Acórdão nº 576/20.6T8EVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 10 de Fevereiro de 2022
Magistrado Responsável | ANABELA LUNA DE CARVALHO |
Data da Resolução | 10 de Fevereiro de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam no Tribunal da Relação de Évora: I “R…, S.A.
”, …, intentou a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra “SEGURADORAS UNIDAS, S.A.”, com sede na Avenida da Liberdade, 242, 1250-149 Lisboa, atualmente designada “GENERALI SEGUROS, S.A.” pedindo a condenação da Ré no pagamento da quantia total de 137.735,35, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, nos seguintes termos discriminada: “A) € 137.735,35 (cento e trinta e sete mil, setecentos e trinta e cinco euros e trinta e cinco cêntimos): B) Juros de mora, de 14% ao ano, em dobro da taxa legal como decorre do nº 1 e 3 do artº 43º do DL 291/2007 sobre o montante da condenação até efetivo e integral pagamento, ou, caso assim não se entenda, juros de mora à taxa comercial, desde a mesma data até efetivo e integral pagamento, a que acresce a obrigação de pagamento de juros à taxa de 5% ao ano desde a data em que a Sentença de Condenação transitar em julgado, os quais acrescem aos juros de mora referenciados nos articulados 49º e 50º da presente PI; C) O pagamento à Autora das penalizações impostas pelo incumprimento do decreto-lei 291/2007; D) E a notificação para ainda no âmbito do processo, se assim se entender, comunicar a assunção ou não assunção da sua responsabilidade como fixado na alínea e) do artigo 36º do decreto-lei 241/2007 a fim de parar com a penalização imposta por força do decorrente deste incumprimento €100,00, o qual se requer continue a contar e seja a Ré condenada a pagar até à data da sua assunção de responsabilidade.
Alega a Autora, em síntese, que um veículo de sua propriedade, constituído por trator e semirreboque e destinado a transporte internacional de mercadorias foi interveniente num acidente de viação causado por veículo automóvel ligeiro cuja responsabilidade civil se encontrava, à data, transferida para a Ré.
A Ré, na contestação, admitiu a responsabilidade do seu segurado no acidente mas impugnou parcialmente os danos, invocando ainda a exceção de abuso de direito para desvirtuar parte do pedido.
Houve resposta à exceção.
Realizada a audiência de julgamento foi proferida sentença que julgou a ação parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, em consequência, condenou a Ré no pagamento: a. Da quantia de 2.820,66€ à Autora, a título de danos patrimoniais; b. De juros de mora sobre a quantia referida em a., à taxa supletiva legal prevista para obrigações civis, vencidos desde a data da citação da Ré nos presentes autos e vincendos até integral pagamento; c. Da quantia de 800€ (oitocentos euros) à Autora a título de indemnização por privação de uso; d. De juros de mora sobre a quantia referida em c., à taxa supletiva legal prevista para obrigações civis, vencidos desde a presente decisão e vincendos até integral pagamento; e. Da sanção a que se reporta o art. 40.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21.07, fixando-a em 3.620,66€, dos quais €1.810,33 deverão ser pagos à Autora e €1.810,33 deverão ser pagos à Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões; f. De juros de mora sobre a quantia referida em e., à taxa supletiva legal prevista para obrigações civis, vencidos desde a presente decisão e vincendos até integral pagamento; No mais, julgou-se a ação parcialmente improcedente, por parcialmente não provada, e, em consequência, absolveu-se a Ré dos demais pedidos contra si formulados.
E, custas na proporção do decaimento.
Inconformada com tal decisão veio a Autora recorrer de facto e de direito, assim concluindo as suas alegações de recurso: 1.
A matéria de facto dada como provada, bem como a matéria de facto dada como não provada, vertida na douta Sentença Recorrida, encontra-se incorretamente julgada.
-
(…) (…) 21.
No que tange aos danos indemnizáveis (capítulo b. da fundamentação de Direito) deverá sempre ser a Ré condenada a indemnizar a Autora no valor de 79,41€, referente ao custo que esta teve com a obtenção de certidão relativa ao Auto elaborado a 10 de julho de 2017, referente ao sinistro em apreço nos presentes Autos e destinada a fazer prova dos factos alegados da Petição Inicial, dano este em que não ocorreria caso a Ré, como lhe competia, tivesse assumido a responsabilidade pela produção do mesmo, verificando-se, face o exposto, a violação do preceituado nos artigos 3º nº1, 5º nº1, 552º nº1 alíneas d) e), 423º nº1 do Código de Processo Civil e artigos 341º, 342º nº1, 362º, 371º e 564º nº1 do Código Civil, por parte do Tribunal Recorrido.
-
Relativamente ao montante de juros devidos pela Ré à Autora (capítulos b.1. e c.1. da Fundamentação de Direito), deverá ser determinado que são devidos pela Ré à Autora juros no dobro da taxa legal aplicável de 7% até efetivo e integral pagamento sobre as quantias devidas a título de danos indemnizáveis e privação de uso, ao contrário do vertido na outa Sentença Recorrida.
-
De acordo com o número 2 do artigo 38º do Decreto-Lei 291/2007, a Ré é devedora de juros no dobro do valor fixado pelo Tribunal Recorrido, e não em singelo, como erradamente mencionado na douta Sentença Recorrida, dado o incumprimento por parte da Ré dos deveres fixados nos artigos 36º e 38º do Decreto-lei 291/2007, como aliás o próprio Tribunal Recorrido o dá como provado no capítulo e. da fundamentação de direito.
