Acórdão nº 2862/21.9T8PTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 27 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelPAULA DO PAÇO
Data da Resolução27 de Outubro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1] I. Relatório Na presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, instaurada por AA contra “Infraestruturas de Portugal, S.A.”, foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo: « Em face do exposto, julga-se a presente ação declarativa comum, instaurada por AA contra “Infraestruturas de Portugal, S.A.” totalmente improcedente e consequentemente:

  1. Absolve-se a ré de todos os pedidos contra ela formulados; b) Condena-se o autor nas custas do processo, sem prejuízo da isenção de que beneficia (artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).» Não se conformando com a improcedência da ação, veio o Autor, patrocinado pelo Ministério Público, interpor recurso para esta Relação, formulando no final das suas alegações, as seguintes conclusões: «1. O presente recurso incide sobre a decisão do Tribunal que julgou a ação instaurada pelo Autor AA contra a sua entidade empregadora “Infraestruturas de Portugal, S.A.” totalmente improcedente, absolvendo a Ré de todos os pedidos contra ela formulados.

    1. O Recorrente entende que a sua situação, que resulta clara da matéria de facto fixada na douta sentença, deveria ter implicado uma decisão diferente, designadamente no que se refere ao seu pedido de reintegração na empresa de onde considera ter sido ilegalmente despedido.

    2. A referida matéria de facto considerada assente na douta sentença (a qual se dá aqui por integralmente reproduzida) espelha corretamente a situação que se passou com o Recorrente, a qual não tem como a resolver sem a ajuda dos Tribunais.

    3. Tal como ficou provado, o autor foi admitido em 22-08-1988, ao serviço da então “CP – Caminhos de Ferro Portugueses, E.P.” e, posteriormente, foi integrado na “Refer, E.P.”, a qual em 2015, foi redenominada “Infraestruturas de Portugal, S.A.”.

    4. Com data de 27-11-2020, o Centro Nacional de Pensões comunicou à ré que «relativamente ao trabalhador acima referido [AA], foi deferida a pensão de invalidez a partir de 2020-10-01», e que «o pagamento da referida pensão tem início a partir de 2021-01».

    5. Em 23-12-2020 o autor recebeu uma carta da ré nos seguintes termos: «Na sequência da comunicação da Segurança Social, recebida no dia 14-12-2020, através da qual a IP SA teve conhecimento do deferimento da sua pensão por invalidez cabe-nos comunicar a caducidade do seu contrato de trabalho por tempo indeterminado, com efeitos a 31 de dezembro de 2020, sendo este o seu último dia de prestação de trabalho, nos termos da alínea c) do artigo 343.º do Código do Trabalho».

    6. Em resposta, o autor dirigiu uma comunicação à ré com o seguinte texto: «Relativamente à v/comunicação supra identificada, datada de 2020-12-21 e contendo a declaração da caducidade do contrato de trabalho com fundamento na obtenção de pensão por invalidez, cumpre informar que o subscritor não requereu qualquer pensão por Invalidez, nem reúne os requisitos da facto e de direito para a sua concessão. A comunicação recebida da Segurança Social só pode, portanto, dever-se a lapso, cuja retificação o subscritor se encontra já a providenciar, comprometendo-se a manter V. Exa. ao corrente da situação. Em face do exposto, não pode, portanto, operar a caducidade do contrato de trabalho, por falta do respetivo pressuposto legal.

    7. Em 29-12-2020 a ré respondeu ao autor que «considerando o teor da comunicação da Segurança Social, recebida no dia 14-12-2020, através da qual a IP, SA, teve conhecimento do deferimento da sua pensão por invalidez, a IP mantém que considera a cessação do seu contrato de trabalho por caducidade, com efeitos a 31 de dezembro de 2020, sendo este o seu último dia de prestação de trabalho, nos termos da alínea c) do artigo 343.º do Código do Trabalho».

    8. O Autor apresentou diversos requerimentos e reclamações presenciais junto da Segurança Social e do Centro Nacional de Pensões com vista a que a decisão de atribuição da referida pensão por invalidez fosse revogada.

    9. Após várias insistências, em 30-08-2021, o autor recebeu do Centro Nacional de Pensões uma comunicação, onde se referia que «a anulação da pensão está condicionada à devolução integral dos valores já pagos, que perfazem, à data de hoje, € 13.525,76».

    10. Com a data de 21-10-2021 e tendo por referência o Autor, o “Instituto da Segurança Social, I.P.” emitiu uma «declaração» com o seguinte alcance: «Declaramos que o beneficiário acima indicado não está a receber qualquer pensão do “Instituto da Segurança Social, I.P.”».

    11. Na posse da declaração referida, que remeteu em anexo, em 29-10-2021, o autor dirigiu aos recursos humanos da Ré a seguinte comunicação «serve a presente para informar V. Exa. que o trabalhador, supervisor de Infraestruturas de Portugal, AA, não é nem nunca foi pensionista, porque nunca a solicitou ou requereu nem lhe poderia ter sido atribuída, face à Lei vigente, sendo um absoluto equívoco por parte da SS/CNP, com um declarado ilícito de cessação contratual perpetrado pela IP ao afastar o Trabalhador do seu posto de trabalho. Em anexo a Declaração da SS. Espero da sua parte, uma adequada resposta ao exposto».

    12. No mês de dezembro de 2020 a Ré, através de acerto de contas, regularizou alguns pagamentos junto do Autor e, a partir daí, este passou a viver com a pensão de reforma da esposa, passando por algumas dificuldades de ordem financeira, no que se refere ao pagamento dos encargos e despesas familiares com alimentação, vestuário e transportes, o que lhe causa sofrimento, angústia, tristeza e desânimo, levando mesmo a que tivesse que receber tratamento e acompanhamento médico-psiquiátrico.

    13. O Autor pretende que a sua situação laboral seja esclarecida, sendo reposta a sua posição como trabalhador na empresa de acordo com o que a lei permite e impõe, evitando que continue nesta situação em que a entidade empregadora não o aceita como trabalhador (por considerar que o mesmo é pensionista) e a Segurança Social não lhe paga qualquer pensão, considerando que a sua situação como pensionista se encontra “suspensa” até que devolva/pague o valor que recebeu durante o tempo em que (por lapso dos serviços da Segurança Social) lhe foram indevidamente processadas pensões.

    14. Assim, desde o final do ano de 2020 o Autor/Recorrente encontra-se nesta situação kafkiana em que: - Não recebe qualquer retribuição da entidade empregadora; - Não recebe qualquer pensão por parte da Segurança Social/CNP.

      - Não sabe como continuar a sobreviver.

    15. A Ré “Infraestruturas de Portugal, S.A.” considerou que o contrato de trabalho do Autor caducou em consequência da atribuição ao trabalhador de uma pensão por invalidez relativa, mas, conforme o Autor insistentemente fez ver em várias comunicações que dirigiu à Ré, à Segurança Social e ao Centro Nacional de Pensões, ele não requereu a atribuição de qualquer pensão, pelo que não existia fundamento para a atribuição daquela pensão (pois tratava-se de um erro da Segurança Social) e, consequentemente, também não havia fundamento para a subsequente extinção do seu vínculo laboral com a Ré “Infraestruturas de Portugal, S.A.”.

    16. Porém, porque a “Infraestruturas de Portugal, S.A.” não ligou aos seus pedidos (os quais o Autor fez por escrito e direta e pessoalmente à sua chefia), o Autor veio pedir ao Tribunal que determinasse a sua reintegração no seu anterior posto de trabalho, com todos os benefícios e regalias inerentes, condenando a Ré no pagamento dos valores necessários para indemnizar todos os danos de natureza patrimonial e não patrimonial que sofreu.

    17. Embora se concorde com toda a factualidade considerada assente na douta sentença, existem dois factos que ficaram omissos, apesar de resultaram evidentes dos depoimentos prestados na audiência de julgamento.

    18. O primeiro facto, que devia constar nos factos provados a seguir ao facto provado n.º 16, é o seguinte: Como não concordava com a caducidade do seu contrato de trabalho, no dia 04 de janeiro de 2021, o Autor AA apresentou-se para trabalhar nas instalações da “Infraestruturas de Portugal, SA”, em Tunes, mas o seu chefe informou-o de que devia abandonar o local, entregando o computador e os restantes pertences da empresa, não tendo, assim, sido admitido ao trabalho, tendo procedido à entrega dos referidos bens e abandonado as instalações como lhe ordenaram.

    19. O segundo facto, que devia constar nos factos provados a seguir ao facto provado n.º 21, é o seguinte: A Ré Infraestruturas de Portugal, SA” recebeu a comunicação que o Autor lhe enviou em 29-10-2021, mas não deu qualquer resposta, nem diligenciou junto da Segurança Social no sentido de apurar o exato alcance da declaração que lhe estava anexa.

    20. Tal como resulta dos factos assentes na douta sentença, apesar das múltiplas diligências e requerimentos apresentados pelo Autor junto da Segurança Social e do Centro Nacional de Pensões, só em outubro de 2021 é que AA conseguiu que a Segurança Social emitisse uma «declaração» no sentido de que não estava a receber qualquer pensão do “Instituo da Segurança Social, I.P.”.

    21. Porém, apesar de o Autor ter remetido aquela declaração à sua entidade empregadora, solicitando que reponderassem a sua reintegração, a Ré não deu qualquer resposta ao Autor e continua a não aceitar reintegrá-lo no seu posto de Trabalho.

    22. A Segurança Social / Centro Nacional de Pensões mantém a situação da pensão do Autor suspensa, mas isso não o converte num pensionista. Pensionista é quem recebe uma pensão, e, como a Segurança Social informou e declarou por escrito, AA não está a receber qualquer pensão.

    23. O Tribunal a quo reconheceu que o Recorrente se encontra numa situação anómala que há que resolver, realçando o percurso sinuoso da atribuição da pensão ao Autor e as limitadas, escassas e pouco esclarecedoras informações prestadas pelos vários departamentos da segurança social, perante as suas insistentes e repetitivas interpelações, e mesmo a solicitação do Tribunal. Esta constatação redunda em apreensão quando, no próprio processo...

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