Acórdão nº 92/19.9GGABT.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 13 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelGOMES DE SOUSA
Data da Resolução13 de Setembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes que compõem a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: A - Relatório No Tribunal Judicial da Comarca de Portalegre - Ponte de Sor, Unidade Central, Criminal (Local) - correu termos o processo comum singular supra numerado no qual o M.º P.º deduziu acusação requerendo o julgamento em processo penal comum, por tribunal singular, da Arguida AA, … nascida a 10.04.1959, ….., imputando-lhe factos susceptíveis de consubstanciar a prática em autoria material, na forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo art.º 143º, n.º 1 do C.P..

O demandante Centro Hospitalar Médio Tejo, E.P.E. veio, a 15.05.2020, sob a referência citius 1611063, deduzir pedido de indemnização civil contra a arguida/demandada pelo valor de €169,68 (cento e sessenta e nove euros e sessenta e oito cêntimos) referente ao valor dos exames e tratamentos médicos dispensados à ofendida BB pela agressão descrita na acusação.

A demandante BB, notificação da acusação deduzida, veio, a 13.10.2020, deduzir pedido de indemnização civil contra a arguida/demandada alegando como fundamento danos não patrimoniais advindo da agressão descrita na acusação.

A arguida/demandada AA apresentou contestação, oferecendo o merecimento dos autos e impugnando os pedidos cíveis deduzidos, não arrolando prova.

A pedido da arguida foi, oportunamente, solicitado ao IML de Portalegre a realização de perícia psiquiátrica à mesma a fim de aferir da sua (in)imputabilidade, tendo sido junto relatório pericial que conclui pela sua imputabilidade criminal, pelo que se determinou o prosseguimento dos autos.

* A final - por sentença lavrada a 19.11.2021 - veio a decidir o Tribunal recorrido: - Condenar a arguida AA na pena de multa de 150 (cento e cinquenta) dias à taxa diária de €6,00 (seis euros), perfazendo o montante global de €900,00 (novecentos euros), pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punível pelo art.º 143º, n.º 1 do C.P..

- Condenar a demandada AA a pagar à demandante BB a quantia de €800,00 (oitocentos euros), acrescida de juros de mora vencidos a contar da data do trânsito em julgado da presente sentença até efetivo e integral pagamento, por configurarem danos não patrimoniais agora fixados.

- Condenar a demandada AA a pagar ao demandante Centro Hospitalar Médio Tejo, EPE a quantia de €169,68 (cento e sessenta e nove euros e sessenta e oito cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos a contar da data da notificação para contestar este pedido de indemnização civil até efetivo e integral pagamento.

- Absolver a demandada AA do demais peticionado.

- Condenar a arguida AA no pagamento ao pagamento das custas criminais do presente processo, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC´s, para efeito do art.º 8º, n.º 5 e tabela III do RCP.

- Com custas cíveis pela demandante AA e pela demandada na proporção do respetivo decaimento, no que concerne ao pedido desta demandante, por força do disposto no art.º 527º do C.P.C., com taxa de justiça pelo mínimo, nos termos do art.º 6º e ponto 2 da tabela I do RCP, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficie.

- E custas cíveis quanto ao pedido de indemnização civil do demandante Centro Hospitalar Médio Tejo, E.P.E. pela demandada na sua totalidade, por força do disposto no art.º 527º do C.P.C., com taxa de justiça pelo mínimo, nos termos do art.º 6º e ponto 1 da tabela I do RCP, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficie.

* Inconformada, a arguida interpôs recurso, com as seguintes conclusões: 1) Considerou o tribunal a quo não provado, que a ofendida tivesse sido agredida na presença das pessoas que estavam no local. O que nos conduz ao pensamento de um bonus pater famílias. Ou seja ninguém presenciou a alegada agressão, porque ninguém estava no local.

2) Contudo, considera o tribunal a quo, que o depoimento da ofendida foi «credível».