-
Os números 2 e 3 do artigo 38º do Decreto-Lei 291/2007 estabelecem sanções à empresa de seguros quanto não cumpra os deveres fixados nos preceitos anteriores, quer quanto à dinâmica de regularização do sinistro, quer quanto ao cumprimento dos prazos aí estabelecidos, ou ainda quanto a proposta indemnizatória seja manifestamente insuficiente, estabelecendo-se o pagamento de juros no dobro da taxa legal prevista na lei, sobre o montante indemnizatório fixado pelo Tribunal ou aceite voluntariamente pelo lesado, no primeiro casou, ou a mesma taxa de juros sobre o montante oferecido por aquela e o montante fixado pelo tribunal, no segundo. Pretende-se, desta forma, compensar o lesado pela privação do montante indemnizatório a que tem direito.
-
Determinando por si só o tornar-se a Ré devedora para com a Autora de juros no dobro da taxa legal prevista na lei aplicada ao caso sobre o montante da indemnização fixada pelo Tribunal, aplicada a empresas comerciais e atualmente fixados em 7%, logo, desde já solicitando a aplicação de juros de 14% sobre o valor da condenação até efetivo e integral pagamento.
-
A douta Sentença Recorrida viola assim o teor do artigo 38º nº2 do Decreto-lei 291/2007, dos artigos 99º, 2º, 13º §2, 230º e 102º do Código Comercial, 9º nº3 do Código Civil, 7º do Regime Anexo ao Decreto-lei 269/98 e artigos 2º e 30º dos Decretos-Lei 32/2003 e 62/2013.
-
Discorda a Autora, no que tange à privação de uso (capítulo c. da fundamentação de Direito), da condenação da Ré somente à quantia de 800€, correspondente a 8 dias à razão diária de 100€, em virtude de não reconhecer aplicar a tabela de paralisações vigente entre a ANTRAM e APS como critério de equidade.
-
Para fundamentar o custo de paralisação do conjunto circulante especial para transporte de automóveis com as matrículas 29-CL-97/ L-145786, a Autora socorre-se do Acordo celebrado entre a APS e a ANTRAM como critério para a fixação da indemnização no caso sub judice, consubstanciando o juízo de equidade previsto no artigo 566º, nº 3, do Código Civil, consistindo num critério através do qual se pode guiar o Julgador, sendo esta a orientação vertida no âmbito dos processos 779/03.8TBOBR.C1, 1661/07.5TBMTJ.L1-8, 1458/12.0TVLSB.L2-2, 189/16.7T8CDN.C1, 11421/16.7T8LSB.L1-6 e 80/14.1T8ALQ.L1-6.
-
Ora, tendo em consideração que o acordo em causa foi celebrado entre a APS e a ANTRAM, sendo que esta entidade representa grande parte do setor dos Transportes Rodoviários Pesados de Mercadorias, afigura-se razoável que os valores indemnizatórios aí previstos para situações de paralisação de veículos pesados de mercadorias surjam como equitativos, atendendo à similitude de situações e à qualidade e representatividade dos Outorgantes no setor dos transportes em questão, sendo indiferente ao caso que a Autora tenha outorgado ou não o referido acordo ou seja associada ou não da ANTRAM, devendo, por conseguinte, ser fixado pelo Tribunal ad quem a verba requerida pela paralisação no valor de € 257,03/dia para o ano de 2017, conforme melhor se alcança pela atualização do acordo entre a ANTRAM e APS, como decorrer da aplicação da taxa de imobilização diária para veículos de peso bruto entre 26 e 40 toneladas afetos ao serviço internacional.
-
Incorre igualmente o Tribunal Recorrido em erro de julgamento no que toca à consideração de que não se vislumbra como pode a Autora, aqui Recorrente, «arrogar-se no direito de receber uma indemnização pela paralisação de cada um dos veículos sem que ao fazê-lo incorra em abuso de direito, na modalidade de «venire contra factum proprium», pois alega simultaneamente que se trata de um conjunto circulante, sendo a mesma nula, neste trecho específico, por violação do princípio do contraditório e do princípio da proibição das decisões surpresa, nos termos do artigo 3º nº3 do Código de Processo Civil.
-
Ora em momento algum anterior se havia levantado a questão do abuso de direito por a Autora peticionar os danos sofridos pelo seu conjunto circulante, por ser devida indemnização referente à indemnização do veículo trator e do semirreboque, não pode o Tribunal Recorrido vir determinar essa aplicação do normativo presente no artigo 334º do Código Civil somente em sede de Sentença, por configurar uma decisão surpresa, a qual se encontra proibida.
-
É, assim, devida indemnização à Autora, no que à paralisação diz respeito, considerandos ambos os veículos que compõe o conjunto circulante propriedade desta, conforme orientação vertida no âmbito dos processos 14227/19.8T8PRT.P1, 2278/07.TVLSB.L1-1, 11421/16.7T8LSB.L1-6, 2278/07.TVLSB.L1-1, 11421/16.7.T8LSB.L1-6 e 04B312, constituindo trator e semirreboque realidades distintas para efeitos de fixação...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO