Acórdão nº 550/21.5T8PTG.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 27 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelPAULA DO PAÇO
Data da Resolução27 de Outubro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1] I. Relatório Na presente ação declarativa emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma de processo comum, que H… instaurou contra Transportes Amadeu Ramos Unipessoal, Lda.

, foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo: « Pelo exposto, e nos termos das disposições legais supra mencionadas, o tribunal julga a ação totalmente procedente por provada e, em consequência, condena o Réu Transportes Amadeu Ramos, Unipessoal, Ldª: a) no pagamento ao Autor da quantia de 34.533,85 € (trinta e quatro mil, quinhentos e trinta e três euros e oitenta e cinco cêntimos), sendo 30.552,18 € (trinta mil quinhentos e cinquenta e dois euros e dezoito cêntimos) a título de capital, e 3.981,67 € (três mil novecentos e oitenta e um mil e sessenta e sete cêntimos) a título de juros de mora vencidos.

  1. No pagamento ao Autor dos juros vincendos até efetivo e integral pagamento à taxa legal em vigor.

  2. Nas custas do processo.».

    Não se conformando com o decidido, veio a Ré interpor recurso de apelação para esta Relação, rematando as suas alegações com as conclusões que, seguidamente, se transcrevem: «1. Tendo o A. sido admitido ao serviço da R. no ano de 2014, o regime regra em matéria de descanso semanal era o constante da Cláusula 20ª, do CCT publicado no BTE 16/1982 e que se manteve na Cláusula 27ª do CCT publicado no BTE E 34/2018, e no BTE 45/2019, isto é, o dia de descanso semanal obrigatório era ao Domingo e o dia de descanso complementar era no dia imediatamente anterior ( Sábado ), ou imediatamente seguinte ( Segunda – Feira ); 2. Ou seja, muito embora o A. na petição inicial tenha mencionado que o dia de descanso complementar era ao Sábado e a R. tenha aceite esse fato na contestação, essa situação tinha que ser enquadrada no regime regra previsto nos CCT citados, isto é, nada impedia que as partes no âmbito do contrato individual de trabalho estabelecessem caso a caso se o dia de descanso complementar iria ser gozado ao Sábado ou na Segunda – feira seguinte; 3. Deste modo, muito embora as partes tivessem aceite que o regime regra era o do gozo do dia de descanso complementar ao Sábado, tal não impedia que fosse gozado à Segunda – feira, como estava aliás previsto no contrato de trabalho celebrado entre as partes; 4. Na verdade, no caso dos autos, as partes celebraram um contrato de trabalho ( Ver Doc. 1 oferecido com a contestação ) onde, na Cláusula 14ª, se veio a estabelecer que a marcação dos dois dias de descanso semanal era feita pelo empregador com o respeito do que se mostrasse em vigor na legislação aplicável e na Regulamentação Coletiva em vigor, e, como consta dessa mesma Cláusula o horário de trabalho do A. era um horário flexível fixado pelo empregador desde que fossem respeitados os limites legais; 5. Assim, o fato de as partes estarem de acordo em que, normalmente o dia de descanso complementar era ao Sábado, não impedia que o mesmo tivesse sido modificado de acordo com as exigências do trabalho para a Segunda – feira; 6. O A., na petição inicial procede à indicação de 29 dias em que o A. Alegadamente prestara o seu trabalho aos Sábados, Domingos e Feriados, fatos esses que a douta sentença deu como provados sob o nº 15; 7. Sobre esta matéria mal andou a sentença recorrida em dois aspetos, quais sejam o da valoração da quantidade do trabalho alegadamente prestado nesses dias, o que necessariamente terá que ser apreciado em sede de aplicação do direito e o da verificação dos dias invocados pelo A. para se poder constatar que verdadeira era a indicação dos dias efetuada pelo A. no art. 43º da petição inicial; 8. A douta sentença recorrida na fundamentação da decisão quanto à matéria de fato dada como provada sob o nº 15, esclarece, que a prova dos fatos vertidas neste número foi corroborada pelos depoimentos prestados em audiência de julgamento, quer pelo A. quer pelos restantes intervenientes, dos documentos de fls. 103 dos autos, e decorria à saciedade dos registos do tacógrafo juntos aos autos e do cartão, pessoal e intransmissível do A., no entanto, ao contrário do que consta desta fundamentação, não existem nos autos registos decorrentes do “cartão pessoal e intransmissível” do A., e não existia esse cartão individual, pois, como decorre dos “discos” juntos aos autos o tacógrafo utilizado pelo A. era um tacógrafo analógico; 9. Há na verdade que esclarecer que existem dois tipos de tacógrafos que são os analógicos e os digitais, pois nos tacógrafos analógicos existe a inserção de um disco em cartão onde são registados os tempos de circulação do veiculo e as paragens e onde o condutor tem de preencher manualmente a sua identidade, o local de saída e o local de chegada, a data de utilização, a identificação da viatura e os quilómetros registados no veículo à saída e à chegada e, no caso dos tacógrafos digitais o condutor do veiculo tem que inserir o seu cartão de identificação digital e todo o restante processamento se opera de modo automático e sem intervenção do condutor, sendo os dados constantes dos registos do tacógrafo extraídos através de equipamento computadorizado que permite a leitura dos dados registados; 10. No caso dos autos estamos perante tacógrafos analógicos onde, ao contrário do que vem dito na sentença recorrida, não existe o “cartão pessoal e intransmissível” do A. e os tempos de circulação e paragens são “geríveis” pelo próprio condutor e, como tem sido entendimento uniforme na Jurisprudência ( Ver por todos o Acórdão do STJ de 10 de Novembro de 2021 ) os dados constantes dos tacógrafos analógicos são meios de prova idóneos para comprovar os registos automatizados gerados pelo próprio tacógrafo, mas não quanto aos elementos preenchidos pelo próprio motorista, e que não são só por si elementos idóneos de prova; 11. Dito isto compreende – se que os fatos dados por provados “à saciedade” como considera a sentença recorrida para dar por provada a matéria vertida no nº 15 estão longe de poder contribuir para a prova dos fatos alegados, e muito menos serão completados em termos probatórios pelos registos manualmente efetuados pelo próprio A., como sucede com o Doc. de fls. 103 dos autos e a que a decisão sobre a prova dos fatos faz referência, sendo certo que nenhuma das partes ou das testemunhas foi confrontada com quaisquer elementos probatórios constantes dos ditos “discos”; 12. Temos pois que, ao contrário do que vem dito na sentença recorrida, nenhuma prova resultava à saciedade dos registos constantes dos “discos”; 13. E, verificando os dias dos meses e anos indicados na petição inicial constata – se que, não eram Sábados, nem Domingos nem feriados, os dias 5 de Março e 8 de Julho de 2019, e os dias 25 de Fevereiro, 6 e 7 de Julho de 2020, razão porque a douta sentença recorrida não podia ter considerado que aqueles dias eram Sábados, Domingos ou feriados, como o fez na resposta dada aos fastos dados por provados no nº 16; 14. E, assim sendo, como é, não podia ter dado como provado que a R. não concedera dias de descanso compensatório devidos por o A. ter trabalhado nos dias 5 de Março e 8 de Julho de 2019 e 25 de Fevereiro, 5 e 7 de Julho de 2020.

