Acórdão nº 949/22.0T8SLV.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 13 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelJOSÉ LÚCIO
Data da Resolução13 de Outubro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

ACORDAM OS JUÍZES DA 1ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA: I – RELATÓRIO*O requerente AA, residente na Rua ...

, instaurou a presente providência cautelar comum contra BB e CC, residentes no sítio do ....

Alega o Requerente, em breve síntese, que é dono de um prédio misto, destinado a habitação, sito em ...

, concelho ...

, o qual os requeridos estão a ocupar, em parte na sequência de um contrato de comodato, que o requerente entretanto já resolveu, e noutra parte por ocupação abusiva.

Acontece que os requeridos recusam restituir-lhe o prédio, apesar de interpelados, e para além de terem nele já provocado variados danos, que o requerente enuncia, como os relativos a obras ilegais e não autorizadas, e degradações várias, colocam sérios riscos de provocarem outros danos, uma vez que instalaram no prédio muitos animais, nomeadamente numa pocilga, galinheiros e cavalariças, que criam riscos sanitários, para a saúde pública, e são adequados à contaminação da água do depósito e furo existentes na parte urbana e rústica do prédio, com o consequente prejuízo.

Conclui o requerente que existe perigo grave e iminente de contaminação, quer do solo, quer da água do furo existente na parte rústica do prédio em causa, e com estes fundamentos, melhor descritos no petitório inicial, juntamente com o restante alegado, pede, além do mais, que os requeridos sejam condenados a devolver-lhe o imóvel, de forma a evitar que tais prejuízos se consumem.

Em face do requerimento inicial, considerou o julgador da primeira instância que estavam reunidos “todos os elementos para proferir decisão de imediato, sem necessidade de citação dos Requeridos e sem necessidade de produção de prova”, e proferiu de imediato despacho que indeferiu liminarmente o procedimento cautelar.

Não se conformando, o requerente interpôs o presente recurso de apelação, o qual foi admitido, subindo então os autos a este tribunal de recurso.

Nesta instância, pela primitiva Relatora foi determinada a baixa dos autos para decisão sobre a dispensa do contraditório prévio, que vinha requerido, e a consequente decisão sobre a citação ou não dos requeridos.

Foi decidido não dispensar o contraditório, e os requeridos foram citados para os termos do procedimento e do recurso.

Apresentaram então oposição ao procedimento, defendendo a sua improcedência, e de igual modo apresentaram contra-alegações em resposta ao recurso.

*II – O RECURSO Vejamos então o recurso de apelação interposto pelo requerente, através das suas conclusões, que transcrevemos apesar da sua desnecessária extensão: A) - Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pela Mª Juiz a quo, que indeferiu liminarmente a providência cautelar comum requerida pelo ora Recorrente, por considerar o pedido manifestamente improcedente, por considerar que não estão verificados os pressupostos para o seu decretamento, invocando o Art. 380º n.º 1 e 2 e 381º n.º 2 do Código de Processo Civil e, ainda o Art. 362 n.º 1 e 2 e Art. 368º n.º1 do referido diploma legal.

  1. - Considera o Tribunal a quo que, atento o teor dos fundamentos de facto invocados pelo Requerente, os autos contém, manifestamente, todos os elementos que permitem proferir decisão, sem necessidade de citação dos Requeridos e, de produção de prova.

  2. - Decidiu o Tribunal a quo que, no caso concreto se encontra preenchido um dos requisitos para o decretamento da providência requerida - a probabilidade da existência do direito -, mas que não se verifica o requisito legal consubstanciado no fundado receio de que a conduta dos Recorridos, cause lesão grave e dificilmente reparável ao direito do Recorrente, incompatível com a demora na resolução definitiva do litígio causa.

  3. - Mais considera o Tribunal a quo que, ainda que “…se concretize o hipotético prejuízo patrimonial identificado pelo Requerente tal será susceptível de tutela pela via típica da responsabilidade contratual, não diferindo o “pedaço de vida”, alegado pelo Recorrente de tantas outras situações que reclamam a aplicação dos meios legais de defesa pela normal via da acção declarativa comum.”.

  4. - Não pode o Recorrente deixar de discordar da sentença proferida, porquanto, requereu o presente procedimento cautelar contra os Recorridos, peticionando que: a) Seja declarado o incumprimento contratual culposo dos Requeridos; b) Reconhecida e declarada a resolução contratual operada pela notificação do Requerente aos Requeridos e, a ilicitude da ocupação do mesmo pelos Requeridos, em virtude da resolução contratual, por incumprimento culposo dos Requeridos; c) Sejam os Requeridos condenados a reconhecer a resolução contratual e, que a mesma é eficaz e, que operou os seus efeitos em 18.01.2022 e, em consequência serem condenados a proceder à imediata desocupação da parte do prédio objecto do contrato de comodato e, a entregá-la livre e, devoluta de pessoas, animais e, bens; d) Seja declarada a ilicitude da ocupação, pelos Requeridos, das partes urbanas/anexos do prédio identificado no ponto 1, que não fazem parte do contrato de comodato e, em consequência serem condenados a proceder à sua imediata desocupação e, a entregá-las livres e, devolutas de pessoas, animais e, bens; e) Seja declarada a ilicitude da ocupação, pelos Requeridos, da parte rústica do prédio identificado no ponto 1, e, em consequência serem condenados a entregá-la livre e, devoluta de pessoas, animais e, bens e, a remover a rede de vedação; f) Sejam os Requeridos, solidariamente, condenados no pagamento ao Requerente na quantia diária de € 250,00 (duzentos e cinquenta euros), a título de sanção compulsória por cada dia de atraso na desocupação do prédio misto em causa com efeitos desde 16.02.2022, até efectiva desocupação e entrega.

