Acórdão nº 201/20.5JAPTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 08 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA CLARA FIGUEIREDO
Data da Resolução08 de Fevereiro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - Relatório.

Nos presentes autos de processo comum coletivo que correm termos no Juízo Central Criminal de (…), do Tribunal Judicial da Comarca de (…), com o n.º 201/20.5JAPTM, foi o arguido ZUG, solteiro, nascido em 09.05.2000, em (…), filho de (…) portador do Cartão de Cidadão n.º (…), residente em Monte (…), atualmente em cumprimento de medida de coação de prisão preventiva no Estabelecimento Prisional de (…), condenado: - Como autor material de um crime de homicídio agravado na forma tentada p. e p. pelos artigos 22º, 23º e 131º do Código Penal e artigo 86º, n.º 3, da Lei das Armas, na pena de 6 (seis) anos de prisão; - Como autor material de um crime de detenção de arma proibida p. e p. pelos artigos 86º, nº1, alíneas c) e d) da Lei n.º 5/2006 de 23 de fevereiro, na pena de 2 (dois) anos de prisão; - Em cúmulo jurídico, na pena única de 7 (sete) anos de prisão.

- No pagamento ao demandante BOG, a título de ressarcimento dos danos não patrimoniais sofridos com a prática do crime, da quantia de € 10.000,00 (dez mil euros), acrescida de juros à taxa legalmente prevista para as obrigações civis, contados desde a data do trânsito em julgado da condenação até efetivo e integral pagamento.

* No acórdão condenatório, foi ainda reapreciado o regime e coativo do arguido, tendo sido mantida a medida de coação de prisão preventiva que anteriormente lhe havia sido aplicada.

* Inconformado com tal decisão, veio o arguido interpor recurso da mesma, tendo apresentado, após a motivação, as conclusões que passamos a transcrever: “1. Impugnam-se os factos constantes dos pontos 7, 13, 14, 15, 16, 26 e 27 da matéria de facto provada.

  1. O artigo 7 deverá passar a ter a seguinte redação: “Ali chegados, argumentando que teria de urinar, o arguido fugiu apeado do local, tendo chamado posteriormente a GNR o que deu origem ao NUIPC 787/20.4GDLLE, tendo nesse circunstancialismo sido apreendida uma arma ao assistente.” 3. O artigo 13 deverá passar a ter a seguinte redação: “Quando o assistente saiu do interior da sua viatura, com um objeto não identificado na mão, foi, em ato contínuo, surpreendido pelo arguido que de arma em punho apontou a mesma na sua direção e proferiu a expressão “Está quieto...Mãos ao ar” ou “Quando o assistente saiu do interior da sua viatura, com um telemóvel na mão, foi, em ato contínuo, surpreendido pelo arguido que de arma em punho apontou a mesma na sua direção e proferiu a expressão “Está quieto...Mãos ao ar” 4. Os artigos 14, 15 e 16 deverão passar a estar pela seguinte ordem e com a seguinte redação: 14. De imediato, a uma curta distância do assistente que se presume de cerca de 2 metros, o arguido, efetuou um disparo que veio a atingir o mesmo na zona abdominal, do lado esquerdo.

  2. O assistente conseguiu entrar na sua viatura automóvel e conduzir a mesma até junto da fábrica TUZ”, sita na (…), local onde imobilizou o veículo e saiu para o exterior, permanecendo prostrado na via pública.

  3. Só após o assistente abandonar o local na sua viatura, permitindo o arguido que o assistente fosse embora, é que o arguido abandonou o local, na sua viatura marca (…), matrícula (…), em direção a LIS.” 5. O artigo 26 deverá passar a ter a seguinte redação: O arguido ao direcionar e disparar a arma para as regiões do corpo do assistente supra descritas causou perigo para a vida do mesmo.

  4. O facto constante do ponto 27 deve ser dado como não provado.

  5. Para a alteração da matéria de facto que se pretende, indica-se expressamente que deverão ser ouvidas as declarações do arguido, tendo as mesmas sido gravadas através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, consignando-se que o seu início ocorreu pelas 14 horas e 22 minutos e o seu termo pelas 15 horas e 22 minutos; e ainda as declarações prestadas pelo assistente, tendo as mesmas sido gravadas através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, consignando-se que o seu início ocorreu pelas 15 horas e 25 minutos e o seu termo pelas 16 horas e 08 minutos; sempre com referência à ata da própria audiência de julgamento.

  6. Ambas as declarações deverão ser ouvidas na totalidade para que se perceba a dinâmica e sequência dos factos e de que de forma geral as versões de arguido e assistente coincidem.

  7. Bem como deverá atender-se ao teor da página 10 do douto acórdão posto em crise, que nessa página faz referência à existência da arma, em resumo das próprias declarações do arguido: “Quando se sentou, a pistola de alarme que trazia saiu da zona da cintura (…)”.

  8. Existe ainda um auto de apreensão a fls. 208, no âmbito do processo NUIPC 787/20.4GDLLE, que esclarece que foi apreendida ao assistente uma arma de ar comprimido, acionada a gás, com projéteis no carregador municiado com esferas metálicas, classe (…), marca (…) e um saco de plástico contendo esferas metálicas, para uso na marma.

