Acórdão nº 318/19.9T9ABF.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 24 de Maio de 2022

Magistrado ResponsávelEDGAR VALENTE
Data da Resolução24 de Maio de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - Relatório

No Juízo Local Criminal de Albufeira (J1) do Tribunal Judicial da Comarca de Faro corre termos o processo comum singular n.º 318/19.9T9ABF, no qual, realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença, decidindo o tribunal (transcrição): “Pelo exposto, com base nas disposições legais citadas, operando o cúmulo da pena aplicada nos presentes autos e da pena aplicada no processo sumario nº 2477/18.9GBABF do Juízo Local Criminal de Albufeira – Juiz 1, condeno o arguido AA na pena única de 14 meses de prisão efetiva em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância (artigos 1.º d), 4.º, 7.º, n.º 1 da Lei 33/2010 de 2 de setembro).” Inconformado, o arguido interpôs recurso de tal decisão, extraindo da motivação as seguintes conclusões (transcrição): “1- O recurso que ora se motiva é interposto da Douta Sentença proferida no processo em epígrafe referenciado que, procedendo ao cúmulo jurídico da pena aplicada ao arguido no âmbito dos presentes autos (Processo Comum Singular com o n.º 318/19.9T9ABF, do Juízo Local Criminal de Albufeira- Juiz 1), no âmbito do qual o ora recorrente foi condenado pela prática de um crime de violação de imposições, proibições e interdições, na pena única de 10 (dez) meses de prisão, em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, 2- bem como, no âmbito do Processo Sumário com o n.º 2477/18.9GBABF, do Juízo Local Criminal de Albufeira- Juiz 1, no âmbito do qual o ora recorrente foi condenado prática de um crime de desobediência, na pena de 9 (nove) de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 (um) ano, sujeita a regime de prova, que veio, entretanto, a ser prorrogada pelo período de 1 (um) ano, com imposição de cumprimento do pagamento do valor de € 450,00 à Santa Casa da Misericórdia, a 02/02/2021

3- Tendo, em consequência o arguido, ora recorrente, sido condenado na pena única de 14 (catorze) meses de prisão efectiva em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância

4- O recorrente entende ainda que a pena de 9 (nove) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 (um) ano, e posteriormente, prorrogada por mais 1 (um) ano, com imposição do cumprimento do pagamento da quantia de € 450,00 à Santa Casa da Misericórdia, que lhe foi aplicada, não se verificando a sua revogação, tem, por si natureza distinta da pena de prisão aplicada; 5- Dado que, a pena de prisão suspensa na sua execução, prevista no art. 50º do Código Penal, trata-se de uma pena autónoma de substituição; 6- Sendo que, conforme foi já decidido pelo Supremo Tribunal de Justiça (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 02-06-2004, Processo n.º 1391/04-3.ª, in CJSTJ 2004, tomo 2, pág. 217 (no caso de concurso de crimes, a aplicação de uma pena única supõe que estejam em causa penas da mesma natureza; daí que como tal não pode ser considerada a pena suspensa, pois constitui uma pena de substituição, de diferente natureza e com regras distintas de execução da pena de prisão); de 06-10-2004, Processo n.º 2012/04; de 20-04-2005, Processo n.º 4742/04; da Relação do Porto, de 12-02-1986, in CJ 1986, tomo I, pág. 204; e na doutrina, Nuno Brandão, em comentário ao Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 03-07-2003, na Revista Portuguesa de Ciência Criminal, 2005, n.º 1, págs. 117 a 153, não se mostra possível cumular uma pena de prisão suspensa na sua execução com uma pena de prisão efectiva; 7- Pois, a pena suspensa tem uma natureza distinta da pena de prisão, não sendo comparável, conceptual, político-criminalmente ou em termos de execução, à pena de prisão; 8- Razão pela qual, não poderá, em nosso modesto entender e, salvo o devido respeito por diversa opinião, ser tal pena incluída no Cúmulo Jurídico realizado; 9- Dado que, só a revogação determina o cumprimento da pena de prisão fixada na sentença (Cfr. art. 56º, n.º 2 do Código Penal); 10- Pois, se tal enquanto esta pena não for declarada extinta ou revogada a suspensão, não é susceptível de execução como pena de prisão; 11- Para além de que, tal revogação não é automática, mesmo verificados os pressupostos de que depende (art. 56º do Código Penal), mostra-se sempre necessária uma decisão que aprecie e avalie se a quebra dos deveres de que depende a suspensão assume gravidade que determine a revogação; 12- Pois, mesmo que se verifique a prática de um crime no decurso da mesma, é necessário constatar-se que não puderam ser alcançadas as finalidades que estiveram na base da suspensão; 13- E, se estabelece o n.º 1 do art. 78º do Código Penal que “ (…) sendo a pena que já tiver sido cumprida descontada no cumprimento da pena única aplicada ao concurso de crimes “, não se compreende como se procede ao desconto da parte cumprida de uma pena suspensa na sua execução, decorrente de regime de prova; 14- Tal como seria bastante injusto e desajustado para com as finalidades de punição, a aplicação de uma pena de prisão suspensa na sua execução, com regime de prova, cumprir-se o regime imposto e, a final, a arguido ter ainda que cumprir a pena de prisão efectiva, decorrente da realização de um cúmulo jurídico; 15- Pois assim sendo a realização de um cúmulo jurídico não traria ao arguido, quaisquer benefícios, muito pelo contrário! 16- Dado que vem penalizar duplamente o arguido e ir contra tudo aquilo que foi considerado aquando da Audiência de Julgamento, onde lhe havia sido dado um voto de confiança e, como tal, uma hipótese de cumprir, em liberdade, uma pena de prisão suspensa na sua execução; 17- Isto, sem esquecer que o arguido, ora recorrente pagou já à Santa Casa da Misericórdia, metade do valor fixado, conforme ficou provado em sede de Audiência de Cúmulo Jurídico

