Acórdão nº 120/19.8T8CTX.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 24 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA ADELAIDE DOMINGOS
Data da Resolução24 de Fevereiro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal da Relação de Évora I – RELATÓRIO F.G. intentou a ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra RUBROPROD, UNIPESSOAL, LDA pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de €15.000,00, acrescida de juros de mora vencidos, que liquidou em €2.931,99, e vincendos até integral pagamento.

Para fundamentar a sua pretensão, alegou, em síntese, que no exercício da sua atividade de agricultor, adquiriu à Ré uma máquina colhedora de tomate pelo preço de €40.000,00 e que, não conseguindo proceder ao seu pagamento integral, tendo apenas pago €15.000,00, entregou a máquina à Autora, no pressuposto de que esta lhe devolveria o que tinha já pago.

Contestou a Ré impugnando os factos alegados pelo Autor, pugnando pela sua absolvição do pedido, porquanto aceitou a entrega da máquina para pagamento da quantia em dívida pelo Autor (€25.000,00), nada mais tendo sido acordado entre as partes, ficando, assim, com a entrega da máquina, paga a dívida do Autor.

Deduziu pedido reconvencional pedindo a condenação do Autor no pagamento do valor de €25.175,89 pelo aluguer da máquina pelo período de 8 meses, decorrente da utilização feita pelo mesmo no período compreendido entre setembro de 2015 a abril de 2016, pelo recondicionamento da máquina feito pela Ré após a sua entrega pelo Autor, com vista à sua preparação para uma futura venda; e, por último, pela frustração do negócio e desvalorização do valor da máquina colhedora de tomate por a revenda só ter ocorrido 2 anos após ter sido entregue pelo Autor.

O Autor apresentou réplica, impugnando o pedido reconvencional, pedindo a condenação da Ré como litigante de má-fé.

Foi proferida sentença, cuja parte dispositiva tem o seguinte teor: «Pelo exposto, julgo: - a acção parcialmente procedente, por parcialmente provada e, em consequência, condeno a Ré no pagamento ao Autor do valor de €5.000,00, acrescidos de juros mora à taxa legal, vencidos desde a data da citação e vincendos até integral pagamento.

- a reconvenção totalmente improcedente, por não provada e, em consequência, absolvo o Autor do pedido reconvencional.

- o pedido de condenação da Ré em litigância de má-fé, totalmente improcedente, dele absolvendo a Ré.» Inconformada, apelou a Ré arguindo a nulidade da sentença e, caso assim não se entenda, a sua revogação e substituição por outra que julgue a ação totalmente improcedente, apresentando para o efeito as seguintes CONCLUSÕES.

I) A Recorrente interpõe o presente recurso apenas da parte da douta sentença que decidiu pela procedência parcial da ação intentada pelo Autor/Recorrido e, em consequência condenou a Ré/Recorrente “no pagamento ao Autor do valor de €5.000,00, acrescidos de juros de mora à taxa legal, vencidos desde a data da citação e vincendos até integral pagamento.” II) Ora, compulsado o pedido formulado pelo Autor, os factos dados como provados e não provados na douta sentença proferida e, bem assim, a fundamentação da mesma, a Recorrente não consegue vislumbrar, de modo algum, com que base factual e/ou fundamentação é que o Tribunal a quo decidiu neste sentido.

III) O Autor peticionou a condenação da Ré no pagamento da quantia de €15.000,00 por conta de um alegado acordo efetuado entre ambas as partes no âmbito do qual a Ré alegadamente se havia comprometido a entregar ao Autor essa quantia após a restituição do equipamento por parte do Autor à Ré.

IV) Ora, compulsados os factos dados como provados e não provados, facilmente se constata que, e bem, o Tribunal a quo deu como não provado, nas alíneas c) e d) que: “c) Acordaram que o equipamento adquirido pelo autor seria entregue à Ré, que, em contrapartida restituiria o cheque que perfazia o montante €25.000,00 euros; d) Entregando ainda ao Autor, a quantia de €15.000,00.” V) Ora, salvo o devido respeito, resulta daqui por demais evidente que o pedido formulado pelo Autor resultou totalmente (e não apenas parcialmente) NÃO PROVADO.

VI) O Autor formulou o seu pedido no sentido de a Ré/Recorrente ser condenada a liquidar-lhe a quantia de €15.000,00 por conta de um alegado acordo efetuado entre ambas as partes no âmbito do qual a Ré alegadamente se havia comprometido a entregar ao Autor essa quantia após a restituição do equipamento por parte do Autor à Ré.

VII) O Autor nunca alegou que entregou a máquina à Ré para que esta vendesse e com o dinheiro da venda satisfaria o crédito que detinha sobre o autor no valor de €25.000,00.

VIII) Pelo que ter-se-á que concluir que o Tribunal a quo condenou em objeto diverso do pedido nos moldes em que o mesmo foi formulado pelo Autor/Recorrido, violando, deste modo, a norma contida no artigo 609.º, n.º 1 do CPC.

IX) Assim, a sentença proferida enferma de NULIDADE, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea e) do CPC, devendo tal nulidade ser declarada com as demais consequências legais.

Acresce ainda que, X) Em nenhum dos factos dados como provados resultou provado que a Recorrente/Ré tenha procedido à venda da máquina assim como não consta dos factos dados como provados que a Recorrente/Ré tenha procedido à venda daquela máquina pelo montante de € 30.000,00.

XI) Aliás, compulsados os factos dados como provados e os factos dados como não provados resulta precisamente o inverso: “f) A Ré alienou o equipamento ainda no ano de 2016, por volta do mês de junho do citado ano.

[…] o) A Ré não conseguiu no imediato concretizar a venda da aludida máquina, o que somente ocorreu em 19 de setembro de 2018, decorridos mais de dois anos após a entrega da máquina pelo Autor à Ré.” Mais, XII) Em sede de fundamentação no que em concreto concerne ao facto dado como não provado na alínea o) menciona o Tribunal a quo que: “Quanto ao facto inserto na alínea o) o mesmo foi dado como não provado, desde logo porque a fatura de venda refere uma máquina da marca Barigelli-Crima, sendo que a máquina que foi vendida ao Autor era da marca Bargam. […]” XIII) Assim, e em face de tudo o anteriormente exposto, a Recorrente não consegue vislumbrar, porque inexiste, os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão final “condenação da Ré no pagamento de € 5.000,00” por conta da quantia que alegadamente excedeu o seu crédito aquando da venda da máquina quanto, como se viu, não foi dado como provado que a Recorrente tenha vendido a máquina e muito menos o valor pelo qual o fez, tendo, aliás, resultado o contrário na alínea o) dos factos dados como não provados.

XIV) Pelo que, não se concebe que Tribunal a quo se tenha baseado na fatura de venda junta pela Recorrente como Doc. 3 com a sua Contestação para dar como não provado o facto constante da alínea o) dos factos dados como não provados e, simultaneamente, - pese embora tal NÃO CONSTE DOS FACTOS PROVADOS – conclua que “[…] porque a Ré vendeu a máquina por € 30.000,00, tem que devolver ao Autor a quantia de € 5.000,00.” XV) Temos assim que, a douta sentença proferida padece de nulidade, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea b) do CPC, uma vez que não especifica os fundamentos de facto e de direito que justificam a sua decisão de ter julgado a ação parcialmente procedente e, consequentemente, condenou a Ré/Recorrente a liquidar à Recorrida a quantia de € 5.000,00 nos termos acima expostos.

XVI) Nulidade que expressamente se invoca e que deverá ser declarada com as demais consequências legais.

Acresce ainda que, XVII) Compulsados os factos dados como provados, factos dados como não provados e respetiva fundamentação, facilmente se conclui que existe uma clara oposição entre a fundamentação (dos factos dados como provados e não provados) e a decisão proferida, assim como se verifica que a decisão proferida a final em nada se coaduna com os factos dados como provados e não provados.

XVIII) Na verdade, e pese embora o Tribunal a quo tenha andado bem ao dar como provado os factos que foram dados como provados e ao dar como não provados os factos dados como não provados, o que é facto é que de tais premissas não possível retirar a conclusão que a final foi retirada pelo Tribunal a quo (“[…] porque a Ré vendeu a máquina por € 30.000,00, tem que devolver ao Autor a quantia de € 5.000,00, valor este que excede o seu crédito”.

XIX) Limitou-se, pois, o Tribunal a quo, sem que tal tenha sido dado como provado ou se encontre fundamentado, a concluir, SEM MAIS E SEM NENHUMA REFERÊNCIA ANTERIOR a tal facto, que “porque a Ré vendeu a máquina por € 30.000,00, tem que devolver ao Autor a quantia de € 5.000,00, valor este que excede o seu crédito”.

XX) Ou seja, estamos perante uma decisão que se encontra em clara oposição com os factos dados como provados e não provados e com a própria fundamentação da douta sentença que, com em exceção da referência que é efetuada na penúltima página.

XXI) Pelo que, a Recorrente desconhece, em absoluto, o que motivou o Tribunal a quo a proferir tal decisão, o que, necessariamente, inibe a Recorrente de exercer cabalmente o seu direito de defesa.

XXII) Temos assim que, por tudo o anteriormente exposto, e também por via da aplicação do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil, a douta Sentença proferida padece de nulidade, seja porque a mesma está...

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