3) Surge-nos um cenário de uma alegada agressão sem qualquer testemunha. E somos confrontados com o testemunho da ofendida que é parte interessada nos autos, e inclusivamente deduziu pedido cível e que tem tudo a ganhar com a condenação da arguida, quer por vinganças antigas, quer porque tem interesse monetário associado à condenação da arguida.

4) Logo, e com todo o respeito por opinião contrária, se há depoimento que não pode deixar de ser parcial e interessado no desfecho do processo e na condenação da arguida, é o testemunho da própria ofendida.

5) Pelo que, não se poderá considerar tal depoimento credível e basear no mesmo a condenação da arguida. Daqui se conclui a fragilidade, aliás, a inexistência mesmo, de matéria probatória suficiente para condenar a arguida.

6) O Autor Paulo Pinto de Albuquerque, tomou posição no sentido de que o art. 129.º do CPP, quando se refere a uma inquirição de pessoa determinada, reporta-se apenas às testemunhas. Não devendo assim ser tido em conta o depoimento indirecto de uma testemunha sobre o que ouviu dizer de um assistente, parte civil ou arguido.

7) Segundo o mesmo Autor, sendo o art. 129.º do C.P.P. uma norma excepcional, não pode ser aplicada de forma analógica ao depoimento de uma testemunha sobre o que ouviu dizer a um assistente, arguido ou parte civil. Vidé, Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário do Código de Processo Penal à Luz da Constituição da República Portuguesa e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 4.ª edição actualizada, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2011, pág. 361.

8) Da mesma posição doutrinal comunga José Damião da Cunha, in «O regime processual da leitura de declarações em audiência de julgamento», Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 7, fascículo 3, Julho – Setembro 1997, Coimbra Editora, págs. 436 a 438.

9) Razão pela qual, deveria a arguida ter sido absolvida da prática do crime de ofensa à integridade física, por falta de prova bastante, ou, pelo menos, por dúvidas sobre a prova produzida em audiência de julgamento - in dubio pro reo.

10) Mas, acresce ainda que se alega terem os factos ocorrido em 17 de Dezembro de 2019. E constata-se depois no relatório do INML que fez a perícia à ofendida, que esta esta só foi lá observada dia 30 do mesmo mês e ano. Nesse relatório lê-se ser visível no braço da ofendida um hematoma de cor arroxeada.

11) Pois resulta da experiência de um bonus pater familias, o conhecimento de que um hematoma tem início com uma cor roxa e vai gradualmente, em uma a dois semanas, desaparecendo, evoluindo para uma cor amarela esverdeada.

12) Não se põe em causa a existência do hematoma observado pelo Sr. Perito Médico. Mas, dúvidas não pode haver de que aquele hematoma em concreto, não poderia ter sido causado pela alegada agressão imputada à arguida.

13) Refere o tribunal a quo, que «o Tribunal não tem conhecimentos médico/científicos para afastar as conclusões que resultam daquele relatório pericial.» Pois se assim é, tem o dever de providenciar pela obtenção de esclarecimentos com vista a que o decidir com pleno conhecimento sobre todos os factos e não aceitá-los porque possa dúvidas. O objectivo de uma audiência de julgamento é a procura e descoberta da verdade material. Dispõe o n.º1 do art. 340.º do C.P.P.: «o Tribunal ordena, oficiosamente ou a requerimento, a produção de todos os meios de prova cujo conhecimento se lhe afigure necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa.» 14) Princípio que o tribunal a quo atropelou.

15) Deu o tribunal a quo como certo, que o hematoma arroxeado observado 13 (treze) dias após a alegada agressão, seria consequência dessa mesma agressão. Ou seja, um hematoma manteria sempre a mesma coloração.

16) Convicção esta que fere mais básicas regras da experiência comum.

17) Quanto à medida da pena e sempre com o devido respeito pelo tribunal a quo, que é muito, não é possível concordar com a mesma. A arguida aufere uma pensão de reforma no montante de 402,00€ (quatrocentos e dois euros) mensais, não chegando assim ao salário mínimo nacional.

18) Nos termos do disposto no art. 40.º, n.2 do C.P.: «Em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa.» Devendo também ter por base a situação financeira da...

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