  9. E na mesma página consta ainda que o assistente: “saiu do carro com o telefone na mão”.

  10. Ora, mais uma vez, a nosso ver, também este facto não deverá ser omitido da factualidade dada como provada, pois como transmitiu o arguido, o mesmo, perante ver tal objeto, convicto que era uma arma, com muito receio, disparou.

  11. Ora, o tribunal omite assim que o assistente confirmou que trazia um objeto na mão quando saiu do carro, aparentemente, diz o mesmo, a sua carteira e o seu telemóvel.

  12. Não se percebe de todo como é que o tribunal conclui, porque nem o justifica, o que dá como provado no facto 15, ou seja, que após o mencionado no facto 14, o arguido de imediato, abandonou o local, tendo o arguido referido que não abandonou o local de imediato.

  13. Pelo que não se percebe, nem o tribunal justificando, como conclui, com a certeza necessária, que o arguido abandonou o local de imediato.

  14. Da mesma forma não se concorda que o tribunal possa concluir, porque de nenhuma prova se pode retirar tal conclusão, que o arguido sabia que ao direcionar a arma para as regiões lhe retiraria a vida, nem como que o arguido só não logrou provocar a morte do assistente por razões alheias à sua vontade.

  15. Tal como não se concorda que o tribunal conclua afirmando que o arguido bem sabia que praticava os factos utilizando meio particularmente perigoso o que quis.

  16. Quando depois, inclusive, o douto acórdão, no capítulo referente ao enquadramento jurídico-penal, admite, que a arma utilizada pelo arguido não se trata de um meio particularmente perigoso.

  17. Ainda que não se ouvissem as declarações do arguido, há elementos suficientes no texto do próprio acórdão colocado em crise, que demonstram que há evidente contradição e erros na matéria de facto dada como provada.

  18. Vícios esses que ainda que possam não servir para fundamentar uma absolvição, porque não é isso que se pretende, aliás, tendo o arguido confessado a prática dos factos, pretende-se uma análise justa da factualidade, devendo a mesma ser fiel ao que na verdade sucedeu, só assim se assegurando verdadeiramente a defesa e direitos do arguido, ponderando-se a eventual prática de um crime de ofensa à integridade física.

  19. Assim, há erro de julgamento pelas contradições notórias entre a prova produzida, a fundamentação e o elenco de factos provados, pelo que, para a correta apreciação dos factos e justa decisão, deverá a matéria de facto ser alterada.

  20. Atente-se que o tribunal entende a versão do ofendido como mais credível, mencionando aspetos tais como (realces nossos): “Quando saíram do bar e sem que nada fizesse prever o arguido terá dito para saírem do seu carro e arrancou, deixando-os sozinhos na estrada.” 23.Perguntamo-nos se é normal este tipo de comportamento? Se o tribunal acredita que o arguido, sem motivo aparente, abandona pessoas num local, então deveria ter pedido uma perícia psiquiátrica ao arguido, pois qualquer homem médio não abandonaria pessoas num local sem qualquer motivo.

  21. E assim, torna-se muito mais credível e justificável o medo que o arguido afirma que tinha, conforme explicou e justificou.

  22. Tal como o tribunal a quo acha perfeitamente aceitável que o assistente, como se refere no douto acórdão colocado em crise: “Foi no carro do arguido pois já não confiava nele e os amigos seguiram num carro atrás. Quando se sentou, a pistola de alarme que trazia saiu da zona da cintura, sendo que explicou ao arguido porque a trazia e inclusivamente tirou o carregador e entregou-lho. Quando chegaram à ATM, o arguido disse que precisava de urinar e voltou a fugir com o carregador na mão.” 26.Qualquer homem médio teria receio nesta situação, imagine-se, acompanhado no carro, acompanhado por outras pessoas atrás do seu carro, amigos do assistente, sendo uma clara e evidente tentativa de intimidação, e sem que nada o fizesse prever, a pistola do assistente, em tudo semelhante a uma 6.35, sai da zona da cintura do assistente.

  23. Da mesma forma, o arguido ao ver o assistente sair do carro, com uma arma, ou ainda que o pensasse equivocadamente, pois bem sabemos que uma carteira masculina ou um telemóvel, na mão, pode, para quem está amedrontado, assemelhar-se bastante a uma pistola, provocou considerável receio no arguido, levando a que o mesmo disparasse.

  24. Atente-se num pormenor bastante importante: o arguido diz “mãos ao ar”. Mais uma vez questionamo-nos porque diria o arguido tal expressão, sem motivo aparente, porque pediria o arguido para o assistente colocar as mãos no ar.

  25. Normalmente esta expressão é usada para alguém se certificar que a outra pessoa não tem qualquer arma na mão nem irá atirar, o que também é indício evidente que o arguido pensava que o assistente estava armado.

  26. Por outro lado, refere a douta sentença colocada em crise que os Senhores inspetores da P.J. inquiridos confirmaram a realização das diligencias junto aos autos e respetivos relatórios periciais que elaboraram e bem assim referiram não terem visto nem no veiculo do ofendido...

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