Acórdão nº 73/19.2IDSTB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 13 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA CLARA FIGUEIREDO
Data da Resolução13 de Setembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - Relatório.

Nos presentes autos que correm termos no Juízo de Instrução Criminal de ... - Juiz 2, do Tribunal Judicial da Comarca de ..., com o n.º 73/19.2IDSTB, foi proferido despacho de não recebimento dos requerimentos de abertura de instrução apresentados pelos arguidos AA e BB, identificados nos autos, em virtude de os mesmos terem sido considerados legalmente inadmissíveis.

Inconformado com tal decisão, veio o identificado arguido BB interpor recurso da mesma, tendo apresentado, após a motivação, as conclusões que passamos a transcrever: “A. Discorda o arguido da decisão do Tribunal a quo, na medida em que este, para a justificar, partiu de pressupostos erróneos que, como tal, se impõem apreciar e determinar com vista a acautelar decisão diversa da recorrida, impugnando-se desta forma a decisão nos termos dos artigos 399.º, 401º n. º 1, b), 407. º n. º 1, 408. º n. º 3,410. º e 412. º do Código de Processo Penal, nomeadamente, B. Está em causa a verificação ou não da causa de SUSPENSÃO prevista no art. 47. º do RGIT, de acordo com a lei aplicável à data da prática dos factos.

  1. Em questão estão os efeitos da Impugnação Judicial interposta junto do Tribunal Administrativo e Fiscal ...: encontra-se ou não abrangida na previsão dos suprarreferidos preceitos.

  2. O Tribunal a quo, para não admitir a Suspensão, partiu de pressupostos de facto inaplicáveis pelo que se impõe decisão diversa da recorrida, impugnando-se desta forma a decisão sobre esta parte e de que importa referir A mera Suspensão dos autos não determina a não submissão a julgamento.) E. Segundo o douto despacho recorrido "(...) que tal suspensão pode ser suscitada já nessa fase (leia-se do julgamento)." F. Isto depois de se considerar que o legislador não define o que entende por "inadmissibilidade lega/ de Instrução" G. Para acrescentar que, admitindo-se a instrução, estaríamos perante uma fase inútil.

  3. Resulta dos autos que foi interposta a Impugnação Judicial supramencionada pelo que, s.m.o., está o M. 0 Juiz vinculado aos estritos termos legais e, essencialmente, na parte em que lesa os seus direitos de não prosseguirem os autos (crime) sem que esteja definida a situação tributária pelo que, isso sim, seria absolutamente inútil marcar julgamento e no âmbito do Processo de Impugnação vir a ser proferida decisão que não acolha a pretensão da AT, de tributar a situação em causa, o que conduziria a uma série de atos processuais inúteis que haveria que expurgar mediante arquivamento.

    l. Mais, está-se perante a consolidação da interpretação do disposto no art. 47.º do RGIT, na Jurisprudência, consentânea com a posição do ora Recorrente, vide a contrario sensu o recente Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 24 Jun. 2020, Processo 931/11.2TAMGR/B [Elisa Costa Sales] "A ação administrativa especial interposta por sociedade com o estatuto de arguida no âmbito de processo de natureza criminal que não vise discutir situação tributária de cuja definição dependa a qualificação crimina/ dos factos imputados, não determina a suspensão do processo penal tributário".

  4. Naquele Acórdão, tomado sobre situação diametralmente oposta à dos presentes autos, consignou-se que a suspensão do processo penal tributário será, pois, obrigatória quando a questão em discussão na impugnação judicial seja uma verdadeira questão prejudicial no processo penal em curso, nos termos do preceituado pelo n.º 2, do artigo 7.º, do Código de Processo Penal, ou seja, quando a decisão dessa questão (prejudicial) seja indispensável para a decisão do crime fiscal ou tributário (questão prejudicada), relativamente à qual se assume como um verdadeiro "antecedente jurídico-concreto", de carácter autónomo.

  5. E, no caso vertente, verificam-se todos os pressupostos para a suspensão do processo penal tributário previsto no n. º 1 do artigo 47º do RGIT.

    L. Com efeito, a ação administrativa, com o n.º 281/21...., que corre termos no TAF ..., é uma impugnação judicial.

  6. A Impugnação Judicial Tributária é um dos meios processuais de defesa, dos sujeitos passivos contra a AT, com vista a salvaguardar a sua posição em função do que determina a Lei substantiva e o cpp.

  7. Os fundamentos da impugnação são os que constam do artigo 99º e sgs. do Código de Procedimento e do Processo Tributário (CPP que se encontram preenchidos com a interposição da em apreço.

  8. Ou seja, na ação em referência discute-se a situação tributária.

  9. Tal como consta do acórdão da Relação de Lisboa, de 10-04-2014, Proc. 438/12.01DLSB-B.L1-9, rel. Ana Filipa Lourenço, disponível em www.dgsi.pt, "I- A possibilidade de suspensão do processo penal fiscal nos termos do artº 470 no 1 do RGIT está delimitado por requisitos taxativos e cumulativos. Para que tal suspensão ocorra, é necessário que esteja pendente processo de impugnação judicial ou oposição à execução e que para além disso, nestes se debata uma verdadeira questão prejudicial, ou seja tem que ser ali discutida a situação tributária do arguido, de cuja definição dependa a qualificação criminal dos factos concretos que lhe são imputados no processo-crime." Q. O entendimento do Mº Juiz não é consentâneo com a melhor interpretação na Lei, pois, em sentido diametralmente oposto, assim o determinou o Mº JIC "Por decisão proferida em 04.06.2021, o Sn Juiz de Instrução Criminal ... determinou, ao abrigo do artº 47º nº 1 do RGIT, "a suspensão dos presentes autos até que seja proferida nos processos de impugnação uma sentença transitada em julgado", vide Acórdão da Relação do Porto, Processo n.º 2/13.51DPRT-A.P, EDUARDA LOBO "PRINCÍPIO DA SUFICIÊNCIA DO PROCESSO PENAL QUESTÃO PREJUDICIAL - SUSPENSÃO DO PROCESSO PENAL TRIBUTÁRIO - EXTENSÃO " R. Assim sendo, mostra-se demonstrado que assiste legalmente o direito ao arguido de requerer a Suspensão dos Autos, no âmbito do presente procedimento criminal na fase de Instrução, nos termos e para os efeitos das disposições conjugadas dos artigos 47.º do RGIT e 286.º e 287º do CPP, o Douto Acórdão do STA, Processo n. ...7, de 19-09-2007.” Termina pedindo a revogação da decisão recorrida e a sua substituição por outra que determine o recebimento do requerimento de abertura de instrução e a suspensão do procedimento criminal até que seja proferida decisão com menção de trânsito em julgado no processo prejudicial.

    *O recurso foi admitido.

    Na 1.ª instância, o Ministério Público, pugnou pela improcedência do recurso e pela consequente manutenção da decisão recorrida, tendo apresentado as seguintes conclusões: “1.ª Ao contrário do veiculado pelo Recorrente, não são pacíficos os efeitos da suspensão do art. 47.º do RGIT, nomeadamente sobre a sua comunicabilidade aos co-arguidos não impugnantes ou não oponentes.

    1. Ao contrário do veiculado pelo Recorrente, resulta do 286.º, n.º 1, do C.P.P., que a finalidade da instrução é, tão só, comprovar judicial se o arguido deve ou não ir a julgamento.

    2. Não estando reunidos todos os pressupostos para a suspensão provisória do processo, nomeadamente por falta de adesão do Ministério Público, resta determinar o envio do processo para julgamento.

    3. Consequentemente, deve o recurso ser julgado improcedente, confirmando-se a decisão do Tribunal a quo.”*A Exmª. Procuradora Geral Adjunta neste Tribunal da Relação emitiu parecer, tendo-se pronunciado no sentido da sua improcedência.

    *Foi cumprido o disposto no art.º 417.º, n.º 2 do CPP, não tendo sido apresentada qualquer resposta.

    Procedeu-se a exame preliminar.

    Colhidos os vistos legais e tendo sido realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir.

    II – Fundamentação.

    II.I Delimitação do objeto do recurso.

    Nos termos consignados no artigo 412º nº 1 do CPP, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente na sua motivação, as quais definem os poderes cognitivos do tribunal ad quem, sem prejuízo de poderem ser apreciadas as questões de conhecimento oficioso.

    Em obediência a tal preceito legal, a motivação do recurso deverá enunciar especificamente os fundamentos do mesmo e deverá terminar pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, nas quais o recorrente resume as razões do seu pedido, de forma a permitir que o tribunal superior apreenda e conheça das razões da sua discordância em relação à decisão recorrida.

    No presente recurso e considerando as conclusões extraídas pelo recorrente da respetiva motivação, é apenas uma a questão a apreciar e a decidir, a saber: - Saber se o requerimento de abertura de instrução apresentado pelo recorrente contém todos os elementos necessários ao seu recebimento e, consequentemente, se deveria ter sido admitido ou se, tal como sustenta a decisão recorrida, se revela legalmente inadmissível em virtude de a suspensão do processo nos termos do disposto no artigo 47º do RGIT, solicitada pelo arguido em tal requerimento, não determinar a sua não submissão a julgamento.

    II.II - A decisão recorrida.

    Decidiu o tribunal recorrido nos seguintes termos: “(…) Requerimentos de abertura de instrução de fls. 674 e segs. e 697 e segs.: Os requerimentos são tempestivos e o tribunal é competente.

    Vejamos, porém, se é admissível a instrução, nos moldes e para as finalidades em que vem requerida.

    Nos presentes autos, por despacho de fls. 640-653., o Ministério Público deduziu acusação contra os arguidos LCSE Exportação e Importação de Ferros e Metais, Lda., AA, CC e BB, imputando-lhes determinada factualidade que no seu entender os faz incorrer: - LCSE Exportação e Importação de Ferros e Metais, Lda., AA, e CC, em autoria material, na prática de um crime de Fraude Fiscal Qualificada, previsto e punido no art.º 104, n.º 1, al.s a), d), e), f), e n.º 2, al.s a) e b), e n.º 3, do RGIT.; - LCSE Exportação e Importação de Ferros e Metais, Lda., AA, e BB em autoria material, na prática de um crime de frustração de créditos, p. e p. pelo art.º 88, n.ºs 1 e 2, do RGIT.

    Por requerimento de fls. 674 e segs. vem o arguido AA...

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