Acórdão nº 2133/18.0PTM-D.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 13 de Outubro de 2022
Magistrado Responsável | MARIA ADELAIDE DOMINGOS |
Data da Resolução | 13 de Outubro de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam na 1.ª Secção do Tribunal da Relação de ÉVORA I – RELATÓRIO Em 15-09-2018, a AIG EUROPE LIMITED – SUCURSAL EM PORTUGAL (AIG), invocando ser uma sucursal de sociedade comercial que tem por objeto, designadamente, a atividade de seguro e resseguro nacional e internacional e respetivas atividades conexas e/ou complementares das de seguro e/ou resseguro, intentou ação declarativa condenatória, com processo comum, contra os seguintes Réus: 1.º - PORTUGAL RETAIL EUROPARK FUND (PREF), fundo fechado de investimento imobiliário, proprietário do empreendimento comercial e respetivas instalações do PORTIMÃO RETAIL PARK (complexo comercial destinado exclusivamente ao comércio, composto por diversos espaços comerciais), sendo o PREF administrado, gerido e representado pela Fund Box – Sociedade Gestora de Fundos de Investimento Imobiliário, S.A.; 2.ª - FUND BOX – SOCIEDADE GESTORA DE FUNDOS DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO, S.A. (FUNDBOX) que, na qualidade supra referida, era a gestora e administradora das instalações comerciais do PORTIMÃO RETAIL PARK, providenciando pelo seu bom funcionamento, segurança, vigilância e cumprimento das respetivas normas técnicas e legais aplicáveis a estes estabelecimentos/complexos comerciais; 3.ª - CENTRAL DEBORLA – COMÉRCIO DE UTILIDADES, S.A. (DEBORLA), sociedade comercial, arrendatária de um dos espaços, sendo um dos lojistas do referido PORTIMÃO RETAIL PARK, e onde terá ocorrido o ponto de ignição do incêndio que destruiu aquele empreendimento comercial.
Pediu a condenação dos Réus nos seguintes termos: «
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Ser a A. declarada sub-rogada, na medida dos montantes por si pagos e indicados no presente articulado, nos direitos do CONTINENTE contra as RR.; b) Serem as RR. condenadas a pagar à A. a quantia de €13.033.750,62 (treze milhões, trinta e três mil, setecentos e cinquenta euros e sessenta e dois cêntimos) paga ao CONTINENTE, por conta dos danos e prejuízos indicados no presente articulado, no âmbito dos contratos de seguro titulados pela apólice ...25 identificada no presente articulado; c) Serem as RR. condenadas a pagar à A. a quantia que se vier a liquidar ulteriormente (v. art. 569º do C. Civil; cfr. arts. 378º/2, 471º/a) e b) e 661º/2 do CPC) correspondente às despesas e honorários devidos com o presente processo judicial; d) Serem as RR. condenadas a pagar à A. os juros legais vencidos e vincendos relativos às quantias peticionadas nas alíneas anteriores, desde a citação até efetivo e integral pagamento, acrescidos, a partir do trânsito em julgado da sentença de condenação que vier a ser proferida, de juros à taxa anual de 5%, nos termos do disposto no art. 829º-A/4 do Código Civil; e e) Serem as RR. condenadas a pagar à A. os montantes relativos às custas processuais e procuradoria relativas aos presentes autos, com as legais consequências.» Em síntese apertada, alegou como causa de pedir factos relacionados com a responsabilidade civil das Rés decorrentes dos danos causados ao CONTINENTE (lojista do PORTIMÃO RETAIL PARK), na sequência de um incêndio ocorrido naquele empreendimento comercial, no dia 23-09-2012, pretendendo a Autora ser reembolsada das quantias peticionadas por ter satisfeito a indemnização paga ao CONTINENTE no âmbito do contrato de seguro que invoca.
Os Réus contestaram por exceção e por impugnação.
No que ora releva para este recurso, a 2.ª Ré FUNDBOX, ora recorrente, excecionou a falta de personalidade judiciária do 1.º Réu PREF, por o mesmo já se encontrar extinto à data da propositura da presente ação e excecionou, ainda, a sua legitimidade passiva por ter sido demandada na qualidade de sociedade gestora e representante do PREF, sendo que, com a extinção deste, no seu entender extinguiram-se, igualmente, os seus deveres de gestão e de representação do PREF, incluindo os deveres e poderes de representação do mesmo em juízo.
