Acórdão nº 556/20.1T8PTG.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 24 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelPAULA DO PAÇO
Data da Resolução24 de Fevereiro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1] I. Relatório I.F.

, intentou a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra o Centro de Bem Estar Social de Arronches, pedindo que se declare que a revogação da denúncia por si operada foi válida e produziu os seus efeitos e, em consequência, se declare que o contrato individual de trabalho celebrado com a Ré se mantém eficaz, condenando a Ré a reintegrar a Autora no seu posto de trabalho com o vencimento devido. Mais peticionou a condenação da Ré no pagamento das retribuições vencidas e vincendas, desde 04-03-2020 até à data do trânsito em julgado da sentença, tudo acrescido de juros à taxa legal, a liquidar mensalmente até integral pagamento.

Alegou, em breve síntese, que foi admitida ao serviço da Ré, em 03-03-2008, mediante a celebração de um contrato de trabalho, prestando, ultimamente, a atividade de cozinheira de 1.ª. Sucede que, em 03-03-2020, procedeu à denúncia do referido contrato, com aviso prévio de 60 dias. Todavia, em 11-03-2020, revogou tal denúncia, pelo que que o vínculo contratual deverá considerar-se válido e vigente para os devidos efeitos.

O processo seguiu a tramitação que consta dos autos.

Após a realização da audiência final, foi prolatada sentença que julgou a ação totalmente improcedente e, em consequência, absolveu a Ré do pedido.

Inconformada, veio a Autora interpor recurso para esta Relação, extraindo das suas alegações, as conclusões que, seguidamente, se transcrevem: «Primeiro: A sentença é nula na parte em que o tribunal a quo apreciou e decidiu por em violação do art.615º/1 alínea d) do CPC, que a procuração foi assinada em 11.10.2020, o que é fundamento do recurso por excesso de pronúncia Segundo: O tribunal recorrido deu por assente erradamente que a comunicação da ratificação de 04.05.2020 foi enviada pelo representante quando o foi pela Autora e não apreciou e aplicou como devia o art. 268º do CC, em violação do art. 615º /1 alíneas d) e b do CPC.

Terceiro: Com a alteração ao ponto 7. da matéria de facto provada pretende a Recorrente, reverter uma circunstância irregular aparente de ilegibilidade da assinatura para uma regularidade e conformidade dessa assinatura com a assinatura também ilegível da denúncia que quer ver revogada.

Quarto: Com a alteração ao ponto 14 da matéria provada, pretende a recorrente por um lado afastar da matéria de facto o termo jurídico “por conta da cessação do contrato de trabalho” e por outro lado, demonstrar que das declarações de parte de Deolinda, não resulta o pagamento de qualquer compensação, uma vez que a depoente considera compensações os valores recebidos em salários, subsidio de férias e de natal e não outros.

Quinto: Com a alteração ao ponto 15., pretende afastar a possibilidade da empresa Serunion desempenhar funções que só podem ser exercidas por pessoa singular.

Sexto: Considera a alteração ao ponto 16, importantíssima no sentido de que foi a própria trabalhadora quem manifestou a intenção de revogar a denuncia do CIT, e não o representante Realçando as pretensões da Autora em revogar a denúncia em 4.05.2020, e por via da ratificação do art.268º do CC, obter retroativamente os efeitos a 11.03.2020, data que em foi recebido o ato da revogação da denúncia, praticado pelo representante da autora.

Sétimo: A alteração ao facto não provado A, para provado com o teor proposto visa retirar da decisão de facto o juízo de direito quanto à invalidade da comunicação e confirmar os atos dados por provados em 6, 7 e 8.

Oitavo: A alteração ao facto não provado B, para provado com o teor proposto, visa acentuar a sua utilidade para a discussão da causa, centrando o momento relevante da assinatura da procuração antes de ter sido recebida em 11.03.2020, sem afastar a possibilidade de ter sido assinada nesse dia 11.03.2020.

Nono: O art. 350/3 do C, não é aplicável in casu como requisito para o exercício do direito á revogação da denuncia, por os valores recebidos não terem natureza de compensação e não estar a Autora obrigada a devolvê-los, o que tem que ser interpretado à luz dos art. 252º, art. 263º, art. 264º e art.366º do CT.

Décimo: A procuração enquadra-se na representação voluntária do art. 262º do CC e não no mandato com poderes especiais do art. 1157º eart.1159º/2 do CC.

Décima primeiro: E na representação a Ré conhecendo a invocada falta de poderes do representante, para rejeitar o ato entre 11.03.2020 e 04.05.2020 tinha que exigir do representante que assinasse essa procuração e não o tendo feito ficou sanado o vicio e justificados os poderes do representante, sem que a Autora pudesse invocar essa falta de poderes, (v. art. 268º/4, art. 260º CC).

Décimo segundo: A partir de 04.05.2020, com a ratificação, a R. deixou não apenas de poder rejeitar o ato, mas ficou-lhe vedada a possibilidade de negar a própria ratificação, por não ter fixado um prazo à trabalhadora para o ratificar, (art. 268º/3 CC).

Décimo terceiro: E sendo válido o ato de ratificação, os seus efeitos deverão produzir-se na esfera jurídica da Autora com efeitos retroativos a 11.03.2020, por força o ar. 268º /2, art. 268º /1 e art. 257 CC.

Décimo Quarto: Por conseguinte as respostas aos pontos 3.3, 3.4 e 3.5 das questões a resolver pelo tribunal são afirmativas Décimo Quinto: E sendo o CIT é válido e vigente, assiste à Trabalhadora / recorrente o direito às retribuições intercalares e a ser reintegrada.

PELO EXPOSTO, REQUER A VEXAS VENERANDOS DESEMBARGADORES, ADMITAM O PRESENTE RECURSO DE APELAÇAO

  1. DECLARANDO NULA PARCIALMENTE A SENTENÇA RECORRIDA NA PARTE QUE DEU POR ASSENTE QUE A PROCURAÇÃO FOI SUBSCRITA EM 11.10.2020 POR EXCESSO DE PRONÚNCIA, DELA RETIRANDO ESSE FACTO E MOTIVAÇÕES.

  2. DECLAREM NULA PARCIALMENTE A SENTENÇA RECORRIDA POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA DA QUESTÃO DA RATIFICAÇÃO, E DE FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA PARA A NÃO APRECIAÇÃO E APLICAÇÃO DO ART.268º DO CC C) ALTERANDO A DECISÃO DE FACTO PROVADA NOS PONTOS 7, 14, 15, 16 E PONTOS A E B DA MATÉRIA NÃO PROVADA, ADITANDO OS PONTOS 17 E 18 À MATÉRIA DE FACTO PROVADA, COM O TEOR PROPOSTO.

  3. E ANULANDO AINDA A SENTENÇA RECORRIDA, NA PARTE QUE APLICOU À SITUAÇÃO DOS AUTOS O ART.350º/3, QUANDO NÃO À OBRIGATORIEDADE DE DEVOLVER OS VALORES PAGOS COM NATUREZA DE RETRIBUIÇÃO E SEM QUE TENHAM SIDO TIDOS EM CONTA OS ART.258º, ART.263º ART.264º E ART.366º DO CT.

  4. ANULAR AINDA A SENTENÇA RECORRIDA POR INCORRETA INTERPRETAÇÃO DO ART. 1157º E ART.1159º CC E ENQUADRAMENTO INDEVIDO DA PROCURAÇÃO NO CONTRATO DE MANDATO, SEM ATENDER AOS ART. 258, ART. 260º E ART. 263º DO CC, VINDO VEXAS A FINAL A PROFERIR ACORDÃO A / QUE NOS TERMOS DO ART. 402º DO CT E ART. 268º DECLARE VÁLIDA A REVOGAÇÃO DA DENUNCIA DO CIT; B/ E VÁLIDO E VIGENTE ESSE CONTRATO DE TRABALHO C) E EM CONSEQUENCIA RECONHEÇAM QUE A AUTORA TEM DIREITO ÀS RETRIBUIÇÕES INTERCALARES E À SUA REINTEGRAÇÃO» Contra-alegou a recorrida, propugnando pela improcedência do recurso.

A 1.ª instância admitiu o recurso de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Previamente, pronunciou-se no sentido de inexistirem quaisquer vícios, irregularidades, omissões ou nulidades na sentença.

Tendo o processo subido à Relação, foi observado o preceituado no n.º 3 do artigo 87.º do Código de Processo do Trabalho.

A Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer favorável à manutenção da decisão recorrida.

Não foi oferecida resposta.

O recurso foi mantido e foram dispensados os vistos, com a anuência dos Exmos. Adjuntos.

Cumpre apreciar e decidir.

* II. Questão prévia: do alegado erro material No requerimento de interposição do recurso, dirigido ao tribunal de 1.ª instância, a recorrente requereu a retificação de um erro material que alega verificar-se na alínea B) dos factos não provados.

Todavia, quando se lê a sugerida alteração/retificação do teor da alínea, percebe-se que não está em causa um erro material, mas uma discordância com o teor do facto dado como não provado.

Conforme se pode ler no sumário do Acórdão da Relação de Évora, de 04-07-2006, proferido no Proc. 1349/06-2[2], « [o] erro material dá-se quando o juiz escreveu coisa diversa do que queria escrever, quando o teor da sentença ou despacho não coincide com o que o juiz tinha em mente exarar, quando, em suma, a vontade declarada diverge da vontade real».

Igualmente com interesse, escreveu-se no sumário do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12-02-2009, proferido no Proc. 08A2680[3]: « Há erro material quando se verifica inexatidão na expressão da vontade do julgador, por lapso notório, sendo que a divergência entre a vontade real e a declarada não deve suscitar fundadas dúvidas, antes ser patente, através de outros elementos da decisão, ou, até, do processo. É o equivalente ao erro obstáculo tratado no direito substantivo».

Ou seja, os erros materiais (lapsus calami) a que se refere o artigo 614.º do Código de Processo Civil, correspondem a erros, omissões ou lapsos cometidos pelo juiz, que se revelam evidentes, traduzindo-se numa desconformidade entre a vontade declarada e a vontade real[4].

A 1.ª instância não reconheceu a existência do apontado erro material.

Inexistem elementos que levem a concluir que a alínea B) dos factos não provados contém qualquer erro material, por a vontade declarada divergir da vontade real.

Nesta conformidade, inexiste qualquer erro material que deva ser corrigido.

*III. Objeto do Recurso É consabido que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da Recorrente, com a ressalva da matéria de conhecimento oficioso (artigos 635.º n.º 4 e 639.º n.º 1 do Código de Processo Civil aplicáveis por remissão do artigo 87.º n.º 1 do Código de Processo do Trabalho).

Em função destas premissas, são as seguintes as questões suscitadas no recurso: 1.ª Nulidade da sentença.

  1. Impugnação da decisão de facto.

  2. Eficácia da revogação da denúncia. *IV. Matéria de Facto O tribunal de 1.ª instância considerou provados os seguintes factos: 1...

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