F)- Para tanto alegou, em síntese, que: a)- é dono e legitimo possuidor do prédio misto, destinado a habitação, sito em ... - ..., concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... ...17 e, inscrito na matriz predial, a parte urbana sob o Art. ...94º e, a parte rústica sob o Art. ...49º, da Secção ...; - DOC 1, 2 e 3 b)- no dia 15 de Janeiro de 2016, o Requerente celebrou com os Requeridos, um contrato de comodato, pelo período de dois anos, renovável por iguais períodos, se não for denunciado por qualquer das partes, sendo que passados 10 (dez anos), as partes acordaram que os Requeridos passariam a pagar uma renda mensal; - DOC 4 c)- o referido contrato de comodato foi celebrado tendo por objecto apenas a parte urbana - Art. 1549º -, destinada a habitação, do prédio misto supra melhor identificado, à data propriedade do Requerente e, de sua mãe, Sr.ª DD e, actualmente apenas propriedade do Requerente, por partilha de herança; - DOC 1, 2, 3 e Cláusula Segunda do DOC 4 d)- nos termos do disposto na Cláusula Segunda do contrato de Comodato, o Requerente cedeu, gratuitamente, aos Requeridos, a parte urbana do referido prédio, para da mesma se servirem, única e exclusivamente, para fins habitacionais; e)- nos termos do disposto na Cláusula Terceira do contrato de Comodato, os Requeridos constituíram-se na obrigação de executar, na parte do imóvel cedida em comodato, os melhoramentos e benfeitorias necessários para a sua conservação, de modo a manter as condições de habitabilidade, nomeada e especificamente, a proceder ao arranjo do telhado e, tudo o que mais necessário for necessário para a conservação do mesmo; - Cláusula Segunda do DOC 4 f)- nos termos do disposto na Cláusula Quarta do contrato de Comodato, ficou acordado que, todas as despesas inerentes à utilização, manutenção e investimentos no prédio objecto do mesmo, são da responsabilidade dos Requeridos e, que todas as melhorias efectuadas ficam a fazer parte integrante do mesmo, não lhes assistindo qualquer direito de indemnização pelas mesmas; g)- sucede que, até à presente data, os Requeridos não realizaram no imóvel quaisquer obras de conservação, nem quaisquer benfeitorias, de modo a manter as condições de habitabilidade do mesmo, designadamente não procederam ao arranjo do telhado; muito pelo contrário; h)- mediante recente deslocação ao local, o Requerente constatou que o imóvel não está cuidado nem conservado, mas sim bastante deteriorado, em virtude da utilização descuidada, negligente, imprudente e, ilegal que Requeridos têm vindo a fazer do mesmo, uma vez que não fizeram quaisquer obras de conservação e/ou beneficiação das condições de habitabilidade do imóvel; i)- o Requerente constatou que: • na parte de trás do prédio, no seu interior, é visível a existência de lixo e entulho, até ao telhado; • o telhado está em risco de queda iminente; • a pintura exterior do imóvel encontra-se totalmente deteriorada; • à volta do prédio existe lixo variado, por todo o lado, bem como vários objectos espalhados e amontoados pelo chão, quer dentro, quer fora do prédio, num estado de total desordem e, falta de cuidado, higiene e limpeza e, de falta de manutenção e de conservação; • encontram-se três cães presos por correntes, sem quaisquer condições, estando tudo sujo à sua volta, o que levanta sérias questões sanitárias; • na parte da frente do prédio e, mesmo ao lado do depósito de água aí existente, os Requeridos instalaram uma pocilga, a céu aberto e, em violação das mais elementares normas legais, onde fazem criação de suínos! • os Requeridos executaram obras de construção ilegais e, não consentidas pelo Requerente, na fachada lateral do prédio, consubstanciadas no fecho de uma porta para o exterior e, eliminação da escada em alvenaria e, na colocação de um tudo e chaminé, em alumínio, nessa mesma fachada; • substituíram a porta de entrada do imóvel, que era de madeira, por uma porta de alumínio; - DOC 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15 16 j)- o local está totalmente imundo, nauseabundo, descuidado e negligenciado o que, além de contribuir para a deterioração do prédio, desvaloriza-o e, levanta sérias questões sanitárias e de saúde pública; existe o sério risco de contaminação da água do depósito...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT