Acórdão nº 812/21.1T8EVR-B.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 15 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelPAULA DO PAÇO
Data da Resolução15 de Dezembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1] I. Relatório AA, patrocinada pelo Ministério Público, intentou ação declarativa emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma de processo comum, contra BB – Herdeiros, pedindo que seja declarada a ilicitude do seu despedimento e que o Réu seja condenado a pagar-lhe: - 1.587,50 €, relativos à compensação por falta de pré-aviso de 75 dias; - 9.151,70 €, relativos à indemnização prevista no artigo 391.º do Código de Trabalho, tendo em conta a antiguidade de 14 anos e 5 meses; - 171,58 €, referente a diferença na retribuição de junho de 2020; - Juros de mora, à taxa supletiva legal de 4%, sobre as quantias em dívida e até integral pagamento.

No essencial, alegou que o seu despedimento foi ilícito e que é titular dos créditos laborais peticionados.

Frustrada a tentativa de conciliação realizada na audiência de partes, foi apresentada contestação.

Para o que agora interessa, invocou-se, nesta peça processual, a falta de personalidade judiciária da herança, porque já não se trata de uma herança jacente, uma vez que foi aceite pelos herdeiros. Mais se pugnou pela absolvição da instância, nos termos previstos pelo artigo 278.º, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Civil.

A Autora respondeu, alegando que não foi feita qualquer prova da identidade dos herdeiros de BB e de que esses herdeiros aceitaram a herança, não se tratando já de herança jacente. Pronunciou-se pela improcedência da exceção dilatória invocada.

No âmbito do despacho saneador proferido em 26/09/2021, escreveu-se o seguinte: «§1. Da exceção dilatória de falta de personalidade judiciária invocada.

AA intentou a presente ação declarativa de condenação com processo comum contra BB – HERDEIROS, nos termos da qual peticionou que estes sejam condenados no pagamento da quantia global de € 10.910,78, acrescida dos correspondentes juros de mora vencidos e vincendos até efetivo e integral pagamento.

Compulsados os autos, constata-se ter sido apresentada contestação aos pedidos de condenação acima descritos, a qual foi subscrita por mandatária com procuração forense outorgada por (apenas) um dos herdeiros do de cujus, a saber, CC (cf.

requerimento de 10-06-2021 / ref. citius n.º 2953100).

Mais se constata da leitura dos autos, outrossim, ter sido invocada, no referido articulado de contestação, a exceção dilatória de falta de personalidade judiciária da herança (jacente) para os termos da causa.

Ora, no que respeita à exceção dilatória invocada, começará por se notar não se vislumbrar existir fundamento bastante para a respetiva procedência. O que decorre, quer da interpretação literal da petição inicial apresentada (conforme se disse, a presente ação foi intentada contra BB – Herdeiros), quer em face do próprio processado nos autos.

Com efeito, e por um lado, quer o dever de gestão processual (cf. artigo 27..º, n.º1 do Código de Processo do Trabalho), quer o princípio da adequação formal (cf. artigo 547.º do Código de Processo Civil, ex vi artigo 1.º, n.º 2, alínea a) do Código de Processo do Trabalho) parecem impor que se interprete a petição inicial apresentada como tendo sido intentada contra os herdeiros de BB; conforme resulta, reitera-se, do respetivo elemento literal.

É, aliás, o que se extrai da jurisprudência constante do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 16-04-2015, proc. n.º 4933/13.6TCLRS.L1-8, rel. Sacarrão Martins, disponível em www.dgsi.pt, segundo o qual «(…) o espírito e a filosofia que estão subjacentes ao Código de Processo Civil [aplicável nesta sede, por força do disposto no artigo 1.º, n.º 2, alínea a) do Código de Processo do Trabalho] também apontam para a conveniência de interpretar a petição inicial de modo a que a ação possa ser aproveitada, evitando a absolvição da instância por razões meramente formais e sem que tal justificação se vislumbre como efetivamente necessária. De facto, a filosofia subjacente ao Código de Processo Civil – concretizada por diversos modos em várias disposições legais – visa assegurar, sempre que possível, a prevalência do fundo sobre a forma, pretendendo que o processo e a respetiva tramitação possam ter a maleabilidade necessária para que possa funcionar como um instrumento (e não como um obstáculo) para alcançar a verdade material e a concretização dos direitos das partes (…)».

Em face do exposto, forçoso será concluir que a eventual procedência da exceção dilatória invocada consubstanciar-se-ia num mero formalismo, o qual implicaria, quer a montante, a propositura de nova ação por parte da Autora (cf. artigo 279.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, ex vi artigo 1.º, n.º 2, alínea a) do Código de Processo do Trabalho), quer a jusante, a dilação (porventura excessiva) do tempo de resolução do presente litígio.

Não deixando de se assinalar, porque relevante nesta sede, que a propositura da presente ação contra ‘BB – HERDEIROS’ terá sido justificada, de acordo com os elementos constantes dos autos, pela circunstância de ser precisamente essa a identificação da entidade empregadora que se encontra registada junto do Instituto da Segurança Social (cf. doc. 1 junto com a petição inicial).

Por outro lado, resulta dos autos que o herdeiro CC outorgou procuração forense em representação dos herdeiros de BB e, bem assim, que se fez representar em sede de audiência de partes (cf. ata de 01-06-2021 / ref. citius n.º 30682013), apresentando posteriormente contestação nos autos.

Pelo exposto, inexiste fundamento para a procedência da exceção dilatória invocada, na medida em que, não só a presente ação foi intentada contra os referidos herdeiros, nos termos acima assinalados, como ainda foi contestada por um deles, o qual, aliás, interveio já em sede de audiência de partes, através de mandatário forense.

Nestes termos, e em face do exposto, julga-se improcedente a exceção dilatória de falta de personalidade judiciária invocada pelo Réu.

*Sem embargo, o que se disse não permite concluir, de per si, pela regularidade da presente instância.

Com efeito, dispõe o artigo 2091.º, n.º 1 do Código Civil que, «fora dos casos declarados nos artigos anteriores, e sem prejuízo do disposto no artigo 2078.º, os direitos relativos à herança só podem ser exercidos conjuntamente por todos os herdeiros ou contra todos os herdeiros»; o que, conforme resulta patente, sucede nos presentes autos.

O que está em causa é, pois, uma situação de litisconsórcio necessário passivo, uma vez que é a própria lei que exige a intervenção dos vários interessados na relação controvertida no processo (cf. artigo 33.º, n.º 1 do Código de Processo Civil) – no caso, os herdeiros de BB –, cuja preterição constitui exceção dilatória, de conhecimento oficioso e que implicará a absolvição dos Réus da instância (cf. artigos 278.º, n.º 1, alínea d), 577.º, alínea e), e 578.º, todos do Código de Processo Civil).

Trata-se, no entanto, de uma exceção dilatória sanável mediante o chamamento dos herdeiros já referidos aos presentes autos; o que, na situação em apreço, deverá ser ordenado oficiosamente pelo tribunal.

Em face do exposto, ao abrigo do disposto no artigo 27.º, n.º 2, alínea a) do Código de Processo do Trabalho e 2091.º, n.º 1 do Código Civil, determina-se a citação das co-herdeiras DD e EE, com cópia dos articulados já oferecidos pelas partes, a fim de integrarem o lado passivo da presente ação (cf. artigo 319.º, n. os 2 e 4 do Código de Processo Civil, mutatis mutandis, aplicável por força do artigo 1.º, n.º 2, alínea a) do Código de Processo do Trabalho).

Oportunamente, proceda à correção da identificação dos Réus no processo físico e eletrónico e requisite e junte aos autos as respetivas certidões dos assentos de nascimento.» Tendo-se cumprido a ordenada citação, a co-herdeira EE veio apresentar contestação. Invocou a exceção da sua ilegitimidade passiva, baseada no repúdio da herança, e impugnou toda a factualidade alegada pela Autora.

Em 12/11/2021, foi proferido o seguinte despacho: «Requerimento de 22-10-2021 / ref. citius n.º 3068033: Em sede de despacho saneador, foi determinada a intervenção principal das co-herdeiras DD e EE, com cópia dos articulados já oferecidos pelas partes, a fim de integrarem o lado passivo da presente ação (cf. artigo 319.º, n.os 2 e 4 do Código de Processo Civil, mutatis mutandis, aplicável por força do artigo 1.º, n.º 2, alínea a) do Código de Processo do Trabalho).

Dispõe, para o efeito, o 319.º do Código de Processo Civil que: «1- Admitida a intervenção o interessado é chamado por meio de citação.

2- No ato de citação, recebem os interessados cópias dos articulados já oferecidos, apresentados pelo requerente do chamamento.

3- O citado pode oferecer o seu articulado ou declarar que faz seus os articulados do autor ou do réu, dentro de prazo igual ou facultado para a contestação, seguindo-se entre as partes os demais articulados admissíveis.

4- Se intervier no processo passado o prazo a que se refere o número anterior, tem de aceitar os articulados da parte a que se associa e todos os atos e termos já processados».

Ora, compulsados os autos, constata-se que o tribunal já se pronunciou sobre a legitimidade processual das partes, em sede de despacho de saneador.

Mais se constata, outrossim, que a chamada EE foi citada após o decurso do prazo para apresentação da Contestação, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 319.º, n.º 4 do Código de Processo Civil, acima transcrito.

Em face do exposto, uma vez que a Contestação que antecede não se afigura legalmente admissível, nos termos supra assinalados, determina-se o respetivo desentranhamento, inclusive informaticamente, bem como o documento que a acompanha, o qual consta já dos autos e cujo teor será tido em consideração em sede de decisão final a proferir.

Notifique.» Inconformada com o decidido, veio a co-herdeira EE interpor recurso de apelação para esta Relação, rematando as suas alegações, com as conclusões que, seguidamente, se transcrevem: «1.

No âmbito...

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