Acórdão nº 1084/19.3TELSB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 15 de Dezembro de 2022

Data15 Dezembro 2022

Acordam, em conferência, os juízes da Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: Na Tribunal Judicial da Comarca de … - Juízo Local Criminal de … – Juiz …, mediante acusação do Ministério Público, foi julgado em processo comum, perante o tribunal singular, com documentação das declarações oralmente prestadas em audiência, o arguido a seguir identificado: AA, filho de BB e de CC, solteiro, nascido em …-…-1975, natural de …, com domicílio na Rua …, …; A final, foi decidido julgar a acusação improcedente, e, em consequência:

  1. Absolver o arguido AA da prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de pornografia de menores, p. e p. pelo artigo 176.º, n.º 1, alínea c) e n.º 8, agravado pelo artigo 177.º, n.º 6 e n.º 7, todos do Código Penal

    Inconformado, o Ministério Público interpôs recurso da referida decisão, formulando as seguintes conclusões: “1 - Por sentença proferida a 30.05.2022, o arguido AA foi absolvido da prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de pornografia de menores, p. e p. pelo artigo 176.º, n.º 1, alínea c) e n.º 8, agravado pelo artigo 177.º, n.º 6 e n.º 7, todos do Código Penal

    2 - O Ministério Público não concorda com a sentença proferida, considerando que efectuou incorrecto julgamento da matéria de facto, uma vez que as provas produzidas impunham decisão contrária – prova dos factos considerados como não provados e subsequente condenação do arguido

    3 - Com efeito, consideramos que os factos dados como não provados na decisão deverão ser considerados como provados nos seguintes termos [alterando-se os mesmos em conformidade com a alteração do facto nº 1 dos factos provados efectuada na decisão]: - O arguido atuou como descrito em 1 bem sabendo que aquele ficheiro continha um vídeo 1. onde surge um menor com idade inferior a 14 anos, do sexo masculino, e um elemento de sexo feminino de idade não apurada, encontrando-se ambos integralmente desnudos, e no qual se visualiza o menor do sexo masculino, de costas, com o seu corpo por cima do corpo do elemento do sexo feminino, no meio das pernas desta, a fazer movimentos sucessivos para a frente e para trás, como se estivesse a introduzir e a retirar o seu pénis na vagina da desta

    - O arguido agiu livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida pela lei penal

    4 – Para tanto, indicam-se como provas concretas que impõem decisão diversa da proferida, as declarações prestadas pelo arguido, pela testemunha DD, o fotograma, bem como a demais prova documental constante do processo, desde já se especificando, nos termos do disposto no artigo 412.º, n.º 4, as provas, de entre essas, gravadas:

  2. Declarações do arguido: Minuto 0:03:00 a 00:4:22 (do dia 18.05.2022); minuto 0:06:00 (do dia 18.05.2022): minuto 0:07:53 (do dia 18.05.2022); minuto 0:09:55 a 0:11:50 (18.05.2022): minuto 0:14:26 (do dia 18.05.2022) (arguido confrontado com a sms reencaminhada com o vídeo fls. 12 a 16); 0:14:48 (do dia 18.05.2022): (arguido confrontado com as sms a fls.14 v); b) Depoimento de DD: minuto 0:05:45 a 00:6: 45 (do dia 18.05.2022); minuto 0:12:15 a 00:12:40 (do dia 18.05.2022); minuto 0:14:50 a 00:15:09 (18.05.2022); minuto 0:17:15 a 00:18:19 (do dia 18.05.2022); c) Depoimento de EE: 0:05:00 a 00:05:5:10 (do dia 18.05.2022)

    5 – A absolvição fundou-se, essencialmente, nas declarações prestadas pelo arguido, tendo a decisão considerado credível o facto de ele ter partilhado o vídeo com 5 pessoas sem ter visionado o seu conteúdo e sem do mesmo estar ciente, porquanto fundamenta a decisão que prestou declarações espontâneas e coerentes, nomeadamente quando afirmou que o título do vídeo não lhe suscitou nada de relevante, que não abriu o vídeo previamente à sua partilha, que, mesmo tendo visionado o thumbnail, dada a dimensão do ecran, não seria possível ter percepção do conteúdo. Ademais, considerou credível que o arguido partilhasse vídeos e outros ficheiros sem visionar o seu conteúdo por vários grupos em que participam inúmeros cidadãos

    6 – A sentença, assim norteada, considerou tais declarações totalmente consentâneas com as prestadas, nomeadamente, pela esposa do arguido, EE que, entre o mais, referiu que o arguido partilhava ficheiros em vários grupos, desde que – sublinhamos dada a sua importância – considerasse úteis aos grupos (tal como aduz a Mma. Juíza na sentença recorrida). Talqualmente, evidenciou a sua compatibilidade com o depoimento de DD, ao referir que esta testemunha atestou ter ficado com a convicção de que o arguido “não sabia do que efectivamente tinha aquele ficheiro” 7 – Ora, desde logo a testemunha DD não atestou tal convicção, tendo o seu depoimento sido cilindrado: - uma vez: “(…) eu confrontei-o com o ficheiro e o arguido recordava-se que efetivamente tinha feito essa partilha.” (….); - duas vezes: “sim, ele recordava-se do vídeo. Ele foi confrontado com o fotograma e recordava-se de o ter partilhado.” - Três vezes: “ele desconhecia os motivos pelos quais tinha sido chamado, mas depois confrontei-o com o tal frame e ele recordava-se sim, que se recordava de ter feito esse upload.” - Quatro vezes: “ele recordava-se de ter visto o vídeo e de o ter partilhado.” - Cinco vezes: “ele tinha consciência que o vídeo com atos sexuais ou simulação de atos sexuais que envolvia menores em práticas sexuais? Sim!” 8 – Já quanto às declarações do arguido, cumpre referir que: - Nenhuma outra defesa se poderia esperar do arguido, que, não podendo refutar o óbvio, argumentou que enviou o vídeo sem o visualizar primeiro; - O arguido referiu partilhar diversos tipos de ficheiros que reencaminhava para várias pessoas sem ver o seu conteúdo, o que é totalmente incoerente com as regras da experiência comum, com a diligência e sensatez que o arguido apresenta, bem como com as declarações da sua esposa que expressamente referiu que, de facto, o marido enviava vários ficheiros em vários grupos, se úteis aos mesmos; - Por outro lado, não logrou explicar, perante o que afirmou relativamente a partilha massiva de ficheiros sem ver o seu conteúdo, o motivo pelo qual enviou este concreto ficheiro apenas a 5 pessoas – ora, se o arguido enviava assim tantos ficheiros em tantos grupos, tal suscita-nos clara estranheza e retira credibilidade às suas declarações; - Ainda que não tivesse visualizado o vídeo integralmente, visionou o Thumbnail no qual é claramente visível que se trata de um menor de 14 anos envolvido em actos sexuais. Mesmo sem visionar o conteúdo integral do vídeo, as imagens aparentes são de cunho marcadamente sexual e caris pornográfico. Sendo, ainda, de imediato apreensível pelo utilizador da rede social que o jovem representado naquelas imagens é menor...

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