Acórdão nº 441/21.0GASSB,E1 de Tribunal da Relação de Évora, 13 de Setembro de 2022
Magistrado Responsável | LAURA GOULART MAURÍCIO |
Data da Resolução | 13 de Setembro de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora Relatório No Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal, Juízo de Competência Genérica de Sesimbra - Juiz 2, no âmbito do Processo 441/21.0GASSB, foi o arguido AA submetido a julgamento em Processo Comum e Tribunal Singular. Após realização da audiência de discussão e julgamento, o Tribunal decidiu julgar a acusação improcedente e, consequentemente, absolver o arguido, AA, da prática do crime de violência doméstica previsto e punido pelo artigo 152º, nºs 1, alínea a), 2, 4 e 5 do Código Penal.*Inconformado com a decisão, o Ministério Público interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões: 1. Por decisão proferida em 08.03.2022, a Mma. Juiz do Tribunal a quo decidiu absolver o arguido AA da prática do crime de violência doméstica previsto e punido pelo artigo 152º,nºs 1, alínea a), 2, 4 e 5 do Código Penal; 2. A matéria de facto encontra-se deficiente e insuficientemente fundamentada e padece de erro na apreciação da prova; 3. Não se mostra devidamente fundamentada a razão que levou a Mma. Juiz do tribunal a quo a absolver o arguido por aplicação do principio in dubeo pro reo; 4. A vitima descreveu os factos de forma escorreita, pese embora compreensivelmente emocionada, não havendo qualquer reparo a fazer ao seu depoimento, que foi corroborado pelo depoimento das demais testemunhas e dos demais elementos de prova, documentais e periciais; 5. O depoimento das testemunhas BB e CC forma objectivos e consonantes com a realidade, contribuindo para corroborar o depoimento da vitima, e não para suscitar a duvida no Tribunal conforme se afirma na douta sentença recorrida, sem ser avançado qualquer fundamento válido para tal; 6. O depoimento da testemunha DD foi tendencioso e pretendia a absolvição do arguido; 7. Os factos relatados por esta testemunha e pelo arguido não tem qualquer sustentação noutro elemento de prova e nunca forma alegados ao longo processo; 8. Os factos constantes do relatório do exame pericial estão subtraídos á livre apreciação do julgador e por isso, a Mma. Juiz do Tribunal a quo não podia desvalorizar a referida perícia, sendo premente que se considere provado o facto 16, dos factos não provados; 9. O arguido não alegou qualquer dificuldade na sua defesa, tendo identificado todos os factos descritos na acusação, pelo que não se compreende a razão de ser de tal questão ser levantada na fundamentação da matéria de facto da douta sentença recorrida; 10. Não existe qualquer duvida acerca dos factos descritos na acusação, pois que a postura agressiva, altiva e desafiadora com que o arguido prestou as suas declarações retiram credibilidade às mesmas, o que não permite afastar a credibilidade do depoimento da vitima que vivenciou os factos, porquanto corroborado também pelo depoimento das demais testemunhas e pelos demais elementos de prova juntos aos autos. 11. Assim, e de acordo com a prova que foi produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, conjugada com os demais elementos de prova documental e pericial, analisados à luz das regras da experiência comum, devem ser julgados como provados, pelo menos, os seguintes factos: 1. AA e EE, iniciaram um relacionamento em março de 2020, tendo casado civilmente no dia 25 de junho de 2020; 2. AA e EE residiam na Rua da Fonte, 31, em Sesimbra; 3. O arguido não tem antecedentes criminais; 4. Desde o início do relacionamento, que o arguido AA controlava a vida da ofendida EE, levando a que mesma se afastasse dos seus amigos, e tivesse deixado de trabalhar, para evitar conflitos entre o casal; 5. Desde data não concretamente apurada do relacionamento entre o arguido AA e a ofendida EE que aquele, sempre que era contrariado, gerava uma discussão, e agredia a ofendida EE com murros, chapadas, pontapés e empurrões e chamava-lhe “puta, porca, nojenta”; 6. Em dia não concretamente apurado do mês de maio de 2020, na sequência de uma discussão, o arguido AA desferiu uma chapada na cara da ofendida EE; 7. Em