Acórdão nº 19/22.0GBMRA.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 15 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelARTUR VARGUES
Data da Resolução15 de Dezembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora I - RELATÓRIO 1. Nos presentes autos com o NUIPC 19/22.0GBMRA, do Tribunal Judicial da Comarca de… – Juízo de Competência Genérica de …, em Processo Especial Abreviado, foi o arguido AA condenado, por sentença de 07/06/2022, nos seguintes termos: Pela prática, como autor material, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo artigo 292º, nº 1, do Código Penal, na pena de 10 meses de prisão; Pela prática, como autor material, de um crime de violação de imposições, proibições ou interdições, p. e p. pelo artigo 353º, do Código Penal, na pena de 8 meses de prisão

Após cúmulo jurídico, foi condenado na pena única de 1 ano e 2 meses de prisão, a cumprir em regime de permanência na habitação, com fiscalização por vigilância electrónica, na sua residência sita no …, …, …, sujeito à obrigação de se submeter a consultas médicas para despiste de adição alcoólica e, sendo caso disso, a tratamento clínico/psiquiátrico adequado, a acompanhar e fiscalizar pela Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais

Foi autorizado o arguido a sair da residência para, pelo tempo estritamente necessário e de modo devidamente comprovado perante a Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, frequentar consultas médicas/tratamentos de eventual adição alcoólica, conforme a sobredita obrigação imposta

Quaisquer outras ausências da habitação seriam, casuisticamente, decididas pelo Tribunal da Execução das Penas, a requerimento do arguido

Foi ainda condenado na pena acessória de proibição de condução de veículos a motor pelo período de 2 anos, ao abrigo do estabelecido no artigo 69º, nº 1, alínea a), in fine, do Código Penal

  1. O arguido não se conformou com a decisão e dela interpôs recurso, tendo extraído da motivação as seguintes conclusões (transcrição): A) O recorrente foi condenado, em cúmulo jurídico, ao cumprimento de uma pena de prisão de 1 (um) ano e 2 (dois) meses

    B) Mais decidiu o tribunal “a quo” que a execução da referida pena de prisão seria em regime de permanência na habitação com vigilância electrónica

    C) Desde logo foi concedida autorização ao recorrente para sair da habitação, pelo tempo estritamente necessário à frequência de consultas médicas/tratamentos de eventual adição alcoólica

    D) O Tribunal desconsiderou a possibilidade do recorrente se ausentar da habitação para o exercício da sua actividade laboral, por considerar as características desse exercício incompatível com o regime da execução da pena em regime de permanência na habitação com vigilância electrónica, fundamentando-se nos relatórios sociais elaborados ao recorrente

    E) O relatório social elaborado em 30 de Maio de 2022, que reflecte as actuais condições sociais do recorrente, não manifesta qualquer incompatibilidade entre o exercício da actividade laboral deste e a execução da pena de prisão no regime de permanência na habitação com vigilância electrónica, pelo contrário parece prevê-lo e acautelar as condições para a concessão dessa autorização

    F) O artigo 43º n.º 3 do Código Penal prevê a possibilidade do Tribunal autorizar ausências da habitação, entre outros, para o exercício da actividade profissional, desde que se mostrem devidamente acauteladas as necessidades de prevenção geral e especial

    G) Não se vislumbra que o exercício de actividade laboral pelo recorrente coloque em crise as finalidades de prevenção que conduziram à aplicação do regime de permanência na habitação, sendo certo que contribuirá para a sua ressocialização

    H) Pelo contrário, a autorização de saída para o exercício da sua actividade profissional propiciará, à partida e em regra, boas condições para a eficácia preventiva da pena, na sua dimensão positiva de reabilitação ou de reinserção social do recorrente e, nessa medida, melhor salvaguardará as necessidades de prevenção especial. I) O direito ao trabalho ou ao exercício da actividade profissional, impõe ponderação estruturada pelas máximas da proporcionalidade, da proibição do excesso ou da proibição do défice, ou, em alternativa, pelas exigências de garantia da dignidade da pessoa humana. J) Efectivamente, o trabalho é um meio de combater o ócio, “essa ociosidade que é a mãe de todos os vícios”, mas também o testemunho da dignidade do homem, de desenvolvimento da personalidade

    L) A ausência de trabalho provoca descontentamento, permite que o corpo seja dominado pela lassidão, dá origem à impaciência, ao desejo de vaguear de um lado para outro, à inconstância, ao tédio”. M) Tendo em conta o tipo de crimes em causa (pequena criminalidade), o comportamento do arguido e a sua personalidade, que confessou integralmente os factos porque se mostra acusado, reconhecendo a existência de um problema no que respeita aos seus consumos de álcool e aceitando submeter-se a um programa de tratamento a adição alcoólica fazem crer que a autorização de saída para o exercício da sua actividade laboral não deixará de manter um juízo de prognose favorável quanto as necessidades de prevenção que “in casu” se fazem sentir. N) O Tribunal “a quo” considerou como circunstâncias favoráveis ao arguido, o facto de estar social, economicamente e laboralmente inserido, revelando hábitos de trabalho. O) Estando salvaguardadas as necessidades de prevenção geral e especial, como cremos que estão, Impedir o recorrente de exercer a sua actividade laboral, é desvalorizar a sua integração laboral e consequentemente um dos factores que contribui a seu favor enquanto indivíduo útil à sociedade. P) Ao regime de permanência na habitação deverá ser assegurada a compatibilização com saídas para o trabalho ou outras actividades sociais necessárias à reintegração social do recorrente, só assim será uma pena verdadeiramente eficaz

    Termos em que e nos melhores de direito, sempre com mui douto suprimento de V. Exas. Venerandos Desembargadores, nos termos do artigo 43º n.º 3 do código penal, deverá a douta sentença recorrida ser substituída por outra que, na execução da pena de prisão em regime de permanência na habitação, autorize o recorrente a sair da sua residência, pelo tempo necessário ao exercício da sua actividade laboral

  2. O recurso foi admitido, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo

  3. A Magistrada do Ministério Público junto do tribunal a quo apresentou resposta à motivação de recurso, pugnando pelo seu não provimento

  4. Nesta Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso

  5. Foi cumprido o estabelecido no artigo 417º, nº 2, do CPP, não tendo sido apresentada resposta

  6. Colhidos os vistos, foram os autos à conferência

    Cumpre apreciar e decidir

    II - FUNDAMENTAÇÃO 1. Âmbito do Recurso O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, havendo ainda...

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