garantias devidas pois sempre se dirá que o RAI foi legítima e tempestivamente apresentado, tendo sido respeitado todo o procedimento e bem assim todos os requisitos legais.
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O requerimento de abertura de instrução foi remetido pelo endereço oficial, o qual inclusive está registado na plataforma da Ordem dos Advogados (OA) e por estes certificado, a mandatária subscritora usou a assinatura digital facultada pela Ordem dos Advogados – certificado multicert, a qual encontra-se instalada no seu computador e que lhe permite a utilização para assinatura de documentos digitais.
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Inclusive é o Requerimento consta de papel timbrado de Advogado, com toda a identificação, os contactos e o número de cédula profissional.
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Não existindo qualquer fundamento para que o tribunal “a quo” tenha decidido que o RAI não respeita as exigências de forma legalmente exigidas, não carecendo o requerimento apresentado de assinatura digital ou qualquer outra.
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A Assinatura digital é utilizada meramente para substituir a Assinatura autografa do Advogado subscritor.
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Não existe qualquer preterição de regras processuais, nem existe qualquer irregularidade.
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Assim como não foi violado o disposto na Portaria 624/2004 de 16 de junho, nem a ratio da criação do mesmo, dúvidas não existindo acerca da genuinidade do RAI, da autenticidade e da tempestividade do mesmo.
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O tribunal “a quo” ao entender que a assinatura digital e o envio de peças processuais de e-mail certificado pela Ordem dos Advogados não respeitam as exigências de forma legalmente exigidas viola o disposto no artigo 3.º da Portaria 642/2004 de 16 de junho.
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Estabelece o artigo 3.º da Portaria 642/2004 de 16 de junho que o envio de peças processuais por correio eletrónico equivale à remessa por via postal registada, nos termos do n.º 3 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 290-D/99, de 2 de agosto, com a redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 62/2003, de 3 de abril, bastando para tal a aposição de assinatura eletrónica avançada.
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Ao que acresce que os originais do RAI enviado por correio eletrónico foram remetidos para o tribunal por correio registado, motivo pelo qual somos do entendimento que pelo mandatário judicial foi garantida a integralidade, autenticidade e inviolabilidade a que obriga o n.º 2 do artigo 132.º do CPC.
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O Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça n.º 3/2014 veio admitir a remessa a juízo de peças processuais através de correio eletrónico.
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O artigo 144.º do Código de Processo Civil elenca os casos em que devem ser apresentados a juízo os respetivos originais dos documentos submetidos via eletrónica.
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Não ocorreu in casu, pela fundamentação do despacho, nenhum destes pressupostos.
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E mesmo que se entenda que a assinatura eletrónica aposta no RAI não é válida sempre se dirá que se trata de uma irregularidade, facilmente sanável, tendo inclusive o mandatário posteriormente remetido o RAI assinado manualmente.
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Cabendo ao tribunal “a quo” ao abrigo do princípio da adequação...
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