dia não concretamente apurado do mês de junho de 2020, por volta das 03,00 horas, o arguido AA viu uma chamada de um cliente do trabalho da ofendida EE no telemóvel desta, ligou de volta para o cliente a descompô-lo, e de seguida, dirigindo-se à ofendida, atirou com o telemóvel à barriga desta e disse-lhe “és uma puta, andas com todos, uma porca, uma nojenta, andas-me a fazer de otário”, cuspiu-lhe na cara e desferiu-lhe chapadas e pontapés; 8.Em data não concretamente apurada do mês de junho de 2020, por volta da hora de jantar, na sequência de mais uma discussão, o arguido AA atirou a ofendida EE para cima do sofá, colocou-se em cima dela, e de molde a imobiliza-la, colocou os joelhos em cima das costelas da ofendida EE, provocando-lhe dores, que perduraram durante alguns dias; 9. De todas as agressões acima referidas a ofendida EE nunca recebeu tratamento médico; 10. Em dia não concretamente apurado, mas no mês de julho ou agosto de 2020 o arguido AA pegou em € 400,00 que a ofendida EE tinha guardado para tirar um curso de unhas, e adquiriu uma arma pois dizia que andava com problemas com o pessoal a quem comprava droga, e precisava dela para se defender; 11. Em data não concretamente apurada mas posterior à data da aquisição da arma por parte do arguido AA, na sequência de uma discussão, este foi buscar a arma, apontou-a à nunca da ofendida EE, dizendo-lhe eu mato-te, sai daqui senão desgraço a minha vida e a tua”. 12. No dia 11 de abril de 2021, na sequência de saber que a ofendida EE estava grávida, o arguido AA ligou à mãe daquela dizendo-lhe “venha buscar a sua filha antes que eu lhe corte o pescoço”, tendo posto a ofendida EE fora de casa; 13. O arguido AA e a ofendida EEestiveram separados cerca de 2 ou 3 meses, tendo reatado a relação em junho ou julho de 2021; 14. Após o reatar da relação, no dia 28 de agosto de 2021, por causa de ciúmes, o arguido AA disse à ofendida que “enquanto estiveram separados ela tinha andado com meia Sesimbra”, “que era uma puta, uma oferecida, uma nojenta, que andava com conversas porcas na net com os gajos”, tendo a ofendida EE respondido que, se fosse necessário ia confrontar as pessoas com quem o arguido AA disse que tinha andado para ver se era verdade; 15. Descontente com a resposta dada pela ofendida EE, o arguido AA agarrou numa faca encostou-a ao pescoço da ofendida EE e disse-lhe “não faças isso senão mato-te a ti e aos gajos em questão”; 16. De molde a afastar o arguido AA de si, a ofendida EE colocou a mão no peito do arguido, e ato contínuo, aquele foi buscar uma chave de fendas e disse-lhe “sai daqui senão eu furo-te toda, eu mato-te”, ao mesmo tempo que a empurrava, levando a que a ofendida EE se desequilibrasse e caísse ao chão; 17. Nesse mesmo dia a ofendida EE saiu de casa; 18. Como consequência direta e necessária da atuação do arguido AA resultaram para a ofendida EE lesões nas pernas e abdómen; 19. Tais lesões determinaram um período de doença fixável em 10 dias, sem afetação da capacidade de trabalho geral e 5 dias de afetação da capacidade de trabalho profissional; 20. O arguido AA quis atingir a ofendida EE, sua mulher, no corpo, bem sabendo que dessa forma causava-lhe dores e ferimentos, quis dirigir-lhe as palavras acima descritas, estando ciente que as mesmas atingiam a sua honra e consideração, e, com as ameaças que proferiu, quis causar-lhe receio pela sua vida e integridade física, limitando-lhe a sua liberdade de agir, o que conseguiu; 21. Com estas condutas que reiteradamente produziu, o arguido AA quis maltratar, torturar, humilhar, ofender e agredir a ofendida EE, sua esposa, bem sabendo que se encontrava na residência comum do casal, o que quis e conseguiu; 22. Em todas as condutas supra descritas, agiu sempre o arguido AA de forma livre, deliberada e consciente, ciente que as mesmas eram proibidas e punidas por lei penal 23. O arguido frequenta curso profissional de cabeleireiro; 24. Tem o 9º ano de escolaridade; 25. Vive com a ajuda financeira dos seus pais; Faz biscates em manutenção de jardins; 26. Tem um filho de dois anos de idade de outra relação marital, que reside com a respetiva...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO