Acórdão nº 530/17.5T8SLV.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 12 de Maio de 2022

Magistrado ResponsávelCRISTINA DÁ MESQUITA
Data da Resolução12 de Maio de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Apelação n.º 530/17.5T8SLV.E1 (1.ª Secção) Relatora: Cristina Dá Mesquita Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Évora: I. Relatório I.1. Agência Funerária (…), Lda., exequente na ação executiva para pagamento de quantia certa que moveu contra (…) interpôs recurso da decisão proferida pelo Juízo de Execução de Silves, Juiz 2, do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, o qual declarou existir falta de título executivo com fundamento na ilegitimidade passiva da demanda do processo de injunção e, consequentemente, rejeitou o requerimento executivo com fundamento em verificação de exceção dilatória na fase declarativa e absolveu a executada da instância executiva. O teor da decisão sob recurso é o seguinte: «Na presente execução o título executivo consiste em requerimento de injunção com aposição de fórmula executória, referindo-se a causa de pedir, invocada para fundamentar o pedido, a despesas com o funeral da falecida mãe da Executada (…). Foi a Exequente ouvida quanto à questão da legitimidade passiva, uma vez que o pedido se funda em despesas de funeral, que são responsabilidade da herança, nos termos do artigo 2068.º do Código Civil. Veio aquela a pronunciar-se nos termos do requerimento de 10-9-2021 (ref. 9272338), que se dão por reproduzidos, concluindo que considera que a Executada (…), na qualidade de entidade contratante dos serviços e do fornecimento em questão, e não os tendo, oportunamente, pago, detém legitimidade passiva nos presentes autos. Nos termos do artigo 726.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (aplicável ex vi do artigo 551.º, n.º 3), o requerimento executivo é indeferido quando seja manifesta a falta ou a insuficiência do título (a)), quando ocorram exceções dilatórias, não supríveis, de conhecimento oficioso (b)), ou nos casos previstos nas alíneas c) e d). Para além do primeiro dos indicados fundamentos, há que ter em conta que a ilegitimidade constitui exceção dilatória nominada, e que as exceções dilatórias são de conhecimento oficioso – artigo 577.º, parte inicial e alínea e), e artigo 578.º do Código de Processo Civil. No caso, o teor do título executivo reflete uma relação negocial que tem contornos específicos, pois trata-se de uma relação que tem um objeto muito particular, e que não pode ser estabelecida de outra forma (exceto em casos em que estas despesas são previstas pelo próprio sujeito, autor da herança, ainda em vida) que não com a intervenção de pessoa que não é a quem se destinam, afinal, os serviços prestados. Estas evidências encontram regulação no citado artigo 2068.º do Código Civil, que prevê que “A herança responde pelas despesas com o funeral e sufrágios dos seu autor, pelos encargos com a testamentaria, administração e liquidação do património hereditário, pelas dívidas do falecido e pelo cumprimento dos legados.” É a herança que é responsável, nos termos da lei, pelas despesas a que se refere a injunção instaurada. Naturalmente, os serviços foram contratados pela filha da autora da herança; mas é o património da que tem de assegurar o pagamento do preço dos serviços prestados pela Exequente, e não o dos seus herdeiros. Por conseguinte, a injunção deveria ter sido intentada não contra a ora Executada, em nome próprio e na qualidade de contratante dos serviços, mas sim contra a herança, representada pelo cabeça-de-casal, ou contra todos os herdeiros, se é que existem outros para além da filha, aqui Executada. A não se entender assim, seria, no caso concreto, o património desta a responder diretamente por dívidas da herança, quando é esta que tem de responder, desde logo, pelas despesas de funeral. Verificando-se o exposto do teor do requerimento de injunção, ao qual foi aposta a fórmula executória, tem de concluir-se que, não obstante a execução ter sido promovida por quem lá consta como credor, e contra quem consta como devedora, o vício no plano dos pressupostos processuais, no procedimento declarativo, foi determinante para a formação do título apresentado à execução, com fundamento nos factos ali alegados. Concluindo-se pela ilegitimidade processual da Executada quanto à relação invocada como fundamento conformador do título executivo (artigo 30.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), decorre também que tal vício determina a falta de título para demandar a Executada por meio da presente execução. Quanto à oportunidade do conhecimento das exceções, este tem lugar no âmbito da primeira intervenção judicial no processo. O artigo 734.º do Código de Processo Civil permite que o juiz possa conhecer, oficiosamente, até ao primeiro acto de transmissão dos bens penhorados, das questões que poderiam ter determinado, se apreciadas nos termos do artigo 726.º, o indeferimento liminar ou o aperfeiçoamento do requerimento executivo. Estando em causa a falta de título, com base na ilegitimidade passiva da demandada, deve decidir-se pela rejeição do requerimento executivo. Em face do exposto, verificando-se falta de título, com fundamento em verificação de exceção dilatória na fase declarativa, e consistindo aquela falta, em si, em exceção dilatória, decide-se rejeitar o requerimento executivo, e absolver da instância executiva a Executada (…). Custas a cargo da Exequente. Registe e notifique». I.2. A recorrente formulou alegações que culminam com as seguintes conclusões: «A) A Recorrente Agência Funerária (…), Lda. intentou requerimento de injunção no dia 30/11/2016, ao qual foi atribuído o n.º 124494/16.7YIPRT e correu os seus termos do Balcão Nacional de Injunção, no qual requereu a condenação da ora Recorrida (…), no pagamento da quantia de € 2.450,00 (dois mil, quatrocentos e cinquenta euros) referente à fatura A/176 emitida em 17/06/2015 – processo n.º 2015/0162, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, calculados às taxas legais em vigor de 7,05% e 7,00% desde a data de vencimento da fatura (17/06/2015), que à data ascendiam ao valor de € 250,77 e da taxa de justiça no valor de € 51,00, num total de € 2.751,77 (dois mil e setecentos e cinquenta e um euros e setenta e sete cêntimos); B) A dívida é referente aos serviços prestados pela ora Recorrente no âmbito do funeral da mãe da Executada, Sra. (…), realizado no dia 10 de Junho de 2015, e que incluía, para além da execução do próprio funeral pelos trabalhadores da agência funerária, também a aquisição de diversos produtos (urna, lençol, véu, entre outros); C) Devidamente notificada a ora Recorrida do teor da referida injunção, não procedeu a mesma, dentro do prazo que lhe assistia, ao pagamento dos valores em dívida à agência funerária, assim como não deduziu oposição a essa pretensão da ora Recorrente, por bem saber que os valores estavam em dívida e deles se tinha comprometido a pagar, tendo sido no dia 9/03/2017 aposta – e bem – fórmula executória no requerimento de injunção em questão, e em cumprimento do disposto no artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 269/98, de 01 de Setembro – vide docs. 1, 2, 3, 4 e 5 ora juntos; D) Mantendo-se em dívida os valores referentes aos serviços fúnebres prestados pela ora Recorrente, foi intentada a ação executiva objeto dos autos recorridos, com base no referido título executivo – requerimento de injunção com fórmula executória, o qual é válido e foi obtido em cumprimento dos dispositivos e formalidades legais, nomeadamente nos termos constantes do regime dos procedimentos para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior à alçada do tribunal de 1.ª Instância, aprovado pelo referido Decreto-Lei n.º 269/98, de 01 de Setembro; E) Sem prejuízo do consignado em sede de Código Civil ao nível da responsabilidade da herança (artigo 2068.º e seguintes), o certo é que a ora Recorrida, na sua qualidade...

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