18- Sendo que, ao englobar-se num cúmulo jurídico uma pena de prisão suspensa na sua execução com uma pena de prisão efectiva, mais não se faz do que permitir que, após o trânsito em julgado da decisão, seja aplicada uma pena mais gravosa do que aquela que havia sido prevista no momento da verificação dos respectivos pressupostos, violando-se assim, o previsto no art. 29º da Constituição da República Portuguesa, o que, desde já, se invoca; 19- Pelo que, tendo em conta o supra exposto, conclui o ora recorrente que não deverá ser cumulada a pena de 10 (dez) meses de prisão, a cumprir em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, fixada no âmbito dos presentes autos (Processo Comum Singular com o n.º 318/19.9T9ABF, do Juízo Local Criminal de Albufeira- Juiz 1), e que, o ora recorrente se encontra a cumprir actualmente, com a pena de 9 (nove) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 (um) ano, e posteriormente, prorrogada por mais 1 (um) ano, com imposição do cumprimento do pagamento da quantia de € 450,00 à Santa Casa da Misericórdia, que lhe foi aplicada no âmbito do Processo Sumário com o n.º 2477/18.9GBABF do Juízo Local Criminal de Albufeira- Juiz 1; Caso assim não se considere e sempre sem Prescindir, 20- O Arguido/ Recorrente não se pode conformar com a pena única de prisão, a cumprir em regime de permanência na habitação, com fiscalização através de meios técnicos de controlo à distância, que lhe foi aplicada, pelo Tribunal “a quo”, em Cúmulo Jurídico, a qual foi fixada em 14 (catorze) meses, por considerar que, em abono da justiça, dever-se-á proceder à redução desta pena de prisão, fixada na Douta Sentença, por uma pena de 10 (dez) meses de prisão, a cumprir em regime de permanência na habitação, com fiscalização através de meios técnicos de controlo à distância

21- Ora, conforme dispõe o art. 77º, n.º 1 do Código Penal, quando alguém tiver praticado vários crimes, antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles, é condenado em pena única, sendo nesta, considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente

22- Estabelecendo o n.º 2 do art. 77º do Código Penal que, a pena aplicável terá como limite máximo, a soma das penas concretamente aplicadas e, como limite mínimo, a mais elevada das penas concretamente aplicadas

23- Pelo que, neste caso, o limite mínimo da pena a aplicar, será assim, de 10 (dez) meses de prisão, e o seu limite máximo de 19 (dezanove) meses de prisão

24- O art. 71º do Código Penal, cuja violação o recorrente invoca desde já, como fundamento para a sua pretensão, estabelece que a medida das penas determina-se em função da culpa do arguido e das exigências da prevenção no caso concreto, atendendo-se a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor ou contra ele

25- Ora, no caso sub judice, considerou a Meritíssima Juíza do Tribunal “a quo” que o arguido “(…) demonstrou uma postura de arrependimento, aliado ao facto de se encontrar sociofamiliar inserido.” 26- Vejamos o que diz o art. 71º do Código Penal, cuja violação o recorrente invoca desde já, como fundamento para a sua pretensão, que estabelece que a medida das penas determina-se em função da culpa do arguido e das exigências da prevenção no caso concreto, atendendo-se a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor ou contra ele

27- Sendo que, e não obstante o facto das exigências de prevenção geral, serem bastante elevadas, tendo em conta os ilícitos em causa, o mesmo não se poderá dizer e, salvo o devido respeito por diversa opinião, quanto às exigências de prevenção especial, dado o arrependimento demostrado pelo arguido e a sua integração a nível social e familiar

28- Pelo que, tendo em conta todas as circunstâncias atenuantes supra expostas, parece-nos que deveria ser reduzida a pena unitária aplicada ao ora recorrente

29- Assim, e tendo em conta que, o mínimo da pena a aplicar seria de 10 (dez) meses de prisão, sendo o seu limite máximo de 19 (dezanove) meses de prisão, 30- Parece-nos assim, e, salvo o...

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