Seguiram-se os demais articulados e respetiva tramitação, bem como vários outros requerimentos das partes, tendo sido realizada Audiência Prévia no dia 17-01-2022, encontrando-se os Ilustres Mandatários das partes à distância, via Webex, na qual foi proferido despacho saneador que, no segmento relevante para o presente recurso, decidiu do seguinte modo: «1.3. Da falta de personalidade judiciária de Portugal Retail (PREF) e da falta de legitimidade da “Fund Box” enquanto representante do PREF A “Fund Box”, assumindo também a defesa da “PREF”, veio arguir a falta de personalidade judiciária do Fundo, já extinto à data da propositura da ação. A personalidade judiciária constitui um pressuposto processual cuja falta constitui uma exceção dilatória que, a proceder, obsta à apreciação do mérito da causa e conduz à absolvição dos réus da instância – arts. 576.º a 578.º e 278.º, n.º 1, al. d), do Código de Processo Civil.- Considerando que:- - O “PREF” está extinto;- - A “Fundbox” era quem o representava,- Deve assumir aqui a posição passiva de demandada, sob pena de qualquer responsabilidade vir a ser apagada com a extinção jurídica de uma instituição, com repercussão ao nível da confiança e na mais elementar justiça.- Não há dúvida de que a “Fund Box” é demandada na qualidade de representante do “Fundo Fechado de Investimento Imobiliário Portugal Retail Europark Fund”.- Os Fundos de Investimento Imobiliário constituem patrimónios autónomos, pertencentes, no regime especial de comunhão regulado pelo presente diploma, a uma pluralidade de pessoas singulares ou coletivas designadas «participantes» (…) que não respondem, em caso algum, pelas dívidas destes ou das entidades que, nos termos da lei, asseguram a sua gestão (art. 2.º, n.º 2, do Regime jurídico dos organismos de investimento coletivo em valores mobiliários sob a forma societária e dos fundos de investimento imobiliário sob a forma societária, na redação dada pela Lei n.º 71/2010, de 18 de junho), e a administração dos fundos de investimento imobiliário é exercida por uma sociedade gestora de fundos de investimento imobiliário, adiante designada por sociedade gestora, com sede principal e efetiva da administração em Portugal – art. 6.º, n.º 1, do mesmo diploma. Os Fundos não têm personalidade jurídica, capacidade jurídica ou capacidade judiciária, isto é a capacidade de estar por si só em juízo, pois que, como se disse, são representados por sociedades gestoras, apesar de lhes ser reconhecida personalidade judiciária – arts. 11.º, a contrario sensu, do Código de Processo Civil, e art. 12.º, al. a), do mesmo código; neste sentido o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa (Rel. Des. M. Graça Araújo), de 7 de maio de 2013, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/f95c51715d6a57ae80257c85004575a6?OpenDocument- Assim, julgo procedente a exceção, mantendo-se porém a “Fund Box” em juízo, na sobredita qualidade de representante do réu “Fundo Fechado de Investimento Imobiliário Portugal Retail Europark Fund” já extinto. - Comunique à CMVM a pendência da ação.-» A 2.ª Ré FUNDBOX interpôs recurso deste despacho apresentando as seguintes CONCLUSÕES: A. O presente recurso vem interposto da decisão que, tendo julgado procedente a exceção de falta de personalidade judiciária do PREF, determinou, no entanto, a manutenção da FundBox nos autos na “qualidade de representante do réu [PREF] (…) já extinto”.
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Tendo em conta uma parte da fundamentação invocada pelo Tribunal a quo – mais especificamente, a referência a que a FundBox “[d]eve assumir aqui a posição passiva de demandada, sob pena de qualquer responsabilidade vir a ser apagada com a extinção jurídica de uma instituição, com repercussão ao nível da confiança e na mais elementar justiça” – o Despacho Saneador ora recorrido poderia ainda ser lido no sentido de o Tribunal a quo ter determinado a substituição do PREF pela FundBox, o que implicaria que, no plano processual, a FundBox passasse a assumir ela própria a posição de parte passiva (sendo ela própria a ré e não representante do réu), e que, no plano substantivo, a FundBox, por ter sido sua representante, sucedesse ao PREF, passando o seu próprio património a responder pelas responsabilidades que pudessem ser assacadas àquele.
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Seja qual for a leitura do Despacho Saneador ora recorrido, a decisão do Tribunal a quo, para além de padecer de nulidades que a FundBox vem arguir conforme os n.ºs 1 e 4 do artigo 615.º do CPC, é errada, na medida em que não é admitida (nem possível) a representação de uma entidade que não é parte da ação e, para o caso de o Despacho Saneador ser lido no sentido de determinar a substituição do PREF pela FundBox – o que apenas por cautela e dever de patrocínio se equacional – não existe norma que determine ou permita que o património do representante passe a responder por obrigações da representada.
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O presente recurso tem, assim, por objeto a decisão do Tribunal a quo que, tendo absolvido PREF da instância, manteve, porém a FundBox nos autos a representar aquele, i.e., “na sobredita qualidade de representante do réu (…) já extinto”.
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Cautelarmente, para o caso de se considerar ser esse o sentido do Despacho Saneador recorrido – o que apenas por mera cautela e dever de patrocínio se equaciona – o presente recurso tem subsidiariamente por objeto a decisão do Tribunal a quo que, tendo absolvido o PREF da instância, determinou simultaneamente que a FundBox, enquanto representante do PREF, substitua aquele Fundo na posição de demandado na presente ação.
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Sendo, portanto, e em qualquer caso, o presente recurso interposto nos termos e ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 644.º do CPC in fine.
Nulidade do Despacho Saneador G. O Despacho Saneador é nulo, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, por omissão de pronúncia quanto a duas questões que foram suscitadas nos autos e que, no entanto, não foram apreciadas pelo Tribunal a quo.
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Em primeiro lugar, o Tribunal a quo não se pronunciou sobre a questão – suscitada e debatida entre as partes nos requerimentos apresentados pela Recorrida nos dias...
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