    15. Nesta sede a douta sentença recorrida apreciou o alegado pela R. na sua contestação no que refere ao contrato de trabalho assinado entre o A. e a R. quando o A. Foi admitido ao serviço da R., e, citando a Jurisprudência existente sobre essa matéria sufragou o entendimento pacifico de que as convenções coletivas só podem ser afastadas por contrato individual de trabalho se este for globalmente mais favorável para o trabalhador, tratando – se pois da aplicação do previsto de forma clara no art. 476º, do Código do Trabalho; 16. E, no seguimento da previsão desse normativo, a sentença vem considerar que, na parte do contrato de trabalho que afasta a aplicabilidade da Cláusula 74º e do regime das ajudas de custo TIR previstas no CCT, o contrato era ilegal, ao substituir os regimes remuneratórios e aplicabilidade de outras Cláusulas do CCT, por um regime remuneratório em vigor na R. e que regulava o pagamento de ajudas de custo nacionais e internacionais, tendo a douta sentença, considerado devidos os acréscimos retributivos peticionados pelo A. a titulo da Cláusula 74º, nº 7, do CCT publicado no BTE nº 16/1982, e às ajudas de custo TIR introduzidas no Anexo III do BTE nº 34/2018; 17. No contrato de trabalho celebrado entre o A. e a R. e através do qual o A. passou a trabalhar para a R. ( Doc. 1 oferecido com a contestação ) estabeleceu – se na Cláusula 3ª que o A. renunciava à aplicação da Cláusula 74º do CCT e ao subsidio TIR previsto no Anexo III do CCT, vigorando antes as “ajudas de custo nacionais” ou as “internacionais” de acordo com a prática retributiva vigente na R. e remetendo – se no mais para as tabelas salariais previstas na Regulamentação Coletiva de Trabalho que estivesse em vigor ( Ver a Cláusula 1ª, nº 1, do Contrato celebrado ), sendo o contrato celebrado claro na sua redação e não suscitando dúvidas; 18. E a maior favorabilidade decorre da aplicação prática do que estava contratado, pois o A., logo no inicio da execução do contrato, o A. deveria ter tido o cuidado de verificar como é que se processava a relação de trabalho, e quais as remunerações auferidas que integravam o que constava do contrato celebrado, tanto mais quando é certo que da Cláusula 18ª, constava que o contrato estava sujeito a período experimental e, se duvidas existissem sobre a matéria retributiva deveria o trabalhador esclarecê–las junto da R.; 19. Dos Docs. 1 a 84 juntos aos autos pela R. em 12 de Janeiro de 2022 consta a demonstração de que a prática retributiva utilizada pela R. era bem mais favorável para o A. em termos das quantias líquidas pagas mensalmente pela R. ao A., em detrimento da aplicabilidade do regime constante do CCT, e nem se objete que os pagamentos a que aqueles documentos se referem só eram feitos no final da cada mês e que, por essa razão...

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